terça-feira, 29 de agosto de 2017

Suco de apuruí

Trouxe as semente lá da Serra do Moa, na fronteira com o Peru, durante uma viagem que fiz em 1993. Há 20 anos, quando chega o verão amazônico, seus frutos caem maduros para que eu faça suco e musse.

sábado, 26 de agosto de 2017

Advogado: "Indígena huni kuin é perseguido por igrejas evangélicas, polícia e judiciário"

O advogado paulista Konstantin Gerber, que atua na defesa do indígena Raimundo Nonato Rodrigues de Carvalho, 37, preso em Feijó (AC) suspeito de estupro de vulnerável e porte de cocaína em rapé, enviou neste sábado (26), uma nota como direito de resposta. 

Konstantin Gerber

Na qualidade de advogado de defesa de Bainawa Inubake, diante da divulgação de sua foto e nome, solicitamos correções e respostas às ofensas publicadas nas matérias do “Blog do Altino Machado”:

Direito de resposta - Liberdade Bainawa

1. A escrita de seu nome na língua Hãtxa Kuĩ” é Bainawa Inubake. Em sua língua, seu nome significa caminho do céu.

2. No post de quinta-feira, 24 de agosto de 2017, onde se lê que “(...) Raimundo Nonato Rodrigues de Carvalho, de 37 anos, foi flagrado com rapé contendo substância derivada de folha de coca (...)” e que “(...) a Polícia Civil do Acre cumpriu, na tarde de 5 de agosto, em Feijó, mandado judicial de prisão, pois ele é acusado por parentes de sua etnia de estupro de vulnerável”, ambas passagens do texto devem ser corrigidas.

3. O inquérito do processo em que é acusado de violência sexual (estupro) não foi concluído, seguindo em segredo de justiça, mas caso a suposta vítima se retrate da falsa denúncia, este segredo de justiça deve ser imediatamente levantado pelo juiz.

4. Processos judiciais podem ser instrumentalizados para fins de perseguição política, ainda mais, quando se tornam midiáticos. Campanhas difamatórias podem gerar danos irreparáveis.

5. Se existem conflitos familiares na aldeia em que Bainawa Inubake foi criado, hoje praticamente toda evangelizada, isso deve ser levado em consideração. Não é de hoje que existem notícias de conflitos familiares entre Huni Kuĩ evangelizados e aqueles que exercem o modo de vida e defendem a cultura Huni Kuĩ tradicional.

6. Se existe comportamento machista deste ou daquele, é preciso discutir e debater o tema da violência contra a mulher com todas e todos Huni Kuĩ. Além do mais, existem casos de crimes, porém, os nomes destes indígenas nunca foram expostos, o que pode colocar as vítimas, sobretudo de assédio ou violência sexual, em situação de opressão e terror com medo de denunciar. Nenhum indígena até agora foi denunciado e anunciado como feito neste momento pela Fephac por crime de estupro pelo blog de Altino Machado, justamente contra a pessoa de Bainawa Inubake.

7. Estamos pedindo que o caso de Bainawa Inubake seja levado para a justiça Huni Kuĩ, para que o direito costumeiro deste povo seja respeitado, nos termos do art. 8.1 da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.

8. Agora, se comprovado de que se trata de uma campanha difamatória motivada por intolerância religiosa contra Bainawa Inubake, este deverá ser absolvido.

9. A decretação da prisão preventiva derivada deste processo teve por fundamento a declaração da suposta vítima, mas não só. Em cumprimento à ordem de prisão, Bainawa Inubake, quando estava a caminho para a assembleia da Fephac, foi preso em flagrante por transportar medicina indígena.

10. Deve ficar claro que à época da expedição do decreto de prisão preventiva, Bainawa Inubake estava ministrando tratamentos como pajé, conforme atas de reuniões da aldeia novo segredo.

11. Aí vem a notícia derivada de laudo de constatação da Delegacia de Polícia do Município de Feijó - preliminar ao exame toxicológico - de que havia cloridrato de cocaína no rapé que transportava. Ora, é sabido e consabido que o rapé é medicina indígena a conter tabaco e cinzas de cascas de árvore.

