sexta-feira, 22 de junho de 2007

INCRA AGRAVA CONFLITO FUNDIÁRIO

Superintendente Raimundo Cardoso desrespeita reivindicação dos extrativistas de Porto Dias


O superintendente do Incra no Acre, Raimundo Cardoso, excedeu-se ontem ao receber no gabinete dele uma comitiva que buscava solução para o conflito fundiário que se desenrola no seringal Porto Dias, em Acrelândia, onde Antonio Carlos Ferreira, o Carlão, vem sendo acusado de fazer ameaças de morte e de converter em fazenda área do projeto agroextrativista de 22 mil hectares.

Os extrativistas procuraram o blog para tornar público o tratamento dispensado pelo superintendente do Incra. Além de representantes da comunidade do Projeto de Assentamento Agroextrativistas Porto Dias, participaram da reunião lideranças do Conselho Nacional dos Seringueiros, Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Acre e Centro dos Trabalhadores da Amazônia.

Causa espanto a conduta do agrônomo Raimundo Cardoso, que ganhou recentemente na justiça o direito de utilizar seu verdadeiro nome - Carlos Augusto Lima Paz. Cearense, o ex-guerrilheiro "Porongaba" trocara de nome para agir na clandestinidade pretensamente em defesa dos trabalhadores durante a ditadura militar. Após o relato da situação em Porto Dias pelos trabalhadores, Cardoso respondeu:

– Peço até desculpas a vocês, mas tudo isso que está acontecendo no PAE Porto Dias é culpa da comunidade que não se organiza para resolver esse problema. O Incra tem recebido uma chuva de ofícios, mas a própria comunidade já poderia ter resolvido a situação fazendo empates, se organizando e se mobilizando para enfrentar os capatazes dos fazendeiros.

Cardoso disse que as derrubadas e as retiradas ilegais de madeira são problemas que a comunidade é quem deve resolver. Quando um trabalhador argumentou que a associação dele fica às margens do rio Abunã, mas o problema ocorre na parte do PAE próxima da BR-364, recebeu de Cardoso um conselho:

- Você precisa mobilizar o povo e vai brigar com os madeireiros. Caso não resolva, aí me procure para que eu possa tomar as providências necessárias.

Dirigindo-se à humilde Maria Albanízia, da Associação Agroextrativista S. José, o superintendente do Incra acrescentou:

- A senhora deve é ir lá na porteira do Carlão e arrebentar o cadeado e ficar fiscalizando a porteira.

Carlão possui uma fazenda de gado dentro do assentamento agroextrativista, modalidade destinada às comunidades tradicionais. Trata-se de um modelo de assentamento conquistado pelo movimento social do Acre, também conhecido por movimento dos seringueiro. A sua conquista custou a vida de lideranças como Wilson Pinheiro e Chico Mendes.

Reuniões como a de ontem são comuns no cotidiano de um gestor público de uma organização da natureza do Incra, onde produtores rurais e florestais buscam dialogar sobre seus direitos de legítimos beneficiários da reforma agrária junto ao órgão competente.

Porém, no Acre, berço das reservas extrativistas e assentamentos extrativistas, o descaso pelo controle fundiário (Incra) e ambiental (Ibama e Secretatria Estadual do Meio Ambiente) dessas áreas se aproxima de um limite. O PAE Porto Dias é apenas um exemplo de uma situação generalizada em todo o Estado e certamente em toda a Amazônia.

A presença do fazendeiro Carlão serve para acobertar a presença de diversos outros pecuaristas, caçadores e extratores de madeira ilegais que, sem o menor perfil extrativista, empreendem negócios dentro do PAE a fim de explorar os recursos ambientais.

Freqüentemente, a comunidade local é ameaçada por capatazes de Carlão, que é apoiado por políticos ligados ao "governo da floresta". Atualmente, o fazendeiro mantém suas porteiras fechadas com corrente e cadeado, fato que impede o direito de ir e vir da comunidade local. Além dos cadeados, mantém em suas terras um rebanho de gado, com reses valentes.

A situação vem sendo exposta repetidas vezes, por escrito, há mais de dois anos, mas o superintendente do Incra teima em não tentar resolver o conflito fundiário. Durante a reunião foram firmados compromissos:


1) Cardoso informou que o processo de desapropriação contra Carlão se encontra na procuradoria do órgão. Vicente Brito, procurador do Incra, está analisando o processo para dar parecer. Caso o parecer seja favorável, o processo será encaminhado para o Incra em Brasília, que efetuará a indenização do Carlão. Após o pagamento, Carlão terá direito a recurso, no entanto, a propriedade deverá ser desocupada.

