sábado, 21 de janeiro de 2006

NÃO DUVIDE DE MIM



Por Joaquim Tashka Yawanawá (*)


Olá Altino e seus fiéis leitores!

Viva 2006, de muito alto astral. Voltei ontem da aldeia, após um mês junto com minha esposa e minhas duas filhas, filmando dois novos documentários que vão estar prontos até metade deste ano. Um será sobre o ritual do sapo kapu, também conhecido como kambô, e outro sobre o xamanismo do povo yawanawá.

Estive por um mês isolado na mata, com um grupo de sete yawanawá, que está sendo iniciado no xamanismo através dos pajés Tata, Yawarani e Tui Kuru. Este grupo é parte do trabalho de conscientização e valorização da cultura que vêm sendo feita pelo meu povo. O pessoal fez um juramento ao Rare, que é uma planta sagrada que inicia ao mundo da espiritualidade yawanawá. O juraramento consiste em aprender, zelar, cuidar e proteger o conhecimento tradicional yawanawá.

Ando muito feliz por presenciar este acontecimento de modo natural e espontâneo, partindo dos próprios yawanawá. Desta forma, podemos fechar acordos com empresas internacionais, como a Aveda, e lançar uma grife de moda com a marca do próprio povo, sem perder o caminho de onde viemos. Aproveitei e acabei também entrando numa dieta por um mês, isolado, em abstinência sexual, sem comer nada doce, nada de carne de caça grande. O pessoal do grupo sequer recebe visitas. Ficam isolados, em dieta mais severa, tomando apenas ayahuasca e Raré.

Quero compartilhar com vocês um sonho que tive, que me fez acreditar muito mais na força do espírito de nossos ancestrais. Sonhei com a força do Rare ou do Runuã, que é a cobra jibóia. Não sei ao certo o que era. Sei que estava em algum lugar, que parecia uma casa de cura. De repente, chegou uma pessoa que era esperada por todos. Chegou um homem negro, de altura mediana, de aparecência serena, vestido com uma bata branca. Ele se aproximou para fazer uma limpeza em mim e na minha casa. Isso mesmo, eu estava em casa.

Meus julgamentos e idéias sobre crenças espirituais resistiam e rejeitavam suas curas. Eu queria antes saber sobre sua verdadeira identidade. Lutei com essa entidade para saber quem era de verdade. Pude olhar em seus olhos e ver seu rosto. Meu sexto sentido dizia que ele era um espírito muito forte que fora a enviado pelo Rare. Minha falta de fé e meus julgamentos sobre ele, fizeram-me lutar com ele.

No entanto, ele tinha vindo em paz, não havia necessidade de uma luta. De repente, ele se transformou numa serpente e disse:

- Não duvide de mim, não brinque comigo. Para que me chamastes se não acreditas em mim?

Despertei com um grande grito, que despertou a vizinhança. Os cachorros latiram assustados com meus gritos, o vizinho abriu a janela para ver o louco que gritava no meio da noite. Estou aqui em casa, andando na sala. Fumei uns dois cigarros e sinto falta do meu rapé, que deixei na aldeia. Agora, sentado diante do computador, tento montar pedaços do meu sonho e entender a mensagem.

Hoje ainda volto pra aldeia, para retomar o trabalho de iniciação espiritual e para acompanhar o tratamento da minha filha de cinco anos que está também isolada na mata com o grupo, nas cabecerias do Rio Gregório. É lá que descansa em paz nosso avô e grande xamã Antônio Luis.

O desenho que estou enviando é da Hushahu, uma das mulheres xamã yawanawá, que está concluindo a dieta agora em fevereiro. É sobre o espírito da jibóia, que representa para os yawanawá o espírito do Uni (ayauhasca).

(*) Joaquim Tashka Yawanawá é um dos líderes do povo yawanawá. Clique aqui para saber mais a respeito dele.

Comentário do Txai Terri Aqui: "Só pra lembrar ao amigo Joaquim Tashkã que estou com muitas saudades dele porque, há quase dois meses, não o vejo; e dizer que é muito bom que ele esteja fazendo uma vigorosa dieta alimentar e sexual nesse novo ano que se inicia; e que quando voltar não se lambuze no mel e venha com espírito bem forte pra conseguir demarcar a Terra Indígena do Rio Gregório, que os Yawanawá partilham com os Katukina, ainda neste ano de 2006; lembro-lhe que o presidente da Funai disse recentemente que os índios brasileiros já têm muitas terras e que é preciso dá um basta nas reivindicações indígenas, exortando o Supremo Tribunal Federal de ajudá-lo nisso; e também pra lhe lembrar que o governador Jorge Viana me disse recentemente que você pode confiar nele nessa luta pela demarcação da TI Rio Gregório nos limites proposto pelo GT de identificação e delimitação da Funai, cujo relatório já foi encaminado à Diretoria de Assuntos Fundiários da Funai; acho que ele está, de fato, disposto a lhe ajudar nessa articulação toda, mesmo contra a vontade do atual presidente da Funai, que não só declarou, mas, de fato, paralizou todos os processos de regularização de terras indígenas no país. É isso aí, Joaquim. Venha da floresta com a força do cipó e do rare pra enfrentar os inimigos passarão que continuam dominando a Funai do governo Lula, que se encontra, hoje, aqui entre nós. Um grande abraço pra você,meu amigo Tashkã. E não seja um homem de pouca fé (ou de por café), porque esses mistérios todos existem mesmo, não é conversa fiada, não. "O sonhar é uma verdade, igualmente a luz do dia ..." (trecho de um hino do Cruzeiro, do Mestre Juramidã). Txai Terri"

Um comentário:

Anônimo disse...

Só pra lembrar ao amigo Joaquim Tashkã que estou com muitas saudades dele porque, há quase dois meses, não o vejo; e dizer que é muito bom que ele esteja fazendo uma vigorosa dieta alimentar e sexual nesse novo ano que se inicia; e que quando voltar não se lambuze no mel e venha com espírito bem forte pra conseguir demarcar a Terra Indígena do Rio Gregório, que os Yawanawá partilham com os Katukina, ainda neste ano de 2006; lembro-lhe que o presidente da Funai disse recentemente que os índios brasileiros já têm muitas terras e que é preciso dá um basta nas reivindicações indígenas, exortando o Supremo Tribunal Federal de ajudá-lo nisso; e também pra lhe lembrar que o governador Jorge Viana me disse recentemente que você pode confiar nele nessa luta pela demarcação da TI Rio Gregório nos limites proposto pelo GT de identificação e delimitação da Funai, cujo relatório já foi encaminado à Diretoria de Assuntos Fundiários da Funai; acho que ele está, de fato, disposto a lhe ajudar nessa articulação toda, mesmo contra a vontade do atual presidente da Funai, que não só declarou, mas, de fato, paralizou todos os processos de regularização de terras indígenas no país. É isso aí, Joaquim. Venha da floresta com a força do cipó e do rare pra enfrentar os inimigos passarão que continuam dominando a Funai do governo Lula, que se encontra, hoje, aqui entre nós. Um grande abraço pra você,meu amigo Tashkã. E não seja um homem de pouca fé (ou de por café), porque esses mistérios todos existem mesmo, não é conversa fiada, não. "O sonhar é uma realidade, igualmente a luz do dia ..." (trecho de um hino do Cruzeiro do Mestre Juramidã). Txai Terri (21/01/06)