quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Girem a roda no final da novela do fuso horário do Acre

POR PEDRO GUSTAVO FARIA NUNES

Há algum tempo prometi para mim mesmo que não voltaria a me manifestar sobre o tema, mas como não sou um exímio pagador de promessas me permito sepultar, pela última vez, este monstro que, deveras, nasceu morto. O fuso horário do Acre  tornou-se o ápice da manifestação popular de mesa de bar e o mais exaustivo dos labores dos parlamentares acreanos. São inconformismos antagônicos providos de feroz reciprocidade.

O fuso do Acre segue acumulando incontáveis adjetivos. Dois deles têm me chamado a atenção nos recorrentes debates, especialmente nas redes sociais: o fuso horário dito de Deus sob o pseudônimo de "fuso horário do atraso" versus o "fuso horário do progresso".

Admira-me a capacidade das pessoas de criarem situações que não deveriam sequer existir. A exaustiva busca pela reinvenção da roda. Quando digo que o monstro nasceu morto, digo por que não existe monstro senão o próprio que criamos.

O fuso horário do Acre está posto desde 1914, quando o Brasil aderiu a padronização mundial da hora legal por meridianos, que utiliza o posicionamento de cada porção de terra (em graus) em relação à Greenwich (o que já foi exaustivamente discutido). E isto é ciência, não é política.

A política não pode, ou pelo menos não deveria, sobrepor à ciência. Seria como se um parlamentar apresentasse um projeto de lei que buscasse desaguar o Rio Acre no Rio Madeira buscando estreitar os laços entre as capitais Rio Branco e Porto Velho. Obviamente, não dá para mudar o curso das águas. E mesmo que fosse possível, tal como tem sido com o fuso horário do Acre, o curso natural das águas do Rio Acre continuaria sendo em direção ao Purus.

Impressiona-me o alarde das pessoas que temem a volta do "fuso  horário do atraso”. Os EUA utilizam seis fusos, sendo quatro deles na porção continental. Quatro horas é a diferença entre Los Angeles e a capital federal Washington D.C. e, até onde sei, isto nunca foi um entrave ao desenvolvimento do Estado da Califórnia que, por sinal, é um dos mais ricos do país.

Estamos há mais de cinco anos consumindo “esforços” de parlamentares que poderiam estar ocupando seus gabinetes com outras demandas de emergencial importância, tais como, a reforma do Código Penal Brasileiro ou a reforma tributária, mas desperdiçam o tempo tentando reinventar a roda para chegarem à conclusão que não existe quadrado redondo.

Antes de ser votado o projeto de lei que alterou o fuso horário do Acre, bem como aquele que agora coerentemente o restabelece, passaram pela apreciação de comissões no legislativo tais como Comissão de Relações Exteriores da Câmara e Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, votações nas duas casas, sanção do então presidente Lula na ida e veto da presidente Dilma na quase volta.

Custou ainda alguns segundos de vida de cada eleitor acreano que simbolicamente votou num referendo meio faz-de-conta. Finalmente surrupiará alguns instantes da pestana da presidente Dilma, para onde segue para sanção ou veto, que decidirá em última instância, tal qual um César no coliseu da floresta, se devolve o fuso do Acre aos acreanos ou se o atira de vez ao extermínio pelos leões.

E quando esta novela acabar e definitivamente estivermos com nossos ponteiros acertados, então pergunto a você: quantas horas serão necessárias para, efetivamente, colocarmos a roda para girar?

Pedro Gustavo Faria Nunes é médico veterinário

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