segunda-feira, 10 de outubro de 2005

FABIANO KAXINAWÁ

O meu amigo índio Fabiano Kaxinawá enviou esclarecimento em decorrência da polêmica gerada pela nota "Nishi pay dá grana", publicada aqui na quinta-feira, que tem resultado em vários comentários contraditórios sobre o uso da ayahuasca. Leia a mensagem do Fabiano, que tem 19 anos:

"Permitam-me, só para ficar claro, meus queridos amigos e irmãos.

Sou Fabiano Kaxinawá, filho do Cacique Siã Kaxinawá e neto do líder Suero Kaxinawa, que descansa em seu lugar onde o destino lhe reservou.

Àqueles que me conhecem como sou e àqueles que me conhecem como falam de mim: sou um jovem que estou lutando pelo meu povo Huni Kui.

Respeitosamente, venho a esta cidade [Rio] do nosso Brasil aprender novos conhecimentos para poder valorizar a tradição do meu povo e mostrar a verdadeira cultura do Brasil.

Eu fico feliz em ver outros povos mostrando as suas tradições e valorizando. Eu não sou o sábio das coisas. A sabedoria que eu tenho é do meu povo Huni Kui.

Sinto-me honrado por poder compartilhar esta bebida sagrada [ayahuasca] do meu povo com outros irmãos e irmãs.

Todos nós temos os nossos valores na vida, respeitando as pessoas e defendendo a vida e a dignidade, com esperança de encontrar a razão porque somos brasileiros.

Que os espíritos abram as mentes dos homem e mulheres, que nos tratam com indiferença ou inferiores, porque diferente é cada um de nos.

Desejo a todos nós que possamos caminhar assim: ao lado uns dos outros, fazendo acontecer. Muita luz àqueles que me conhecem e também àqueles não me conhecem.

Força para meu amigo Altino. Meu respeito ao meu guerreiro [Joaquim] Tashka Yawanawa.

Que os deuses transmitam ao coração de cada um a revolução da amizade, construindo a paz. Sejamos simplesmente, gente.

Desculpe por não escrever muito bem.

Obrigado

Fabiano Kaxinawá"

5 comentários:

Anônimo disse...

Caro Altino, como vai? Recentemente, passei a ler o teu blog através de uma amiga que o recomendou, animada. Estes dias, infelizmente, tive a oportunidade de ler comentários teus ao trabalho de duas pessoas que acompanho há algum tempo, Fabinho e José Floriano. Para dizer o mínimo, achei os comentários preconceituosos, ainda mais partindo de uma pessoa dita espiritualizada e que as pessoas julgam também espirituoso e crítico.
Se você tiver tempo, releia ( é de fato importante reler!).
Observe o preconceito quase em carne e osso e ainda, travestido de purismo (como?)ou tradicionalismo (pior).
Espero que a releitura te mostre o que eu vi: a semente da intolerância.
Andrea

Anônimo disse...