12. O tabaco é conhecido como Dume Putu tendo como guardião espiritual Heske, que é o chefe do tabaco. O rapé é utilizado em cerimônias, em relaxamento depois do trabalho e em rituais de cura. É agente de comunicação com o espírito da floresta.

13. O rapé vem também referido no livro da Cura Una Isi Kayawa como “importante medicina do conhecimento tradicional”, afirmando-se que “conecta com o espírito de cura”, página 81.

14. No Brasil, traficante é quem a polícia quer que seja. O modus operandi é de violação sistemática ao devido processo legal em todo território nacional, com a maioria dos processos de tráfico contando como única prova do crime o apenas e exclusivo testemunho de agentes do Estado.

15. Bainawa Inubake é cacique (líder da aldeia Novo Segredo) e presidente do Centro de Cultura do Espírito da Floresta Yurubaka Nai Bai Yuxibu Baibu composto por pajés Huni Kuĩ do Rio Envira, sendo responsável por reestruturar e expandir a cultura do conhecimento tradicional Huni Kuĩ, com valorização e respeito dos mais velhos (anciões) nas aldeias do Formoso, Mē Txanaya, Novo Segredo, dentre outras.

16. Bainawa Inubake é um pajé e possui a formação da jiboia e as chamadas formações com a Mucá (batata sagrada) e com o Nixi Pae (conhecido também como ayahuasca).

17. É pai de família (pai de cinco filhos e mais um sexto vindouro), casado com Samã Yurubakã, que está grávida de oito meses, que é pajé e agente de saúde. Samã realiza em conjunto com seu par, importantes projetos nas aldeias do Envira focados na saúde, na educação e na cultura do povo Huni Kuĩ do rio Envira.

18. Bainawa Inubake trata-se de um txai, pajé, cacique, “txaná” (músico, artista) tem formação em educação, foi professor, alguém que se preocupa com projetos educacionais, culturais e de saneamento. Homem de caráter, correto, íntegro, respeitoso, moralmente reto. Não admite deturpações e manipulações contra os povos originários e suas medicinas. Trata-se de defensor nato dos direitos dos povos originários que está sendo perseguido e desvalorizado por igrejas evangélicas, polícia e judiciário, em meio a um castelo teórico para imputar crimes sem provas.

19. Bainawa Inubake participou de diversos festivais no Estado de São Paulo, levando para o espaço público respeito, valor e sensibilidade do povo Huni Kuĩ, em atividades até agora sem fins lucrativos, procurando-se comunicação constante com a Fephac para cumprimento e preenchimento de todos os requisitos do Estatuto desta. É protagonista do documentário premiado internacionalmente “Os últimos guardiões Huni Kuĩ” (https://vimeo.com/191013483). Sua intenção é continuar produzindo festivais de cultura, apresentações artísticas e livros didáticos.

20. Com o intuito de fomentar a economia sustentável ao longo das aldeias, foi desenvolvida uma produtora cultural no Estado de SP e está em vias de estruturação uma associação para defesa dos patrimônios culturais Huni Kuĩ e Guarani. Dentre os objetivos, está o de constituir uma rede de economia solidária, com fomento ao artesanato e à agrofloresta, e também reerguer a OPIRE (Organização dos Povos Indígenas do Rio Envira) de modo a instituir protocolos comunitários com declarações de princípios para medicina indígena e divulgação da cultura.

21. No atual momento, alguns dos objetivos centrais do Conselho do Centro Yurabaka Naibai Yuxibu Baibu consistem em contribuir para: saneamento básico; construção de casa de reza; construção de casas de parto; auxílio às parteiras; oferecimento de transporte; estabelecimento de infra-estrutura para comunicação; criação de radio web; construção de estúdio de música mantido por energia solar; projetos de energia solar; monitoramento de terras indígenas; e projetos educacionais e culturais para defesa da cultura do povo Huni Kuĩ.

