terça-feira, 19 de outubro de 2004

“PF AGREDIU PRESOS”


Antonio Braña (esquerda) e Domingos Munhoz, que está foragido

O advogado acreano Antônio José Braña Muniz, do PT, era o candidato a vice-prefeito de Boca do Acre na chapa encabeçada por Domingos Munhoz e, posteriormente, por Dorinha Munhoz, ambos do PL, que foram impugnados pela juíza Rosa Maria Calderaro.

A decisão da juíza motivou a revolta de mais ou menos duas mil pessoas que atearam fogo e destruíram a casa e a rádio do prefeito Iran Lima (PPS), a sede da prefeitura e o fórum.

Braña, que é natural de Sena Madureira (AC), é funcionário do Incra na região há mais de 20 anos. O petista denuncia torturas a que teriam sido submetidos pela Polícia Federal os supostos responsáveis pela condução da fúria popular.

Leia a entrevista:

Quando começaram as irregularidades no processo eleitoral em Boca do Acre?
Braña
- Prevendo um acirramento da disputa política no município, no dia 14 de agosto de 2004 nós, que compúnhamos a candidatura das oposições, pedimos à juíza que providenciasse a vinda de tropas federais para garantir a tranqüilidade do pleito. Este pedido foi indeferido pela juíza.

Por que o registro da candidatura de Domingos Munhoz foi impugnado?
Braña
- Dias após o pedido de registro de candidatura dele, o Ministério Público pediu, através de ação de impugnação, o indeferimento do pedido de registro da sua candidatura bem como a de seu filho Doniscley Munhoz, alegando que Dominguinhos estava concorrendo a um terceiro mandato, baseado no artigo 14 da Constituição Federal.

O pedido também foi ajuizado pelo prefeito Iran Lima, candidato à reeleição?
Braña
- Sim. O pedido de impugnação foi ajuizado também pela coligação do candidato Iran Lima com os mesmos argumentos e data do que fora formulado pelo Ministério Público. Mas foram ajuizados outros pedidos contra 14 candidatos a vereadores. A juíza indeferiu a todos os pedidos com exceção do pedido de candidatura do Valcy, do Partido Liberal

A sua coligação tem criticado duramente a conduta da juíza Rosa Maria Calderaro. Por que?
Braña
- O calendário eleitoral foi desconsiderado pela juíza que, após despachar quanto à abertura de prazo recursal, viajou em meados de julho para Manaus retornando no dia 9 agosto, quando o prazo para julgamento dos processos em primeira instância, não poderia ultrapassar ao dia 14 de agosto.

Além disso, o senhor considera algum outro fato como grave?
Braña
- Um fato grave aconteceu quando estávamos copiando os processos para interpor recursos. A funcionária do fórum, conhecida por Rosa, que não é advogada, declarou que fez várias sentenças para a juíza assinar. Em muitos casos a sentença distorcia completamente do que constava nos autos. Eis um exemplo: O vereador Raimundinho, reeleito que não fez o teste de escolaridade, e justificou o porquê, constava na sentença como reprovado.

Quando as sentenças foram publicadas?
Braña
- As sentenças foram publicadas no final da tarde do dia 22 de agosto, quando não havia populares nem candidatos no fórum. Ao invés de deixar o prazo de edital transcorrer, expediu intimações pessoais assinadas por ela, a juíza, para serem cumpridas no dia seguinte, constando nas mesmas o prazo de 72 horas para recurso.

O que aconteceu a partir disso?
Braña
- Esse fato causou prejuízo para a coligação Frente Popular para o Desenvolvimento Bocacrense, pois induziu os advogados ao erro, uma vez que os recursos foram interpostos com base na intimação pessoal. Acontece que este entendimento, divergente no TRE, resultou no indeferimento de alguns processos de nossa coligação, dentre as quais a do candidato a prefeito Domingos Munhoz. Inclusive no TSE, através do ministro relator Carlos Veloso, sem julgamento do mérito.

Houve outro fato que a coligação considera irregular?
Braña
- Outro ato de atropelamento da lei, praticado pela juíza Rosa Maria Calderaro: Não aceitou que juntássemos originais dos recursos enviados por fax de Manaus. Alegou que os tais deveriam ser também dentro do prazo de 72 horas e não em cinco dias subseqüente ao prazo. Tentamos argumentar por telefone, mais proibiu ao chefe de cartório de receber nossos recursos. Pedimos certidão.

O que vocês decidiram a partir disso?
Braña
- Em razão do risco de indeferimento, a coligação resolveu substituir o candidato Domingos Munhoz, por sua esposa Maria das Dores de Oliveira Munhoz, a dona Dorinha, o que foi perfeitamente entendido pelo povo. No entanto, antes de transcorrer o prazo de que dispunha o Domingos Munhoz, no TSE, a juíza Rosa Maria Caderaro expediu notificação à coligação para cessar as músicas do candidato, recolher material de propaganda e proibiu de realizar comícios. Isso aconteceu no dia 29 de setembro.

