sábado, 29 de novembro de 2014

Mulçumanos do Senegal

Dois imigrantes senegaleses, seguidores da fé islâmica, na Estrada Raimundo Irineu Serra, em Rio Branco

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

RS faz 'tempestade em copo d’água' por causa de imigrantes haitianos, diz Acre

Haitianos no abrigo de imigrantes, em Rio Branco, com destino a São Paulo e Porto Alegre

O governo do Acre considera “tempestade em copo d’água” a reação crítica do governo do Rio Grande do Sul em decorrência dos ônibus com imigrantes do Haiti que teriam sido enviados durante a semana, de Rio Branco para Porto Alegre, sem aviso. O secretário de Desenvolvimento Social do Acre, Antonio Torres, disse que o governo estadual foi orientado pelo Ministério da Justiça a providenciar o embarque dos imigrantes haitianos para a capital gaúcha.

- O governo gaúcho está fazendo uma tempestade em um copo d’água. Essa questão tem que ser dialogada com o Ministério da Justiça porque não é o Acre que coordena a política e as ações em benefício de imigrantes no país. O Ministério da Justiça é quem tem que dar respostas. Nós estamos cumprindo com as orientações do plano de trabalho de um convênio com o ministério. Nós comunicamos isso ao governo do Rio Grande do Sul. Se não está havendo comunicação entre eles, paciência – afirmou Torres.

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Brasil desconhece risco do ebola na fronteira com Peru e Bolívia

As autoridades gaúchas reclamam que os imigrantes chegam a Porto Alegre com carteira de trabalho, permissão do governo federal para trabalhar, mas sem previsão de emprego.

O abrigo de imigrantes caribenhos e africanos, mantido em Rio Branco pelos governos federal e estadual, permance lotado há mais de três meses. Na manhã desta sexta-feira (28) havia 420 imigrantes, sendo 350 haitianos, que isputavam inscrição na lista de 44 passageiros do quinto ônibus que sairá de Rio Branco com destino a Porto Alegre esta noite. Cerca de 30 mil imigrantes já passaram pelo Acre desde o final de 2010, quando começou o fluxo crescente na fronteira com Bolívia e Peru.

Com verba do governo federal, o Acre contratou por R$ 1,1 milhão uma empresa de ônibus para transportar imigrantes em território acreano até as cidades de São Paulo e Porto Alegre.

O governo estadual exigiu que os 24 ônibus fretados tenham cortinas, ar-condicionado central, poltronas reclináveis e que a empresa forneça aos estrangeiros água, café da manhã, almoço e jantar, no trecho de Rio Branco a Porto Alegre, com paradas em Porto Velho (RO), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Florianópolis (SC).

O secretário Antonio Torres disse ter comunicado na sexta (21)  o governo gaúcho sobre o envio de haitianos. Segundo ele, foi o Ministério da Justiça orientou o Acre a providenciar, além de São Paulo, como já vinha sendo feito desde abril, o embarque de imigrantes haitianos para Porto Alegre.

- Telefonei e conversei com Débora Silva, da Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos do Rio Grande do Sul. Minha equipe enviou até a relação dos imigrantes e eu mesmo informei que todos estão saindo daqui documentados com protocolo, carteira de trabalho, CPF e, no caso de crianças, com autorização do Juizado da Infância e Juventude. A gente informa que dispomos de ônibus para Porto Alegre, eles se inscrevem na lista e assim a gente os envia.

O secretário rebateu as críticas de que o governador do Acre, Tião Viana (PT), deveria ter telefonado para o governador gaúcho Tarso Genro (PT).

- Lamento que haja falta de comunicação na equipe do governo do Rio Grande do Sul, mas logo os gaúchos vão se ajustar à realidade. São apenas oito ônibus previstos no plano de trabalho.  A embaixada do Haiti não telefona para o Acre todo dia dizendo que vai chegar 100 imigrantes. Sendo assim, o governador do Acre não tem como ficar ligando todos os dias para os demais governadores, para avisá-los que vai chegar ônibus com imigrantes em seus estados.

Torres lamentou que o governo gaúcho tenha identificado dificuldade em lidar com os imigrantes e “jogado a responsabilidade sobre o governo do Acre”.

- Não dá pra funcionar assim. Estamos fazendo um trabalho com responsabilidade e coerência. Não estamos tentando nos livrar de um problema jogando no colo dos outros. O fato é que o Acre se tornou porta de entrada de imigrantes africanos e caribenhos que querem seguir com destino a outros Estados. Imprevistos vão acontecer sempre, pois os próprios imigrantes não têm clareza do que querem e para onde querem ir no país, e vão decidindo na medida em que se encontram.

Em Rio Branco (AC), 420 imigrantes aguardam ônibus com destino a outros Estados

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Cobra

Como aprendi andar devagar, deu tempo estancar a passada e evitar o pé esquerdo sobre a criatura. "É uma inofensiva cobra-cipó (Oxybelis aeneus). De hábitos diurnos, caça durante o dia pequenas rãs para se alimentar. Vive sobre a vegetação", explica o professor Paulo Sérgio Bernarde.

Pernoite em endereço errado


quarta-feira, 26 de novembro de 2014

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Nota de esclarecimento da Associação dos Magistrados do Acre

Do juiz de direito Raimundo Nonato da Costa Maia, presidente da Associação dos Magistrados do Acre:

"Caro Altino Machado,

Gostaria de prestar alguns esclarecimentos acerca da postagem em seu site sob o título "As lições e o silêncio dos magistrados":

Em nenhum momento eu disse que a imprensa não é absoluta (minhas declarações estão gravadas em áudio - essa frase foi criação da cabeça da jornalista que assinou a matéria no Ac24horas). O que eu disse foi que nenhum direito previsto na Constituição é absoluto (leia). Obviamente eu estava me referindo ao direito de expressão, bem como ao direito à preservação da imagem e a todos os demais direitos encartados a CF/88.

Pode ter certeza de que eu sei da importância da imprensa para o estado democrático de direito e jamais faria qualquer coisa tendente a restringir o direito à livre expressão do pensamento ou cercear esse direito sagrado e vital para a democracia. É claro que eventuais excessos devem ser rechaçados e, se for o caso, até punidos, mas sempre tendo em mente que não se deve impedir quem quer que seja de expressar suas opiniões e ideias.

No tocante às declarações feitas pelo governador Tião Viana sobre integrantes da magistratura do Acre, ao contrário do você afirmou na sua postagem, a Asmac não ficou silente, pois embora eu estivesse fora do estado naquela ocasião, a vice presidente da Associação, a doutora Lílian Deise, falou em nome da nossa entidade, repudiando as acusações genéricas proferidas pelo governador, conforme matéria veiculada no mesmo veículo que havia noticiado os fatos.

Espero que dessa forma seus leitores possam ter uma visão real do que efetivamente ocorreu".

Grato,

Raimundo Nonato da Costa Maia
Presidente da Asmac"

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Um luxo

E assim, direto de minha mesa, posso fotografá-los na mesa deles

Havia um cacho de banana no meio do caminho

Tempos difíceis, muitas pedras no caminho, mas abrir a janela é um "acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas"

domingo, 23 de novembro de 2014

Adeus, Fernando Pierro

Minha família e eu perdemos neste domingo um amigo muito especial, o advogado Fernando Pierro, paulistano que se apaixonou pelo Acre e me defendeu gratuitamente e com brilhantismo em vários processos judiciais por eu tentar exercer o jornalismo nesta terra. Nunca vou esquecer das tantas vezes que me disse: "Fica frio, velho, deixa comigo". Fernando partiu feliz quando supostamente o coração parou e ele montava uma bike no ramal Aquiles Peret, perto de minha casa, onde era sempre muito bem recebido. Registrou no Instagram parte de seu último périplo na periferia da cidade que adotou como dele. Nunca dá para entender o porquê disso acontecer com alguém tão especial. Nós te amamos, velho.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Dia da Consciência Negra

Jovem haitiano no abrigo de imigrantes em Rio Branco

As lições e o silêncio dos magistrados


O presidente da Associação dos Magistrados do Acre (Asmac), Raimundo Nonato, deu lições à imprensa durante uma coletiva na quarta-feira (19), no Palácio da Justiça, de acordo com relato do site AC 24 Horas (leia). Disse que a imprensa é fundamental, mas não é absoluta. É verdade. O que ninguém viu até agora foi a Asmac se manifestar a respeito das declarações do governador Tião Viana (leia) sobre a suposta conduta de magistrados na Operação G-7.

Em entrevista ao mesmo site, Viana declarou:

- Eu sei até que foi numa pizzaria da cidade que começou o diálogo que isso [Operação G-7] ia começar a ocorrer. Eu sei o que ocorreu dentro da Catedral eu numa missa num domingo. E eu recebi visita de um desembargador tratando de uma questão [G7] dentro da missa. Não esqueço do bafo de álcool que tava na boca dessa pessoa.

O governador acrescentou:

-Eu tive informações em agosto do ano anterior (2012), vésperas das eleições, que tinha um processo em curso pra explodir, pra desonrar o governo e fazer o Marcus Alexandre perder a eleição. Só que pra graça de Deus um juiz federal recusou-se a aceitar aquele tipo de denúncia que tava sendo formulada. Quando foi em fevereiro eu recebi aqui em meu gabinete a visita de desembargadores [também omitiu o nome] me alertado de uma operação suja que estava em curso. E eu disse que quem não deve, não teme. Mas sobre isso eu só quero falar depois, porque eu não queria fazer defesa antecipada. G7 vai entrar pra história, quando a verdade aparecer, como a maior farsa contra a integridade de uma instituição chamada governo. Não tenho a menor dúvida que nada se provará contra a qualquer ato de desonra e desonestidade do governo. Nós estamos entrando numa fase preliminar; são 43 meses que nós estamos chegando desde o início da investigação. Começou em abril de 2011 a investigação.

Imagens de Rio Branco e Brasileia durante gestão do governador Hugo Carneiro

Vídeo com trechos do documentário "Ao Redor do Brasil - Aspectos do interior das fronteiras brasileiras", de 1932, mostra Rio Branco, Brasileia e Cobija, na Bolívia, em imagens filmadas pelo major Thomaz Reis, durante gestão de Hugo Carneiro, que governou o Território Federal do Acre de 15 de junho de 1927 a 3 de dezembro de 1930.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Haitianos são maioria entre imigrantes no mercado de trabalho formal no Brasil

Empresas buscam mão obra de imigrantes em abrigo no Acre
Um levantamento inédito revela que os imigrantes haitianos passaram a ser a principal nacionalidade no mercado de trabalho formal brasileiro. Os dados do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra) demonstram que o número de imigrantes no mercado de trabalho formal cresceu 50,9%, entre os anos 2011 e 2013. A população de haitianos no Brasil cresceu aproximadamente 18 vezes, passando de pouco mais de 814 imigrantes, em 2011, para 14.579 empregados no mercado de trabalho formal em 2013, superando os portugueses.

O ingresso dos haitianos no Brasil, a partir da fronteira do Peru com o Acre, após percorrerem a Rodovia Interoceânica, está completando quatro anos. Trata-se de um fluxo imigratório que tem se mostrado cada vez mais constante e crescente, com uma regular chegada diária de grupos, não apenas de haitianos, mas de outras nacionalidades caribenhas e africanas. O Acre é a principal porta de entrada deles no país. De acordo com dados do governo estadual, 30 mil imigrantes já passaram pelo Acre desde dezembro de 2010. Até setembro deste ano, 39 mil imigrantes do Haiti entraram no país, de acordo com a Polícia Federal.

O levantamento “Inserção dos Imigrantes no Mercado de Trabalho Brasileiro”, de autoria de Leonardo Cavalcanti, Antônio Tadeu Ribeiro de Oliveira e Tânia Tonhati, divulgado na semana passada, assinala que, se for somado os imigrantes sem vínculo formal de trabalho, o coletivo de haitianos possui uma presença significativa no Brasil.

- Se os mexicanos e centro-americanos conformam o principal grupo de imigrantes nos Estados Unidos; os equatorianos na Espanha; os bolivianos na Argentina; os negros caribenhos na Holanda; os índios e bengalis na Inglaterra; os argelinos, senegaleses e marroquinos na França; no Brasil é possível conjeturar que, dada as características do fenômeno migratório atual e a lógica das redes migratórias, esse coletivo terá um lugar permanente no cenário da imigração no país, tanto em termos numéricos, quanto simbólicos, culturais, econômicos e sociais – destacam os pesquisadores do OBMigra.

Haitiano Beevendy Maurice, 5 anos, aguarda ônibus para reencontrar os pais em Santa Catarina

Consultada pela reportagem, a professora de sociologia Letícia Mamed, da Universidade Federal do Acre (Ufac), que realiza pesquisa sobre trabalho, precarização, migração e recrutamento de caribenhos e africanos na Amazônia pela agroindústria da carne disse que o relatório do OBMigra comprova aquilo que empiricamente já era notado por todos os que se dedicam a analisar a questão dos imigrantes em passagem pelo Acre, ante o volume de estrangeiros que transitam pela região diariamente.

- Como um todo, os movimentos migratórios internacionais para o Brasil constituem hoje importante questão social, pois envolvem grupos específicos, cada qual com suas particularidades. Nesse sentido, destaco que o relatório informa que, de modo geral, os imigrantes têm uma formação técnica e profissional superior às exigidas pelo exercício da profissão atual, mas seguem exercendo atividades aquém das suas formações e experiências nos países de origem.

Letícia Mamed assinala que o documento pontua, por exemplo, casos de dentistas, médicos, jornalistas, engenheiros de diversas nacionalidades que estão trabalhando na construção, na indústria pesada, nos abatedouros de frangos e carnes, entre outras atividades. Já no caso dos imigrantes que chegam pela fronteira acreana, a professora detaca que as pesquisas qualitativas realizadas na região ressaltam fundamentalmente o aspecto da baixa escolaridade dos grupos, inclusive com significativos registros de analfabetismos, o que sugere um cenário de maior vulnerabilidade laboral e social.

- Sabendo-se que a fronteira acreana é a principal porta de entrada dos imigrantes caribenhos e africanos no Brasil, é essencial considerar o conjunto de características que eles apresentam: trabalhadores indocumentados, com reduzida escolaridade, sem conhecimento do idioma nacional, que se endividam em seus países de origem para custear uma viagem organizada por redes de aliciadores e coiotagem, aventurando-se na busca por trabalho e uma vida digna no Brasil

De acordo com a professora, impelidos pela situação socioeconômica do Haiti, diante da dificuldade de acessar os países do capitalismo central, na América do Norte e Europa, que têm adotado a política de fechamento das suas fronteiras para imigrantes, o Brasil tornou-se referência a eles após dez anos de ação da Minustah no Haiti, ao mesmo tempo que há uma crescente demanda por força de trabalho interna no país, resultante da expansão econômica brasileira na última década.

Ela disse que o fluxo de estrangeiros mostra-se associado às mudanças ocorridas nos setores da indústria e de serviços do Brasil, acompanhando o desenvolvimento destes, o que fez gerar grandes demandas por força de trabalho, especialmente por aquela de perfil menos qualificado. O mapa dos empregos no Brasil revela, por exemplo, que o aumento no volume de colocações vem ocorrendo, sobretudo, em categorias com baixos salários, no setor administrativo, de comércios e serviços, construção civil e agropecuário, que se caracterizam pela intensa rotatividade da força de trabalho.

- Diante disso, eles têm reforçado nos últimos anos a contratação de imigrantes, como haitianos e muçulmanos em geral, como senegaleses e bengalis.

Estrangeiros com vínculo formal de trabalho, por Estados


Para Letícia Mamed, no caso da agroindústria da carne no Brasil, de um lado temos o movimento econômico que posicionou o país como maior exportador mundial de carne, gerando grande número de trabalhadores para cumprir as altas demandas de produção; por outro, em razão das circunstâncias do trabalho em um frigorífico, com longas jornadas e elevado índice de doenças ocupacionais (lesões físicas, distúrbios mentais, quadros depressivos e pensamentos suicidas, entre outros), o setor tem tido dificuldades para contratar brasileiros. Por isso eles têm reforçado nos últimos anos a contratação de imigrantes, como haitianos e muçulmanos em geral, como senegaleses e bengalis.

Por serem trabalhadores indocumentados, com reduzida escolaridade, sem conhecimento do idioma nacional e da proteção legal a que têm direito, ansiosos para começar a trabalhar e reconstruir suas vidas, os imigrantes caribenhos e africanos se tornam bastante vulneráveis à ação de redes de coiotagem e tráfico de pessoas, que os orientam durante a trajetória até o Brasil, e também de eventuais empregadores no lugar de destino, pois chegam com a necessidade imperiosa de trabalhar para quitar as dívidas contraídas com a viagem e para ajudar os familiares que permanecem na terra natal.

- Isso tende a mantê-los em uma condição de fragilidade, que os expõe a diversas possibilidades de superexploração do trabalho e, em alguns casos, análogas à escravidão – servidão por dívida, jornadas exaustivas, trabalho forçado e condições de trabalho degradantes. Muito frequentemente, em todo o mundo cabe a esse perfil de imigrante os salários mais baixos, as tarefas mais braçais, manuais, perigosas e insalubres – alerta a professora da Ufac.

Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, por meio do programa de Erradicação do Trabalho Escravo executado por suas superintendências regionais, o número de estrangeiros resgatados nessas condições vem aumentando. E esse aumento se deve ao crescimento de estrangeiros trabalhando no país, situação que desafia a estrutura institucional atualmente disponível para realização das fiscalizações e atuação na proteção do trabalho.

- O trabalhador imigrante tem suas particularidades, mas elas não podem ser vistas de modo dissociado das problemáticas que se apresentam hoje ao mundo do trabalho como um todo. No caso do contexto brasileiro, onde as políticas de proteção ao trabalho se mostram insuficientes para conter os efeitos da flexibilização, desregulamentação e terceirização sobre os trabalhadores nacionais, a situação do imigrante tende a tornar-se mais preocupante. O desafio à sociedade brasileira, colocado na pauta do dia a todas as nações que lidam com os dilemas da questão migratória, é o de garantir não apenas o recebimento, documentação e inserção no mercado laboral, mas também proteção social, inclusão nas políticas sociais, apoio na qualificação, no aprendizado da língua, na integração à cultura local e na preservação da própria cultura do imigrante – afirma Letícia Mamed.

Frigorífico contra em abrigo

Funcionários de frigorífico arregimentam imigrantes em abrigo
As empresas continuam indo ao abrigo de imigrantes, mantido pelo governo do Acre na capital Rio Branco, em busca da mão de obra de caribenhos e africanos. No final da tarde desta terça-feira, a reportagem constatou a presença de Lígia Santos, coordenadora de relação e desenvolvimento do Marfrig, um dos maiores frigoríficos do país. Ela estava no abrigo de imigrantes, mantido pelos governo federal e estadual, acompanhada do psicólogo Paulo Machado. Eles vieram ao Acre para selecionar 20 imigrantes que serão levados para trabalhar na unidade do frigorífico em Rondônia.

- No mês passado, nos viemos aqui e selecionamos 45 haitianos e os levamos para nossa unidade no interior do Mato Grosso. Estamos satisfeitos, pois trata-se de mão de obra que tem se mostrado muito produtiva pela força física, força de vontade e interesse em aprender. Os haitianos são muito prestativos, carismáticos, e mudaram a cultura na unidade do Mato Grosso. O pessoal brasileiro na região é preguiçoso, descomprometido com o trabalho. A presença dos haitianos tem servido para que os brasileiros percebam que existem pessoas enfrentando maiores dificuldades na vida. Desde então, os brasileiros deixaram de faltar ao trabalho e até agora não houve nenhuma desistência de haitianos.

Havia no abrigo 507 imigrantes hatianos  (478), senegaleses (20) e dominicanos (7). O Diário Oficial do Acre publicou na terça que o governo estadual vai destinar R$ 1,1 milhão para o transporte de imigrantes do território acreano para o restante do país. O governo contratou uma empresa para a prestação de serviços de transporte por meio de fretamento de ônibus, para levar os imigrantes haitianos refugiados em Rio Branco para São Paulo (SP) e Porto Alegre (RS).

O governo exige que os ônibus tenham cortinas, ar-condicionado central, poltronas reclináveis. Além disso, a empresa Solimões Agência de Viagens e Turismo Ltda, contratada pela Secretaria de Desenvolvimento Social terá de fornecer alimentação para todos os estrangeiros que farão as viagens. Num total, serão 24 veículos fretados.

Imigrantes em Epitacionlândia (AC), na fronteira com a Bolívia
Ainda nesta terça, o vereador Carlos Portela, do município de Capixaba (AC),  a 70 quilômetros de Rio Branco, registrou a presença de 120 imigrantes haitianos, senegaleses, dominicanos numa praça em Epitaciolândia, na fronteira com a Bolívia, esperando atendimento na delegacia da Polícia Federal.

Portela encontrou um grupo de senegaleses entrando a pé na cidade, mas achou estranho porque os mesmos pareciam chegar de Rio Branco.

- Parei e fui conversar com eles. Estavam muito sujos cansados. Só um falava espanhol. Disseram que já estavam há três dias percorrendo a BR-317. Eles tinham saído a pé, com destino ao abrigo de imigrantes em Rio Branco, a 235 quilômetros de Epitaciolândia, mas um carro, com três policiais que usam coletes e portavam armas, os obrigaram que voltasse a pé para que procurassem a Polícia Federal na  fronteira. Eles disseram que já tinham percorrido uns 70 quilômetros, mas retornarem para Epitaciolândia. Cansados e famintos, sem tomar banho, reclamaram da atitude dos policiais. Mostraram os pés e os sapatos já comidos pelo asfalto, enquanto taxistas se ofereciam para levá-los de forma clandestina por US$ 100 cada passageiro, quando na verdade a passagem custa R$ 25,00 ou R$ 30,00. Mas que eles não tinham dinheiro.

O vereador ouviu de um imigrante o relato de que existe no Senegal um agenciador que os envia para o Brasil mediante o pagamento de US$ 4 mil. A rota percorrida pelos senegaleses inicia de avião, em Dakar, num vôo de quatro horas de duração, com escala em Madrid, na Espanha. De lá, prosseguem em voo de 13 horas para Quito, capital do Equador. Viajam mais 45 minutos até Guayaquil, e passam então a seguir a mesma rota dos haitianos por estradas em território peruano até o Acre, na tríplice fronteira do Brasil-Peru-Bolívia.

- Os imigrantes, que possuem vários contatos em suas agendas, pediram meu celular para telefonar com um amigo deles em São Paulo. Falaram quase meia hora, mas não permitiram que eu fotografasse a agenda.



Trabalho escravo

O procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Rondônia e Acre, Marcos Cutrim, disse que ainda há muitos desafios relativos à políticas públicas humanitárias de acolhimento aos estrangeiros em busca de melhores condições de vida. Falta maior participação dos órgãos da União no custeio e no auxílio aos Estados e Municípios de fronteira na política de acolhimento, maior controle estatal e fiscalização das formas de contratação dos imigrantes, combate às redes de exploração do tráfico humano, coiotagem e contrabando de trabalhadores, no Brasil, e, no exterior, por meio de cooperação jurídica internacional com as polícias e os Ministérios Público dos países que são rotas, como Equador, Peru e Bolívia, além de facilitação da emissão de vistos nas embaixadas nos países de origem.

- Não basta dar qualquer emprego aos estrangeiros. É fundamental que se promova trabalho e emprego decentes aos haitianos, senegaleses e outras nacionalidades que buscam o sonho brasileiro. Empregar médicos, engenheiros, advogados, jornalistas haitianos em frigoríficos, na construção civil, na limpeza pública, sujeitando-os a empregos precarizantes e que não condizem com sua formação profissional, não mudará a realidade tão sonhada por esses imigrantes, que é trabalhar e ter dignidade – afirma.

Marcos Cutrim disse que preocupa também a situação dos imigrantes de outras nacionalidades, tais como senegaleses e dominicanos. Quando chegam à fronteira do Acre com o Peru (Puerto Maldonado) ou Bolívia (Cobija), eles solicitam, na Polícia Federal, o reconhecimento da condição de refugiado. Neste momento, cabe à Polícia Federal emitir o protocolo em favor do solicitante e de seu grupo familiar e autorizar, provisoriamente, a estada no Brasil até decisão final do Comitê Nacional de Refugiados (Conare), órgão vinculado ao Ministério da Justiça. Esse protocolo permite ao estrangeiro ter acesso à carteira de trabalho provisória, emitida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, para o exercício de atividade remunerada no País, além do CPF e da carteira de identidade de estrangeiro.

- O problema é que, com exceção dos haitianos, que têm reconhecido o visto humanitário para residência e trabalho, o Conare vem indeferindo o refúgio para outras nacionalidades, como, por exemplo, senegaleses e dominicanos. Esses estrangeiros, a partir da decisão que nega o refúgio, tornam-se imigrantes em situação irregular, pois, permanecem sem visto no Brasil. O refúgio só se configura se houver perseguição política, racial ou étnica, ou por motivo de guerra, que impeçam o retorno deles à sua terra natal. Com tantos estrangeiros irregulares no país, naturalmente o lado perverso do mercado e das empresas se aproveitará desta situação para superexplorar esses trabalhadores, submetendo-os à informalidade e ao trabalho escravo.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Bolívia oferece curso de medicina a R$ 700 em Puerto Evo Morales, na fronteira



O Ministério da Educação da Bolívia está prestes a autorizar a Universidad Técnica Privada Cosmos (Unitepc) a se instalar em Puerto Evo Morales para oferecer cursos de medicina, odontologia, veterinária e enfermagem. Mais de 25 mil brasileiros estudam atualmente em universidades particulares da Bolívia.

A Unitecp abriu inscrições gratuitas no Brasil para 250 vagas e 960 pessoas, apenas do Acre, já se inscreveram, todas seduzidas pela ausência de vestibular e pelo valor mensal dos cursos de medicina (R$ 750,00), odontologia (R$ 500,00), veterinária (R$ 500,00) e enfermagem (R$ 250,00). A mensalidade na Uninorte, única faculdade privada que oferece curso de medicina além da Universidade Federal do Acre, custa R$ 7.790,00.

Puerto Evo Morales é um povoado (veja) localizado na margem direita do Igarapé Rapirrã, em território boliviano, no Departamento de Pando, ligado ao município de Plácido de Castro (AC), a 97 quilômetros de Rio Branco, a capital do Acre, por uma precária ponte de madeira de 18 metros de extensão.

O povoado onde a Unitepc planeja se estabelecer com seus cursos acadêmicos na verdade foi batizado originalmente como Vila Montevideo. Era um amontoado de palafitas do comércio varejista de produtos importados da Ásia, que funcionava na margem direita do Rio Abunã, frequentados por turistas e sacoleiros brasileiros.

Há sete anos, durante uma madrugada de maio, Vila Montevideo foi extinta do mapa por um incêndio cujas causas nunca foram esclarecidas pelas autoridades bolivianas. O sinistro causou a destruição de seus 60 estabelecimentos comerciais.

Sensibilizado com a tragédia, o presidente Evo Morales visitou Vila Montevideo de helicóptero, motivando os comerciantes bolivianos a não desistirem da freguesia brasileira. E eles decidiram então improvisar outro povoado perto dali, a 534 metros em linha reta do ponto de confluência do Igarapé Rapirrã com o Rio Abunã.



Batizado de Puerto Evo Morales em homenagem ao presidente boliviano, em sete anos o povoado se tornou um amontoado bem maior de palafitas do que era quando atendia como Vila Montevideo.

Agora existem 180 lojas e dois prédios com quatro andares, o que não se vê do lado brasileiro, em Plácido de Castro, município fundados há 38 anos, além de uma dezena de edificações de alvenaria com até dois andares.

O povoado já conta com um posto médico e duas escolas, de ensino fundamental e médio, e o governo já comprou cimento e areia, em Plácido de Castro, para construção de um hospital.

Mas Puerto Evo Morales exibe esgoto a céu aberto e não conta com água encanada. Não existe calçada e suas duas únicas ruas são de barro, ambas com imensas crateras, sendo algumas abertas pelos moradores para forçar lentidão no trânsito e reduzir as nuvens de poeira que se formam até quando se acelera o motor do carro.

O comerciante Heráclio Flores, 54 anos, pai de cinco filhos, líder dos lojistas, disse que Puerto Evo Morales abriga uma população de mais ou menos mil pessoas e gera cerca de 500 empregos a brasileiros que residem em Plácido de Castro.



- Parei de vender roupa por causa da poeira e abri essa farmácia. No meu país não é necessário receita para comprar qualquer remédio. Somos muito procurados por brasileiros. Quando Montevideo pegou fogo estava com 20 anos de funcionamento, mas aqui é melhor e vai se desenvolver mais e mais, sobretudo a partir do ano que vem, com a abertura dos cursos de medicina, odontologia, veterinária e enfermagem. A presença de tanta gente forçará o governo a fazer os investimentos de infraestrutura necessários – avalia Flores.

Uma comitiva de assessores do Ministério da Educação boliviano, com a presença de Jimena Fernandez, dona da Unitepc, está sendo aguardada durante a semana em Puerto Evo Morales. As autoridades vão avaliar o povoado e expor à Unitepc as adequações que julgarem necessárias para autorizar o funcionamento dos cursos.

A Unitepc já atua na fronteira há quatro anos, quando se instalou em Cobija, capital de Pando, vizinha dos municípios de Epitaciolândia e Brasileia, ambas separadas apenas pelo Rio Acre. No primeiro ano, atraiu 700 estudantes, a maioria brasileiros. Atualmente, com 1,2 mil alunos, oferece cursos de medicina, odontologia, enfermagem, fisioterapia e kinesologia, veterinária e zootecnia, engenharia comercial e direito.

Em maio, a prefeitura de Plácido de Castro, administrada por Roney Firmino (PSB), assinou convênio de cooperação interinstitucional com o reitor da Unitepc, Hernán García Arce. O objetivo é, daqui a três anos, reforçar a formação acadêmica dos estudantes de maneira integral mediante participação direta no manejo prático dos serviços de saúde que oferecem os hospitais dependentes da prefeitura para cumprimento do programa de internato rotatório e práticas hospitalares.

Plácido de Castro possui dois hospitais, sendo um em Vila Campinas, ambos gerenciados pelo Estado, além de nove postos de saúde administrados pelo município. A Associação dos Prefeitos do Vale do Acre está envolvida para garantir também a participar dos postos de saúde e hospitais dos municípios de Assis Brasil, Brasileia, Epitaciolândia, Xapuri e Capixaba. O prefeito informou que o governador Tião Viana (PT) já teria liberado os hospitais para que sejam usados nas aulas práticas de medicina e enfermagem.

O convênio estabelece ainda que o plantel docente de médicos da Universidad Federal do Acre facilitará o ingresso dos estudantes da Unitepc nos hospitais, nos ciclos de práticas hospitalares e internato rotatório.

Plácido de Castro, cuja população é de 17,2 mil habitantes, se mantém basicamente do repasse mensal de R$ 800 mil do Fundo de Participação dos Municípios. Com 500 funcionários, destina mensalmente R$ 700 mil para pagamento da folha de pagamento.

Formado em pedagogia em Barretos e educação física em Batatais e em medicina pela Unitepc, em Cochabamba, com especialização em cirurgia geral e cirurgia plástica em São Paulo, o prefeito Roney Firmino é o maior entusiasta na defesa da presença da faculdade em Puerto Evo Morales. A gastroenterologista Marta, a mulher do prefeito, também se formou na mesma faculdade boliviana e trabalha no posto de saúde do município.

- Estou diante de um desafio grande e ousado, pois sei o que passei para me tornar médico. Estou atraindo a faculdade para Puerto Evo Morales preocupado com a população de nosso município, que não tem opção de emprego e renda. Queremos que os estudantes tenham casa e comida em Plácido de Castro e estejam a menos de dez minutos da faculdade. A qualidade é cada aluno que busca – afirmou Firmino.



De acordo com o prefeito, existem cinco médicos bolivianos e cubanos qualificados em Puerto Evo Morales, além de oito médicos brasileiros que estão credenciados à dar aula nos cursos de medicina e enfermagem porque se formaram na Bolívia. Firmino disse que não existe impedimento legal para que os médicos continuem trabalhando Brasil e passem a lecionar na Bolívia. Ele acredita que a presença de mil alunos em Plácido de Castro pode impulsionar a economia.

- Cada aluno trazendo R$ 1 mil significará R$ 1 milhão. É como se tivéssemos 1,5 mil pessoas empregadas na cidade com salário mínimo. Onde ou quando vamos atrair para cá uma empresa que seja capaz de gerar essa quantidade de empregos? É por isso que pedimos e contamos com a parceria integral do governador Tião Viana.

O prefeito não vê como dificuldade a falta de estrutura de Puerto Evo Morales. Contou que em 1990 visitou Bonito, pólo do ecoturismo no Mato Grosso do Sul, e encontrou mais de 500 pessoas acampadas em barracas.

- Hoje, em Bonito, operam redes de hotéis e pousadas. Não tem como incentivar as pessoas a criarem estruturas sem que haja demanda. Quando os estudantes se mudarem para cá, a infraestrutura vai começar a aparecer. Os estudantes vão morar no Brasil e o que vão necessitar do lado boliviano da fronteira é apenas estudar. O esgoto a céu aberto, por exemplo, também existe em 95% das cidades brasileiras. Durante a adolescência, aqui, na zona urbana de Plácido de Castro, morei doze anos sem energia elétrica.

Firmino não vê diferença entre médicos formados na Bolívia ou no Brasil. Segundo ele, o currículo da mulher dele, por exemplo, é igual ao currículo da Universidade Federal de Uberlândia.

- O que ela não estudou na Bolívia foram as matérias estudo de problemas brasileiros, doenças tropicais e geriatria. O que a gente vê em qualquer faculdade são professores ou alunos comprometidos ou não com o curso que está fazendo. Se eu nunca tivesse me formado no Brasil, não poderia dizer o que estou dizendo. Existe gente que não se formou na Bolívia e que não sabe onde é o Norte ou Sul. O ensino boliviano é compatível com o ensino brasileiro. Quem fala o contrário é porque é simplesmente contra que surjam mais profissionais. Depois de formado, assim como eu, todos terão que correr para revalidar seus diplomas no Brasil.

Na opinião do médico e prefeito, o que atrai na Bolívia os milhares de estudante brasileiros é o valor das mensalidades e não a ausência de vestibular.

- Quem, no Acre, pode pagar R$ 8 mil por mês para cursar medicina na Uninorte, em Rio Branco, sem contar as despesas com aluguel, livros, material didático? Quem vai pra Bolívia é o estudante pobre. Os ricos cursam as universidade federais no Brasil. Os pais têm dinheiro para pagar bons cursos para seus filhos, que sempre estudaram em escolas particulares, mas que se preparam e são aprovados. Essa realidade só mudaria se as vagas nas universidades públicas fossem limitadas a quem sempre estudou em escolas públicas.

Danielle Oliveira



A potiguar Daniella Oliveira começou a estudar engenharia de sistemas na Unitepc, em Cochabamba, em 1997, abandonou o curso após três anos e passou a estudar odontologia, quando conheceu o então estudante de medicina acreano Renato Garcia. Casaram e agora possuem um centro médico em Plácido de Castro. Ela está empolgada com a possibilidade da instalação dos cursos prometidos para Puerto Evo Morales.

- Estudei odontologia dois anos na Bolívia, fiz uma prova, fui aprovada e me transferi para concluir o curso na Universidade Potiguar de Natal.

Com três pós-graduações, a última na Uninorte, em Rio Branco, Daniella Oliveira trabalha há 10 anos em Plácido de Castro, além de ser mediadora de curso de assistente de auxiliar de consultório dentário do Instituto Dom Moacyr Grechi, do governo estadual, que excuta o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego.

Ela considera “muito promissor” que a Unitepc possa abrir mais cursos de medicina, odontologia, veterinária e enfermagem na fronteira do Acre com a Bolívia.

- Estudei dois anos lá e é uma universidade muito boa. Devo muito de minha formação aos primeiros anos de anatomia lá, que foram de excelência. Voltei para o Brasil com a mesma carga horária de medicina. Não necessitei pagar matéria. Passei e fiz só português e inglês técnico.

Na avaliação da dentista, no Brasil existe preconceito contra quem se forma na Bolívia, mas ela considera que “é o aluno quem faz a faculdade”.

- Quem quer estudar vai para qualquer lugar. Conheço várias pessoas, médicos e dentistas, que se formaram lá e que atuam em várias partes do país. Tenho três amigas que se formaram na mesma Unitepc, sendo que duas atuam em Brasília e a outra em Natal. Vou ser sincera: queria mesmo era ser aluna de medicina em Puerto Evo Morales e por isso estou em dúvida em aceitar ou não o convite que recebi para mediar no curso de odontologia.

Apenas em Plácido de Castro, segundo Firmino, existem mais de 100 alunos se deslocam diariamente para Rio Branco, onde cursam faculdades particulares.

Rosa Chavez



No lado direito da rua principal, logo após a ponte sobre o Igarapé Rapirrã, a médica boliviana Maria Rosa Silva Chavez, 40 anos, que nasceu e se formou em La Paz, atende no improvisado Consultório Zapata. Ela divide o espaço com uma médica cubana, especialista em doenças tropicais, e com um dentista (marido) e outro médico também bolivianos.

Cirurgiã abdominal, Maria Chavez no momento está dedicada ao atendimento clínico, pois essa é a maior demanda de seus pacientes, quase todos brasileiros das zonas urbana e rural dos municípios do Vale do Rio Acre. Os dados de todos os seus pacientes estão anotados em sete cadernos grandes empoeirados que ela exibe como troféus de sua reputação profissional na região.

A médica disse que tem mestrado em pedagogia, recebeu convite e se sente preparada para dar aula na faculdade que vai abrir no povoado. Ela contou que mudou para Puerto Evo Morales há sete anos, quando estavam sendo construídas as primeiras casas. Por causa do frio em La Paz, a filha dela convulsionava durante crises de asma.

- Estou aqui há sete anos. Cheguei quando estavam construindo as primeiras casas. O clima daqui é benigno, tropical, uma beleza, e os brasileiros são muito carinhosos. Todos os médicos que estão nesta vila são capazes, são referências. A medicina não precisa de gênios, mas de pessoas de grande coração. Falta de estrutura não é problema. Nós precisamos apenas de conhecimentos básicos para formar pessoas ao estilo de meu país.

Maria Chavez disse que o dinheiro, no Brasil, está sempre à frente da medicina e que no país dela isso não acontece. Segundo ela, na Bolívia as aulas de anatomia, por exemplo, são melhores porque os alunos podem estudar diretamente em cadáveres.



- Não dispomos daqueles corpos de silicone e estudamos nos próprios humanos ou animais mortos. Fiz minhas primeiras cirurgias num cachorro, meu animal de estimação, na minha casa, pela necessidade de aprender.

A médica, que disse atender cerca de 30 pessoas por dia, contou que sonhava em dispor de um cadáver para estudar, mas não conseguia adquirir porque custava US$ 1 mil. Mas a mãe dela conseguiu comprar de um coveiro de La Paz o cadáver de um indigente pelo valor equivalente a R$ 8,00.

- Minha mãe e eu lavamos o cadáver com cloro e levamos para nossa casa. Eu tinha 16 anos. O meu José até hoje em minha casa, em La Paz. Penso trazê-lo para servir à minha filha e aos colegas dela na faculdade de medicina em Puerto Evo Morales, pois ela já está inscrita para estudar aqui também.

Segundo a médica, quando estudou na Universidad Mayor de San André, o curso de medicina era precário e um morto tinha que ser compartilhado por 45 estudantes, mas tudo mudou com o cadáver José.

- Um dia eu leva a cabeça, noutro o fígado, sempre dentro de uma mochila. E quando não tínhamos um morto, íamos aos cemitérios e tirávamos algum morto. Como pude fazer todas essas coisas para aprender. Era muito difícil, muito difícil, mas foi assim que aprendi. Sinto muito orgulho de meu país – acrescenta emocionada médica, sem conter o choro.

A médica tem verdadeira ojeriza por Evo Morales, a quem se refere como “um pobre burro e estúpido”.

- Entre falar mal dele e ir para a cadeira, prefiro guardar silêncio absoluto.

Renato Garcia



O médico Renato Garcia, que nasceu em Rio Branco e se formou em Cochabamba, é professor do curso de medicina da Universidade Federal do Acre. Filho de um ex-sindicalista ligado aos trabalhadores rurais e de uma ex-diretora do hospital de Plácido de Castro, atua há onze anos como médico no município.

- Minha mãe me fez desenvolver o sonho pela medicina. Estou falando de uma família de baixa renda, para quem a Bolívia já era, em 1997, a opção para quem queria estudar medicina.

Após se formar, em 2003, Garcia percorreu vários estados tentando revalidar o diploma. No ano seguinte, fez provas na Universidade Federal de Alagoas e na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, sendo aprovado nas duas instituições.

- Voltei para Plácido de Castro, atuei dois anos com clínico geral, e fiz residência na capital em medicina da família. Voltei para o município com o dever de conduzir o estágio rural da Universidade Federal do Acre. Tentamos instalar um pólo de extensão, mas por alguns problemas não conseguimos consolidar o estágio rural, embora tenhamos preparado o hospital para tal.

No hospital de Plácido de Castro o atendimento é feito por três médicos brasileiros e dois cubanos. Garcia enxerga viabilidade nos cursos acadêmicos em Puerto Evo Morales, embora reconheça que a estrutura necessária dependerá dos entendimentos da universidade com o governo boliviano.

- O mais importante, que são os alunos, existe bastante. Temos que esperar o tamanho do investimento que a reitoria e o governo da Bolívia farão para que a faculdade possa se estabelecer e se estruturar gradualmente.



O médico considera que a questão mais delicada envolve o convênio que a prefeitura de Plácido de Castro assinou com a Unitepc.

- Aí partimos para um pólo maior, que dependerá do Itamaraty, numa discussão maior envolvendo políticos dos dois países.

Segundo o médico, os questionamentos em relação à qualidade dos que são formados na Bolívia depende muito de cada pessoa, da estrutura e da qualidade na escolha dos professores que vão moldar os  profissionais.

- Estrutura favorece muito o aluno, mas precisamos entender que ele lida com duas opções:  passar pela universidade ou a universidade passar por ele. Se alguém se dedica a ser um bom profissional, será um bom profissional, mas se entra apenas para brincar, pode entrar na Universidade de São ou qualquer outra, que sairá de lá como um profissional medíocre.

Para Garcia, na atualidade, quem socorre o Acre são os médicos estrangeiros, sobretudo os brasileiros formados na Bolívia. Depois deles, alunos formados na Universidade Federal do Acre.

- Esses são os pilares da saúde pública no Estado.  Há dez anos, ninguém imaginava isso. Da mesma maneira podem criticar agora o que está sendo sonhado para Puerto Evo Morales. Vivemos num mundo capitalista e quando se quer, se faz. Basta o governo boliviano autorizar a abertura de um aeroporto e em uma hora começa a chegar bons professores de diversas partes do país. Acho que é necessário iniciar o básico e, a partir disso, ir construindo. Foi assim que a Universidade Federal do Acre fez.

sábado, 15 de novembro de 2014

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Marina: “Ingrisia e alegria a gente transforma em poesia”

“Sabe aquele poema que te mandei, outro dia? Mande pro Altino, peça pra ele publicar. Faça um pequeno texto de apresentação, simples, não precisa fazer referência a nada nem a ninguém. Basta dizer o seguinte: ingrisia e alegria a gente transforma em poesia”.

Forem estas as palavras que Marina me disse, ao telefone, interrompendo seu descanso neste breve intervalo entre batalhas.

Passo como recebi, um dia após a partida de Manoel de Barros, no ano em que nos despedimos também de Ariano Suassuna, João Ubaldo Ribeiro e Rubem Alves.

Acho que essas pessoas Marina há de me permitir citar e aproveito para lembrar da trágica partida de Eduardo Campos, ao início de uma campanha em que o Brasil também perdeu o pouco que restava de inocência na política.

E paro por aqui, pois no interdito algo está dito. Assim, pois, apresento a leveza e o humor com que Marina Silva recebe uma interdição maior e mais severa (que a História, onde subjaz toda ironia, quiçá revogue e desfaça) e a publicação ao editor solicito. (Antonio Alves).

Sentença - Marina Silva

Pesquisaram, investigaram
O passado e o presente,
Os feitos e os não feitos,
Os ditos e os não ditos,
E não encontrando nada,
Deram o cabal veredito:
Alguém com uma vida assim,
Que não rouba, que é decente,
Que respeita adversários,
É uma afronta à nossa mente.
A declaramos culpada!
E a pena da apenada,
Seja exemplo a toda gente:
Pode falar, ensinar,
Pode até legislar
(Melhor se só costurar),
Mas jamais ser presidente.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Pena


Documentário mostra danos causados no AC e RO por hidrelétricas do Madeira

POR LUIS FERNANDO NOVOA GARZON



O documentário “Entre a Cheia e o Vazio” é um recorte de uma batalha de sentidos em torno dos efeitos de larga escala produzidos pelas Usinas Hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, o afluente mais caudaloso do Amazonas. Batalha que se intensificou com a chamada “cheia histórica” de 2014, ampliada pela retenção de água nos dois reservatórios, e que prossegue nesse exato momento em que estudos preliminares indicam que os elevados níveis de assoreamento do rio podem resultar, em 2015, numa cheia de proporções similares, ainda que com menor volume de precipitações.

As consequências do duplo barramento (e que pretende ser triplo com o aproveitamento da Cachoeira de Ribeirão) de um rio com tamanha descarga sólida, em períodos muito concentrados de tempo, só estão sendo avaliadas a posteriori e muito limitadamente. Além de expropriarem o rio e seus usos sociais, procuram expropriar a capacidade de percepção e inteligibilidade do território recriado.

Leia mais:

Hidrelétricas ignoram as causas da catástrofe ambiental no AC e RO

Dilma tergiversa sobre impactos das hidrelétricas no Rio Madeira

A região do Médio e Alto Madeira e seus tributários vai se convertendo em um corredor de exportação (inter-regional a princípio) de energia enquanto commodity; a gerar lotes de energia pré-negociados, cotados no “mercado livre” de energia que norteia, ponta-cabeça, o “mercado regulado” que deveria servir à nação. Nesse quadro de privatização crescente de todos os setores de infraestrutura, as concessões elétricas trazem embutidas cessões territoriais, para as quais concorrem outros setores com uso intensivo de recursos naturais, como a mineração e o agronegócio. Nesse reembaralhamento das posses e das jurisdições, os desastres técnico-ambientais sempre serão apresentados como “naturais” e “inevitáveis”.

Nosso documentário procura, nos 25 minutos em que foi concebido, recolocar as polaridades e conflitos invisibilizados pelos Consórcios e seus sócios nos governos, parlamento, judiciário e grande mídia. De um lado, a construção da calamidade “sem culpados”; de outro, a identificação de causas coadjuvantes e das consequências sociais muito diferenciadas da “supercheia”.

Os vazios deliberados de informação, em que foram escoradas as licenças e outorgas obtidas pelas concessionárias privadas (Suez e Odebrecht) propiciaram um regime de operação totalmente imprevidente dos reservatórios. Como fica comprovado no filme, a UHE Santo Antônio tinha aumentado, com autorização da ANEEL, a cota de seu reservatório para 71,5 justamente nos primeiros meses de 2014, quando começaram a se avolumar as precipitações nos formadores do Rio Madeira.

Pode-se notar, nas falas cruzadas dos gerentes das duas usinas, o desconcerto deles elidindo ou transferindo “erros” de uma para outra. A acoplagem dos depoimentos desses dirigentes que tiveram a vazão do rio sob seu controle durante a cheia foi equivalente a uma acareação recheada de atos falhos. Claro que, perante o MPF e especialistas independentes, todos procuram atestar plena isenção sobre as ocorrências e seus agravantes. Ao invés de uma postura de transparência e socialização dos dados reais do cronograma de enchimento dos reservatórios, o que deixaram transparecer foi uma postura premeditadamente defensiva de quem teme investigações e novos estudos que atestarão inaceitáveis margens de risco para a população e o meio ambiente.

Vivemos em um ambiente de insegurança ambiental permanente e tudo o que mais precisamos nesse momento é acesso à informação que vem sendo omitida e censurada sobre as interrelações entre a cheia e os reservatórios. O documentário expõe a necessidade de que as empresas e o Ibama apresentem os estudos já feitos e os por serem feitos, e que especialistas e cientistas – que não sejam nem consultores das empresas nem funcionários do Governo – possam apresentar um parecer independente sobre esses dados.