22. Esclareça-se, por fim, que medicina indígena é: direito humano, art. 31 da Declaração Universal dos Povos Indígenas da ONU; e que está está definido e protegido como conhecimento tradicional pelo art. 2.2 d) da Convenção para Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial de Salvaguardas da UNESCO, bem como fartamente disciplinado pela Convenção e Lei da Biodiversidade.

23. Liberdade Bainawa!

Rio Branco, 24 de agosto de 2017

Konstantin Gerber
OAB-SP 290.415

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Federação Huni Kuin pede divulgação do nome de indígena preso suspeito de estupro e porte de cocaína no rapé

Bainawa Baikana está preso em Feijó - Foto: Facebook

O presidente da Federação do Povo Huni Kuῖ do Estado do Acre (Fephac),  Ninawa Inu Pereira Nunes Huni Kui, enviou nota de esclarecimento a respeito da postagem, neste blog, intitulada “Indígena é preso com cocaína no rapé; maconha e folha de coca são moda em aldeias do Acre”.

A Fephac, representante da etnia, composta só no Brasil por mais de 12 mil pessoas, pede "que quando a acusação incidir sobre uma pessoa, essa pessoa seja indicada, e não apenas o povo a que pertence, para que o suposto crime do indivíduo não seja atribuído a todo um povo como temos visto ocorrer nesta última semana em face da divulgação deste caso".

O blog havia optado por omitir o nome e o real motivo da prisão: o indígena Bainawa Baikana, registrado como Raimundo Nonato Rodrigues de Carvalho, de 37 anos, foi flagrado com rapé contento substância derivada de folha de coca quando a Polícia Civil do Acre cumpriu, na tarde de 5 de agosto, em Feijó, mandado judicial de prisão, pois ele é acusado por parentes de sua etnia de estupro de vulnerável.

Trecho do boletim da Polícia Civil
— E no tocante à questão específica do rapé, esclarecemos que o rapé feito pelo povo Huni Kuῖ na forma tradicional não contém folhas de coca in natura e/ou de algum subproduto da mesma como a cocaína que jamais, em qualquer tempo poderá ser considerada como tradicional de nosso povo. Inclusive, uma das iniciativas que a FEPHAC está desenvolvendo é justamente a criação de um selo que ateste a qualidade e autenticidade de nossos produtos - afirma a nota.

E sobre esse ponto específico, a Fephac assinala que "pairam dúvidas sobre a veracidade da informação divulgada. Para a entidade, "é recomendável que se possa conhecer e divulgar amplamente todos os resultados laboratoriais capazes de atestar sem qualquer dúvida que, de fato, o indígena preso portava a substância noticiada, mas, ainda que isto seja comprovado neste caso específico, reiteramos a imprescindibilidade de diferenciar a pessoa de seu povo, e do mesmo modo, a substância que o mesmo portava do rapé que é produzido de forma tradicional e pelo povo Huni Kuῖ".

Embora bastante esclarecedora, a nota da Fephac não comenta sobre a acusação de estupro e sobre o plantio e consumo crescente de maconha nas aldeias indígenas. A pedido da Funai, o indígena Bainawa Baikana está preso numa unidade do Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen), junto ao quartel da PM em Feijó. O secretário de Justiça e Direitos Humanos, Nilson Mourão, pediu que seja garantida a integridade física do indígena.

A Funai solicitou nesta quarta-feira (23) que a Delegacia da Polícia Federal em Cruzeiro (AC)  realize exame laboratorial mais acurado para confirmação do resultado do narco-teste realizado no ato do flagrante pela Polícia Civil.

