segunda-feira, 7 de julho de 2008

A SEGUNDA REVOLUÇÃO ACREANA

Milton Hatoum

Na minha juventude amazonense, Rio Branco fazia parte das conversas familiares. Meu pai havia morado nove anos no Acre, destino de centenas, talvez de milhares de imigrantes árabes desde o final do século XIX. Atraídos pela economia extrativista da borracha, esses imigrantes deixaram a Síria e o Líbano e foram trabalhar em Rio Branco, Xapuri, Sena Madureira, Cruzeiro do Sul. Penso que esta saga ainda não foi narrada pelos historiadores. No entanto, todo ser humano tem sua história pessoal, que é um capítulo minúsculo - e às vezes ocultado - da história coletiva.

Em 1904, ano da revolução acreana, meu avô paterno saiu de Beirute e foi morar em Rio Branco. Eram tantos os imigrantes libaneses nesta cidade, que uma das ruas do Segundo Distrito era conhecida como Nova Beirute. Mais de trinta anos depois, meu pai e seu primo Said Farhat desembarcaram em Rio Branco, onde já moravam vários parentes, alguns nascidos no Brasil.

Território da mais recente fronteira brasileira da Amazônia Ocidental, o Acre foi também uma nova pátria desses imigrantes do Oriente Médio e de milhares de nordestinos que, já na década de 1870, foram trabalhar nos seringais da região. Homens que trabalhavam para escravizar-se, segundo a expressão certeira de Euclides da Cunha, que viajou para as cabeceiras do Purus em 1905. No livro À margem da História (1909), Euclides reuniu vários ensaios e crônicas sobre essa viagem. Nesses textos indispensáveis para a compreensão da formação social, histórica e geográfica do Acre, Euclides discorreu sobre índios, seringueiros e caucheros. Em outros ensaios ele analisou as péssimas condições de trabalho nos seringais e a importância do Purus como um dos grandes eixos de navegação regional. Por fim, ele mencionou um projeto relevante para o Brasil e seus vizinhos, sobretudo o Peru: um projeto ambicioso e de grande alcance geopolítico, econômico e cultural. Mais de um século depois, esse sonho de Euclides está se realizando: a ligação da Amazônia brasileira com o Pacífico.

Leia o relato da última viagem do escritor Milton Hatoum ao Acre em sua coluna na Terra Magazine.

Nenhum comentário: