terça-feira, 8 de novembro de 2005

RAZÃO E EMOÇÃO


Por Vássia Silveira

Nasci em Belém no ano de 1971, mas ainda moleca, meu pai resolveu voltar com a família para o Acre. A desculpa era que estava indo, como correspondente do jornal O Estado de São Paulo, cobrir os conflitos de terra na região. Hoje vejo que era mais do que uma cobertura jornalística. E acredito que além do retorno a terra onde havia nascido, meu pai desejava que os filhos conhecessem a cor do barro e os mistérios das raízes seringueiras. E acabou conseguindo.

Ali aprendi o sentimento amazônida. Um sentimento alimentado pelos ideais comunistas de meu pai e pelos pensamentos libertários de minha mãe – que me imputaram, na infância, a pecha de ser filha de hippie.


Foi essa mesma combinação que forjou o meu nome: Vassia, a homenagem a um personagem de Dostoievsk; e Vanessa, graças à atuação de Vanessa Redgrave no papel da bailarina Isadora Duncan. Razão e emoção. Dois elementos que passaram a fazer parte de mim, e que até hoje explicam o meu olhar sobre o mundo. Explicam também os cursos começados e não terminados. As paixões efêmeras, a inquietação e o não-conformismo.

Morei alguns anos no Rio de Janeiro, tempo suficiente para descobrir que habitava em mim uma alma urbana. E quando estava preste a fundir-me no concreto da grande cidade, fiz as malas e voltei para a Amazônia – onde passei os últimos dez anos trabalhando como jornalista.

Hoje, as sombras que vejo são novamente as dos arranha-céus. Cinza-fuligem que alimenta as idiossincrasias da palavra. Chão de concreto e brisa delimitando o espaço da criação. E uma memória molhada pelos rios e igarapés, o verde da mata e o silêncio.

A maturidade descobriu-me com as calças do medo e a tranqüilidade do amor. E se antes o espelho mostrava a face despida de traços, reflete agora a imagem de uma mulher na descoberta de suas primeiras rugas. No círculo da existência, sou agora a mãe que procura nas suas próprias referências o nome que forjará os destinos de Clara e Anaís. Uma mistura de razão e emoção.

Nota do blog: O jornalista gaúcho Roberto Villar Belmonte havia solicitado, no âmbito da Rede Brasileira de Jornalistas Ambientais, a indicação de blogs de outros jornalistas ambientais. Aproveitei para sugerir a leitura de O Espírito da Coisa, o blog do jornalista bissexto Antonio Alves, formulador do conceito de florestania, responsável por burilar boa parte das idéias da ministra Marina Silva e do governador Jorge Viana. Villar agradeceu a sugestão e prometeu passar a ler o Antônio Alves. "Rapidamente vi que ele também lê o Fritjof Capra, que, aliás, está retornando à Porto Alegre nos próximos dias. Uma conversa com ele é sempre inspiradora", disse. O jornalista pediu então "notícias da filha daquele jornalista que fazia o Varadouro aí no Acre, o Elson Martins. Ela editava a revista Outras Palavras. Está vivendo em Rio Branco ela?" Foi a deixa para fazer aqui o registro que faltava: a Vássia Silveira atualmente mora em Fortaleza, onde trabalha como jornalista e se dedica mais à literatura. Quem quiser, pode conferir alguns textos dela no Jornal da Poesia, de onde tirei a autobiografia, ou no site Ana e suas mulheres, no qual finalmente Vássia Silveira aderiu à blogosfera.

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