quarta-feira, 21 de agosto de 2013

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Governo do Acre investiga denúncia contra servidora do Diário Oficial do Estado

O governo do Acre investiga uma denúncia anônima contra a servidora pública Eliete Rates Menezes Brandão, que foi nomeada pelo governador Tião Viana, em janeiro de 2011, para exercer cargo comissionado CEC-4, no Departamento de Imprensa Oficial, do Gabinete Civil.

De acordo com a denúncia, enviada ao gabinete do governador e ao blog, a servidora usa o nome Eliete Rates Carneiro dos Santos, de solteira, na assinatura de um contrato de R$ 208 mil, firmado pela Secretaria Municipal de Obras Públicas de Rio Branco com a empresa L.M.P Rodrigues.

O nome da servidora aparece no contrato como representante da L.M.P Rodrigues, empresa que pertence a Lucas Mendes Pereira Rodrigues. No contrato, o CNPJ 13.637.847/0001-23, usado como sendo da L.M.P Rodrigues, na verdade é o CNPJ da empresa Mil Service Ltda.

Além disso, o CPF 233.306.942-20, que consta no contrato como sendo de Eliete Rates Carneiro dos Santos, na verdade pertence a Antonio Elias Rates Carneiro.

O objeto do contrato é a "prestação de apoio à Coordenação de Fiscalização de Posturas na Reorganização dos Espaços Públicos da cidade de Rio Branco".

O contrato original, de 2012, foi assinado por Lucas Mendes Pereira Rodrigues, mas o terceiro aditivo, de  maio de 2013, quando os direitos e obrigações foram transferidos da Secretaria de Obras Públicas para a Secretaria de Desenvolvimento e Gestão Urbana, quem assina é Eliete Rates Carneiro dos Santos.

Nota da Casa Civil

A subchefe da Casa Civil, Maria de Nazaré Melo de Araújo Lambert, e o diretor de Assuntos Jurídicos, Cícero Furtado da Rocha, enviaram a "nota de esclarecimento" a seguir:

"A denúncia anônima de que uma servidora do Diário Oficial do Estado integra uma empresa privada está sendo averiguada e, caso comprovada alguma ilegalidade no ato, as providências cabíveis serão tomadas.

A apuração da existência de ilegalidade se faz necessária em virtude de que a lei complementar nº 39, de 29 de dezembro de 1993, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos do Estado do Acre, em seu artigo 167, inciso X, permite a participação de servidores, efetivos ou não, em cargos de gerência ou administração de empresa privada, desde que seja na qualidade de acionista, cotista ou comanditário. Vejamos:

“Art. 167- Ao servidor é proibido: (...)

X - participar de gerência ou administração de empresa privada, de sociedade civil ou exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário” (grifo nosso)

Além disso, segundo a própria denúncia, a licitação foi realizada no âmbito municipal, que representa outra esfera de poder, que não o estadual; portanto, sob essa análise, não há que se falar em ilegalidade.

Como foi abordado na denúncia, a referida servidora trabalha no Diário Oficial do Estado, cujo conteúdo é de domínio público e, portanto, não há acesso a informações privilegiadas.

Como integrantes da administração pública, não podemos atuar no âmbito de meras suposições, pois um dos princípios que regem compras e contratos administrativos é o da legalidade, ou seja, deve estar expressamente autorizado ou vedado na lei.

Reafirmamos nosso compromisso de não compactuar com a ilegalidade. Os atos administrativos são públicos e devem ser transparentes. Precisamos, portanto, de cautela para, na tentativa de combatermos a ilegalidade, não agirmos contrários à lei."

Vamos aguardar esclarecimento

Todos sabemos que muita gente no governo do Acre mantém bico e lucra com o fato de estar no governo.

Uma servidora pública, ocupante de cargo comissionado, com salário de R$ 5 mil, que trabalha na Casa Civil, usa uma empresa para celebrar contratos com o governo e com a prefeitura de Rio Branco.

O contrato mais recente, de R$ 208 mil, com a prefeitura, mereceu vários aditivos.

Na tentativa de driblar qualquer suspeita, a servidora, que foi promovida em maio por ser ocupante do cargo de Gestor de Políticas Públicas, usa o nome de solteira.

O blog, o gabinete do governador e a Casa Civil receberam a denúncia.

A Secretaria de Comunicação informou que o governo deu prazo de 24 horas para que a servidora se explique e anunciou que a Casa Civil vai se manifestar sobre o caso.

Repassei a denúncia também para a Assessoria de Comunicação da prefeitura de Rio Branco.

Aguardemos.

sábado, 17 de agosto de 2013

Paisagem da capital do Acre durante estiagem amazônica

Fogo afeta todos os anos o esforço para regenerar a cobertura florestal neste trecho da Área de Proteção Raimundo Irineu Serra. Essa é a paisagem predominante em Rio Branco neste período de estiagem. Para não me estender, a precariedade com que opera nosso bravo Corpo de Bombeiros é vergonhosa. Com apenas dois caminhões, que às vezes pifam nas ruas, só podem atender quando o fogo atinge casas. Bombeiros usam até escadas de madeira com remendos. Nunca receberam escada magirus. É o Acre.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Hospital Santa Juliana diz que bebês estão na UTI e não em salas improvisadas

Nota de esclarecimento enviada pelo padre Jairo Coelho, assessor da direção do Hospital Santa Juliana, em resposta à mensagem de Jonas Amado Araújo intitulada "Situação de bebês no Hospital Santa Juliana é imoral, desumana e criminosa":

"Em resposta à notícia que está circulando na imprensa, o Hospital Santa Juliana cumpre com o dever de apresentar os seguintes esclarecimentos:

Do total de 18 crianças transferidas da Maternidade Bárbara Heliodora, por ocasião do princípio de incêndio, na noite do dia 7 de agosto, para o Hospital Santa Juliana, apenas 3 permanecem internadas na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTI Neo). Outras 14 já receberam alta da UTI Neo e foram transferidas para o berçário da Maternidade Bárbara Heliodora e uma veio a óbito devido a problemas graves de saúde constatados antes do incidente.

As crianças que permanecem internadas no HSJ estão na UTI Neo e não em salas improvisadas. Toda a equipe do Hospital e da Maternidade Bárbara Heliodora tem se esforçado diuturnamente para oferecer um atendimento de qualidade e humanizado aos recém-nascidos, inclusive com a instalação do banco de leite, que foi transferido provisoriamente da Maternidade para o HSJ para dar apoio à alimentação dos bebês.

Não procede a informação de que profissionais de fisioterapia tenham realizado a intubação de bebês, pois este é um procedimento que só pode ser realizado por médicos habilitados para tal.

O Hospital Santa Juliana tem se empenhado diariamente no controle de infecção hospitalar. Para isso, a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) realiza inspeções diárias.

Destacamos, ainda, que a parceria com a Secretaria Estadual de Saúde está cada vez mais sólida, permitindo oferecer toda a segurança necessária para os recém-nascidos. Inclusive, a Secretaria tem disponibilizado profissionais (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos de enfermagem), além de materiais e equipamentos.

Qualquer irregularidade verificada por pais ou familiares de pacientes, deve ser imediatamente comunicada à Ouvidoria ou à Direção do Hospital, para que seja solucionada no menor espaço de tempo possível."

Retratação


Em outubro do ano passado, neste blog, em nota intitulada "Nepotismo casado", noticiei que no dia 1˚ de fevereiro de 2011, o então diretor geral do Deracre, Marcus Alexandre, então candidato do PT à prefeitura de Rio Branco, nomeou a engenheira que hoje é sua esposa, Gicélia Viana da Silva, para responder pelo Departamento de Construção de Infraestrutura de Transporte.

O título “Nepotismo casado” induziu a uma análise distorcida e a engenheira tem razão ao se sentir ferida em sua honra.

Baseado nas informações posteriormente a mim prestadas e por decisão judicial, esclareço: durante o período em que Gicélia Viana da Silva trabalhou no Deracre, nomeada pelo então diretor Marcus Alexandre, ambos ainda não eram cônjuges, tampouco se teve conhecimento da existência de relacionamento amoroso entre ambos, o que afasta qualquer possibilidade de configuração de nepotismo.

Portanto, meu sincero pedido de desculpa à Gicélia Viana da Silva e sua família, por eventuais transtornos causados pela nota “Nepotismo casado”.


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Situação de bebês no Hospital Santa Juliana é imoral, desumana e criminosa

POR JONAS AMADO ARAÚJO

Prezado Altino Machado.

Não sei se você sabe, mas a Aretusa Machado, que é sua prima, casada com meu irmão, Jorge Adonis Araújo, atravessa uma fase muito difícil em Rio Branco. Vou contar um pouco: ela esperava um bebê e, devido a problemas, tiraram com cinco meses de gestação.

O descaso que está acontecendo envolve os bebês prematuros que foram transferidos para o Hospital Santa Juliana, na semana passada, em decorrência de um incêndio na usina de oxigênio da Maternidade Bárbara Heliodora.

As condições são precárias. Cinco bebês já morreram e os que ainda estão vivos podem não suportar a situação. Estão no limite entre lutar pela vida e lutar também agora contra o descaso do governo e de suas autoridades de saúde.

A começar pelas instalações insalubres para uma UTI neonatal. Existem formigas e baratas dentro da sala improvisada onde jogaram os bebês. Não existe oxigênio suficiente. Quando acaba o oxigênio, os pais têm que brigar por um cilindro.

