Autores de blogs mais chegados a posts ácidos nem desconfiam que podem ser processados por empresas ou pessoas que se sentem prejudicadas. Advogados ensinam a contornar problemas deste tipo.
É no blog onde muita gente expõe o que pensa sobre a vida, as pessoas e o mundo. No entanto, poucos percebem que a popularização excessiva também pode trazer surpresas desagradáveis. Ao achar que estão livres para escrever o que pensam de forma indiscriminada, blogueiros podem correr riscos judiciais sem necessidade.
Uma empresa ou uma pessoa, ao se sentir ofendida por algo escrito no blog, pode processar o autor. As conseqüências podem ser mais sérias, com pagamento de multas pesadas e, em situações mais raras, até prisão. No Brasil, há vários casos de blogueiros que se sentiram coagidos a apagar comentários ou tirar o blog do ar.
Cientes das dúvidas sobre o assunto, Túlio Vianna e Cynthia Semíramis, advogados especializados em tecnologia e informática, resolveram criar uma espécie de manual de sobrevivência para ajudar donos de blogs e sites. Ele é professor de Direito Penal da PUC Minas e doutorando em Direito pela UFPR. Ela é mestre em Direito pela PUC-MG. Ambos são blogueiros e acompanham de perto a situação dos blogs que tiveram problemas com a Justiça brasileira. Confira a entrevista:
Um blog pode mesmo ser retirado do ar por causa de uma ofensa? E se o autor não se identificar e escrever de forma anônima?
Túlio Vianna – Um blog hospedado no Brasil, mesmo de forma anônima, pode ser facilmente retirado da internet por meio de ordem judicial. É uma ilusão achar que escrever um blog anônimo seja seguro, pois a Justiça pode determinar a quebra do sigilo contratual com a empresa que hospeda o site. O autor pode ser processado por danos morais ou até mesmo na esfera criminal. Por outro lado, um blog anônimo hospedado em servidor estrangeiro dificilmente será alvo de um processo, porque o procedimento vai exigir intermédio do serviço diplomático para retirar uma página em outro país. É bem mais complicado.
Então pela lei as pessoas não podem escrever no blog sem se identificar? Não seria uma forma de censura? E se o autor não usar o nome verdadeiro, com medo de represálias? Um pseudônimo, talvez?
Cynthia Semíramis – A Constituição Federal garante a livre manifestação do pensamento, mas veda expressamente o anonimato (art.5º, IV) que, em princípio, pode ser interpretado como má-fé do autor. Mas é bom não confundir anonimato com pseudônimo (nome artístico, por exemplo). O pseudônimo para atividades legais é protegido por lei (art.19 do Código Civil).
Uma dos aspectos mais interessantes nos blogs é o sistema de comentários. As pessoas deixam opiniões e sugestões, passam dicas e pedem ajuda. Se alguém escrever uma calúnia ou algo ilegal, o autor do blog pode ser processado ou a responsabilidade é apenas de quem escreveu o comentário?
Em que situações o dono do blog pode ser processado por algo escrito? Ele pode ir preso?
CS – Um comentário ofensivo pode gerar dois tipos de responsabilidade jurídica: a criminal e a civil. A criminal, em regra, resulta na prisão do culpado. No entanto, em crimes leves – como nos casos de crimes contra a honra, que são os mais comuns em blogs, a prisão pode ser substituída por prestação de serviços à comunidade e/ou multa. Já a condenação civil é sempre patrimonial e consiste no pagamento de uma indenização à vítima pelos danos sofridos.
Existem blogs onde podemos ler críticas de novelas, músicas e filmes. Alguns são excelentes e até referência para a grande imprensa. Em casos assim, o artista que se sente prejudicado por uma crítica também pode processar o autor do blog?
E em relação às empresas? Há pessoas que compram um produto, não gostam e depois usam o blog para criticar de forma ofensiva. Como funciona a lei em casos assim?
CS – Evite criticar uma empresa sem ter algo contra ela. A reclamação pode ser feita, sim. Mas quem reclama deve fazê-lo com base em fatos, não em suposições ou porque ouviu alguém reclamar. A crítica aos serviços de empresas pode ser considerada judicialmente como de utilidade pública, mas deve ser dirigida ao serviço prestado, não ao dono ou à empresa como um todo – a menos que quem critique possa provar isso perante um tribunal. Não há, em princípio, a obrigação de retratação ou de retirada de comentários, a menos que os termos usados tenham sido realmente desrespeitosos e ofensivos.
Fontes:
Folha de Pernambuco
Cynthia Semíramis
Túlio Viana
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