domingo, 22 de abril de 2007

REVIRAVOLTA NO ENSINO

Polêmico, projeto Universidade Nova prevê o fim do vestibular tradicional e um diploma de nível superior em três anos. Em 2008, UnB deve adotar a proposta, que conta com o apoio do Ministério da Educação

Aline Falcão

Ter um diploma de nível superior sem, necessariamente, ter uma profissão específica. Entrar na universidade sem precisar passar pelo estresse do vestibular. Poder aprender de tudo um pouco, antes de decidir o que fazer. A Universidade Nova, proposta de uma estrutura acadêmica mais flexível e de um novo sistema de títulos para as instituições federais de ensino superior, oferece um novo parâmetro para o ensino superior no país. Sete universidades brasileiras já estão discutindo essas mudanças, que podem começar a valer em 2008.

A proposta conta coma simpatia do Ministério da Educação (MEC) que deve editar, ainda este mês, uma portaria criando uma linha de apoio financeiro às universidades que apresentem projetos de mudanças na estrutura acadêmica. A Universidade Nova deve ser uma das contempladas pela nova norma.

A única obrigação exigida pelo governo federal será a de aumentar, no prazo de 10 anos, em 90% o número de alunos, e garantir a permanência de 90% estudantes até o final do curso. Para o MEC, as mudanças acadêmicas podem aumentar o número de vagas no ensino superior.

A Universidade de Brasília (UnB) é uma das instituições que deve adotar o novo modelo a partir do próximo ano. A estrutura nova não deve extinguir o modelo existente. “Essa é uma mudança estrutural, que demanda recursos e não será feita de uma hora para outra”, explica Timothy Mulholand, reitor da UnB.


A discussão sobre a transformação da arquitetura acadêmica da universidade não é nova. Já na década de 30, o educador Anísio Teixeira pregava um modelo mais flexível de ensino superior. Em agosto do ano passado, a idéia voltou a ganhar força, incentivada pelo reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Naomar de Almeida Filho. “A inflexibilidade da estrutura acadêmica atual já não atende mais os requisitos de um mundo globalizado. É preciso formar pensadores”, diz.


Já foram realizados dois seminários nacionais e diversos encontros regionais para discutir a proposta. “A questão acadêmica, que é central, sempre ficou marginalizada em tentativas anteriores de reforma. Agora, é a oportunidade de debatermos o assunto”, diz Timothy Mulholland.

Ainda não se chegou a um consenso de modelo unificado para que todas as universidades atuem da mesma maneira. E talvez não se chegue. A idéia é que cada instituição se organize de acordo com suas características. Mas a proposta tem uma base comum. Em vez de entrar diretamente em um curso de engenharia ou arquitetura, por exemplo, o jovem vai ingressar em uma formação geral, que está sendo chamada de Bacharelado Interdisciplinar, que será feito em grandes áreas, como Saúde, Artes, Ciências. Após um período médio de três anos no bacharelado, o universitário receberá um diploma de nível superior. Com esse título, a pessoa já pode seguir para concursos públicos ou para o mercado de trabalho.

Em seguida, o estudante que quisesse continuar os estudos ingressaria na segunda etapa do projeto, com disciplinas voltadas para profissões específicas. A duração dessa fase dependerá do curso escolhido. Medicina e direito, por exemplo, devem durar mais do que uma formação em letras.

Pós-graduação
O terceiro ciclo é o da pós-graduação, que se dividiria em acadêmica ou profissional. Os estudantes que quiserem seguir uma carreira acadêmica poderiam, por exemplo, sair do bacharelado diretamente para o mestrado, sem precisar necessariamente passar pelo profissionalizante.

Para Timothy, a Universidade Nova permite escolhas mais maduras, porque o jovem pode transitar por várias áreas do conhecimento, antes de decidir o curso. “O modelo de universidade atual é cruel com os jovens, obriga a fazer escolhas muito cedo”. A estudante do terceiro ano do ensino médio Thaís Malheiros, de 17 anos, conhece a realidade de perto. Vai fazer vestibular no fim do ano e tem que escolher uma profissão. “Vou fazer a prova para arquitetura, mas não tenho certeza se é isso que eu quero”, confessa. “Para mim, seria ideal cursar três anos de um bacharelado em artes antes de decidir o que fazer”.

O processo seletivo também está sendo repensado. O vestibular, como existe hoje, tende a acabar. Além da seleção para o ingresso na universidade, o estudante que quiser continuar os estudos depois de ter obtido o diploma de bacharel terá que passar por outro processo de seleção.

Modelo antigo será mantido

A proposta não impõe a Universidade Nova como único modelo a ser seguido. “Um bom profissional hoje passa por uma formação mais ampla. Ele aprende a enfrentar situações inovadoras, a ter uma nova visão de país. Portanto, a mobilidade acadêmica deve ser um elemento comum entre todas as arquiteturas”, avalia Ronaldo Mota, Secretário de Educação Superior do Ministério da Educação (MEC).

Para receber os repasses de recursos do mi-nistério, as universidades terão ainda que aumentar as políticas de inclusão social e articular o ensino superior com os outros níveis de educação. O projeto de reestruturação, antes de ser apresentado ao MEC, tem que ser aprovado pelo conselho de cada universidade.

Debates
A Universidade de Brasília e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) já estão debatendo seus projetos com os respectivos conselhos. A intenção é que, já em 2008. as mudanças comecem a ser implementadas nas duas instituições.

De acordo com Naomar de Almeida, reitor do (UFBA), o principal objetivo da Universidade Nova é superar os limites e os problemas da atual universidade no Brasil. Um deles é o da inflexibilidade dos currículos.

“A universidade não está atendendo à demanda da sociedade, não oferece formação abrangente. Estamos no século do conhecimento”, argumenta. Outro, é o da evasão. Segundo o MEC, em 2005, o percentual das pessoas que abandonam cursos nas universidades federais foi de 40%.

Aline Falcão é da equipe do Correio Braziliense. Para ler defesa do projeto, clique em Universidade da Bahia. Mas há quem diga que a Universidade Nova seja mais um capítulo da reforma universitária em curso cuja principal qualidade é maquiar as estatísticas do ensino superior no Brasil sem resolver seus principais problemas de forma permanente: mais financiamento público, autonomia universitária e maior acesso e condições de permanência dos alunos nas universidades. O problema do projeto é que ele induz a privatização das universidades públicas. Leia aqui.

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