sexta-feira, 25 de maio de 2007

GEOGLIFOS

Parceria entre Brasil e Finlândia estuda
estruturas arqueológicas no Acre


Fabio Reynol

O tamanho impressiona. O quadrado escavado de 215 metros de lado, 15 metros de largura e quatro de profundidade e com cantos arredondados é apenas uma dentre cerca de 100 estruturas semelhantes que vem sendo descobertas no estado do Acre desde 1977. No final do mês de junho, trinta anos após sua descoberta, os geoglifos acreanos - como são chamadas essas estruturas - serão revisitados pela ciência. Uma equipe multidisciplinar formada por pesquisadores brasileiros e finlandeses irá estudá-los. Essa parceria internacional envolve a Universidade de Helsinque, a Universidade Federal do Acre e o Museu Paraense Emílio Goeldi.

O objetivo do trabalho é responder, pelo menos em parte, as perguntas que envolvem essa descoberta arqueológica: por que, como e quando foram feitos e que civilização está por trás de sua construção? “Por enquanto, os geoglifos são apenas perguntas”, admite o paleontólogo Alceu Ranzi, da Universidade Federal do Acre, que integra a equipe que começará os estudos em junho. Ranzi participou como estagiário nos primeiros estudos dos geoglifos liderados pelo arqueólogo Ondemar Dias, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, logo após sua descoberta no final da década de 1970.

O atual grupo de pesquisa obteve autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para explorar cinco sítios arqueológicos dentre 60 conhecidos. Ranzi conta que foi somente após o desmatamento da floresta para dar lugar aos pastos e fazendas que as estruturas foram encontradas. São quadrados e círculos perfeitos, às vezes concêntricos, com dezenas de metros de extensão, de modo que só são vistos do alto. A terra retirada foi cuidadosamente colocada nas bordas de modo a formar um perímetro gigante feito de uma depressão ao lado de uma elevação de terra. A precisão dos formas geométricas chama a atenção dos pesquisadores, que consideram pouco provável que elas tenham sido construídas dentro da floresta. “Essa região já foi uma grande savana com lhamas e outros animais”, explica Ranzi. “Ainda não sabemos se os geoglifos são dessa época ou se ainda foram feitos durante um breve período de alteração climática, por exemplo”, afirma.

Os sítios do Acre lembram os desenhos esculpidos a 700 quilômetros dali no deserto peruano de Nazca e descobertos em 1927. No Peru, as escavações tomam a forma de imensos animais só visíveis a grandes alturas. Essas obras ganharam fama depois que o livro {Eram os deuses astronautas?}, do escritor suíço Erich von Daniken, tornou-se um best-seller. Inspirado nos megadesenhos peruanos, Daniken teceu a teoria de que certas civilizações teriam sido visitadas por seres extraterrestres inteligentes.

De qualquer forma, os especialistas não acreditam que Nazca e o Acre tenham uma civilização ancestral em comum. Essa é a opinião de Ranzi e da arqueóloga Denise Schaan, da Universidade Federal do Pará e do Museu Paraense Emílio Goeldi. Denise também está entre os pesquisadores que estudarão os geoglifos no mês que vem.

A arqueóloga acredita que as enormes valetas no Acre ajudam a quebrar um paradigma da arqueologia: o de que as grandes civilizações estariam instaladas apenas nas margens dos grandes rios. “Essas construções mostram que havia grandes sociedades também longe dos rios,” afirma a pesquisadora.

A idade das escavações continua sendo uma das maiores dúvidas. Duas amostras retiradas de sítios revelaram datações diferentes: 1.260 anos e 2 mil anos. Um dos objetivos do estudo em parceria com a Universidade de Helsinque é aprofundar o trabalho das datações nos sítios estudados.

A exemplo das figuras peruanas, o governo do Acre já estuda um meio de transformar os geoglifos em fonte de atração turística. Um encontro realizado no último dia 3 de maio reuniu autoridades e especialistas para discutir o tema. Tanto Denise Schaan como Alceu Ranzi vêem o turismo arqueológico como benéfico para a preservação das estruturas. “Desde que exista uma infra-estrutura que ofereça proteção ao turista e ao sítio e que dê ao visitante informações sobre o que ele está vendo, todos só têm a ganhar”, acredita Denise. “Foi por causa do desconhecimento que muitos geoglifos foram danificados. Conhecer é uma maneira de preservar”, afirma Ranzi.

O pesquisador ainda aposta que o Acre pode pegar carona no tráfego turístico já estabelecido em Nazca. “Cerca de 35 mil turistas visitam anualmente o deserto peruano. Se apenas 10% deles vierem ao Acre para conhecer os geoglifos, já serão 3,5 mil pessoas por ano incrementando a economia do estado”, calcula Ranzi. Com o término da construção da rodovia Pan-Americana que ligará o Brasil ao Peru, ainda mais turistas poderão viajar no tempo ao apreciar essas intrigantes e milenares obras.

Fabio Reynol é da revista ComCiência

Nenhum comentário: