quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

O GRANDE ENCONTRO

"Não encontrando, mais uma vez, qualquer sinal do uirapuru, o ornitólogo viu-se obrigado a retornar à Manaus para pegar um avião para o Acre. Quando de sua chegada à capital, Rio Branco, foi recebido pelo governador do estado, Aníbal Miranda.

- Ele tinha ouvido, pelo rádio, a notícia de que eu estava à procura do uirapuru. O governador Miranda acabou por me dar valiosas indicações sobre onde supunha ser mais fácil encontrar o lendário pássaro. Parti, então rumo ao seringal Bagaço, situado na divisa do Acre com o estado de Rondônia - conta Dalgas.

Ao anoitecer, ele finalmente chegou ao local sugerido. Pouco depois, caiu um temporal. Na manhà seguinte, aos primeiros raios de sol, parecia que toda floresta amazônica estava em festa. Sons de pássaros de diversas espécies vinham de todos os lados. Acompanhado de um guia índio, Dalgas foi penetrando a mata fechada.

- De repente, o guia chamou minha atenção. O uirapuru cantou, disse ele. E eu não tinha percebido nada. Pouco depois, ele repetiu a mesma frase. Entramos um pouco mais na floresta. A essa altura meu gravador e a parabólica já estavam operando. Então, um pequenino pássaro, menor que um tico-tico, pousou em minha aparelhagem. Tentei espantar a avezinha, quando o índio explicou: é o próprio uirapuru - recoda Dalgas.

Após alguns instantes de tensão, a avezinha vôou para o galho de uma árvore, a menos de um metro e meio dos dois espectadores boquiabertos e dali fez uma apresentaçào exclsuiva e sem pressa.

- Assim que o uirapuru parou de cantar, voltei a fita e reproduzi o canto, com qualidade perfeita. A avezinha ficou um pouco nervosa com o som de sua própria voz, suas penas arrepiaram-se e passou a cantar uma melodia totalmente diferente da primeira. Repeti o mesmo procedimento outras vezes e, ao final, consegui gravar oito cantos diferentes. No dia seguinte, retornei ao mesmo local e consegui gravar os mesmos cantos de forma ianda mais perfeita. Concluí, então, que havia feito um registro completo e inédito dos cantos dessa espécie. Foi uma das maiores emoções de minha vida.

Aquele que seria o encontro mais significativo de Dalgas com uma ave aconteceu em 9 de novembro de 1962, exatamente às sete horas da manhã, no Acre".

Texto e fotos do livro "Aves Brasileiras - Minha Paixão", a vida e obra de Johan Dalgas Frisch, com redação de Silvestre Gorgulho, Simone Silva Jardim e Martim Bueno de Mesquita. A espécie encontrada por Dalgas no Acre, o autêntico Cyphorhimus aradus, canta apenas somente por ocasião da construção de seu ninho, entre os meses de outubro e novembro. O canto, que imita as notas de uma flauta, dura de cinco a dez minutos, geralmente ao amanhecer. Macho e fêmea cantam, mas o primeiro tem maior desenvolvutra. O uirapuru é símbolo de sorte e amor. Diz a lenda que a pessoa que ouvir o canto da ave e fizer um pedido, esse será realizado. Dalgas capturou no ninho (uma bola feita de palha e ramos entrelaçados com abertura lateral) o exemplar encontrado no seringal Bagaço. Na foto em preto e branco, Dalgas aos 30 anos de idade, em embarcação cedida pelo então governador do Acre, Aníbal Miranda, para sua expedição em busca da inédita gravação do canto do uirapuru.

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