quinta-feira, 23 de dezembro de 2004

AUTO-CENSURA

Havia começado a redigir essas mal traçadas linhas indagando-me se era má fé ou ingenuidade da direção ou editoria do jornal Gazeta suprimir pelo segundo dia consecutivo notas críticas da coluna do jornalista Cláudio Humberto contra o governador Jorge Viana.

A Gazeta, que publica a coluna com exclusividade, retirou da edição de ontem a nota “Cai a máscara”. Nela, Cláudio Humberto afirmava: “O Sindicato dos Jornalistas do Acre desfez a cara e a pose de bom moço do governador Jorge Viana (PT). Acusa-o de manter um esquema de censura a notícias que o desagradem e de demissão de jornalistas que não controla”.

Certamente a fonte de Cláudio Humberto no Acre o avisou de que a coluna fora censurada pelo governo e não pela editoria no esforço de agradá-lo a qualquer custo. O jornalista então redigiu para a coluna de hoje a nota “Como na ditadura”. Gazeta mordeu a isca censurando-o novamente.

“Além de vetar propaganda oficial nos jornais que o desagradem, impondo-lhes censura prévia, o governador petista Jorge Viana há seis anos proíbe a rádio Difusora Acreana, do governo, de entrevistar políticos de oposição”, afirma a nota da coluna, que é distribuída para jornais do país inteiro.

Telefonei para o jornalista Sílvio Martinello, diretor do jornal, que explicou não ter acompanhado a decisão da editoria.

Ele disse que nos últimos anos se dedicou a escrever dois livros porque está cada dia mais complicado fazer jornalismo no Acre. “O Paulo Francis dizia que antes de exigir liberdade de imprensa o jornalista deve conferir o caixa da empresa para a qual trabalha”.

Sílvio Martinello, ex-correspondente do Jornal do Brasil no Acre, se tornou sócio da família do ex-governador e ex-senador Flaviano Melo no jornal. Gazeta exerceu uma crítica insana contra o primeiro mandato do governador Jorge Viana.

Jornalista e governador chegaram a romper o diálogo e a amizade, mas se reaproximaram e o jornal passou a dispensar outro tratamento ao governo.

Segundo o diretor da Gazeta, o jornal era patrocinado pelo atual prefeito Isnard Leite, mas, em razão da aproximação com o governo, perdeu o patrocínio ao tentar fazer uma cobertura equilibrada da política.

“Não é fácil manter o equilíbrio na corda bamba da política. Isso só vai mudar quando circular mais din-din do capital privado no Acre”, disse Martinello.

Conversei ainda com o jornalista Elson Martins, ex-sócio de Martinello na fundação do Varadouro e da Gazeta, para quem os patrocinadores de jornais no Acre, especialmente o poder público, deveriam deixar fluir o papel da imprensa sem sobrosso. “O governo precisa confiar mais no povo”.

A auto-censura da editoria da Gazeta agrava a polêmica sobre o suposto cerceamento da liberdade de imprensa no Acre. As notas censuradas de Cláudio Humberto, que não teriam maior impacto no Acre, já estão sendo usadas para reforçar os argumentos dos jornalistas que ficaram órfãos com a derrota de Márcio Bittar para a prefeitura de Rio Branco.

Esse debate se alastra e dele tenho participado em vários ambientes, sobretudo na internet, onde a maioria prefere se ocultar no anonimato. Quem quiser conferir muitas opiniões controversas deve visitar os blogs do jornalista Antonio Alves, do deputado Moisés Diniz, além dos anônimos Imprensa Livre e Caverna da Lua de Saturno.

Penso que permaneceremos atrelados ao cativeiro dos coronéis do barracão da política enquanto a sociedade tiver que se preocupar se o que necessita ser feito agrada ou não a Plácido de Castro, Nabor Júnior, Flaviano Melo, Edmundo Pinto, Romildo Magalhães, Orleir Cameli, Jorge Viana...

A auto-censura dessa vez foi um tiro no pé do governo.

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