segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

TUDO É GRANDE SERTÃO

Por Juarez Nogueira (*)

Olá, Altino
Que a luz do Natal te mantenha inspirado.

Conforme combinamos, segue um arrazoado de minhas expectativas, um "Juarez antes"...

Minha viagem ao Acre coincide com um momento em que acabo de ler "Contos Amazônicos", do Inglês de Souza. Fino, o cara. Livro do vestibular UFMG, tarefa escolar para cumprir com meus alunos.


Não que isso tenha qualquer peso sobre a decisão da viagem: eu já pretendia fazê-la no princípio deste ano mas, por eventos tantos e tais, não me foi possível. Dentre meus objetivos, estão aqueles dos quais já falei com você por telefone. E saiba: sou muito grato, de antemão, por ter respondido sim ao meu chamado.

De plano, nada do espírito de "safári em terras exóticas". Viajo movido por um fundo desejo de conhecer e, nisso, vale aquele élan de Romaria que Elis cantou: "só queria mostrar meu olhar".

Por acréscimo, o que vir/vier, sei, será bem vindo e benfazejo, dentro de minhas expectativas pacificadas, creio eu, pela mesma natureza melancólica vagante nessa região de florestas que, por ora, parece tão distante de mim. Distante, mas dentro de mim porque viva e semovente como a certeza de que existe um ponto/porto em algum lugar para quem está de passagem.

Tenho acompanhado os noticiários da floresta; aqueles da seca na região, então, me tocaram muito. Juro: não pensei que viveria para ver isso. E a julgar pelo que se mostra aqui, sei que não vou encontrar um santuário intocado, e sim uma região que sofre as consequências da urbanização, da extração e do desmatamento acelerado e ilegais, da invasão de reservas indígenas, do avanço da agricultura, que experimenta o descaso governamental como também há aqui, ou seja, onde atuam forças antagônicas - muitas delas conflagradas pela presença humana.

Essa mesma presença que, da mesma forma, pode ser tanto regeneradora a ponto de nos devolver a esperança neste "melhor dos mundos", a exemplo do bravo Chico Mendes ou da destemida Doroty Stang. Ou, ainda, como alguém que responde a uma mensagem de "pede ajuda"...

Sei também que poderei contemplar uma natureza grandiosa, exuberante, solene, talvez nesse mesmo recolhimento que as gentes aqui das Gerais experimenta entre montanhas, com essa saudade ataviada que não tem nome e nem pé nem cabeça...

Afinal, como disse Guimarães, o Rosa, tudo é grande sertão. Define bem, o sertão está em toda parte. E, para além dos aspectos geográficos, turísticos e etcéteras, é isso: estou diante e em meio a contingências humanas universais que, oxalá, me façam "homem humano" integrado à vida por solidariedade aos meus semelhantes e não por consolo da minha inevitável e reconhecida pequenez.

Por ora, eis.

Um verdadeiro abraço.


(*) Juarez Nogueira, que é professor e autor do Manual de Sobrevivência na Redação, reside em Divinópolis (MG). Tornou-se leitor desse modesto blog ao planejar viagem ao Acre para os primeiros dias de janeiro. Pediu-me ajuda para os dias de vivência que terá na floresta. Em troca, pedi que registrasse aqui suas expectativas antes e depois da viagem. Que seja bem vindo à essa terra positivamente estranha, que ainda não sei se é o começo ou o fim do mundo. Ou ambos?

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