Caro Altino Machado.
Permita-me dirigir esta carta pela primeira vez.
Antes de mais nada, meus respeitosos cumprimentos pelos trabalhos desenvolvidos por vocês junto ao seu Blogspot.
Sou Yoshihiro Odo, Psicólogo e Acupuntor, Tradutor de lingua japonesa, e um dos organizadores do Ritual de Nishi pay, a ser dirigido pelos irmãos Banê e Fabiano Kaxinawá. Venho colaborando na divulgação da alma ancestral brasileira, do conhecimento e do respeito à floresta aqui em São Paulo e no Japão, desde a década de 1980.
Fiquei sabendo da sua opinião a respeito do evento que estamos organizando, mas lamento o seu posicionamento e divulgação precoce, e por isso mesmo injusto para com este evento e para com os irmãos Kaxinawá. Deixe-me explicar:
UM POUCO DA HISTÓRIA:
Vimos realizando rituais mensais, desde julho de 2003, sob o comando do Leopardo Kaxinawá, que veio para São Paulo estudar e conhecer a cultura desta cidade brasileira e trabalhar na divulgação e valorização da cultura e conhecimento do seu povo.
Leopardo Kaxinawá nestes dois anos conseguiu abrir as portas desta cidade paulistana, favorecer a divulgação da cultura Kaxinawá, organizou o Nishi-pay com a participação do seu pai Siã Kaxinawá e sob o comando do Pajé Agostinho Manduca Muru, participou da organização de Ritos de passagem na qualidade de diretor da IDETI, com a presença e participação de diversas tribos de todo o Brasil, participou de palestras e debates organizados pelas universidades, escolas particulares e públicas em São Paulo.
Este mês, o trabalho ritual ficou por conta dos irmãos Fabiano e Banê. Esperamos poder receber a visita nos próximos meses de mais representantes Huni-kuin a divulgarem a sua cultura ancestral aqui em São Paulo.
SOBRE O CUSTO DO EVENTO E PREÇO.
Não sabemos como acontece aí no Rio Branco. Aqui em São Paulo, tanto para conseguirmos a passagem do pessoal Kaxinawá, como o local e a hospedagem (chácara para realizar o evento) temos uma despesa enorme. (Por exemplo, a despesa ida e volta de Rio Branco a São Paulo custa pelo menos R$ 1000, por pessoa). E ficamos sempre devendo a despesa de gasolina dos colaboradores que nos ajudam voluntáriamente. O preço cobrado é o mínimo para cobrir as despesas. Nós que ajudamos a organizar o evento temos vontade, sim, de que toda a cultura e tradição indígena seja realmente valorizada. E que isso venha a refletir inclusive na valorização econômica dos seus conhecimentos. Estamos ainda na fase inicial dos trabalhos de sua divulgação.
SOBRE A ONDA NEO-XAMNICA.
A maioria dos participantes deste Encontro vêm à procura de ter contato com o uso original da ayahuasca, fora do contexto urbano e cristão, relacionado ao conhecimento tradicional do índio e da floresta. Os irmãos Yawabanê, mesmo tão jovens, conseguem ensinar e conduzir o encontro com o Nishi-pay transmitido na sua memória ancestral, através dos seus cantos sagrados na sua lingua tradicional. O trabalho deles prepara a visita futura dos pajés e valoriza o conhecimento do seu povo e dos demais povos sobreviventes e ancestrais do Acre. Na cidade grande aonde a onda neo-xamânica vem favorecendo a confusão no consumo do Ayahusca, o trabalho dos Kaxinawá se destaca pelo simples e revelador. Tem uma verdade inegável daqueles que são filhos da jibóia branca. Traz o conhecimento e respeito à floresta. Permite-nos uma re-descoberta de que a verdadeira alma do Brasil, alma com mais de 30 mil anos de história está, sim, depositada nestes sobreviventes do massacre promovido pela invasão ocidental. Por isso a sua colocação de que os “meninos fazem o meio de vida no meio da onda neo-xamânica” é profundamente injusta. Não há ninguém trabalhando em proveito pessoal. O tempo e a planta sagrada deverão mostrar isto a todos que estão atuando com sinceridade.
SOBRE A INSINUAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL.
Não há qualquer preconceito contra esta ou aquela profissão, uma ou outra religião e nem contra imigrantes e estrangeiros. Participaram até agora do Encontro com Nishi pay, policiais, advogados, estudantes, professores, psicólogos, médicos, acupuntores, economistas, bancários, fotógrafos, cineastas, antropólogos, jornalistas, artistas... Assim como budistas, católicos, judeus, shintoístas, japoneses, alemães, italianos, negros, xavantes, guaranis… O Ritual é livre e legal. Não há medo nem perseguições.
SOBRE A AUTORIA DO CONVITE.
O convite e o material de divulgação é oficial dos irmãos Leopardo e Fabiano Kaxinawá. E este trabalho vem sendo realizado com a autorização dos líderes da sua Aldeia. A Cecília é apenas a organizadora da divulgação e inscrição, sempre sob a orientação dos Kaxinawá.

A sua injusta colocação, creio, devido a falta das informações acima, está resultando em visões e opiniões distorcidas sobre o trabalho desenvolvido pelos Kaxinawá em São Paulo. E até mesmo numa colocação equivocada, mas claro, como um aviso amigo, do Joaquim Tashka Yawanawá. O equívoco entre os Kaxinawá e Yawanawá se desfaz no seu Encontro direto. Mas o equívoco da opinião dos seus leitores… Espero estar esclarecendo e contribuindo para desfazê-lo.
Por fim, coloco-me à sua inteira disposição para outras informações que possam contribuir no seu trabalho de jornalismo em defesa da verdade e justiça.

Yoshihiro Odo

Anônimo disse...

Caro Altino, nunca havia entrado em seu blog antes.
Gostaria de deixar aqui um pequeno comentário de um homem branco caucasiano que sente profunda ligação com as culturas ancestrais deste planeta. Gostaria de dizer que sei bem o que você quer dizer com onda neo xamanica e que este ritual com os Kashinauá não tem nada,nada em comum com o que tem acontecido de néo xamanico aqui na cidade grande. É muito difícil o homem branco se relacionar com algo sem modificá-lo.
ou melhor a relação entre culturas sempre modifica os lados envolvidos de alguma forma. Estou no caminho sagrado desde que nasci e em todos os momentos de busca de contato com o que há de mais próximo da ancestralidade planetária não encontrei nada que fosse mais puro e sem pretensões dogmáticas e religiosas como o ritual nishi pay. Infelizmente para conseguir dizer algo na grande cidade é preciso se inserir no contexto( aluguel,transporte,logística). Posso deixar aqui minha colaboração para seu maior conhecimento do assunto. Gostaria de deixar bem claro meu respeito por quem se expõe em dizer o que pensa. Mas,...para dizer o que pensamos em público e abertamente precisamos nos vestir de uma dose de prudência e responsabilidade para honrarmos as verdades que foram ditas ;e bastante humildade para admitir que estivemos pouco informados sobre este ou aquele assunto que comentamos e admitir nossos erros. Errar faz parte de todo aprendizado, quem não erra nunca saberá que existem diversas formas de melhorar ou até nunca saberá que erra mesmo que não saiba. Nosso trabalho não termina enquanto não nos reconhecermos como aprendizes. Espero ter contribuido ainda que bem pouco no aprendizado, meu, seu, e de todos que lerem estes comentários, afinal somos professores e alunos uns dos outros. Esteja em Paz!

