sexta-feira, 3 de agosto de 2007

MENOS BERRO NA EXPOACRE

O evento continua com seus rodeios, com os bancos dando mais dinheiro para quem já o tem em demasia (vi um montão de carros e motos de luxo em pedestais e algumas caras arrogantes do poder), mas percebi uma guinada boa na direção da florestania


Elson Martins


A primeira impressão que a feira me causou, numa breve visita domingo à noite, foi muito ruim. Tinha gente demais, uma multidão de pessoas trajando calças jeans apertadas, botas e chapelão sob uma barulhada infernal inspirada no estilo country. Ou pior: cópia vagabunda de um modismo que agride a estética da floresta. Saí de lá correndo e desabafei com alguém: “O Acre capitulou de vez”!

Pela manhã havia lido no blog do Altino, o estrago da bosta que os cavalos da cavalgada de sábado tinham deixado sobre o asfalto da Via Verde. E me senti tentado a acrescentar algum protesto ao comentário do jornalista, que logo sugeriu: “Escreve um texto para o blog”.

Ainda bem que não me faltou na ocasião a ética jornalística! Ela alertou-me de que eu poderia estar fazendo avaliação precipitada e equivocada, sobre a Feira Agropecuária do Acre inaugurada dia 28. De pronto respondi ao Altino: “Prefiro voltar lá com mais calma, depois escrevo minha opinião”. Ele compreendeu e falou: “Beleza”!

Quinta-feira à noite estive de volta à exposição. E, surpreendentemente, vi coisas que me agradaram. Comparada com a do ano passado, a Expoacre parece bem mais “sustentável” e menos “bovinizada”. Dei uma circulada pelos estandes, observei vários serviços públicos funcionando com segurança e organização.

Merece elogio o tratamento dado agora aos artesãos. Eles ocupam imenso espaço central, bem iluminado e distribuído. No ano passado, permaneceram confinados numa ruela escura da exposição, fora do circuito que atraia os visitantes.

Também chama atenção o estande da Integração, que abriu vaga para “nuestros hermanos” peruanos e bolivianos. Estes fizeram sucesso vendendo tudo o que trouxeram, nos dois primeiros dias da feira. Na quinta, consegui comprar duas latinhas de “trucha ecológica” produzida pelo Bio Trucha Andina Peru. O vendedor me disse que se trata de um peixe saboroso da região do lago Titicaca. A receita recomendada é comê-lo com macarrão, como às vezes fazemos com nossa sardinha em lata.

Animado com a novidade (ou seja: a integração andina), paguei 10 reais para um caricaturista peruano desenhar o rosto de minha filha Yasmim. Ela pousou durante 20 minutos, atraindo curiosos, e saiu satisfeita com sua figura feita a lápis crayon em cartolina.

Depois fui à Polleria Aló Peru comer um frango (polle) com legumes. De lá fiquei “bispando” as pessoas que iam e vinham passeando na feira, e me alegrei de ter agido como jornalista checando melhor a tal primeira impressão. Posso afirmar com segurança, agora, que os acreanos ainda são maioria, apesar da zueira dos cawboys.

Ouvi até uma dupla sertaneja que cantou sem botas e sem chapéu, bastante desafinada na melodia, mas que passou um recado politicamente correto sobre a vida, paixão e morte nos seringais. Ouvi também foguetório, como se alguém tivesse anunciando o nascimento de mais gente na floresta e gravei gestos de quem ainda não se acostumou com multidão.

Enfim, refleti, a Expoacre continua com seus rodeios, com os bancos dando mais dinheiro para quem já o tem em demasia (vi um montão de carros e motos de luxo em pedestais e algumas caras arrogantes do poder), mas percebi uma guinada boa na direção da florestania. Esta palavra –faço questão de dizer- não perdeu seu charme, sua força e significância, a não ser para quem apenas finge ser povo da floresta pensando, quem sabe, que é fácil nos enganar.

Elson Martins é jornalista acreano. Pena que a tal "guinada" mencionada pelo articulista tenha demorado nove anos de Governo da Floresta para começar a acontecer. Daqui a pouco outro boi vem e lambe-a. Em tempo: Alceu Ranzi avisa que, devido a problemas com o vôo em Manaus, o encontro com o escritor Charles Mann está transferido para amanhã, no mesmo local e horário - 18 horas, Pavilhão Integração da Expoacre.

Um comentário:

Saudades do Acre disse...

Por falar em feiras, lembrei-me de algo que achei conveniente comentar, aproveitando o gancho do texto do Élson Martins.
A FENNEARTE, realizada no Centro de Convenções de Pernambuco, bateu o próprio recorde, atraindo mais de 30 mil visitantes. A feira, que congregou artesãos de vários estados brasileiros, incluiu estandes também de outros países.
Ansioso por visitar o estande do Acre fui até lá, quando tive duas surpresas desagradáveis. A primeira, logo na chegada, quando fui ao balcão de informações solicitar a uma recepcionista que me indicasse a localização do estande acreano.
-Acre? Ah, sei. O senhor segue este tapete vermelho aqui à esquerda e depois segue o tapete amarelo, que o levará até uma praça chamada “outros países”. O estande do Acre é lá. Agradeci, engolindo em seco algumas palavras mal educadas pra não constrange-la diante de outros visitantes e segui procurando o estande. Fui encontrá-lo no lado oposto do pavilhão, seguindo o tapete verde. A segunda e não menos desagradável surpresa foi a falta de criatividade na apresentação do estande. Uma ínfima placa com o nome do Acre e um banner meio que escondido do Chico Mendes. Nada mais. Nenhum pôster que associasse o artesanato ali exposto, à imagem da cultura indígena ou seringueira. De um indígena paramentado, por exemplo. Ou um seringueiro, uma curva ou estirão de rio, uma anta, uma arara, uma onça, uma castanheira. Enfim, nenhuma expressão visual da Florestania. Ao menos a bandeira, símbolo maior do Acre, minha gente. Entendo que o governo seja discreto, até porque governo deve mesmo é trabalhar e ser discreto, mas o estado como um todo, não. Tem que mostrar sua imagem. Preferencialmente a florestana, pois imagem de gado e cana, o País já tem demais.