Os bebês estão tomando leite em pó porque não existe a máquina para tratar o leite que as mães levam com todo cuidado, às vezes até durante as madrugadas.

Meu irmão, que levava o leite três vezes por dia para alimentar o bebê prematuro de seis meses, chegou a ver a enfermeira alimentando o filho dele com leite em pó. Perguntou onde estava o leite que levava diariamente e disseram que não podiam servir porque não havia onde guardá-lo adequadamente. Seguramente jogavam fora o leite obtido e entregue com tanto sacrifício e amor.

Na semana passada, quando meu irmão chegou ao Hospital Santa Juliana, o bebê estava roxo, morrendo engasgado com a sonda e o equipamento de respirar na boca devido a posição.

A enfermeira estava dormindo de cansada porque lá não trocam o plantão. O pessoal fica dois dias seguidos no hospital, pois não existe gente especializada suficiente para substituir o plantão.

O fisioterapeuta, responsável por entubar os bebês, a toda hora pede para os pais tomarem providência, pois aquelas condições são inviáveis para esses bebês, que necessitam de cuidados e locais diferenciados.

A gota d'água aconteceu nesta quinta-feira. Meu irmão não aguentou mais e abriu a boca. Chamou a imprensa e falou tudo. Como sabemos que a imprensa no Acre é cerceada e controlada, desconfiamos que a situação não se torne do conhecimento da opinião pública e de outras autoridades do Estado.

Os pais estão desesperados, vendo os bebês morrerem. Para que você tenha ideia, estavam pregando com martelo e furando as paredes dentro da UTI. Um barulho infernal para bebês que não podem nem ser tocados. Imagine o barulho de martelo e furadeiras dentro de uma sala, além do cheiro de cola insuportável.

A freira que administra o Hospital Santa Juliana limitou-se a dizer:

- Desde que esses meninos vieram para cá, só tivemos problemas. Amanhã mesmo vou devolvê-los. Estamos fazendo um favor a vocês.

Adonis e Aretusa estão em Rio Branco há mais de um mês. Desde que houve o incêndio na Maternidade Bárbara Heliodora, estão passando por essa agonia. Procure o meu irmão. Ele pode contar muito mais. Isso é o pouco que imaginamos que ele nos conta ao telefone para nos poupar de preocupações.

Mas o que supomos pouco é imoral, é desumano, é crime. A ajuda que necessitam a essa altura é somente a de expor à opinião pública o descaso para com os bebês.

Jonas Amado Araújo mora em Cruzeiro do Sul

Em Rondônia, pesquisador diz ter encontrado altar de cidade inca


Um pesquisador independente localizou um sítio arqueológico no município de Alta Floresta do Oeste (RO), a 540 quilômetros de Porto Velho, e já relatou a descoberta ao Ministério Público Federal e ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. 
 
O farmacêutico Joaquim Cunha da Silva, especialista em citologia clínica e georreferenciamento,  acredita que trata-se de um altar onde eram realizadas cerimônias sagradas na lendária cidade perdida Paititi, que teria sido criada pelos incas em fuga após a colonização espanhola no Peru.
 
- Existem vários altares similares a esse, que é o primeiro encontrado no Brasil, em países como Argentina, Peru e Colômbia, onde a cultura pré-inca, inca e aruaque se desenvolveu – disse o pesquisador.
 
Leia mais no Blog da Amazônia.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Empresário Roberto Moura morre em São Paulo aos 60 anos


O empresário Roberto Moura, que completaria 61 anos em 17 de setembro, morreu no Instituto do Coração, em São Paulo, na madrugada desta quarta-feira. Dono do Grupo Recol, Moura era um dos homens mais ricos do Acre.

- Embora fosse muito vaidoso e fizesse tratamentos para rejuvenescimento, o Moura viajou com o filho dele, o Marcelo, para tratar de negócios. Ele falou para o filho que não se sentia bem, foi levado para atendimento médico e sofreu um ataque fulminante. Marcelo está com o corpo do pai no IML. Você sabe que o Moura não suportava ser fotografado nem de revelar a idade, mas estamos providenciando todas as informações para a imprensa - disse Raimundo Martins, diretor da TV Gazeta, propriedade do empresário.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Crise invisível: Brasil esconde emergência humanitária no Acre

Campo de ‘refugiados’ abriga mais de 800 haitianos em condições desumanas. Para Conectas, Brasil maquia crise internacional e deve articular solução urgente no âmbito da ONU e da OEA


O governo brasileiro faz uso há meses de um jogo de palavras – entre migração e refúgio – para minimizar a grave crise humanitária instalada na cidade acreana de Brasiléia, na fronteira com a Bolívia, 240 km a sudoeste da capital do Estado, Rio Branco.

Mais de 830 imigrantes – quase todos, haitianos – vivem confinados num galpão, com capacidade para apenas 200 pessoas, em condições insalubres de higiene, repartindo o uso de apenas 10 latrinas e 8 chuveiros, onde não há distribuição de sabão nem pasta de dente, o esgoto corre a céu aberto e as pessoas são empilhadas durante meses num local de 200 m2, com teto de zinco, no qual lonas plásticas negras servem de cortina, sob temperaturas que chegam aos 40 graus. O hospital local diz que 90% dos pacientes provenientes do campo têm diarreia. O local já abriga 4 vezes mais pessoas do que deveria e 40 novos haitianos chegam todos os dia.


“É insalubre, desumano até. Os haitianos passam a noite empilhados uns sobre os outros, sob um calor escaldante, acomodados em pedaços de espuma que algum dia foram pequenos colchonetes, no meio de sacolas, sapatos e outros pertences pessoais. A área onde estão as latrinas está alagada por uma água fétida, não se vê sabão para lavar as mãos e quase todos com os que conversamos se queixam de dor abdominal e diarreia. Muitos passam meses nessa condição”, disse João Paulo Charleaux, coordenador de Comunicação da Conectas, que esteve no local.

Conectas realizou uma missão a Brasiléia do dia 4 ao dia 6 de agosto, onde gravou 20 entrevistas com moradores do campo, conduzidas pela pesquisadora convidada da Conectas Gabrielle Apollon, no idioma creole, falado pelos haitianos. Gabrielle já havia feito previamente outras 27 entrevistas com haitianos que conseguiram chegar a São Paulo, totalizando mais de 20 horas de depoimentos gravados. Nas histórias, eles contam como chegam ao Brasil depois de gastar até US$ 4 mil em pagamentos a atravessadores no trajeto desde o Haiti.

Os haitianos também dizem que a concessão de ‘visto humanitário’ na Embaixada do Brasil em Porto Príncipe não funciona como prometido – atravessadores cobram taxas, não há informação clara sobre os procedimentos, é difícil conseguir atendimento e tem sido pedido currículo para favorecer o que se chama “imigração qualificada” ao Brasil, sem levar em conta justamente o caráter “humanitário” que este visto deveria ter, de acordo com o próprio governo brasileiro.

“Posso dizer que o que vivemos aqui em Brasiléia não é para um ser humano. Eles nos colocaram de novo no Haiti que tínhamos logo após o terremoto: a mesma sujeira, o mesmo tipo de abrigo, de água, de comida. Isso me machuca e me apavora. Eu sabia que o caminho até aqui seria duro, porque você está lidando com criminosos, mas, ao chegar aqui no Brasil, estar num lugar desses é inacreditável”, disse o haitiano Osanto Georges, de 19 anos.


No campo superlotado, as brigas para formar filas são constantes. “No dia em que chegamos, a polícia sacou arma de fogo para controlar um distúrbio. É evidente que se trata de uma tarefa complexa demais para ser gerida da forma como está sendo. A situação no campo é semelhante em muitos aspectos ao que eu mesmo vi quando estive no Haiti, pouco após o terremoto, em 2010. Trata-se de uma questão regional, que envolve, pelo menos cinco países: Brasil, Peru, Bolívia, Equador e Haiti. Pediremos a realização de uma audiência temática na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA e enviaremos nossas constatações a dois relatores independentes da ONU, um para migrantes e outro designado para acompanhar a situação de direitos humanos no Haiti”, disse Charleaux.

Membros da organização também entrevistaram in loco médicos do hospital de Brasiléia, policiais, membros do Ministério Público Federal e do Conselho Tutelar e autoridades de governo, em Rio Branco, além de diversos moradores da cidade acreana. A organização também usou duas vezes a Lei de Acesso à Informação para obter de diversos ministérios, em Brasília, informações acuradas sobre a situação. Na maioria dos casos, os nomes das fontes estão omitidos obedecendo a pedidos expressos de funcionários públicos que não possuem autorização formal para falar em nome das organizações para as quais trabalham.

‘90% tem diarreia’

Quase todos os haitianos entrevistados pela Conectas entre 4 e 6 de agosto se queixaram de dor abdominal e diarreia. Conectas visitou o Hospital Raimundo Chaar, de 46 leitos, responsável por atender casos de urgência e emergência na cidade. De acordo com membros da equipe, já houve surtos de diarreia que levaram 40 haitianos ao pronto socorro de uma só vez. Um dos funcionários explica que o hospital não recebe nenhum recurso adicional para lidar com o fluxo de haitianos. “Os políticos estão tratando isso aqui como se fosse um assunto de diplomacia, mas, enquanto isso, todos os dias, estamos importando miséria e doença sem poder lidar com isso”, disse, revelando parte do preconceito e rechaço preocupantes na cidade. A informação é confirmada por plantonistas, que se dizem espantados com o fluxo de novos pacientes. Segundo eles, são atendidos em média 4 haitianos por dia, mas no dia em que o hospital recebeu a Conectas, houve 10 atendimentos de haitianos do campo, só no período da manhã. A consulta é feita sem o auxílio de tradutores e, segundo as fontes ouvidas no local, “90% dos casos são de diarreia e 10% de doenças respiratórias”. As pessoas responsáveis pelo atendimento disseram nunca ter entrado no campo e receberam com surpresa a informação sobre as condições de higiene no local.

‘Vai piorar’

De acordo com o coordenador do campo, Damião Borges, do Governo do Estado do Acre, o campo vem recebendo 40 novos haitianos por dia, apesar de a última alteração estrutural ter ocorrido há quatro meses. Ele diz que o aumento do número de recém chegados, combinado com a diminuição da oferta de vagas por parte de empresas que antes buscavam trabalhadores no campo, está criando um caos social para os próprios haitianos no Brasil. “Isso precisa ter um fim porque nossos recursos se esgotaram. O Estado tem uma dívida de R$ 700 mil com a empresa que provê alimento para o abrigo e o prazo para pagar termina no dia 15 de agosto. Precisamos urgentemente que o Governo Federal nos ajude. Aqui foi posto R$ 4,5 milhões pelo Governo do Estado e R$ 2 milhões pelo Governo Federal, em 2 anos e 8 meses. Mas o peso, mesmo, quem carrega, é a cidade de Brasiléia. Isso não pode estar a cargo de um município pequeno e modesto como esse”, disse. A Conectas foi informada, durante a missão, que há 3 meses não há repasse de verba do Governo Federal para o Estado do Acre destinado ao atendimento dos migrantes haitianos. Mais grave, não há previsão de novas remessas.

Queixas sobre água e comida

O maior número de queixas recebidas no campo diz respeito à qualidade da água e dos alimentos consumidos. O local possui um único ponto de distribuição de água potável, um filtro industrial, com três torneiras. Para a administração, as dores abdominais são causadas pelo efeito do cloro, que “provoca diarreia de três dias em pessoas que possuem muitas amebas no organismo”. Outro aspecto negativo mencionado é a má qualidade dos alimentos, que, para os gestores do serviço, tem a ver com a diferença de paladar e de hábitos alimentares entre brasileiros e haitianos. Ainda que os problemas relatados se deem por essa razão, pouco se tentou para alterar substancialmente o cardápio. As refeições são distribuídas em marmitas de papel alumínio enquanto a Polícia Militar monta guarda ao lado da fila de mais de 800 pessoas. Os relatos de brigas nas filas são frequentes.

Crianças desacompanhas e indocumentadas

Outro local visitado pela Conectas foi o Conselho Tutelar de Brasiléia, por onde passaram 20 casos de crianças e adolescentes haitianos sem documentos ou separadas dos pais. Mas, no dia 7 de agosto, quando a missão da Conectas já havia regressado a Rio Branco, 5 crianças haitianas chegaram ao campo. “Estamos muito além de nossas modestas capacidades. Esse, para mim, é o pior momento, desde que os haitianos começaram a chegar”, disse um dos membros do Conselho Tutelar. Apesar do aumento de trabalho, não houve, segundo a fonte, nenhum aporte adicional de recursos, estrutura material ou funcionários desde o início da crise. Ao todo, 5 conselheiros trabalham no local, atendendo todos os problemas relativos a crianças e adolescentes na cidade. “De repente, uma pequena cidade como essa tem de lidar com um fenômeno deste tamanho, sem sequer receber qualquer preparação”, complementou. Entre os haitianos, há inúmeros relatos de roubo de documentos – entre muitos outros pertences – no caminho até chegar ao Brasil.

Comunidade local

“Brasiléia é um barril de pólvora que pode explodir a qualquer momento. Os moradores não aguentam mais essa situação. Isso pode se desdobrar em ações de hostilidade”, disse à Conectas, em Rio Branco, uma autoridade do Governo do Estado do Acre. A declaração reflete o estado de espírito dos moradores desta cidade pequena, de apenas 20 mil habitantes. Embora os moradores mostrem compreensão e solidariedade com os haitianos, as manifestações de cansaço e descontentamento são cada vez mais frequentes. Os moradores do campo competem por vagas com os moradores locais nos postos de saúde, supermercados, padarias, agências bancárias, farmácias, correios e demais serviços públicos.

Funcionários

Uma das constatações evidentes é a desproporção entre o número de funcionários e o número de moradores no campo. Ao longo de três dias, apenas 2 funcionários trabalharam em período integral no campo, atendendo diretamente os 832 haitianos, num pequeno trailer com um computador e um ventilador. Apesar da dedicação integral, os funcionários são locais, não falam o idioma dos haitianos e não receberam o treinamento necessário, nem possuem experiência prévia na gestão de questões humanitárias, aplicando a este contexto complexo a lógica de atendimento a ocorrências próprias de uma pequena cidade. Não basta boa vontade e dedicação. Apesar das constantes viagens ao local de membros do Governo do Estado do Acre, baseados em Rio Branco, faz-se necessária a constituição urgente de um corpo de trabalhadores familiarizados com crises humanitárias para gerir o campo.

Comunicação

O campo e o hospital não dispõem de nenhum tradutor. Os poucos funcionários tentam falar espanhol, mas os haitianos, na imensa maioria dos casos, falam apenas creole. As instruções para formar filas ou entregar documentos são feitas no grito, o que aumenta a incerteza e a ansiedade dos haitianos, que muitas vezes se aglomeram e brigam por espaço diante do pequeno trailer da Polícia Militar, que serve de escritório da administração do campo. Não há nenhuma senhalética no campo, ou serviço de amplificação de voz. Os poucos cartazes em creole estão escritos à mão. No campo, não há cartazes sobre DST/Aids nem sobre hábitos de higiene, assim como cartilhas sobre direitos ou qualquer outro material comunicacional com orientação aos recém chegados.

Refúgio x Visto Humanitário

Todos os residentes do campo são oficialmente solicitantes de refúgio, por orientação do próprio Governo, que, após 6 meses de análise dos pedidos, prorrogados por mais 6 meses, nega a concessão do refúgio a todos os haitianos.

Este arranjo legal, enquadrado numa política chamada pelo Brasil de “visto humanitário”, evita a deportação dos haitianos que chegam ao País, uma vez que a lei proíbe a deportação de solicitantes de refúgio durante o período de tramitação do pedido. O improviso, entretanto, está fazendo com que uma grave crise humanitária – originada por uma situação de violência interna, seguida de diversos desastres naturais, o último deles um terremoto responsável pela morte de 220 mil pessoas no Haiti – seja tratada como um simples problema migratório no Brasil. “A principal consequência disso é uma abordagem improvisada, amadora e descoordenada, que sobrecarrega o pequeno município de Brasiléia e sua população, quando, na verdade, deveria ser gerida por especialistas em emergências humanitárias desta complexidade. Do ponto de vista humanitário, a questão do nome do visto que se dê é agora menos urgente do que as condições brutais enfrentadas no campo. Esta política de visto humanitário está sendo tudo, menos humanitária”, disse Charleaux.

Leia mais:

Conectas recolhe 20 depoimentos em Brasiléia

Veja as recomendações enviadas ao Brasil e órgãos internacionais sobre a crise

Fonte: Conectas Direitos Humanos

PT se rende à decisão popular que restabele fuso horário tradicional do Acre

O senador Sérgio Petecão (PSD-AC) solicitou, nesta terça-feira (13), celeridade à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) para votar o relatório favorável, apresentado pelo senador Aníbal Diniz (PT-AC) ao PLC nº 43/2013, que restabelece o horário antigo do Acre.

O presidente da CAE, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), garantiu ao senador Petecão que o projeto entrará na pauta de votação já na reunião da próxima terça-feira (20). Petecão explicou que o projeto é da máxima importância para a população acreana.

- O povo está aguardando essa decisão. Precisamos tratar a matéria com prioridade máxima.

Se aprovado na CAE, o projeto segue para a Comissão de Relações Exteriores (CRE) em caráter terminativo.

A retomada do fuso horário acreano foi expressa pela população no referendo realizado em 2010, e mostrou que a maioria da população opta pelo horário de duas horas a menos em relação à hora oficial de Brasília.

Designado relator do Projeto de Lei da Câmara nº 43, de iniciativa da presidente Dilma Roussef, que restabelece os fusos horários do Estado do Acre e de parte do Estado do Amazonas, o senador Aníbal Diniz (PT-AC)  finalmente se rendeu à decisão da maioria da população.

Veja o relatório:

I – RELATÓRIO

Tramita nesta Comissão o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 43, de 2013 (nº 3.078, de 2011, na Casa de origem), de iniciativa da Presidenta da República, que restabelece os fusos horários do Estado do Acre e de parte do Estado do Amazonas, que haviam sido alterados pela Lei nº 11.662, de 24 de abril de 2008.

O autor dessa Lei, o então Senador Tião Viana, motivou sua iniciativa por prejuízos econômicos, sociais e culturais decorrentes do atraso de duas horas do fuso horário aplicado ao Estado do Acre em relação ao fuso horário das regiões Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul do País. O atraso era anualmente aumentado para três horas na vigência do horário de verão.

Tal situação apresentava-se difícil de ser justificada, uma vez que quando da sanção pelo Presidente Hermes da Fonseca do Decreto nº 2.784, de 1913, que estabeleceu os fusos horários no Brasil, o Acre ainda não existia enquanto Estado, ainda não possuía a devida representação no Parlamento Brasileiro. Os meios de comunicação e transporte eram rudimentares. A título de exemplo, uma simples viagem do Rio de Janeiro, à época nossa Capital Federal, para Rio Branco, consumia meses de navio e outras embarcações adequadas para navegação nos rios amazônicos.

Por tudo isso, os argumentos apresentados pelo proponente da matéria, o Senador Tião Viana, revelaram-se tão consistentes que conquistaram a unanimidade dos votos do Congresso Nacional e a sanção da Lei pelo Presidente Luiz Ignácio Lula da Silva, no dia 24 de abril de 2008.

Assim, a necessária mudança do fuso horário reduziria os prejuízos, os contratempos e os desconfortos que o povo acreano sofria há anos com a disparidade de fusos horários entre a região mais ocidental e o restante do Brasil.

Inicialmente, o projeto de lei propunha alteração dos fusos horários apenas para o Estado do Acre e parte do Estado do Amazonas, duas únicas regiões do País onde a diferença de fuso horário era de duas horas em relação à Hora Oficial de Brasília. Na Câmara dos Deputados, foi incluída a unificação da hora legal do Estado do Pará para coincidir com a Hora Oficial de Brasília. Antes da Lei, vigiam nesse Estado dois fusos horários: um coincidente com a Hora Oficial de Brasília, e outro com uma hora de atraso.

A Lei entrou em vigor em junho de 2008. Tão logo a população acreana foi submetida à mudança de fuso horário, iniciaram-se acalorados debates em torno da sua conveniência, refletindo clara divisão de opiniões no seio da sociedade em torno do tema.

Partidários e críticos da alteração do fuso horário sustentaram o debate, que culminou com a aprovação, no Congresso Nacional, do Decreto Legislativo nº 900, de 2009, que dispunha sobre a realização de referendo para decidir sobre a alteração da hora legal do Estado do Acre. Em 2010, concomitantemente ao segundo turno da eleição presidencial, realizou-se o referendo para que os 470.560 eleitores inscritos à  época manifestassem sua opinião. O resultado mostrou que 39,2% dos eleitores votaram pelo retorno ao fuso horário antigo e 29,7% votaram pela manutenção do fuso horário vigente. Houve 28,6% de abstenções, 2,2% de votos nulos e 0,3% de votos em branco. Portanto, com a apuração dos votos válidos, prevaleceu a defesa do retorno ao fuso horário antigo, com 56,87% dos votos, ao passo que 43,13% dos acreanos optaram pela manutenção do horário.

Para que o resultado do referendo produzisse efeitos seria necessária uma nova lei. O Projeto de Lei do Senado (PLS) nº  91, de 2011, levado à sanção presidencial no mesmo ano, previa o retorno dos fusos horários dos Estados do Acre, do Amazonas e do Pará à situação vigente antes da edição da Lei nº  11.662, de 2008.

A Senhora Presidenta da República, entretanto, vetou integralmente a proposição sob o argumento de que o Projeto extrapolava o resultado da consulta realizada e trazia inconvenientes para outras unidades da Federação. Ato contínuo, encaminhou ao Congresso Nacional, pela Mensagem nº 595, de 21 de dezembro de 2011, o presente projeto de lei, promovendo o retorno apenas da hora legal dos Estados do Acre e do Amazonas e mantendo a alteração feita pela Lei nº 11.662, de 2008, para o Estado do Pará.

Na Câmara dos Deputados, a matéria foi aprovada sem emendas e remetida a esta Casa em 24 de junho de 2013, na forma do PLC nº 43, de 2013, que ora analisamos. A proposição foi despachada inicialmente para esta Comissão e seguirá para a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, antes da manifestação definitiva do Plenário desta Casa. Não foram oferecidas emendas nesta Comissão.

II – ANÁLISE

Compete a esta Comissão opinar, entre outros temas, sobre aspecto econômico e financeiro de qualquer matéria que lhe seja submetida.

A mudança de fuso horário no Estado do Acre, promovida pela Lei nº 11.662, de 2008, teve como uma das principais motivações os prejuízos econômicos decorrentes da diferença entre a hora legal vigente naquele Estado e a Hora Oficial de Brasília. Durante a vigência dos quatro meses do horário de verão, esta diferença chegava a três horas.

É inegável que a redução da diferença do fuso horário trouxe os benefícios econômicos desejados na justificação da citada Lei. De fato, a vigência do novo horário oficial do Acre tem propiciado uma maior integração com o sistema financeiro do resto do País. Com a globalização, o acesso à rede mundial de computadores e às novas tecnologias de informação foi facilitado. A atual grade horária de nossa programação televisiva enfim responde aos anseios da sociedade, e o transporte aéreo está em sintonia com os outros Estados, resultando numa maior participação da população acreana na vida econômica, política e cultural dos centros mais desenvolvidos.

Não custa lembrar que os transtornos ocasionados pelo retorno do fuso horário anterior serão significativos. Nova adaptação ao expediente funcional e comercial, bem como ao horário escolar será  necessária. Mais uma alteração na rotina da vida da população acreana, após cinco anos de vigência da lei atual, certamente terá impacto considerável.

Entretanto, houve uma consulta à população nas eleições de 2010 e a maioria dos votantes optou pela volta do antigo fuso horário.

Desta forma, ainda que o instrumento de consulta —  o referendo —, não tenha sido apropriado e que não tenha havido o devido esclarecimento à população sobre a sua forma de implementação, e, ainda que a questão do fuso horário do Acre tenha sido excessivamente politizada durante aquelas eleições, nunca esteve em questionamento a soberania do povo acreano e o seu direito à tomada de decisões. Por isso, o resultado deve ser respeitado, razão pela qual, defendo a aprovação do projeto que ora analisamos.

III – VOTO

Feitas todas as ressalvas, voto pela aprovação do Projeto de Lei da Câmara nº 43, de 2013.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Por "limpeza", Rio de Janeiro desterrou para o Acre mais de 2 mil "criminosos", diz historiador Francisco Bento

Mais de duas mil pessoas foram desterradas do Rio de Janeiro para o Acre pelo governo federal como criminosos políticos, sem condenação judicial, por participarem das revoltas da Vacina (1904) e da Chibata (1910). A constatação resulta de uma pesquisa do professor Francisco Bento da Silva, 43 anos, do curso de História da Universidade Federal do Acre, autor de uma tese de doutorado cuja narrativa foi adaptada no livro "Acre, a Sibéria Tropical", que lança uma nova leitura sobre o processo de ocupação da região mais ocidental do país.

Os desterros foram adotados pelo governo federal como medidas de "limpeza" dos indesejados sociais da cidade do Rio de Janeiro, então capital da República. Eram homens, mulheres e até crianças pobres. Alguns sobreviviam de trabalhos avulsos, esporádicos e não reconhecidos formalmente pelas autoridades, enquanto outros viviam de pequenos crimes e contravenções, como roubos, furtos, jogos de azar, conto do vigário, capoeira, prostituição etc.

–– Mas também havia pessoas que não se enquadravam no perfil retratado pelo governo e pela imprensa – os trabalhadores e operários que foram apanhados na rua protestando contra o governo. O governo aproveitou para mandar pessoas que durante as revoltas estavam em presídios da cidade. Fica claro que a motivação para o desterro não foi somente por alguém ter participado das revoltas – assinala o historiador em entrevista exclusiva.

Para a região do Alto Madeira, no atual Estado de Rondônia, foram desterradas 400 pessoas. Homens e mulheres eram pintados pelo governo federal como expressões natas do crime e da discórdia, profissionais habilitados da desordem. De acordo com o relato do agente sanitário Belfort Booz de Oliveira, da Comissão Rondon, testemunha do desembarque, "os quatrocentos desgraçados foram guindados, como qualquer cousa, menos corpos humanos, e lançados ao barranco do rio".

–– Eram fisionomias esguelhadas, mortas de fome, esqueléticas, e nuas como lêmures das antigas senzalas brasileiras. As roupas esfrangalhadas deixavam ver todo o corpo – acrescenta Belfort de Oliveira em carta enviada ao amigo dele, o senador oposicionista Rui Barbosa, no dia 30 de maio de 1911.

Os desterrados do Madeira foram submetidos a trabalhos forçados e muitos foram fuzilados para servir de exemplo quando se opuseram às normas e regras dos superiores. Na então prefeitura do Alto Juruá, no Acre, os desterrados viviam em cárcere privado, em um galpão, e também realizavam trabalho forçado.

–– No Departamento do Alto Acre, existem denúncias de muitos terem sido assassinados por autoridades locais e enterrados com atestados de óbitos falsificados pelos médicos da prefeitura. Além disso, parece que pela mácula que carregavam, os desterrados era mal vistos pela população local como criminosos irrecuperáveis e para os quais os castigos recebidos eram válidos – diz Francisco Bento.