A coligação não buscou saída?
Braña
- Tentamos argumentar por telefone com a juíza, mas ela apenas disse que teríamos que cumprir suas ordens. A notificação estava assinada por Domingos Munhoz. Não assinamos porque atropelava a legislação.

Houve uma segunda sugestão para que fosse requisitado o auxílio de tropas federais?
Braña
– No dia 25 de setembro, já preocupados com o acirramento dos ânimos, conversamos com a juíza, o MP e representantes da outra coligação. Pedimos novamente reforço de forças federais, mas novamente a juíza não decidiu.

Quando a candidatura de Domingos foi substituída pela da esposa dele, a Dorinha?
Braña
- Isso aconteceu no dia 29 de setembro. Substituímos Domingos Munhoz, mas a juíza, sem abrir prazo para o Ministério Público e demais coligações, indeferiu de pronto a candidata substituta, um dia antes da eleição, causando a partir deste momento, grande confusão dentre nossos simpatizantes.

Como se comportou o candidato à reeleição?
Braña
- Aproveitando-se de toda essa situação, as rádios de propriedade do sr. Prefeito Iran Lima, vinham noticiando há dias, e sobretudo a partir do dia 2 de outubro, que nossa coligação não tinha candidato a prefeito. Fez até campanha fora do horário eleitoral, inclusive com uma entrevista do governador Eduardo Braga, que pedimos ao Ministério Público para tomar as providências, além de propaganda sonora pelas ruas da cidade, panfletos etc.

O que fez a juíza em relação a isso?
Braña
- Preocupados com todos as mentiras veiculadas nas rádios do prefeito Iran Lima, nos bairros, ruas, estradas e rios, fomos à juíza e pedimos providências. Por causa disso, ela determinou que cessasse a propaganda enganosa, notificando a outra coligação cuja redação da notificação foi entendida ao contrário pelo povo. Todos entenderam como sendo contra nós.

O que fez mais a juíza?
Braña
– Ela decidiu que requerêssemos direito de resposta, o que fizemos. O despacho da juíza, no entanto, foi no sentido de requisitar a fita da rádio, concedendo para tanto um prazo de 24 horas. Acontece que tal prazo, se exauria no final do dia 3, dia da eleição. Portanto, não tivemos como nos defender nas rádios. Aliás, até uma entrevista solicitada para o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, alegaram problemas técnicos, enquanto a referida autoridade permanecia na cidade. Ao viajar, a rádio entrou no Ar. Tal manipulação foi rotina no horário eleitoral. Aliás, a própria juíza chegou a nos afirmar que estava havendo esse tipo de atitude por parte do prefeito e dos diretores da Rádio, mas que teria tomado providências às vésperas das eleições.

O que agravou a tensão naquele momento?
Braña
- Para dificultar ainda mais a situação bastante tensa que vivia a cidade, a juíza resolveu dar uma entrevista desnecessária e tendenciosa um dia antes da eleição, às 15 horas, nas rádios sob controle do prefeito. Naquele momento, nossa coligação preparava uma passeata. O povo, já apreensivo e revoltado com o noticiário enganoso, ficou de prontidão para ouvi-la, na esperança de que o pronunciamento fosse no sentido de trazer clareza sobre o processo de votação.

O que disse a juíza durante a entrevista?
Braña
– A entrevista da juíza permitiu que a população se revoltasse com suas palavras. Ela repetiu por três vezes que só havia oficialmente duas candidaturas, a do PDT, de nº 12, e a da coligação n°23, do prefeito Iran Lima. A nossa coligação estava indeferida por ela. Avisou que nossos votos seriam nulos. Disse que quem quisesse votar no 22 que votasse, mas que os votos seriam nulos, enquanto sua decisão prevalecesse. A gravação dessa entrevista nós repassamos à imprensa.

Qual foi o resultado dessa entrevista?
Braña
- Após a entrevista, que, para a maioria da população decidiu a eleição, mais de 6 mil pessoas foram às ruas protestar. Realizamos a maior passeata da história de Boca do Acre.

O que aconteceu no dia da eleição?
Braña
- Às 17 horas daquele dia, conversamos com a juíza. Ela se dizia preocupada com a apuração. Nessa conversa, juntamente com Domingos Munhoz, ratificamos nossa vontade de ajudá-la no processo eleitoral, na manutenção da ordem. Porém, alertamos que sua entrevista havia sido acolhida de forma negativa pelo povo. No entanto, estávamos empenhados na defesa da paz a da ordem.