No mínimo, o que se exige é que os Consórcios comecem imediatamente a reparar os danos amplificados pelos seus reservatórios, a começar pela recuperação das casas e das comunidades ribeirinhas que pagaram um preço muito alto para “fornecer energia para o Brasil”. Ao contrário disso, o que vem ocorrendo é a destituição das últimas comunidades ribeirinhas e bairros “beiradeiros” através da atuação “higienista” da Defesa Civil nas três esferas de Governo.

A meta é unidirecional: evacuar todas as pessoas e comunidades das agora chamadas “áreas de risco”, sem se preocupar com a criação de novas áreas de risco, já que as causas não estão sendo consideradas. Enquanto os fatores geradores de risco não forem levados em conta, Porto Velho e toda a região do Madeira será uma indeterminada e extensa área de risco, incluindo o Acre que tem situada nessa zona sua única via de acesso terrestre ao conjunto do país, agora sujeita a “inundações crônicas”.

A agonia do Rio Madeira e de todos os modos de vida nele imbricados tornou-se cenário agora para uma política deliberada de silenciamento sobre os variados desastres que se consumaram no projeto Complexo Madeira. O pacto de silêncio se estende da Presidência, passando pelas agências setoriais, pelo Judiciário, leal engavetador em segunda instância, e chega até algumas grandes ONGs que assim revelam suas conexões mais que diretas com o mundo corporativo.

O Secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, que chegou a ser bombeiro no governo Lula, deu recente declaração incendiária sob medida para ficar no posto no segundo mandato de Dilma. Disse que do Complexo Hidrelétrico do Tapajós “não abrirão mão”. Por que precisaria, ele, o "interlocutor do social" – do malfadado social-liberalismo – abrir fogo contra o rio Tapajós e suas comunidades? O argumento usado como justificativa explicita como esse Governo torna-se refém voluntário dos conglomerados privados. O motivo para seguir com o projeto Tapajós seria o de tornar o Estado (e a "cidadania", presume-se) mais presente na região amazônica, falta essa que seria o grande "erro de Belo Monte".

Falemos claro, com os modelos de concessão para aproveitamento de recursos naturais vigentes no país, e com o estiolamento do sistema de licenciamento ambiental, todos sabemos que são os monopólios privados os que se fazem presentes de fato. Talvez por isso não haja menção sobre o fracasso e as incertezas cada vez mais certas quanto à viabilidade do Complexo Madeira. Nem se cogita ocorrência de "falhas" ou uma remota possibilidade do Estado ter "chegado antes das consequências das obras", como se admite no caso de Belo Monte. E no caso do Madeira, o que fica? A depender dos promotores e legitimadores dessa interminável frente de despossessão, só apagamento e amnésia. E não adianta supor compensações do tipo uma monstruosidade ali, uma preservação acolá.

O que vemos, medimos e sentimos aqui é que o pior não tem chão ou piso. O pior é uma queda livre que leva de roldão todos os limites de tolerabilidade anteriores. Quanto maior o apagamento dos danos, devastações e crimes perpetrados na implantação das usinas no Rio Madeira, maior será a força autolegitimatória para impor licenciamentos expressos do Complexo Tapajós, das UHEs Tabajara, Marabá, Santo Antônio do Jari, São Manuel e dezenas de outros projetos hidrelétricos em toda a Amazônia.

Luis Fernando Novoa Garzon é sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia

Ficha técnica e sinopse
Entre a cheia e o vazio: A cheia histórica do Rio Madeira em 2014 e seus nexos Com as UHEs Santo Antônio e Jirau

Realização: Mapeamento Social como Instrumento de Gestão Territorial contra o Desmatamento e a Devastação – Núcleo Rondônia e Universidade Federal de Rondônia – UNIR.

Apoio: Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia – UEA. Roteiro: Luis Fernando Novoa Garzon

Direção: Lou-Ann Kleppa

Fotografia: Carlos Fiengo, Rodrigo Rodriguez, João Marcos Dutra, Eliaquim da Cunha, Paula Stolerman, Daniela Moreira, Inaê Level, Lou-Ann Kleppa, Mario Venere, Altino Machado, funcionário da Transfish.

Duração: 25’38’’

Ano: 2014

Prêmio Lídio Sohn de Melhor Produção Rondoniense no FestCineAmazônia (2014)

O documentário é resultado de um esforço compartilhado de pesquisadores para colocar em questão os nexos entre a cheia do rio Madeira e os vazios relacionados à implementação e atividade das duas usinas hidrelétricas instaladas no mais caudaloso afluente do rio Amazonas. O ponto de partida do filme é a afirmação do diretor da UHE Jirau de que “acreditar na relação entre a cheia e as usinas seria crendice”. O empenho das usinas em ocultar as causas coadjuvantes dessa catástrofe expõe as populações que vivem no entorno dos megaprojetos hidrelétricos em Rondônia, Beni e Pando (Bolívia) a novos e ampliados danos sociais e ambientais, além de colocar em risco de isolamento a população do Acre, que tem sua única via de acesso por terra afetada pelo atual regime de operação dos reservatórios das usinas. O consenso propalado pelos empreendedores das obras de que “a cheia foi natural” é desvelado por pesquisadores independentes e comunidades ribeirinhas afetadas. Philip Fearnside, Edna Castro, Célio Bermann e Jorge Molina, especialistas reconhecidos nacional e internacionalmente, deram significativa contribuição nesta reconstrução de sentidos. Grande parte das filmagens foi realizada no interior das usinas, ouvindo seus representantes e decodificando seus números e discursos. Estas informações são apresentadas ao público como uma espécie de plataforma audiovisual para que se investigue o que significam de fato hidrelétricas “a fio d`água” e fontes de “energia limpa”, quem se beneficia da energia gerada e por que novos estudos de impacto são necessários.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Nosso pão de milho transgênico de cada dia

POR BAB FRANCA



Excelentíssimos Senhores Vereadores e Deputados  do Estado do Acre (os que são e os que assumirão), venho solicitar pública e respeitosamente de Vossas Excelências, muita atenção ao assunto que abordarei nestas breves linhas. Irei direto ao assunto: Excelentíssimos, nós acreanos, com “e”, filhos, netos, bisnetos e tataranetos de nordestinos, caboclos e sírio-libaneses, acostumados há décadas a comer o saboroso cuscuz de milho no café da manhã, que, aqui no Acre, antes da chegada dos colonizadores sulistas na década dos 1970 era mais conhecido como “pão de milho”,  estamos correndo grande risco de saúde por estarmos há alguns anos nos alimentando de milho transgênico, ou seja, milho geneticamente modificado.

Estive em todos os supermercados de Rio Branco, fiscalizei e verifiquei que nas prateleiras reservadas aos derivados deste produto, para minha grande decepção e espanto, nenhuma  das seis marcas encontradas ofereciam derivados de milho natural. Todos os supermercados trabalham com milho  transgênico, nenhuma marca trabalha com milho de procedência natural - a única diferença entre elas, era o tamanho do “T” de transgênico.

Penso que não sou obrigado a me alimentar da maneira que os governos estadual e federal  arbitram e determinam. A população brasileira, pacificamente acomodada, aceita qualquer produto que lhe oferece sem sequer questionar a liberdade de escolha e consumo, e o que é pior, paga sem reclamar o preço e não tem o hábito de verificar a data de validade. Eu, cidadão brasileiro pagador de tributos, sugiro que Vossas Excelências criem projetos de lei municipal e estadual propondo às prefeituras e ao governo estadual a obrigatoriedade de todas as redes de supermercados do Acre a exibirem em suas prateleiras a informação “produtos transgênicos”, em letras graúdas e em cores vivas. Assim sendo, quem gosta deste tipo de produto, o consome, e quem não se interessa pelo mesmo, passa longe, e quem nem sabe do que se trata, pode se interessar e pesquisar sobre o assunto.

Como não existe a possibilidade de se comprar derivados do milho normal e natural nos supermercados de  Rio Branco, sugiro que Vossas Excelências enviem projeto de lei para o governo no sentido de se criar uma lei que obriguem o comércio a importarem uma quantidade determinada de milho do Peru e da Bolívia, países que não cultivam grãos transgênicos e tem uma grande diversidade de tipos de milho orgânico. Sabe-se que estes países tem tradição milenar no cultivo deste precioso alimento, e o que é melhor, estão bem próximos de nós. Fica bom e viável do ponto de vista econômico também, além de que, é melhor para a saúde.

