terça-feira, 4 de julho de 2006

VILMAR BERNA AMEAÇADO

Assim como o seringueiro Chico Mendes, assassinado em 1988 no Acre, e o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho (1935-97), o ambientalista Vilmar Berna é um dos brasileiros agraciados pela ONU com o Prêmio Global 500. Ele tem sofrido ameaças de morte. Leia a carta que o editor do Jornal, da Revista e do Portal do Meio Ambiente enviou ao Governo Federal.


Niterói, 03 de julho de 2006

Ao Exmo. Sr. Ministro
Paulo de Tarso Vanuch
Secretaria Nacional dos Direitos Humanos

Senhor Ministro,

Peço sua ajuda e de sua equipe a fim de acelerar as investigações sobre ameaças de morte que recebi desde o final de maio até meiados de junho deste ano, a fim de identificarmos os agressores e evitarmos que alguma fatalidade aconteça, como as que vitimou o ambientalista Dionísio Júlio Ribeiro Filho e cujo assassino, acabei de ser informado, foi solto, assim como o mandante do assassinato da irmã Dorothy Stang.

Estarei, amanhã, às 14 h, sendo recebido pelo Sr. Nelson Garbaios, Chefe de Gabinete do Cel. Jorge da Silva, aqui no Rio de Janeiro, para levar um dossiê sobre o assunto que estarei postando também para o senhor assim que receber o endereço.

Desde já, agradeço pelo interesse demonstrado, especialmente, agradeço pela atenção da Sra. Adeyde Viana, que já está se mobilizando em minha defesa.

Ao longo de minha vida como ambientalista sofri diversas ameaças de morte e aprendi que, diante delas temos duas saídas, ou nos acovardamos e pedimos aos Céus para que nos proteja, ou damos transparência a estas ameaças, para que os nossos pretensos ameaçadores tenham certeza de que se algo nos acontecer responderão por isso diante das autoridades.

No dia 28/05 ligaram tarde da noite para minha casa e minha esposa atendeu. Uma voz de mulher disse que não passaríamos daquela noite. Uma semana antes, um vizinho, de nome Maurício (que durante o Carnaval construiu junto com outro vizinho, chamado Júlio, um píer em frente à minha casa, contra a minha vontade) disse que, 'por ser meu amigo', me avisava que ouviu falar que um grupo estava se organizando para "me aplicar uma coça". Em 26/05, o ambientalista e amigo Wagner, do CREA-RJ, ligou-me para dar a mesma informação, dizendo que tinha chegado aos seus ouvidos que pessoas estavam se organizando "para me dar uma
coça e sumir comigo no mar".

Já encaminhei pedido de proteção e segurança de vida à 79ª Delegacia de Polícia (Jurujuba - Niterói), a quem comuniquei os fatos, o que deu origem ao Registro de Ocorrência nº 001702/0081/6. Também pedi ajuda e proteção à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Niterói e à ALERJ, através do Deputado Alessandro Calazans, entre outros.

Existem motivos reais para me preocupar e tomar minhas precauções. Há alguns meses atrás, uma pessoa não identificada foi morta a pauladas na praia ao lado de minha casa e teve o corpo parcialmente queimado no local onde os pescadores cozinham os mexilhões para descasque. Esta pessoa foi vista no dia anterior bebendo nos bares da Ponta da Ilha, onde fica a minha casa e onde funciona a Redação e sede da REBIA. O corpo ficou exposto durante a manhã inteira e foi puxado por alguém para o mar onde desapareceu e, no final da tarde, quando os policiaischegaram ao local, só haviam restos de roupas incineradas. Não se sabe quem foi ou foram os assassinos, não se sabe quem sumiu com o corpo.

Além do cuidado de dar transparência a estes fatos, instalei sistema de câmera com gravação em vídeo e, nos últimos dias, contratei segurança para me proteger e à minha família.

Não tenho como identificar os motivos que estão levando a estas ameaças. Pode ser algum dos fatos antigos que retorna. Muitas pessoas sentiram-se prejudicadas por mim depois que as denunciei por agressões ao meio ambiente, e resolvem se vingar. Por exemplo, em 2003, dei uma entrevista à imprensa onde denunciei a pesca predatória de filhotes de sardinhas para uso como isca para atum, aqui na enseada de Jurujuba e Icaraí, em que os barcos chegavam até a beira da praia de Icaraí, o que deu origem a um inquérito na Polícia Federal (nº 089/2003), que investiga o caso.

Os veículos que edito, como o Jornal, a Revista e o Portal do Meio Ambiente, também têm se mantido independente e por isso mesmo incomoda algumas pessoas. Pode ser que eu tenha publicado alguma coisa que contrariou alguém. Só terei como saber depois que a polícia identificar meus ameaçadores.

Mas também tais ameaças podem estar ligadas a fatos aqui mesmo da comunidade, pois muitas pessoas sentiram-se prejudicadas quando comprei a casa onde moro, pois era um local onde pessoas reuniam-se para consumir drogas, etc. Logo que vim para cá, reuni-me com essas pessoas e entramos num entendimento e hoje, apesar de passarem diariamente à minha porta, não criaram mais nenhum problema, logo, não imagino que possa estar partindo deles.

Há alguns meses, procurei o então administrador regional da Prefeitura, Sr. Cláudio Fera, que veio até a minha casa e pude mostrar-lhe a situação de sujeira na praia, hoje tomada por cascas de mexilhão que provocam cortes nos pés dos banhistas, e devido seu volume, está aterrando a Baía de Guanabara. Pedi que ajudasse na reorientação das atividades de descasque dos mariscos para dar um aproveitamento adequado a estas cascas impedido sua transformação em resíduos.

Me ofereci para buscar uma solução talvez com a instalação de uma máquina que transformasse as cascas em pó facilitando assim a sua retirada. Na mesma ocasião chamei a atenção para o problema do acesso à praia, que passa em frente à minha casa. O costão de pedra é irregular pois serviu de jazida para a construção do antigo cais das barcas. Pedi ao Administrador que construísse uma passarela para facilitar o acesso principalmente de crianças e idosos. Ele disse que a Prefeitura não tinha recursos para fazer uma passarela, mas que se eu dispusesse de recursos eu poderia fazer. Hoje, este administrador não está mais no cargo e o novo administrador pediu-me que não fizesse qualquer obra, o que atendi.

Este episódio deu origem a intrigas, mentiras e fofocas onde as pessoas rapidamente formaram um conceito de valor negativo contra a minha pessoa, sem nem sequer me conhecer ou vir falar comigo sobre a minha versão dos fatos. Na boca das pessoas que consideram minha presença uma ameaça às suas atividades, o que era passarela virou um muro que eu estaria fazendo para impedir o aceso das pessoas à praia, e ainda que eu esclarecesse o assunto, as difamações
continuaram e continuam, pois na verdade tem pessoas que não querem ser esclarecidas, mas por inveja ou ressentimentos, sentem prazer em saber que estou sendo perseguido e ameaçado. O invejoso não quer ter o que temos, ou ser o que somos, mas quer que não tenhamos o que temos nem sejamos o que somos, ainda que não obtenha qualquer vantagem pessoal com isso.

Quem conhece minha trajetória como ambientalista, sabe que jamais concordaria com qualquer tipo de obra que impeça ou dificulte o acesso de alguém à praia, que é um bem público.

Um abraço fraterno e ecológico do

Vilmar Sidnei Demamam Berna

2 comentários:

Anônimo disse...

Altino, boa noite.

Ao ler uma história dessas e infelizmente, imaginar o pior, mai sme impressiono por viver em um país onde as leis dão aimpressão de terem sido feitas para proteger os criminosos, enquanto cidadão de bem, como este ambientalista e sua família, vivem sob o terror constante, sem qualquer atenção das autoridades.
O fato de um cidadão ameaçado de morte ser obrigado a se dirigir a um ministro para pleitear por sua segurança demonstra o quanto o cidadão comum está desassistido pelos governantes.
A segurança pública é um direito básico e elementar, quer seja para o cidadão um ambientalista, quer seja para mim, uma mulher comum, do povo.
Desculpe o tom, mas fico pensando: em um país onde o cidadão que luta pela preservação vive cercado de estranhos pra garantir sua segurança e o assassino da freira anda lvre, leso e solto, o que devemos pensar dos nossos legisladores?

Beijos

Anônimo disse...

Vamos torcer para que desta vez a Justiça não se coloque "por trás" do crime, mas adiante, como escudeira contra desmandos que impunemente abriga e desobriga. É forçoso, doído reconhecer, mas Vilmar deve procurar algum organismo internacional, se ainda não o fez, através da própria ONU inclusive, de que recebeu o Global 500, para dar maior visibilidade ao fato. E quanto ao que pensar dos nossos legisladores? Ora, sabemos: leis feitas por bailarinos para pernetas, somadas à crise de autoridade (vide mensaleiros e coetâneos comparsas...) e a falta de comprometimento com a prevenção e a punição do crime. A ser assim, é trágico, mas parece que vamos ter que recorrer ao PCC.