2) Carlos Eduardo Sturm, diretor do Incra, se comprometeu a verificar a questão das porteiras trancadas que impedem o livre acesso dos moradores.

3) O mesmo diretor foi convidado e aceitou participar, no dia 4 de julho, de uma reunião onde estarão presentes as três associações de moradores do PAE Porto Dias. Na oportunidade o Incra poderá se manifestar em relação às denuncias feitas pela comunidade local sobre invasão e ocupação ilegal de terras no PAE. Também firmou o compromisso de realizar um diagnóstico da ocupação no PAE Porto Dias.

Durante a reunião, os trabalhadores lembraram que foram eles que colocaram os atuais gestores no poder para representarem os seus interesses. Reconheceram que esses gestores assumiram organizações e estruturas que historicamente serviram para atender os interesses das classes dominantes.

Assista ao vídeo das entrevistas com Aclício Daniel Alencar e Maria Albanízia, da Associação Agroextrativista S. José.

5 comentários:

Anônimo disse...

Prezado Altino,

Li no seu blog noticias sobre os conflitos fundiários em Porto Dias, e achei interessante vc acompanhar e saber que não é só por lá que a coisa anda feia, agora de manhã está acontecendo um encontro com os seringueiros da Gleba Mari e Floresta (ver noticia em anexo) na Assembléia.

Saudações Cordiais,

Mirna Caniso

Anônimo disse...

Caro Altino a verdade é que a gestão do Ex guerrillheiro Raimundo Cardoso foi a grande decepção. Pois depois de décadas de domínio da máquina do INCRA do Estado em favor da grilagem, regularização de grandes propriedades, favorecimento em licitações o Cardozo representava a grande esperança de darmos um salto na resolução do grave problema fundiário do Estado. Pela primeira vez na história tivemos forças progressistas na gestão do Estado e dos órgãos federais, infelizmente a esperança tornou-se decepção ao ver grupos ligados a própria Frente Popular operando em favor de fazendeiros, grileiros, latifundiários contribuintes de campanha.

Espero que ainda não seja tarde para aproveitarmos esta oportunidade, tendo corajem e vontade política na realmente tocar nas feridas e mexer com os poderosos. Espero que possamos ainda reverter este quadro nos três anos que restam dos Governos do Binho e Lula, pois não sabemos se teremos oportunidades semelhantes tão cedo

Anônimo disse...

Proposta

22.06.2007

Já chegou aos ouvidos da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, a proposta para que o estado seja mais um aliado no pacto do desmatamento zero da Amazônia. A idéia que está sendo arquitetada por organizações não-governamentais já conseguiu como aliados governadores de peso na região. Começou com Eduardo Braga, do Amazonas, e Binho Marques, do Acre, e recentemente entrou em jogo ninguém menos do que o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi.


Cooptação complexa

22.06.2007

Ana Júlia mostrou-se interessada no pacto pelo desmatamento zero, mas impôs uma condição: só entra nessa se as "complexidades" do Pará forem consideradas. Em outras palavras, antes de falar em degradação nula, o estado precisa regularizar todo seu passivo fundiário e ambiental. Cerca de 35% das terras paraenses estão na ilegalidade.Os proponentes do pacto sugeriram que se inicie um plano conjunto para licenciamento das propriedades rurais e regularização fundiária.


Estados à frente

22.06.2007

A adesão de governadores faz com que o pacto de desmatamento zero na Amazônia caminhe com rapidez significativa. Além disso, com a descentralização de gestão florestal promovida recentemente por resoluções Conama, trabalhar com os estados aumenta a eficácia do plano. Em nível nacional, as conversas com o governo federal caminham a passos de tartaruga.

oeco.com.br

Editor disse...

Ainda há muita grilagem de terras no Acre. Aliás, só tem aumentado. O problema apenas não é noticiado. Esse capital que está órfão aí no Sul do Amazonas já está pressionando o sistema fundiário. Como o Iteracre só existe no papel é de se esperar o agravamento da situação. São as regras do desenvolvimento insustentável do governo de mentirinha que foi instalado aqui mostrando a sua cara.

Anônimo disse...

Altino, o Jornal da Amazônia fez essa matéria. É claro que usamos o seu blog como fonte primária dessa informação e fizemos nossa apuração. Mais uma vez obrigado!

Daniel Costa
Editor-Chefe Jornal da Amazônia/Rádio Nacional da Amazônia/Radiobrás