O milho é o alimento principal da América Latina. No Brasil, existem mais de 20 itens culinários à base de milho. Exemplos: mugunzá, pamonha, canjica, angu, broa, bolo, pão de milho, polenta, aluá etc. Precisamos ter mais zelo com a alimentação das crianças do nosso país, temos que ter o mínimo conhecimento sobre o que compramos e de que nos alimentamos. Nem mesmo os cientistas poderão explicar ao certo o que poderá ocorrer com a saúde de quem se alimenta de grãos transgênicos. Quem sabe, talvez algum fanático defensor, por motivos corporativistas ou partidários, se insurja contra este apelo. Como já dizia meu tataravô, é melhor prevenir que remediar. Atenção senhoras mães, donas de casa, seus filhos correm sério risco de se transformarem em Frankensteins, sua filha grávida pode desenvolver fetos com anomalias físicas e cognitivas.

Sou neto de Domingos do Rêgo Leite, pai de minha mãe Maria Deusa de Farias Leite. Esse guerreiro potiguar, natural de Apodi, foi um dos primeiros homens a trazer grãos do nordeste para plantar no  Acre. Ele cultivou um belo milharal em um grande roçado onde se produzia quase tudo, inclusive cana-de-açúcar. Tarauacá teve a sorte da chegada deste homem de bem em suas terras no início do século 20. Minha mãe aprendeu com minha avó Olinda Farias Nobre a fazer o pão de milho com o milho ralado, amarrado no pano úmido numa tampa de panela ou prato raso. Depois fazia-se a cobertura com leite de castanha verde, e se servia quentinho. Isso é qualidade de vida. Da pena ver o povo pobre, ingênuo e humilde da nossa terra, comendo cuscuz transgênico nos mercados pela manhã.

A limitação da participação da sociedade, que depende do grau de conscientização quanto aos problemas ambientais, do seu nível de organização e da existência de comunicação entre a sociedade e a administração pública, é que nos faz andar devagar.  Por isso, o Brasil tende a crescer sem qualidade e lentamente. E é exatamente por isto que estou tomando esta iniciativa. O antigo grego Hipócrates, considerado o pai da medicina, dizia: “Que o teu alimento seja o teu remédio e que o teu remédio seja o teu alimento”.  Nossa qualidade de vida depende da nossa atuação, comportamento e atitude.

Em tempo: o cultivo de milho geneticamente modificado foi liberado no Brasil no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que desconsiderou os conselhos do Ibama , Anvisa e outros sobre os  riscos que este tipo de cultura poderia causar.

Bab Franca é artista plástico

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Juiz aceita denúncia do MPF e abre processo contra sobrinho do governador do Acre


O juiz Jair Araújo Facundes, da 3ª Vara da Justiça Federal, aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o ex-diretor de Análises Clínicas da Secretaria de Saúde do Acre, Tiago Viana Neves Paiva, sobrinho do governador Tião Viana, que passa a responder ação penal e ação de improbidade administrativa por fraude em processo licitatório no valor de R$ 2,6 milhões destinado à contratação da Centtro Medicina Diagnóstica Ltda., empresa criada para desviar verbas do governo federal destinadas ao Sistema Único de Saúde (SUS).

A empresa Centtro pretendia contratar empresa de radiologia médica para fazer a implantação do Sistema de Digitalização de Imagens Radiológicas em unidades de saúde no Acre, bem como ser responsável pelos laudos médicos dos respectivos exames. Também foram denunciados pelo MPF e terão que responder à ação penal Edilene Dulcila Soares, Gerival Aires Negre Filho, Narciso Mendes de Assis Júnior, Paulo José Tonello Mendes Ferreira, Ricardo Alexandre de Deus Domingues e Ronan Zanforlin Barbosa.

A denúncia do MPF, instruída com vários documentos, narra que os sócios da empresa Centtro (Gerival Aires, Paulo José, Ricardo Alexandre, Ronan Zanforlin), e o representante da empresa (Narciso Mendes Júnior), entabularam prévio ajuste com o Diretor de Análise Clínica da Secretaria Estadual de Saúde (Tiago Viana), para o fim de fraudar a licitação para contratação de empresa que forneceria diagnósticos por imagens à Secretaria de Saúde do Acre. Acrescenta que a pregoeira do certame licitatório (Edilene Dulcila) participou da fraude ao inabilitar desmotivadamente a empresa que ofereceu o melhor lance.

Na decisão, o juiz escreveu que a a instauração de uma ação penal, por si mesma, afeta o património jurídico da pessoa denunciada, que ostentará, doravante, a condição de acusado.

- Para ser legítima e conforme as garantias previstas no ordenamento, a acusação deve, já ao início, demonstrar sua plausibilidade, elencando os indícios de autoria e prova da materialidade, ou, na dicção do STJ, "deve ser edificada em bases sólidas, corporificando a justa causa, sendo abominável a concepção de um chamado princípio in dúbio pró soc/etate”. acrescenta o magistrado.

Os elementos colhidos indicam que a empresa Centtro venceu a licitação realizada através de pregão com uso de fraude. Entre as provas, o juiz destacou que as interceptações telefônicas colhidas antes do pregão entre os denunciados evidenciam que agente público não só orientava o réu Narciso Mendes na montagem das planilhas que seriam oferecidas, mas também como esse acusado deveria "pressionar" ou "acochar" a Secretária de Saúde para o fim de aceitar valores e condições prejudiciais ao interesse público.

Documentos e testemunhas expõem que agente público indicou empresas ligadas a Paulo José, Ronan Zanforlin e Gerival Aires (sócios da empresa Centtro), para oferecer propostas de valores, permitindo que antes mesmo do início da publicação do edital os denunciados manipulassem os valores de referência que iriam balizar o pregão. Por outras palavras, assinala o magistrado, os valores de referência que fixaria os preços do pregão foram coletados não junto a empresas do ramo selecionadas aleatoriamente no mercado, mas junto três empresas representadas justamente pelos três sócios da Centtro, de modo que os sócios e futuros licitantes fixaram o preço básico que nortearia o certame de que iriam participar.

Consta na decisão do juiz que as diligências realizadas pela Polícia Federal no endereço da empresa Centtro demonstraram um prédio vazio e destituído de qualquer equipamento para produzir diagnósticos por imagens de qualquer natureza. Além disso, diálogos entre os denunciados Narciso Mendes (cunhado de Ronan, segundo a denúncia) e Paulo mostram o propósito de obter um contrato com o Governo do Estado do Acre para fornecimento de diagnósticos por imagens, com a finalidade, entre outras, de cobrar por serviços não realizados ou desnecessários.

As conversas captadas entre os denunciados Narciso Mendes, Paulo e servidor público tornam verossímil o ajuste de estratégias, valores, planilhas, além de expor como acompanhavam a movimentação interna da licitação.

Decisão proferida no procedimento licitatório inabilitando a empresa Cedmip, ao argumento de que esta empresa não possuía património líquido igual ou superior a 10% do valor de sua proposta, embora essa empresa tenha apresentado balancete ostentando património líquido de RS 436.713,76 (valor superior a 10% de sua proposta, conforme exigência editalícia).

- A decisão de inabilitar empresa que satisfazia as exigências editalícias beneficiou justamente a empresa Centtro e os interesses dos denunciados, de modo que essa decisão, por se afastar das regras do edital, consubstancia justa causa suficiente, nesse momento processual, para autorizar o recebimento da denúncia - escreveu o juiz.

Jair Facundes escreveu que “todos esses elementos, e tantos outros descritos na denúncia, são indiciários, precários porque não submetidos ao contraditório e à ampla defesa enquanto condição de legitimidade do próprio processo penal que valerá na exata razão em que proporciona e realiza aquelas garantias constitucionais”.

- Esses indícios, por certo, não autorizam veredicto algum, e poderão se esvaecer durante a instrução do processo. Porém, consubstanciam, nesse momento, indícios suficientes para autorizar o início do processo - acrescentou.

O juiz determinou que os acusados  Gerival Aires Negre Filho, Narciso Mendes de Assis Júnio, Paulo José Tonello Mendes Ferreira, Ricardo Alexandre de Deus Dqmingues sejam citados para oferecerem resposta escrita em dez dias, expedindo-se as necessárias precatórias. Com relação aos denunciados Edilene Dulcila Soares e Tiago Viana Neves Paiva, em razão da condição de servidores públicos, deverão ser notificados para responder, por escrito, no prazo de 15 dias.