Distante, vazio, selvagem e isolado, o então Território Federal do Acre era tratado pela imprensa da época como "Sibéria do Brasil". Era considerado o lugar ideal para manter distante da capital federal quem se insurgia contra as ordens dos mandatários da República. 

Eis a entrevista:

Por que mais de duas mil pessoas foram desterradas do Rio de Janeiro para o Acre, em 1904 e 1910?
Os desterros foram desdobramentos de duas grandes revoltas que ocorreram naquele período na cidade do Rio de Janeiro: a Revolta da Vacina e a Revolta da Chibata. O governo, para debelar os protestos, implantou o estado de sítio na capital federal, que suspendia por trinta dias algumas garantias legais – constitucionais e jurídicas. De posse desse instrumento, o governo federal prendeu e desterrou aqueles sujeitos -homens e mulheres pobres- que há muito causavam preocupações, infundadas ou não, nas autoridades da República. Pessoas que eram vistas como desviantes das normas de “bem viver”, em descompasso com os valores urbanos e “civilizatórios” que estavam sendo implantados. À época, o Acre era o oposto do Rio de Janeiro: local distante, “vazio”, selvagem, isolado e outros atributos correlatos. Ou seja, torna-se o espaço adequado para os indesejados que a República queria se desfazer. Além desses estereótipos negativos, o Acre era um Território Federal, administrado diretamente pela Presidência da República através do Ministério da Justiça. Não havia a necessidade de costura política com autoridades locais para viabilizar o recebimento dos desterrados.

Quem eram esses homens e mulheres?
Eram pessoas pobres. No cotidiano do Rio de Janeiro, sobreviviam de atividades que transitavam na fronteira tênue do ilegal e legal: trabalhos avulsos, esporádicos e não reconhecidos formalmente pelas autoridades. Outros viviam de pequenos crimes e contravenções no espaço urbano -roubos, furtos, jogos de azar, conto do vigário, capoeira, prostituição etc. Mas também havia pessoas que não se enquadravam no perfil retratado pelo governo e pela imprensa – os trabalhadores e operários que foram apanhados na rua protestando contra o governo. E por fim, o governo aproveitou para mandar pessoas que durante as revoltas estavam em presídios da cidade. Por este ultimo exemplo, fica claro que a motivação para o desterro não foi somente por alguém ter participado das revoltas.

Até crianças foram desterradas?
Sim, existem fotografias de época que demonstram claramente crianças enfileiradas para identificação e embarque para o Acre. Uma ressalva é que, de acordo com o Código Criminal de 1890, a partir dos nove anos de idade a pessoa já tinha responsabilidade penal. Contudo, havia uma preocupação por parte das autoridades com a chamada “infância perdida”. Muitas crianças eram compulsoriamente alistadas na marinha como grumetes, como forma de “prevençao”, para que não se tornassem criminosas. E sobre o Acre e crianças, existe uma crônica conhecida do poeta Olavo Bilac, publicada em 1908, intitulada “Menor perverso”. Bilac narra o assassinato de uma criança de três anos morta com requintes de crueldade por outra de 10 anos. E pergunta que punição será dada ao menor assassino: Casa de Detenção, fuzilamento ou envio para o Acre? Ou seja, ser mandado para o Acre era uma punição vista como rigorosa até mesmo para um criminoso.

Penalizava-se pessoas ou atos?
Penalizavam-se pessoas acima de tudo. Os rigores e atenuantes da lei eram de acordo com a posição social do faltante. No caso das duas revoltas, só foram desterradas pessoas pobres, sem padrinhos ou posses materiais para contratar advogados. Militares de alta patente e jornalistas acusados de participação nas duas revoltas não foram desterrados. Foram presos, processados e depois anistiados. Mas a anistia não atingiu os desterrados para o Acre, pois não havia processos contra eles. Era como se não existissem perante o monstro Hobessiano do estado autoritário da Primeira República e seus valores de classe elitista.

Eles partiam para o Acre com esperança de retorno ou sabiam que o caminho era sem volta?
Aqui só podemos especular, pois lidamos com subjetividades individuais e coletivas. Mas podemos fazer um exercício de especulação. Historicamente, partidas forçadas são traumáticas e os deslocados sempre desejam voltar para onde estavam. Neste caso em particular, os desterrados para o Acre certamente tinham um imaginário sobre a região do Acre, na Amazônia, bastante negativo e tenebroso: local de morte e isolamento certos.

Quantos desterrados permaneceram no Acre?
Impossível quantificar. Mas a grande maioria jamais retornou ao local de origem. Parte pequena morreu durante a viagem devido as condições insalubres dos porões dos navios o por fuzilamento em tentativas de revoltas. Outros morreram na Amazônia devido doenças tropicais endêmicas. E a grande maioria refez certamente suas vidas carregando a pecha de desterrados permanentes ou escondendo esta mácula nos novos espaços de sociabilidades em que foram se inserindo.

Algum deles conquistou projeção na vida social, política ou econômica local?
Isso não procurei mapear porque não era o foco da minha pesquisa. Ainda é um trabalho a ser feito, pois muitas pontas dessa história dos desterros permanecem soltas e talvez nunca se amarrem por completo.

Com o advento da internet e suas redes sociais, muita gente diz que o Acre não existe. No Dicionário Aurélio consta a expressão ir para o Acre entre os sinônimos do verbete morrer. Em outros dicionários, dos anos 1960, constava “acreana” entre os sinônimos de prostituta. O desterro é mais amplo?
A figuração do Acre como parte do território brasileiro é ainda motivação de equívocos e estereótipos. E isso resvala evidentemente para aqueles que nasceram e vivem no Acre. Talvez essa incorporação tardia ao território nacional, a condição de Território Federal sustentado pela União, após o fim do ciclo da borracha, foi gerando um conjunto de olhares externos que reforçou uma imagem que desde muito tempo já era extremamente negativa. O Acre como última fronteira, como última unidade da federação, torna-o também o ultimo “sertão” do Brasil. A Sibéria tropical legou uma imagem perene e que ainda é muito forte nos dias de hoje. O advento da internet e a circulação desses estereótipos irônicos e exagerados é algo que segue o mesmo padrão das charges, crônicas e versos publicados no inicio do século XX, no Rio de Janeiro. Mudam-se os veículos, mas a mensagem é semelhante.

Você estudou o autoritarismo em outro trabalho de sua autoria e sabe que os governos do Acre também desterravam seus adversários. Isso ainda acontece? De que maneira?
Não podemos falar em desterros internos no Acre no sentido clássico do modelo republicano que estudo em meu trabalho. Mas existem relatos de pessoas mais idosas ao dizerem que na época territorial e até mesmo já na fase pós 1962, os adversários políticos daqueles que estavam na situação eram deslocados ou lotados em postos distantes e isolados como forma de penalização. Hoje as formas de ostracismo e punição são mais veladas, mas atingem basicamente aqueles que desempenham cargos públicos em níveis municipal e estadual ou em firmas que dependem de contratos com a administração pública. O nível de influência na vida pessoal dessas pessoas certamente é maior por parte dos dirigentes políticos e partidos quando estão no domínio da máquina pública.

A forma como o Acre foi ocupado e conquistado, com seus coronéis de barranco no barracão do seringal, com os desterrados, é a nossa gênese? Qual a influência disso na política atual? O estado parece controlar a tudo e todos, existe pouco espaço para a crítica e o contraditório e isso foi agravado nos últimos 14 anos de dominação de uma suposta esquerda. Como avalia?
A gênese do acreano -com “e”, como prefiro- é das mais diversas do ponto de vista étnico, cultural e dos tipos de gentes. Contudo, a narrativa historiográfica, popular e política sobre isso é hegemônica em ressaltar a origem heroica, do conquistador e do desbravador. O fato é que ninguém gosta de realçar suas raízes “não nobres” e o Brasil como artefato étnico e cultural foi formado por muitos indesejados portugueses enviados para a colônia além mar. O Acre também foi marcado por migrações espontâneas e forçadas das mais variadas desde finais do século XIX, mas para o poder estabelecido é sempre mais interessante marcar aspectos positivos dessa trajetória coletiva e “inventar” as tradições em torno dessas narrativas formadoras. Independente da coloração político-partidária, essa apropriação emerge e é reinventada em datas simbólicas -centenários ou datas “redondas”- que por coincidência marcou a ascensão de um grupo político ao poder no executivo acreano no inicio da primeira década do século XXI. Grupo que através de suas lideranças, chega ao cúmulo de imaginar uma linearidade temporal onde eles se colocam como redentores de ideias do passado que não foram efetivados em sua época.

Mas voltemos ao Rio de Janeiro. Ele já era a Cidade Maravilhosa quando desterrou tanta gente e como era o Acre em 1904 ou 1910?
O Acre era o oposto imagético da cidade do Rio de Janeiro. Esta era a capital da República recém-proclamada, cosmopolita, estava passando por reformas urbanas e arquitetônicas inspiradas em modelos europeus, que lhe deram o epíteto de Cidade Maravilhosa já em 1909. O Acre e suas vilas e espaços urbanos eram vistos como o oposto de tudo isso, pois a maioria da população vivia nas matas e colônias. Interpretava-se que a civilização, normas de bem viver, costumes refinados, presença do Estado nacional e o sentimento pátrio eram elementos frágeis ou ausentes no Território Federal do Acre recém incorporado ao Brasil. Como disse Euclides da Cunha, o Acre teve uma formação à gandaia, fora das bases do progresso nacional. Em suma, duas localidades que formavam diante desses imaginários e discursos uma antítese poderosa.

