quarta-feira, 23 de maio de 2007

CÃIBRA, CÂIMBRA

Joffre M. de Rezende

As duas formas coexistem em português. Qual seria a preferível?

Cãibra (ou câimbra), no sentido de contração muscular espasmódica e dolorosa, tem sua origem no germânico kramp, de que resultou krampf, em alemão; cramp, em inglês; crampe, em francês; cambro, em italiano, e calambre, em espanhol.

Em português, a palavra cãibra ter-se-ia formado a partir do francês crampe por metátese, abrandamento da última sílaba e ditongação, na seguinte seqüência: crampe > campra > cambra > caimbra (cãibra).

A forma cambra é encontrada em textos arcaicos e em dicionários do século passado. Sobrevive ainda na linguagem médica popular, na expressão "cambra(s) de sangue", usada como equivalente de disenteria, provavelmente em virtude do tenesmo retal.

Em latim, a contração muscular dolorosa era chamada de spasmus. Segundo Skinner, o texto médico em que aparece pela primeira vez o termo germânico em substituição a spasmus é de autoria de Van Helmont (1577-1644).

Mas voltemos ao português: cãibra ou câimbra?

Consultando-se os principais léxicos da língua portuguesa encontramos as seguintes posições:

1. Registram somente cãibra: Aulete, Moraes (10.ed.), Séguier.
2. Registram somente caimbra (sem acento circunflexo na primeira sílaba): Nascentes, e Silveira Bueno,
3. Registra somente câimbra (com acento circunflexo na primeira sílaba) Luis Rey.
4. Registram ambas as formas Heckler et al. e o Vocabulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras
5. Registra ambas as formas, considerando incorreta a forma câimbra, Laudelino Freire.
6. Registra, na mesma entrada cãibra, cambra e quembra, mas não câimbra, J.P. Machado.
7. Registram câimbra, como variante da palavra, com remissão para cãibra, o que pressupõe preferência para esta última forma: Cândido de Figueiredo; Prado e Silva, Aulete-Garcia, Michaelis, Aurélio Ferreira, Houaiss, 2001.

Pedro Pinto diz textualmente: "Câimbra é grafia errônea" e Calbucci ensina que "a grafia escorreita é cãibra e não câimbra".

Convém, talvez, rememorar que o til em português nada mais é que a letra n colocada sobre a vogal para indicar o som anasalado da mesma.


Durante o período de formação da língua portuguesa empregava-se indiferentemente m, n ou ~ para indicar o som nasal. A confusão persistiu por muito tempo e podemos encontrar em clássicos da literatura portuguesa e brasileira a mesma palavra grafada de duas maneiras.


Na reforma ortográfica de 1943, o emprego do til foi assim definido: "Usa-se o til para indicar a nasalização e vale como acento se outro acento não figura no vocábulo".

O objetivo da reforma ortográfica foi o de tornar mais fonética a escrita e, assim, a forma cãibra atende melhor a esse propósito.

A melhor opção, por conseguinte, é cãibra e não câimbra.

Reproduzido do livro Linguagem Médica, 3a. ed., da AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda. Autor: Joffre M. de Rezende. Leia mais aqui. Portanto, câimbra é tão arcaica quanto chamar os professores de "pessoal da lousa e do giz".

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