Nota de esclarecimento da Federação do Povo Huni Kuin do Acre

Na qualidade de instituição representativa máxima do povo indígena Huni Kuĩ no Brasil, que agrega as diversas associações, organizações e comunidades Huni kuĩ em território brasileiro, a Federação do Povo Huni Kuῖ do Estado do Acre – FEPHAC – NUKUN HUNI KUINEN BEYA XARABU TSUMASHUN EWAWA, vem se manifestar publicamente acerca da matéria “Indígena é preso com cocaína no rapé; maconha e folha de coca são moda em aldeias do Acre”, publicada pelo senhor Altino Machado na data de 21/08/2017. Sobre o assunto temos a manifestar o quanto segue:

I. Desde a sua fundação no ano de 2006, a FEPHAC tem buscado a proteção dos direitos culturais do povo huni kuĩ, através do estabelecimento de uma agenda positiva com as instituições competentes, notadamente a Funai, o Ministério Público Federal, Ministério da Cultura, IPHAN, IBRAM, CISGEN e Ministério das Relações Internacionais, dentre outros.

II. Da mesma maneira, a preocupação com o modo como gerimos e protegemos a nossa cultura não é ausente e tem sido alvo de intensas discussões pelas lideranças huni kuĩ em suas terras indígenas, e, do mesmo modo, nas Assembleias Coletivas da Federação.

III. Cabe citar a propósito, que foram realizadas, nos anos de 2015, 2016 e 2017 as três grandes assembleias do povo huni kuĩ, onde, dentre outras coisas, foi debatido o assunto da autorização para realização de pesquisas ligadas a conhecimentos tradicionais do povo huni kuĩ, a saída de pessoas huni kuĩ nas chamadas ‘viagens de divulgação da cultura’, a diferença do uso tradicional dentro das Aldeias das medicinas consideradas sagradas e a banalização dessas fora da aldeia, assim como também a entrada de não-indígenas nos territórios huni kuĩ.

IV. Do resultado dessas Assembleias e dos amplos debates, tivemos como resultado a aprovação do Estatuto e do Regimento da Federação do Povo Huni Kuĩ e, também a partir desses fóruns decisórios coletivos, estamos trabalhando na criação do Protocolo Comunitário de nosso povo, sendo nossa intenção sempre que estes instrumentos sejam criados com o acompanhamento e apoio do Órgão Indigenista, bem como será divulgado para todas as instâncias competentes e instituições parceiras, tanto para que o mesmo seja conhecido, como para que também tenhamos o auxílio necessário para a sua efetividade.

V. Dentre as regulamentações que internamente já estabelecemos e estão funcionando deste o ano passado, está o instrumento de anuência para a aprovação da saída de pessoas huni kuĩ para as chamadas ‘viagens de divulgação da cultura’, as quais devem atender sempre aos seguintes requisitos: ter comprovada autorização de sua comunidade de origem, e informar à Federação Huni Kuῖ com antecedência a finalidade, o local de destino e os objetivos da viagem, assim como também pelo menos um contato de pessoa na cidade destino que se responsabilizará pelo huni kui convidado desde a saída da TI até o seu retorno, quando, inclusive, espera-se que a pessoa que viajou preste contas dos resultados obtidos em sua viagem. Além disso, o documento de anuência indica ao huni kuĩ que empreende a viagem que ele se compromete a não realizar quaisquer atos que venham a ser danosos à cultura huni kuĩ o à cultura indígena em geral, sob pena de responder por isso inclusive criminalmente. Por óbvio, aquele que viaja também deve ter conhecimento que deve respeitar às leis vigentes no país.

VI. Fica compreendido, também, que aqueles que se convidam a pessoa huni kui para realizar essas viagens, respondem solidariamente por quaisquer ilícitos que venham a ser cometidos durante o curso da viagem.

VII. Esclarece-se que estas medidas não têm qualquer objetivo proibitivo ou de controle à livre circulação e manifestação, mas tem a intenção de acompanhar tais tratativas e prestar auxílio em situações de conflito, não sendo cabível que, no entanto, a Federação, as comunidades ou o Povo Huni Kuῖ respondam por atos ou tenham o seu nome envolvido em acusações a respeito de condutas de indivíduos que não respeitam esse procedimento, e que não têm autorização de sua comunidade para viajar ou falar em nome do povo.

VIII. Reiteramos que estamos ampliando o diálogo e o debate com os órgãos competentes para divulgar cada vez mais este instrumento, e, ao mesmo tempo, buscar ações de conscientização no interior de nossas comunidades Huni Kuῖ, para que compreendam a necessidade de termos zelo pela nossa cultura e imagem.