Como a sociedade acreana reagia à presença dos desterrados? Eles chegavam, digamos, carimbados como tal?
Pelas esparsas e frágeis informações, sabemos que a presença desses desterrados na Amazônia era de difícil aceitação. Antes mesmo da chegada deles, jornais locais, memórias e relatórios oficias de época expressam isso. A mácula de bandidos, prostitutas, gatunos, capoeiras, rebeldes, inadaptados à vida em sociedade, irá acompanhar esses homens e mulheres do embarque ao desembarque e perdurará localmente enquanto a lembrança e identificação deles forem possíveis. Muitos dos desterrados devem ter criado estratégias para mascarar ou apagar a marca que passaram a carregar como um estigma permanente, de difícil esquecimento coletivo e pessoal. Mas a má fama às vezes era útil, como denúncias feitas à época do uso de alguns desterrados como capangas do prefeito Acauã Ribeiro, do Departamento do Alto Acre.

A decisão de expulsar tanta gente foi uma decisão social e política?
Os dois elementos se conjugam. Foi política do ponto de vista do uso do estatuto do estado de sítio, expresso na Constituição Federal de 1891, que facultava ao presidente da República ou ao Congresso Nacional fazer uso desse expediente em momentos de “comoção intestina”. Decretado o estado de sítio, estavam suspensas várias garantias legais. Esse instrumento dava às autoridades o poder de desterrar, deportar e banir as pessoas acusadas de causar graves distúrbios sociais. Só que nem todas as pessoas acusadas de causarem distúrbios e serem culpadas de participação nas duas revoltas foram desterradas. Essa punição só foi adotadas contra sujeitos oriundos daquilo que na época era chamado “membros das classes perigosas”: pobres que transitavam na tênue linha do “bem viver e mal viver”. Portanto, o componente da origem social, independente da cor da pele, gênero e idade, foi um elemento definidor de que seria ou não desterrado.

A Sibéria tropical era mesmo imaginada pelas autoridades como um destino de morte certa?
Sim, muitos acreditavam que as regiões tropicais amazônicas e o Acre em particular se configuravam em localidades mortíferas devido a presença de doenças endêmicas que eram mais severas nos corpos dos adventícios que aportavam na região. À época, a literatura meédico-higienista apontava a questão dos ares corrompidos, águas pútridas e calores excessivos como elementos propícios para doenças cujas causas e vetores ainda não eram plenamente conhecidas. A construção discursiva de regiões insalubres, como a do Acre, eram bastantes frequentes em jornais, relatórios e escritos literários. As autoridades, portanto, estavam permeadas por esse tipo de pensamento quando decidem escolher o Acre como local de envio dos indesejados sociais do Rio de Janeiro.

Como o seu trabalho pode nos influenciar a rever concepções sobre o Brasil?
Talvez contribua para pensar o quanto o Estado brasileiro da Primeira República e a elite social da época eram fechados aos gritos e vozes descontentes e alijadas de direitos sociais e políticos. A questão social era caso de polícia e resolvida com o sufocamento e repressão vigorosas que barravam qualquer possibilidade alteração do modelo implantado em 1889, mas que mantinha algumas continuidades vigentes desde o regime imperial: latifúndio, participação restrita, modelo agroexportador, preconceitos de classe e cor. E os desdobramentos disso vão atingir e ter consequências para outras localidades distantes da capital federal.

Qual era o papel estatal à época, como os desterrados eram manipulados?
O Estado é o elemento de força e que implementa os desterros com poucas vozes contrárias ou silenciadas, que só tornaram isso publico após o fim dos respectivos estados de sítios. Os desterrados foram os bodes expiatórios e a demonstração de como as autoridades imbuídas de poder tratavam essas vozes e comportamentos vistos como dissonantes. Eles tornaram-se os indesejados da República e que servem para mascarar as contradições e fissuras internas da falta de hegemonia política daquela elite política em conflito. A situação, nos dois momentos, usa os desterros para causar medo nos adversários e capitalizar politicamente diante de seus apoiadores. Em sentido mais restrito, os desterrados em alguns momentos serão utilizados como mão de obra compulsória e barata, como foram nos trabalhos da Comissão Rondon e em trabalhos das prefeituras dos Departamentos do Acre Federal.

Os abusos eram tolerados, institucionalizados?
Parece que sim. Na prefeitura do Alto Juruá os desterrados viviam em cárcere privado, em um galpão da prefeitura, e realizavam trabalho compulsório. Na região do Madeira, trabalhavam também compulsoriamente e muitos foram fuzilados quando se opuseram às normas e regras dos superiores. No Departamento do Alto Acre, existem denuncias de muitos terem sido assassinados por autoridades locais e enterrados com atestados de óbitos falsificados pelos médicos da Prefeitura. Além disso, parece que pela mácula que carregavam os desterrados era mal vistos pela população local como criminosos irrecuperáveis e para os quais os castigos recebidos eram válidos.

Quem se beneficiou da presença dos desterrados?
Como foi dito anteriormente, os beneficiados com os desterrados foram as autoridades que os usaram como mão de obra compulsória parte deles. Foram usados como capangas políticos por autoridades locais e muitos desses desterrados refizeram suas vidas no Acre e em Rondônia, contribuindo às suas maneiras para o desenvolvimento, povoamento e diversidade da região.

Qual a matriz do degredo, desterro e banimento no período imperial, bem como do desterro republicano?
As formas de expulsão de indesejados sociais e políticos têm uma matriz muito antiga: gregos e romanos já faziam isso. Portugal utilizava indesejados metropolitanos como mão de obra e povoamento da sua Colônia americana. Quando vem a ruptura com Portugal, em 1822, o Brasil Imperial conserva as práticas do degredo e desterro internos no território nacional. A República aboliu o degredo, visto como degradante (palavras de mesma raiz semântica), mas mantém o desterro (interno e só para nacionais), banimento (de nacionais para fora do território pátrio) e a deportação (de estrangeiros para seus países de origem).

O Acre virou porta de entrada de imigrantes de várias partes do mundo, sobretudo de haitianos. Como você avalia essa nova realidade? O que é o Acre hoje?
Há uma diferença, pois os haitianos a princípio chegam voluntariamente. Mas seus deslocamentos são atravessados por elementos que fogem ao controle deles quando resolvem partir -máfias, coiotes, roubos, violências etc. O ponto de semelhança talvez seja o fato de que localmente eles são vistos como elementos indesejados por vozes difusas que ecoam através de conversas e na imprensa por pessoas de diferentes classes ou grupos sociais. O fato é que o “outro” muitas vezes serve para reforço de uma autoidentidade coletiva e individual, onde a comparação serve para elevar o coletivo “nós” ou o individual “eu” e diminuir, macular, rebaixar o “outro”, o adventício, aquele que chega sem ser “convidado” e querido.

sábado, 10 de agosto de 2013

Aeroporto e BR-364 piores a cada reforma

Do senador Jorge Viana (PT-AC) sobre a pista do aeroporto Plácido de Castro, de Rio Branco:

- É um absurdo as obras não ter fim e um serviço que hoje é caro e precário ficar pior a cada reforma feita. A reforma da pista em agosto e setembro vai implicar em aviões menores e preço de passagem maior, ou seja, quem perde é o cidadão.

Resta saber se o senador tem a mesma opinião em relação à BR-364, que já consumiu mais de R$ 1,3 bilhão e permanece inacabada e praticamente intrafegável.

Se a catraia não virar

Capa do livro da acreana Olivia Maria Maia, que vive em Brasília desde 1972, onde se formou em sociologia e psicologia e teve filhos e netos.

- Ousei, com este novo trabalho, fazer travessia no rio da minha terra, e também em rios de palavras - diz a autora.

Lançamento em Brasília dia 17 de agosto, às 19h30, no Bar do Brasil (202 Norte).

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

"Ir para o Acre" ainda é sinônimo de morrer


Ao pesquisar para entrevistar o professor Francisco Bento, autor do livro "Acre, a Sibéria Tropical", encontrei na web registro de um protesto do então senador Nabor Júnior (PMDB-AC), de agosto de 1997. Faz 16 anos, mas o dicionário Aurélio não mudou um dos sinônimos do verbete morrer:

Nabor: verbete de dicionário desrespeita o Estado do Acre

O senador Nabor Júnior (PMDB-AC) criticou hoje (dia 18) a inclusão da expressão ir para o Acre entre os sinônimos do verbete morrer, na 2ª edição do dicionário Aurélio. Ele afirmou que está interpelando judicialmente a Editora Nova Fronteira, responsável pela publicação do dicionário, para cobrar uma explicação sobre as origens e condições em que foi colhido o conceito.

Nabor Júnior lembrou que para um conceito ser reconhecido e citado em um dicionário como o Aurélio, o verbete deve passar antes por avaliação criteriosa de importância e veracidade. Ele disse que deixar de fazê-lo em um caso é a abertura para outras leviandades, "escancarando as páginas para delírios e retaliações desprovidas de dignidade ou base científica". O senador considerou a inclusão do significado uma agressão ao Acre e disse que esse estado "não pode ficar exposto à chacota gratuita e maldosa".

