sábado, 24 de novembro de 2007

CARTA ASHANINKA

Associação Ashaninka do Rio Amônia (Apiwtxa), no Brasil, e Asociación de Comunidades Nativas de Ashanínkas-Ashenínkas de Masisea y Callería (Aconamac), no Peru, denunciam mais uma vez a exploração madeireira na fronteira dos dois países e pedem a intervenção da Organização Internacional do Trabalho

"Ao Senhores Representantes de Instituições
Governamentais,
Não Governamentais e
Organizações Indígenas do Brasil e do Peru


Nós, Asheninka da Terra Indígena Kampa do Rio Amônia (Comunidade Apiwtxa) e da Asociación de Comunidades Nativas de Ashanínkas-Ashenínkas de Masisea y Callería (ACONAMAC), vimos, por meio desta, informar e manifestar a nossa mais completa oposição à exploração madeireira que afeta diretamente todos os povos da fronteira Brasil-Peru, sobretudo as nossas comunidades que se localizam na região da linha de fronteira Brasil-Peru.

1- No lado brasileiro da fronteira, nós estamos, desde 1999, junto à Justiça e a vários órgãos do governo brasileiro tentando impedir que nossa fronteira seja invadida brutalmente por empresas madeireiras autorizadas pelo Governo peruano para exploração comercial em área de concessões florestal e em terras indígenas peruanas. Nós temos uma política que é proteger a nossa biodiversidade para garantir a nossa tradição, utilizar os recursos naturais sem causar desequilíbrio ambiental, que deve ficar por conta do processo natural do Planeta. A nossa vida sempre foi assim, mas não sabemos mais até quando vamos suportar.

2 - No lado peruano, ainda hoje temos os mesmos problemas que aconteceram no Brasil há vários anos atrás, os povos indígenas submetido a regras dos madeireiros, sofrendo violências e sendo alvo de enganação. Hoje, muitas comunidades vêem suas lideranças tradicionais trocadas por novos representantes, que são preparados por empresas somente para usar seu povo como mão de obra barata e fácil de enganar, para tirar proveito. Como exemplo, temos duas terras indígenas no lado peruano, Sawawo e Nova Shawaya, próximas ao marco 40, que firmaram convênio com a empresa Forestal Venao [saiba mais aqui] para explorar em suas terras vários tipos de madeiras nobres e ganhar uma porcentagem. Legalmente, as comunidades estão contratando os serviços da empresa e assumindo as conseqüências negativas que acontecem no âmbito local, e nunca aparece a realidade em que eles vivem, ganham uma pequena parcela do lucro, ficando este para os representantes comunitários que gerenciam de acordo com suas políticas. Na realidade, estão vitimando pessoas e povos com a violação de seus direitos. A Forestal Venao não é a única empresa, existem outras, como RuBem, Cabrera e outras, em que o trabalho é muito mais complicado e mantem um povo tradicional em um sistema de escravidão. Queremos uma intervenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

3 - Também temos visto e presenciado vários problemas de alcoolismo. O alcoolismo vem causando a desestruturação sociocultural do nosso povo, e gera pessoas que passam a ser destruidoras de suas próprias tradições e dos recursos naturais. O pouco dinheiro que ganham serve apenas para se prejudicar cada vez mais e ser mais dependente da exploração. Esse é um ciclo vicioso fomentado e imposto pelas empresas.

4 - No lado peruano, vários povos, assim como os Asheninka, há décadas vêm sendo usados para as frentes de exploração dos recursos naturais, muitas das vezes deixando suas terras de origem e acompanhando as empresas, eliminando vários conhecimentos do povo com relação à natureza e a nossa forma própria de utilizar os recursos naturais. Nessa luta, muitos povos também estão sendo eliminados. É o caso dos índios "isolados", as populações de índios em isolamento voluntário, que estão sendo mortas, sem que ninguém peça por eles. Nós presenciamos um fato de conflito entre nosso povo no Alto Juruá, no ano de 2003, onde tivemos depoimentos de Asheninka comentando que o conflito foi causado pelas empresas madeireiras, que expulsou os isolados de suas terras, matando vários deles.

5 - Também temos informações que grupos de exército Asheninka foram criados na época do Sendero para proteger o povo e hoje também são usados pelas empresas madeireiras, através das comunidades conveniadas, para vigiar seus trabalhos.

6 - O trabalho da empresa Forestal Venao, com duas comunidades aqui vizinhas à nossa, ganhou a certificação do padrão FSC. Nos perguntamos hoje se essa certificação foi dada para certificar o extermínio de várias espécies, florestais e animais. Também nos perguntamos se o plano de manejo certificado foi para invadir áreas da linha de fronteira e prejudicar diretamente o país vizinho e seus recursos, se foi para desrespeitar a faixa de 2 km (dois quilômetros) do trato de respeito à fronteira. Precisamos ver isso com mais atenção e mais detalhe, pois nessa região vivem seres humanos que precisam ser respeitados nos seus direitos. Também as Nações Unidas precisam ter conhecimento desse fato, e fazer valer o direito de cada povo ter direito à sobrevivência, não só o direito do homem sobreviver, mas o direito à proteção dos recursos naturais de que depende para viver, os rios, a flora e a fauna, que podem garantir, por fim, a vida do Planeta por mais tempo.

7 - No plano de exploração da Forestal Venao tudo parece perfeito, mas, na prática, a sua forma de exploração só tem gerado o extermínio de milhares de espécies e a poluição das águas, algumas das quais correm para o território brasileiro. Mais recentemente, começaram a chegar as concessões minerais e petrolíferas, que para nós serão uns dos maiores problemas e que precisam ser discutidos. E não aceitamos que as empresas tenham tratamento de vítimas, como é comum nos debates, onde colocam as mesmas como importantes e produtivas para o desenvolvimento da economia e os povos indígenas como improdutivos e atrasados.

8 - Solicitamos a pronta manifestação das instituições endereçadas, e as convocamos para uma reunião na fronteira o mais rápido possível.

Leia mais no blog Apiwtxa, dos ashaninka.

Um comentário:

. disse...

É so a turma dos madereiros darem uma gratificação para a turma dos desocupados preocupados com natureza... que tudo se resolve e ninguem fala mais nada... indio ja quis apito.. indio agora quer dolar