IX. Nesse sentido, ressaltamos que Huni Kuῖ é o nome de um povo composto hoje só no Brasil por mais de 12 mil pessoas e, portanto, este nome deve ser respeitado seja por qualquer instituição, pessoa ou meio de comunicação, e nesse sentido, indicamos que quando a acusação incidir sobre uma pessoa, essa pessoa seja indicada, e não apenas o povo a que pertence, para que o suposto crime do indivíduo não seja atribuído a todo um povo como temos visto ocorrer nesta última semana em face da divulgação deste caso.

X. Cabe acrescentar também, que somente quem tem legitimidade para dizer quem é ‘pajé’ ou não é sempre o próprio povo, razão pela qual não reconhecemos títulos auto-atribuídos, e muito menos aqueles atribuídos por terceiros que não pertencem ao nosso povo e nem possuem compreensão da cultura.

XI. E no tocante à questão específica do rapé, esclarecemos que o rapé feito pelo povo Huni Kuῖ na forma tradicional não contém folhas de coca in natura e/ou de algum subproduto da mesma como a cocaína que jamais, em qualquer tempo poderá ser considerada como tradicional de nosso povo. Inclusive, uma das iniciativas que a FEPHAC está desenvolvendo é justamente a criação de um selo que ateste a qualidade e autenticidade de nossos produtos.

XII.
E sobre esse ponto específico, a respeito do qual pairam dúvidas sobre a veracidade da informação divulgada, indicamos que é recomendável que se possa conhecer e divulgar amplamente todos os resultados laboratoriais capazes de atestar sem qualquer dúvida que, de fato, o indígena preso portava a substância noticiada, mas, ainda que isto seja comprovado neste caso específico, reiteramos a imprescindibilidade de diferenciar a pessoa de seu povo, e do mesmo modo, a substância que o mesmo portava do rapé que é produzido de forma tradicional e pelo povo Huni Kuῖ.

Sem mais pelo momento, nos colocamos à disposição para quaisquer esclarecimentos que se façam necessários sobre os assuntos aqui comentados, ou sobre o povo huni kui. Tais esclarecimentos poderão ser prestados também pelo telefone: (68) 99901-7161 ou através do email fephac16@gmail.com.

Cordialmente,

Ninawa Inu Pereira Nunes Huni Kui
Presidente da Fephac

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Indígena é preso com cocaína no rapé; maconha e folha de coca são moda em aldeias do Acre


Um indígena de 37 anos, da etnia huni kuin (kaxinawá), do Rio Envira, está preso desde o começo do mês no quartel da Polícia Militar do Acre, no município de Feijó, após agentes da Polícia Civil flagrá-lo com 51,5g de maconha e 6,9g de rapé misturado com cocaína.

O resultado positivo da presença de cocaína no suposto rapé foi constatado em exame toxicológico (narco teste) preliminar realizado na Delegacia de Polícia Civil da cidade.

Vários indígenas, principalmente da etnia kaxinawá, têm sido presos no Acre nos últimos anos com maconha.

Caso o juiz de Feijó decida em audiência de custódia que o indígena terá que responder ao processo preso, ele terá que ser transferido para a penitenciária de Tarauacá.

Com um histórico de conflitos em sua aldeia, o indígena preso vivia basicamente de vender e realizar rituais com rapé em cidades como Rio, Brasília e São Paulo, onde o consumo de tabaco em pó feito para cheirar é crescente.

O caso trouxe mal-estar aos huni kuin, agora divididos entre os que comemoram a prisão e os que tentam libertá-lo.

Excetuando o já grande comércio de ayahuasca, nos últimos anos os indígenas do Acre passaram a viajar e a ganhar dinheiro com a exportação de rapé e kambô, conhecido como vacina do sapo.

Turistas estrangeiros, principalmente chilenos, costumam viajar até Cruzeiro do Sul (AC) para comprar a secreção do sapo cristalizada.

Existe até uma mistura muito perigosa, que não faz parte da tradição de nenhuma etnia, que combina rapé com kambô.

Atualmente, o rapé faz parte da lista de produtos da floresta acreana mais comercializados dentro e fora do país.

Alguns indígenas, individualmente, chegam a produzir até 40kg de rapé. Além disso, nas cidades do Acre, brancos produzem rapé e comercializam como sendo de origem indígena. Vários sites, dentro e fora do Brasil, também comercializam abertamente o rapé, inclusive com outras misturas exóticas.

Nenhum documento antropológico ou etnográfico sobre as populações indígenas do Acre menciona o cultivo e uso de maconha.

Os huni kuin gostaram tanto da canabis que passaram a cultivá-la em suas aldeias. Dizem que é um "tabaco perdido", que era consumido por seus ancestrais.

A maconha passou a ser chamada de shuru e contou até com parecer antropológico em defesa de seu cultivo nas terras da etnia.

As redes sociais, especialmente o Facebook, são o ambiente ideal para acompanhar a expansão do comércio de todas essas substâncias em várias cidades do mundo, levadas por indígenas.

Existem jovens indígenas com menos de 20 anos de idade que se declaram pajés e viajam para metrópoles atraídos por gente do movimento new age, capaz de pagar em dólares por experiências com substâncias que sejam capazes de ampliar os sentidos.

Das 14 etnias presentes no Acre, o consumo de folha de coca para mascar faz parte da tradição apenas dos ashaninka, que pertencem a família linguística aruak (ou arawak), principal componente do conjunto dos aruak sub-andinos, também composto pelos matsiguenga, nomatsiguenga e yanesha (ou amuesha).

Mascar folha de coca virou moda entre as demais etnias, que são da família linguística pano. Como a planta não existe nas terras destas etnias, os indígenas adquirem a folha de coca em cidades e vilarejos peruanos e bolivianos.

A moda, que começou entre os yawanawá, se tornou foco de preocupação do líder indígena Joaquim Tashka Yawanawá durante o recente 5˚Festival Mariri de sua etnia.

Indígenas e brancos compareceram ao festival com sacos pretos contendo folhas de coca. Por causa disso, o líder indígena já solicitou à Funai para agendar a presença, na aldeia Mutum, do delegado da Polícia Federal de Cruzeiro do Sul.

— Mascar coca não faz parte de nossa tradição e não vamos ficar mascando coca apenas porque os ashaninka mascam. Queremos a presença do delegado da Polícia Federal para nos explicar sobre as implicações legais disso. Vamos, primeiro, criar consciência de que não faz parte de nossa cultura e que isso pode nos causar problemas com a lei, pois o cultivo e uso da folha de coca são proibidos por causa de sua substância. Depois desse esclarecimento, após tentar criar essa consciência, nós vamos expulsar de nosso convívio e até denunciar às autoridades quem continuar trazendo folha de coca para mascar em nossa aldeia.

Consultada, a Funai de Cruzeiro do Sul disse que acompanha o caso do indígena preso e prometeu se manifestar após apurar os demais fatos relatados nesta nota.

NOTA DO BLOG - aatualização às 14h de 22 de agosto de 2017:

Aviso aos fanáticos do movimento new age e aos usuários de maconha que exploram a boa fé dos indígenas do Acre e que ficam questionando o meu trabalho.

Conversei com lideranças huni kuin (kaxinawá) a respeito da nota que escrevi sobre um indígena preso após ser flagrado com rapé contendo cocaína.

Os líderes huni kuin com quem conversei disseram que meu erro foi ter omitido o nome do indígena.

Fiz a opção de omitir o nome, assim como optei por omitir que a prisão decorre do cumprimento de um mandado de prisão por estupro de vulnerável.
A suposta substância tóxica foi constatada no flagrante da prisão, no cumprimento do mandado judicial.

A Federação Huni Kui do Acre prometeu redigir uma nota de esclarecimento e ela será publicada com o destaque que merece.

Portanto, evitem fazer comentários idiotas sobre o que desconhecem.