quarta-feira, 22 de abril de 2009

PAULO VANZOLINI



Da esquerda para a direita: Celso Morato de Carvalho, Altino Machado e Paulo Vanzolini

A foto já tem mais de 12 anos. Foi tirada em Boa Vista, quando eu fazia uma série de reportagens para a Folha de S. Paulo que despertou a atenção mundial para um megaincêndio em Roraima, em 1998.

Passei um mês na cidade, sendo uma semana de intenso convívio com o zoólogo e teórico da biodiversidade Paulo Vanzolini, que fora convocado para ajudar o governo federal a compreender o impacto ambiental decorrente daquela tragédia. Ele conhece a Amazônia, especialmente Roraima, como poucos.

- Sampa é um plágio de Ronda. Caetano Veloso sabe disso - repetia Vanzoline sempre que o assunto mudava de Amazônia para música.

A edição de hoje da Folha de S. Paulo noticia que Paulo Vanzolini ganha homenagem com filmes, shows e debates em comemoração aos seus 85 anos. Autor de clássicos do samba, Vanzolini não toca nenhum instrumento musical. Sempre se valeu simplesmente de caixas de fósforo.

Leia a entrevista ao repórter Ivan Finotti:

"Compositor, cantor, sambista, músico, poeta. Nada disso descreve o paulistano Paulo Vanzolini como ele gostaria.

Zoólogo? Aí, sim. Cientista? Certo. Teórico da biodiversidade? Agora estamos chegando lá.

"O que você tem que entender, meu amigo, é que sou zoólogo", diz ele no documentário "Um Homem de Moral", de Ricardo Dias, que tem pré-estreia hoje no Espaço Unibanco, com promoção da Folha.

"Nunca fiz música profissionalmente. Nunca quis perder tempo nisso, porque nunca considerei minha profissão", diz Vanzolini, formado em medicina pela USP e com doutorado em biologia em Harvard.

São essas as credenciais que lhe interessam, não o fato de ter composto clássicos do samba paulistano como "Ronda" ("De noite, eu rondo a cidade, a lhe procurar, sem encontrar) e "Praça Clóvis" ou de ter inventado a expressão que dá título a

"Volta por Cima" ("Levanta, sacode a poeira, dá a volta por cima"). Vanzolini trabalhou por mais de 50 anos no Museu de Zoologia da USP e foi diretor da instituição entre 1962 e 1993, quando se aposentou.

Mas, como não o deixam em paz com seus répteis, o teórico da biodiversidade, que faz 85 no sábado, vai enfrentar uma bateria de homenagens nesta semana.

"Não gosto de homenagens", reclama. "Mas de show eu gosto", concede. "Pego uma cerveja e sento na mesinha da frente. Adoro", contou à Folha na entrevista a seguir.

O senhor fazia a ronda em São Paulo quando compôs "Ronda". O senhor era cabo da polícia...

Polícia, não. Da polícia foi o Nelson Cavaquinho. Eu era da cavalaria, que era a polícia do Exército. Mas a patrulha era a pé. A gente patrulhava a pé o baixo meretrício, o Bom Retiro, o centro, a região da São João.

E se inspirou assim?

Cansei de ver mulher chegar na frente do bar, olhar para dentro como se procurasse alguém e ir embora. Não foi uma só que vi. Escrevi sobre isso.

E quanto a "Volta por Cima"? Qual é a história por trás da composição?

Não tem. Fiz porque fiz. Tem até uma história de que fiz porque perdi um filho num acidente. Mas, na verdade, fiz a música antes.

O senhor ainda compõe?

Larguei. Fazia música por prazer. Perdi o gosto. Eu estava em Mato Grosso, na década de 80, e fiz a última, "Quando Eu For, Eu Vou Sem Pena". É muita mão de obra. Ficava seis meses para resolver uma rima...

E o que o senhor está fazendo atualmente?

Difícil explicar. Fiz recentemente um trabalho sobre cascavéis e alguma coisa em cima de relatórios de impactos ambientais.

O senhor ganhou dinheiro com música?

Dinheiro, só ganhei com "Volta por Cima". Foi a única. Não sei por quê, deu uma enxurrada de dinheiro. Foi em 1959, 1960. Comprava livro sem ver o preço. Sempre coloquei tudo o que ganhei na biblioteca que tinha na minha sala do museu. Agora doei tudo para o museu.

Por que quis ser zoólogo?

Pelos répteis. Fui ao Butantan menino e gostei muito dos répteis.

Quais répteis?

Répteis só existem quatro: tartaruga, jacaré, lagarto e cobra.

Nunca trabalhou com sapos e rãs?

Sapo, não, graças a Deus.

Seu maior orgulho é musical ou científico?

Não tenho orgulho. Tenho satisfação. Trabalhei em todos os Estados do Brasil. Tive um barco no Amazonas.

Qual é a maior satisfação?

É a teoria dos refúgios. Sobre ciclos de vegetação no Amazonas. O clima fica mais seco, depois mais úmido, e acaba criando "ilhas" de vegetação sem contato umas com as outras. O lagarto fica ali e vai se diferenciando. Quando o clima permite que as ilhas se juntem de novo, os lagartos já não conseguem procriar. Já são espécies diferentes.

Que lagarto foi esse que o senhor estudou?

O lagarto anolis. Mas fui o segundo. Um alemão, estudando pássaros, publicou três meses antes os mesmos resultados. Estava escrevendo o meu artigo quando chegou a revista "Science" com o dele.

Que tragédia!

Mas o meu é original. Não usei o dele. Tenho enorme satisfação por esse trabalho. Fiz em conjunto com Ernest Williams, cientista americano. E continuei trabalhando até 2004, quando saí do museu.

Tive quatro úlceras hemorrágicas e três infartos na mesma noite. Ouvi os enfermeiros falando: "O velhinho não passa dessa noite". Fiquei com 30% da capacidade do coração.

E o que senhor acha dessas homenagens nesta semana?

Não gosto de homenagem. Mas gosto de show. Pego minha cervejinha e sento na mesa ali na frente. Adoro.

Cerveja com ou sem álcool?

Com. Isso os médicos ainda não tiraram.

Um comentário:

Evandro Ferreira disse...

Altino,

A pessoa à esquerda na foto é o pesquisador do INPA Celso Morato de Carvalho. Segundo info do Lattes:

"É Pesquisador Titular do INPA, vice-chefe da Coordenação de Pesquisas em Biologia Aquática; foi Chefe do Núcleo de Pesquisas do INPA em Roraima (1985-1995) e Pesquisador da Universidade Federal de Sergipe (1995-2005), onde participa dos programas de pós-graduação Prodema e Ecologia".