O que o senhor fez durante a apuração dos votos?
Braña
- Eu, na qualidade de candidato a vice prefeito na chapa do Domingos Munhoz, juntamente com minha esposa, ficamos no fórum até às 19h30, enquanto Domingos Munhoz, ficou até 20h30. Nos recolhemos em nossas residências. Aliás, na conversa com a juíza, chegamos a lhe deixar o número de nossos telefones para qualquer eventualidade.

O processo de votação foi tranqüilo?
Braña
- Foi tranqüilo, mas a juíza, divergindo do promotor, e de toda orientação do TSE, arbitrou que somente poderia votar com o título acompanhado de documento, com foto. Quem apresentasse apenas o título, não poderia votar, o que causou constrangimento e mais confusão. Somente por volta das 14h30 é que a juíza autorizou que o eleitor votasse com o título e o registro de nascimento ou casamento. No entanto, muitos eleitores já haviam desistido de votar.

Quando começou a reação popular?
Braña
– O movimento popular de revolta estourou às 23h30, estendendo-se pela madrugada do dia 4, segundo relato de testemunhas. Foram milhares de pessoas, mais ou menos duas mil.

Ocorreram muitas prisões no dia da eleição?
Braña
- Ainda no dias das eleições, foram efetuadas 32 prisões arbitrárias, sendo apenas duas por estarem fazendo boca de urna. Ainda tentamos convencer a juíza para que permitisse que as pessoas fossem votar, mas ela foi irredutível declarando que não adiantaria oficiar o pedido. Essas pessoas não votaram, todas simpatizantes de nossa coligação, inclusive um candidato a vereador. No entanto, os candidatos da outra coligação, a exemplo do senhor Ecivaldo, foi detido e liberado duas vezes durante o dia da eleição. Até o delegado pediu ao promotor que interviesse junto à juíza para que os eleitores presos fossem votar, mas ela negou e ainda o tratou mal na presença de várias testemunhas.

O que a coligação quer agora?
Braña
- É nossa opinião que a magistrada não tem condições de permanecer presidindo o pleito e deve imediatamente afastada. Ela está desmoralizada perante a maioria da população. Entramos com reclamação no Tribunal Regional Eleitoral, no Tribunal de Justiça do Amazonas e no TSE porque não aceitamos que ela presida mais o pleito.

Qual a sua opinião sobre a prisão de pessoas que supostamente promoveram os incêndios e a destruição de prédios públicos?
Braña
- As prisões estão sendo feitas sem nenhum critério. Exemplo disso é que o delegado de nossa coligação, Gerson Marreira, permaneceu no fórum até o final da apuração, portanto, não teve nenhuma participação no episódio. No entanto, teve a prisão decretada pela juíza. Até o prefeito está indicando quais pessoas deverão ser presas. Todas elas são pessoas que apoiaram a candidatura da oposição, lideranças sindicais, jornalistas, empresários, funcionários públicos federais, jovens, pecuaristas e líderes partidários. Todos são primários, têm profissão definida, de endereço certo e pais de famílias.

O que está acontecendo em sua avaliação?
Braña
- Está havendo perseguições a policiais militares. Um dia após as eleições eles começaram a ser transferidos. Também está havendo perseguições a taxistas, comerciantes, pais de famílias que apoiaram nossas candidaturas sem que ninguém tome providências. O prefeito continua perseguindo as pessoas e demitindo-as mesmo com a proibição da lei, neste período leitoral. Nem a justiça e nem o Ministério Público em Boca do Acre tomam as providências.

Após a revolta popular como se comportou a juíza?
Braña
- Houve invasão do escritório de advocacia do José Carlos, onde trabalhavam nossos advogados, que tentaram argumentar com a juíza por tamanha afronta de lei. O que fez a Magistrada? Mandou que recorresse, como se o recurso fosse desfazer a invasão que estava acontecendo. A juíza não toma qualquer atitude contra o prefeito, que é quem está indicando quem deve ser preso.

E os prisioneiros?
Braña
- As pessoas ficaram vários dias presas na Câmara Municipal de Boca do Acre. Depois foram transferidas para Rio Branco. Elas foram interrogadas e agredidas pela Polícia Federal numa sala reservada dentro da própria Câmara.

O que mais o senhor tem a dizer?
Braña
- O pleito legalmente deve ser anulado, pois os votos nulos contabilizaram 50,64% enquanto o prefeito e o outro candidato do PDT, obtiveram 48,28% dos votos. O Ministério Público ajuizou ação de cassação do mandato e candidatura do prefeito que se encontra com a juíza há vários dias sem providências por compra de votos. O Ministério Público promoveu buscas e apreensões em vários comércios e em todos foram encontradas requisições do prefeito, que também se encontram no cartório, sem providências.

Um comentário:

Unknown disse...

Brana, grande figura.
Daqui da Bahia continuo torcendo por vc.
Tania Penna