Mario Rayel

Anônimo disse...

Olá Altino:
Por causa dessa polêmica toda acabo de conhecer seu blog.
Que beleza, o seu trabalho como jornalista.
Conheci você em 96 em Rio Branco e talvez não lembre de mim. Mas jamais vou esquecer de tudo de bom que você pode abrir pra mim e pra mim aluna Dani.
No entanto com relação aos Kaxinawás vejo - por trás - o oasqueiro endógeno.
Penso mesmo que eles deveriam cobrar muito mais, mas muito mais mesmo.
Depois, essa bebida é sagrada e pertence aos povos que não foram contaminados pela praga do desenraizamento.
Mas concordo contigo quando fala que esse rótulo de neo-xamã é fora de foco. Parece-me que os povos da cidade não conseguem fazer a transcodificação de símbolos.
Mas esse assunto é complexo.
Grande abraço e lutemos por um jornalismo cada vez mais sem preconceitos, tolerante e comunicativo.
abs
Jussara

Anônimo disse...

Caro Altino Machado,
Prezados amigos, irmãos e irmãs, txais.
Vos peco licenca, para aqui neste espaco colocar algumas palavras, consciente da responsabilidade que é publicar alguma palavra. Admiro a posicão do jornalista, que neste ofício arca com esta responsabilidade diariamente, afinal todos estamos constantemente nos transformando, assim como algumas de nossas opiniões. Sou um brasileiro chamado Fernando, fazem 27 anos. Tive o privilégio, 7 anos atrás, de reencontrar aí nesta linda cidade de Rio Branco, um grande amigo, Leopardo. Logo depois o Siã, Fabiano e família. Desde então, após muitos reencontros, só cresceu minha amizade e admiracão por eles e todo seu povo Huni Kui. Povo este que tenho tido a honra de conhecer mais de perto e que cativou meu coracão.
Estivemos juntos no fim do ano passado por muito esforco e dedicacão na área indígena do Jordão realizando as gravacões do filme sobre o Katxa Txirim, a cerimônia do gavião real, uma das riquesas da forte cultura Huni Kui. Também elaborando sólidos projetos de desenvolvimento e preservacão que estão se realizando. Esses irmãos, nativos da floresta, estão trabalhando sério e sabem oque estão fazendo, transmitindo a mensagem do seu povo. Por uma curiosa "coinscidência" estou tendo contato com este equívoco no dia de hoje, dia em que a voz deste menino de 19 anos e seu povo, e do Acre, foi ouvida aqui em Oslo, na Noruega. Fui convidado por uma associacão norueguesa chamada Indiansk Støtteforening à apresentar alguns projetos deste povo num grande encontro europeu que está acontecendo na capital escandinávica, sendo que um dos projetos, da criacão do centro de saúde de prática e estudo da medicina tradicional Huni Kui na aldeia do jordão, já foi aprovado. O relatório do vice-prefeito do Jordão e lideranca do povo Huni Kuin Siã entregue para autoridades daqui. Enquanto o povo da europa aprende um pouco, admirados, sobre a linda cultura do Acre, o próprio Acre a ignora, desconhece, até desrespeita. Meus irmãos, vamos abrir os olhos e dar valor ao que é nosso. Ainda acrescento que é muito mais válido o que chamas de neo-xamanismo (que não é o caso dos huni kui, definitivamente) do que os velhos vícios da sociedade. Ao menos já é um caminho de volta as origens e vem abrindo muitos coracões. Viva o Brasil, Viva a Floresta.
Finalizo vos agradecendo, Altino, pelo espaco e pela saudável abertura a outras colocacões e esclarecimentos, e a todos envolvidos. E lembro o sábio Confúncio : " A única maneira de não cometer nenhum erro é não fazer nada. Este, no entanto, é certamente um dos maiores erros que se poderia cometer em toda uma existência."
Amor e luz, sincera e fraternalmente
Txai Fernando Assad, Oslo 19.11.2005