- O que terá mudado, entre a primeira e a segunda edição do festejado dicionário, para que o Acre passasse a ser considerado o cemitério alegórico dos brasileiros? Onde os renovadores do legado de Aurélio Buarque de Holanda foram descobrir, inventar ou falsear essa definição, de tão mau gosto e de legitimidade duvidosa? - indagou. Para Nabor Júnior, essa questão, embora possa parecer de pouca importância, refere-se, na verdade, "à dignidade e à preservação da imagem do estado do Acre".

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

MP faz grampos em mais de 16 mil telefones; Secretário de Segurança do AC entende que não há necessidade de instrumentos formais de cooperação

POR RODRIGO HAIDAR

Enquanto o Supremo Tribunal Federal não define os limites do poder de investigação do Ministério Público, a instituição vai se equipando para conduzir inquéritos e produzir suas próprias provas para os processos penais em que atua. É o que revela relatório apresentado nesta terça-feira (6/8) pelo conselheiro Fabiano Silveira, do Conselho Nacional do Ministério Público.

Das 30 unidades do Ministério Público brasileiro, 21 possuem ou têm acesso a sistemas de monitoramento de interceptações telefônicas. Das 21 unidades, 17 possuem equipamento próprio para fazer as gravações e quatro usam equipamentos cedidos por órgãos do Poder Executivo estadual para gravar conversas de alvos de suas investigações.

De acordo com informações do relatório, repassadas pelas próprias unidades do MP, a instituição já investiu R$ 8,3 milhões para a aquisição de três tipos de sistemas de grampos telefônicos, sem contar custos de manutenção dos sistemas. Em apenas dois casos foi feita licitação para a compra dos equipamentos: o MP de São Paulo fez pela modalidade pregão e o MP de Mato Grosso do Sul por tomada de preços. As outras 15 unidades do Ministério Público compraram o equipamento com dispensa ou por inexigibilidade de licitação.

Onze unidades do MP usam o sistema Guardião — oito compraram o sistema e três usam por cessão de secretarias de estado. Outras seis unidades usam o Wytron e quatro, o Sombra. O relator também revela que em maio de 2013, o MP monitorava 16.432 telefones e 292 e-mails. E 9.558 pessoas eram investigadas.

Leia mais no site Consultor Jurídico

Veja o relatório

No relatório do Conselho Nacional do Ministério Público, a pedido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,  o secretário de Segurança Pública do Acre, Ildor  Reni Graebner, informou que no âmbito do Poder Executivo do Estado do Acre  só existe um Sistema Guardião, que serve basicamente à Polícia Judiciária, assim como ao Ministério Público e ao Judiciário. O secretário entende que não há necessidade de  instrumentos formais de cooperação, tendo em vista que as ações desenvolvidas fazem  parte das atribuições e competências institucionais desses órgãos, ressaltando haver “constante parceria harmoniosa entre os poderes do Estado”.

Por sua vez, o Ministério Público do Estado do Acre (MP-AC) informou que não possui em suas instalações ou dependências e nunca possuiu ou adquiriu  o Sistema Guardião ou sistema congênere.

Nas informações prestadas pela procuradora de  Justiça Kátia Rejane de Araújo Rodrigues, Procuradora-Geral Adjunta para Assuntos  Administrativos e Institucionais, no exercício da Procuradoria-Geral de Justiça, há o  registro de que no Estado do Acre, conforme Decreto Estadual nº 2.823/2011, só existe o  Sistema Guardião, administrado e gerenciado exclusivamente pela Secretaria de Estado de  Segurança Pública.

De acordo com o relatório, em informações complementares, a procuradora geral de Justiça do Estado do Acre, Patrícia de Amorim Rêgo, esclareceu que os membros e servidores do MPE-AC não utilizam e não têm acesso ao Sistema Guardião da Secretaria de Segurança Pública, que detém a atribuição exclusiva de administrá-lo e gerenciá-lo.

Clique aqui e leia o relatório completo.

Promotora critica homenagem do Ministério Público ao governador Tião Viana

O Colégio de Procuradores de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre (MPE-AC) decidiu agraciar pessoas "que, por seus méritos e relevantes serviços prestados à cultura jurídica, à sociedade acreana ou ao Ministério Público, mereçam especial distinção".

A decisão, tomada no dia 24 de julho, foi publicada na edição do Diário Oficial do Acre de segunda-feira (5) para concessão de uma comenda do cinquentenário do MPE-AC. Entre os homenageados, o governador Tião Viana, o presidente da Assembleia Legislativa, Elson Santiago, e o presidente do Tribunal de Justiça, Roberto Barros.

A promotora de Justiça de Defesa do Consumidor, Alessandra Marques, reagiu contra a homenagem ao governador Tião Viana. Veja a mensagem que a promotora enviou na segunda-feira a todos os membros do Ministério Público:

- Senhores e Senhoras Membros do MP AC, foi com profundo pesar e com a mais sincera vergonha que tomei conhecimento hj de que alguns membros do MP decidiram condecorar mais de cem pessoas, dentre as quais o atual chefe do executivo estadual. A absurda ideia mistura relações particulares com o interessa público, e é vergonhosa por três especiais razões. A primeira delas consiste no fato de que dar prêmio a si mesmo, aos membros, é ridículo e pura soberba. A segunda reside no fato de que banalizar premiações é dar a essas o mais verdadeiro desvalor, pois quantos ganham, p ex, o Nobel? Mas, o mais grave de tudo é homenagear o chefe do executivo estadual, que deve ter seus atos fiscalizados pelo MP constantemente. E, ainda que nunca tenha sido investigado, o que já é preocupante, mesmo que seja um verdadeiro Francisco, ainda assim, quem o fiscaliza não pode premiar. Deixo assim registrado que, como o MP somos todos nós, jamais premiarei um chefe do executivo, seja ele ou ela quem for, de forma que esta homenagem não é do MP, pois sou MP também. Esse prêmio será dado por membros do MP, pela instituição, jamais. E não venham me dizer que se não gosto do que alguns fazem devo cair fora, porque esse lugar também me pertence, e ninguém irá me calar!

A procuradora geral de Justiça, Patrícia Rego, está em Brasília, onde recebe um prêmio do Conselho Nacional do Ministério Público. O MPE-AC foi o único da região norte premiado por possibilitar que usuários de drogas tenham oportunidade de reinserção social com tratamento de saúde adequado a partir do Núcleo de Atendimento Terapêutico (Natera).

Consultada por telefone, Patrícia Rego disse que a reação da promotora Alessandra Marques "é um exercício do direito de manifestação de opinião que todo mundo tem".

- Nós temos uma medalha de mérito, para distinguir pessoas que colaboraram de alguma forma para o engrandecimento da instituição. A decisão do Colegiado de Procuradores criou uma comenda específica para a comemoração dos 50 anos do Ministério Público do Acre. A ideia da comenda é homenagear as pessoas que contribuíram com o MPE, o que inclui todos os procuradores que chefiaram a instituição  os ex-corregedores e os ex-presidentes da Associação dos Membros do Ministério Público. Além disso, decidimos condecorar os chefes do Judiciário, Legislativo e Executivo, pois compete ao MPE, por missão constitucional, zelar pelo respeito e o prestígio dos poderes do Estado. Decidimos ampliar a homenagem ao presidente do Tribunal de Contas e ao presidente da OAB, pois são instituições cuja atuação convergem em várias missões semelhantes à do MPE na sociedade. A resolução foi aprovada de forma unânime, mas outros nomes, além dos que constam na lista, serão homenageados em dezembro. Tomamos conhecimento da opinião da promotora e sabemos lidar com isso sem afetação.

Veja a lista dos que que já foram selecionados para receber a Comenda do Cinquentenário do MPE-AC:

Ex-Procuradores Gerais de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre, Drs. Lourival Marques de Oliveira, Jersey Nazareno Nunes, Manoel Antônio da Cruz, João Ramos Torres de Mello Filho, Ciro Facundo de Almeida, Felipe Assef, Antônio Guedes Dantas, Edmar de Azevedo Monteiro, Yoshio Suzuki de Oliveira, Walter Limão Montilha, Nilo Figueiredo Maia, Raimundo Nascimento de Carvalho, Vanda Denir Milani Nogueira, Edmar Azevedo Monteiro Filho, Eliseu Buchmeir de Oliveira, Giselle Mubarac Detoni, Sammy Barbosa Lopes, aos Ex-Corregedores Gerais do Ministério Público do Estado do Acre, Drs. Manoel Leite Araripe, Francisco Matias de Souza, Samoel Martins Evangelista, Cosmo Lima de Souza, Oswaldo D´Albuquerque Lima Neto, Ubirajara Braga de Albuquerque, Flávio Augusto Siqueira de Oliveira, aos Ex-Presidentes da AMPAC, Drs. Durval Vieira Maia, Maria de Salete Costa Maia, Getúlio Barbosa de Andrade, Celso Jerônimo de Souza, Ricardo Coelho de Carvalho, ao Governador do Estado do Acre, Tião Viana, ao Presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Acre, Elson Santiago, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, Desembargador Roberto Barros, ao Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Acre, Valmir Ribeiro e ao Presidente da OAB, Seção Acre, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Estado Independente do Acre

Como um militar gaúcho no comando de um bando de seringueiros destreinados redefiniu o mapa do Brasil e conquistou a região oeste da Amazônia




Altino Machado, de Rio Branco

Ainda era madrugada de 6 de agosto de 1902. A guarnição boliviana ainda dormia na cidade de Xapuri, que décadas depois, já como cidade brasileira, se tornaria famosa por causa do sindicalista Chico Mendes. Um pequeno grupo de 33 seringueiros brasileiros, armados com rifles, desembarcou de suas canoas. Subiram o barranco íngreme do Rio Acre e tomaram posição em pontos estratégicos, divididos em três grupos. Os bolivianos estavam exaustos. Haviam comemorado na véspera a data nacional de seu país, com muito, muito álcool. O militar brasileiro Plácido de Castro, que comandava os seringueiros, seguiu em silêncio até a grande casa de madeira onde funcionava a Intendência do país vizinho. Dios Fuentes, o intendente e maior autoridade do local, despertou de um salto e, pensando tratar-se de um compatriota, ainda com sono, avisou:

–– Es temprano para la fiesta.  

