sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

E ASSIM SE FEZ JUSTIÇA


Erguida há 100 anos num morro de terra firme, em Cruzeiro do Sul, na margem esquerda, de onde se avista a beleza do gigante Rio Juruá, esta é a mais antiga edificação em pé no Acre.

O prédio foi construído em 1912 para ser a sede da Prefeitura do Departamento do Alto Juruá. Sediou o Tribunal de Apelação do Alto Juruá e, posteriormente, se transformou no Fórum Rego Barros, sede da comarca da cidade até 1979.

Em 2003, foi transformado no primeiro Museu da Justiça Acreana. Naquele ano, após ampla reforma, passou a abrigar o Centro Cultural do Juruá, como é conhecido atualmente.

Trata-se do último sonho realizado pelo desembargador Arquilau de Castro Melo, que está oficialmente aposentado a partir desta sexta-feira.

O projeto de revitalização das instalações e do entorno do Centro Cultural do Juruá é uma ação conjunta do Tribunal de Justiça, governo do Acre e prefeitura de Cruzeiro do Sul, que foi responsável na semana passada pela demolição de um prédio erguido onde, na foto, se vê agora o chão coberto de areia.

- Geralmente as pessoas vêm até o Judiciário porque são intimadas. Mas aqui elas serão convidadas, não precisam se sentir coagidas ou ameaçadas. O Centro se confunde com a dinâmica do município e guarda a memória cultural e a história de vida de nossa gente - disse Arquilau Melo, que, aposentado, continuará como curador do acervo histórico do Poder Judiciário.


Questão trabalhista

O prédio, digamos, faz parte de minha infância, pois algumas vezes meu pai me levou até lá para contemplar a paisagem exuberante do Juruá.


Por causa de uma audiência nele, no começo da década de 60 do século passado, o então juiz Jorge Araken, atualmente aposentado como desembargador, até hoje conta para os amigos que meu pai foi um dos homens mais inteligentes que conheceu.

Meu pai era um modesto enfermeiro das antigas, do quadro de servidores do governo do Acre. Naquele tempo, o salário costumava atrasar até mais de seis meses. Por causa dos atrasos, uma empregada doméstica ficou sem receber e o denunciou à Justiça.

Intimado, meu pai, além da empregada, estiveram numa audiência em que o juiz Jorge Araken, de reconhecida fluência verbal e jurídica, o pressionava a pagar o salário dela com urgência.

- É fácil fazer isso, senhor Eriberto Machado. O senhor pode pedir dinheiro emprestado a qualquer pessoa para honrar os meses de salário em atraso. Quando o governo pagar os seus proventos, o senhor devolve o dinheiro a quem pediu emprestado. Viu como é fácil?

Meu pai pediu a palavra e o meritíssimo concedeu:

- Doutor Jorge Araken, tudo bem. Sendo assim, o senhor me empresta o dinheiro e eu faço o pagamento na sua presença.

O juiz reagiu:

- Está vendo, senhora? Viu como ele tem boas intenções? Viu como ele quer pagar? Ele é um homem bom, honesto. Fica combinado assim: quando o governo pagar ao senhor Eriberto, a senhora receberá dele todos os meses de salário em atraso.

E assim se fez Justiça.

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