quarta-feira, 6 de abril de 2016

Sertanista José Meirelles: “Morrer se preciso for, matar jamais, é bonito na teoria”

O sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, 68 anos, dos quais 46 de trabalho em defesa dos indígenas, revela detalhes do dilema que enfrentou ao matar com um tiro de fuzil um índio em isolamento, na fronteira do Brasil com Peru, para salvar o sogro.

Paulista, Meirelles desistiu da faculdade de engenharia para viver cercado por índios sem contato nas florestas do Acre.

O slogan “morrer se preciso for, matar jamais”, do general Cândido Mariano Rondon, segundo Meirelles, “é bonito na teoria”.



- Não tenho essa filosofia de monge budista, de sentar na praia e dizer: matem-me. Nessas horas você não pensa. O racional vai pro espaço.

Embora declare que lida tranquilamente com o episódio, Meirelles não esquece o indígena:

- Você sabe aquele momento que você não está dormindo nem acordado? De vez em quando eu vejo o rosto desse cara. Se eu soubesse pintar… Está aqui, na minha cabeça, a cara de espanto dele, quando largou o arco e flecha e caiu morto. Isso me persegue até hoje.

Em 2004, nas cabeceiras do Rio Envira, o sertanista foi alvo de uma flechada de uma etnia que vivia em isolamento, considerada atualmente de recente contato:

Meirelles, que também relata o episódio na entrevista, relembrou do fato nesta quarta-feira (6) em sua página no Facebook:

- Era um domingo. Funai fechada. Pouca gente sabe que duas pessoas me salvaram a vida. A notícia chegou aos ouvidos do senador Tião Viana e de Jorge que era governador. Na mesma manhã. Eles conseguiram a façanha de deslocar um helicóptero do exército de Porto Velho, que pousou em Rio Branco. Tião que é médico embarcou um médico e uma enfermeira e tudo que podia ser usado em primeiro socorro. O helicóptero chegou à tarde na base de frente Envira. Fui medicado e no dia seguinte o helicóptero me deixou em Tarauacá onde um avião tipo UTI aérea me esperava. Fui transladado para Rio Branco e internado. Escapei da morte por um fio. Fica difícil até agradecer o que fizeram por mim. Mas é bom que as pessoas saibam disso. Atitudes como esta mostram quem são estes dois personagens a quem devo somente a vida.

A conversa vai muito além desses dois episódios e tem valor de um documento para quem se interessa pelo processo de ocupação da Amazônia.

Nenhum comentário: