sábado, 21 de março de 2009

SUPOSTO ABUSO SEXUAL NAS ALDEIAS

Joaquim Tashka Yawanawa



Cheguei ontem de uma viagem à Terra Indígena do Rio Gregório, acompanhado de amigos ingleses que foram visitar o povo Yawanawa. O clima na aldeia era de muita comida, muita festa e muita alegria. Meus amigos ficaram encantados com a energia contagiante do povo Yawanawa. Inauguramos o novo shuvo (casa tradicional) na aldeia do Mutum, uma construção incrível, de fazer inveja a qualquer construção moderna.


Depois de uma noite de uni (ayahuasca), dançando e cantando até o amanhecer, tomamos o barco para vir até São Vicente, onde pegamos um carro até Cruzeiro do Sul e de lá retornamos de avião para Rio Branco, onde tínhamos pré agendado várias reuniões.

Atravessando a balsa de Rodrigues Alves, encontrei o Flávio Contanawa, que me contou que o Francisco Pianko, atual assessor indígena do governo do Estado do Acre, estava sendo acusado na imprensa de abuso sexual de jovens yawanawa. Ouvindo isso do Flávio, fiquei muito triste, senti uma energia muito ruim, das muitas vezes que atravessei o Rio Juruá para ir e vir da aldeia. Nunca tinha atravessado o Rio Juruá com tanta tristeza.

Perguntei a mim mesmo, onde está a ética da política? Até que ponto o movimento indígena chegou? Sempre me mantive margem do movimento indígena, na entrelinha, para acompanhar o processo de mudanças que o mesmo atravessa. Sempre me posicionei a favor de um movimento indígena unificado.

No caminho para Cruzeiro do Sul, fiquei pensando nos rumores que tinha ouvido antes de viajar para a aldeia. A minha tristeza se deu por conta de que, enquanto a comunidade está vivendo um novo momento de reorganização, depois de passar por um ano todo de reorganizações das divisões internas, quando começa a aparecer uma luz no fim do túnel, aparecem novos problemas para tirar a paz e o silêncio das aldeias.

Chegando em Cruzeiro do Sul, tinha muitas mensagens no telefone, todos pedindo uma resposta urgente para saber se os yawanawá estavam sabendo do que estava acontecendo.

Acabou a tranqüilidade e me dei conta de que já estava na cidade, envolvido num redemoinho do qual não fazia parte, nem tampouco fui chamado. No entanto, como envolvia o povo yawanawa, me senti na obrigação de me pronunciar em nome das cino aldeias que a Associação Sociocultural Yawanawa representa.

Chegando na minha casa em Rio Branco, procurei me informar do que estava sendo noticiado pela imprensa. Para minha surpresa e decepção, o povo yawanawa era o alvo da atenção quanto a denúncia feita no Ministério Público Federal sobre o suposto abuso de nossas jovens pelo Assessor Indígena do Governo do Acre. Como já estamos arrolados num processo público sem saber, tenho o seguinte a esclarecer:

- As denúncias apresentadas não partiram do povo yawanawa e tampouco de um de seus representantes. A denúncia não partiu da aldeia. O povo yawanawa não está envolvido neste imbróglio. Lamento profundamente que o nome de nosso povo esteja envolvido num processo do qual não fazemos parte.

- Quanto `s meninas envolvidas no caso, os familiares das meninas nunca foram contatados para que seja ouvidos, para que se possa verificar a veracidade do caso. Hoje comunicamos isto à comunidade e criou-se uma grande revolta interna por causa da denúncia. Estamos trabalhando para acalmar os ânimos nas aldeias.

- Quanto à omissão do governo no caso da denúncias das lideranças, não tem fundamento e não é verdade. A única vez que as lideranças yawanawa se reuniram com a equipe do governo, no qual estava presente Fábio Vaz, Carlos Alberto e Edigar de Deus, foi uma reunião solicitada por mim e prontamente atendida por eles. Fomos recebidos com a devida atenção e respeito e tivemos nossas reivindicações atendidas e tratamos de assunto de interesse do povo yawanawa. Em nenhum momento tratamos de denúncia contra o Assessor Indígena.

- Não estamos aqui defendendo o assessor indígena e o governo, apenas estamos esclarecendo os fatos reais, pois temos visto no noticiário rumores que não condizem com o que está acontecendo nas aldeias. Acho precipitação da mídia local emitir opiniões, julgar ou até condenar sem que antes seja apurada a veracidade dos fatos.

- Nestes últimos anos tenho feito duras criticas ao assessor indígena por ele não saber lidar com a política indígena, de ele usar as facilidades, a confiança e o poder que ele tem dentro do governo para desestruturar o movimento indígena. Sempre fui e sempre serei um defensor de uma política de autonomia do movimento indígena, que resguarde os direitos dos povos indígena.

- Mantenho posição pelo afastamento do assessor indígena, porque considero que que Francisco Pianko não tem capacidade nenhuma de articulação e diálogo para possibilitar aproximação do governo com as lideranças indígenas. Vou continuar defendendo a mudança na Assessoria Indígena, vou continuar defendendo uma política que atenda os interesses dos povos indígenas do Acre. Não sou aliado do Francisco, nem tampouco estou defendendo ele de qualquer arbitrariedade que possa ter cometido sem o nosso conhecimento em nossas aldeias. Mas no meu entendimento as nossas diferenças não podem permitir que injustiças sejam cometidas. Por discordar do Francisco, não posso permitir que ele ou quem quer que seja, seja injustiçado.

Agora que a denúncia foi feito, cabe a apuração para que o Ministério Público Federal e a Justiça possam verificar os fatos. Não queremos encobrir nenhuma injustiça que esteja acontecendo na aldeia ou em qualquer lugar. Não compactuo com nenhum tipo de injustiça, no entanto, temos nossos próprios meios de nos defender. Estamos à disposição da Justiça para cooperar no que for necessário para esclarecer essa história triste.

Pedimos respeito ao povo Yawanawa. Paz e harmonia a todos.

Joaquim Tashka Yawanawa é liderança do povo yawanawa e coordendor da Associação Sociocultural Yawanawa. Saiba mais sobre a etnia yawnawa no blog Awena.

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