Castro retrucou:

–– Não é festa, senhor intendente. É revolução.

Terra sem lei

Tão logo o intendente boliviano se rendeu, os brasileiros recolheram as armas e aprisionaram a guarnição. Era o começo da Revolução Acreana. Com a população de Xapuri em festa – muitos confundiram o movimento com o Dia da Independência da Bolívia –, Plácido de Castro anunciou o sucesso da revolta e justificou a ação com o argumento de que em troca de favores financeiros, La Paz pretendia entregar a região ao capital norte-americano e britânico na forma do chamado Bolivian Syndicate. A ideia era ocupar com soldados e explorar a região por pelo menos 30 anos. O Acre era uma região da Bolívia, mas a cada ano, entre o final do século 19 e o início do século 20, aumentava o número de brasileiros, especialmente nordestinos, que corriam para lá em busca da riqueza da borracha.

A Bolívia estava disposta a recuperar o território por causa dos lucros que poderia aferir com a borracha, uma das commodities mais desejadas em um mundo que começava a ser desbravado pelo automóvel e pelo uso industrial do látex. O governo brasileiro não pleiteava a região. Portugueses e espanhóis haviam definido que o Acre era boliviano desde 1750, com o Tratado de Ayacucho. Em 1898, o Brasil independente reconheceu que o território pertencia mesmo à Bolívia. Mas como era distante, de difícil acesso e em plena floresta amazônica, os bolivianos não se interessaram em colonizar a região. Até aparecer o interesse internacional pela borracha.

O gaúcho Plácido de Castro chegou à Amazônia em 1899, aos 26 anos, depois de viver no Rio de Janeiro e em São Paulo. Três anos depois, seringalistas (compradores e distribuidores do látex) viram no militar, que havia lutado na Revolução Federalista do Rio Grande do Sul, uma oportunidade para ampliar seu território. Ofereceram a Castro armas, munição e dinheiro para enfrentar os bolivianos. Ele, imaginando que poderia ganhar dinheiro demarcando os latifúndios da seringa (era formado em agrimensura), topou treinar e comandar 2 mil seringueiros, a maioria armado apenas com facões.

Estado soberano

A Revolução Acreana durou pouco, desde a ação de 6 de agosto. Terminou em 24 de janeiro de 1903, e as ações mais agudas, decididas rapidamente, facilitou o desfecho favorável para os brasileiros. De acordo com o especialista em história do Acre Marcos Neves, o principal fator de sucesso foi o fato de pela primeira vez se formar um exército organizado na região. “Era composto por seringueiros sem experiência militar, mas foi suficiente para direcionar corretamente os esforços militares na região”, afirma Neves. “E nesse aspecto a experiência de Castro foi fundamental.”

Depois da vitória militar, coube a Castro organizar a vida política e administrativa do novíssimo Estado Independente do Acre. Seu decreto número 1, de 26 de janeiro de 1903, mandava aplicar à justiça civil, criminal e comercial a lei brasileira, até que se promulgasse a Constituição do Estado soberano. Considerou válidos todos os títulos de propriedade, definitivos ou provisórios, expedidos pela Bolívia e pelo Estado do Amazonas. Definiu o português como língua oficial e adotou o padrão monetário do Brasil. Mas encontrou inimigos em seus antigos aliados. “Rodrigo de Carvalho e Gentil Norberto, os principais articuladores da Revolução Acreana com o governo do Amazonas, tornaram-se seus adversários”, afirma o professor Eduardo Carneiro, da Universidade Federal do Acre. “Os dois acusavam Plácido de Castro, entre outros, de ter acumulado riquezas com a revolução.” Em carta ao Barão do Rio Branco, Rodrigo de Carvalho, ministro da Fazenda, Justiça e Guerra do Estado Autônomo, enviou tempos depois uma carta ao Barão do Rio Branco repleta de acusações. “Plácido de Castro não é honesto; é feroz e sanguinário”, registrou.

Nos meses que seguiram à vitória de Plácido na Revolução Acreana, a diplomacia brasileira agiu rápido. O Barão do Rio Branco convenceu os bolivianos a evitar um conflito armado de consequências imprevisíveis na região.

Primeiro território

No dia 17 de novembro de 1903, o Acre foi finalmente incorporado ao Brasil com a assinatura do Tratado de Petrópolis. O país pagou à Bolívia 2 milhões de libras esterlinas (o equivalente hoje a XX milhões de reais) e indenizou o poderoso Bolivian Syndicate com 110 mil libras (cerca de XX milhões de reais) por causa da rescisão de contrato de arrendamento que havia sido firmada com o governo boliviano. Também cedeu terras no Amazonas e se comprometeu a construir a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré para escoar a produção boliviana pelo Rio Amazonas.

No princípio de 1904, o Acre se tornou o primeiro Território Federal da história brasileira. Exemplo de um novo sistema político-administrativo, não previsto na Constituição, pelo qual seria gerido diretamente pela Presidência da República, a quem caberia nomear seus governadores e arrecadar os impostos. Transformado em herói pelos locais, Plácido de Castro tornou-se uma ameaça para as novas autoridades brasileiras que passaram a gerir o território. O presidente de República, a mais de 4 mil km de dist6ancia dos problemas acreanos, nomeava sucessivamente militares, magistrados ou políticos derrotados em eleições para governar o primeiro Território Federal.

 Afastado do poder, mas com muito cacife político, Castro virou latifundiário e gerenciava um seringal, até que resolveu voltar à política defendendo a criação de um Estado independente. Em agosto de 1908, a situação era de conflito entre ele e o prefeito de Alto Acre, o coronel Gabino Besouro, que o acusou de planejar uma revolta armada. Neste cenário, cinco anos depois de dar início à Revolução Acreana, o militar gaúcho deixou Rio Branco em direção ao seu seringal, o Capatará, com seu irmão, Genesco, dois amigos e um funcionário. No dia 9, o grupo cruzou o Igarapé Distração preocupado com o alerta de Castro, conhecedor do região: “Esse é o lugar das emboscadas”. Mal atravessaram, foram recebidos por 14 homens armados. O militar recebeu dois tiros a queima roupa: um no braço, outro que perfurou seu pulmão esquerdo. Ainda assim, conseguiu esporear o cavalo e fugir. Foi socorrido por um amigo, o seringalista João Rola, que apareceu com 20 homens armados e o levou para sua casa, no seringal Benfica. O local foi atacado à noite e no dia seguinte pelo mesmo grupo da emboscada. Antes de morrer, às 16h do dia 11 de agosto, aos 35 anos, pediu ao irmão que tirasse seus ossos do Acre. Segundo Genesco, estas foram suas últimas palavras:

Direi como aquele general africano: “Esta terra que tão mal pagou a liberdade que lhe dei é indigna de possuí-los”. Ah, meus amigos, estão manchadas de lodo e sangue as páginas da história do Acre...

O nome de Plácido de Castro está inscrito no "Livro dos Heróis da Pátria, que se encontra no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília, desde 2002, como o Libertador do Acre, ao lado, entre outros, de Dom Pedro I, Duque de Caxias, Santos Dumont e Chico Mendes, que, nascido em Xapuri, não fosse pelo militar gaúcho, seria um famoso boliviano.

“A posteridade o julgará” - A furiosa carta da mae de Plácido de Castro

Em 1929, o senador J. Pires Ferreira apresentou um projeto de lei que promovia postumamente Plácido de Castro a general. A honraria não convenceu a mãe do militar, Zeferina, de 92 anos, que enviou uma carta ao político. A seguir, os principais trechos.

“Chegando ao meu conhecimento que transita pelo Senado Federal um projeto de lei de autoria de Vossa Excelência dando honras de general ao meu pranteado filho, J. Plácido de Castro, e de coronel a dois dos principais cúmplices no seu assassinato – Gentil Tristão Norberto e Antônio Antunes de Alencar – venho pedir-lhe o grande favor de retirar o nome do meu filho do mesmo projeto.

Em vida, ele nada pediu à sua pátria e nada recebeu além da perseguição, da injúria, da calúnia e da morte por mão das principais autoridades federais; é justo que depois de morto, quando de nada precisa, também nada receba. Os governos já tripudiaram muito sobre o seu nome e sobre a sua memória...

É preciso que a Pátria seja coerente: com honrarias póstumas ela não ressuscita a vítima nem lava as máculas do passado. Continue ela a proteger, amparar e distinguir os assassinos, procurando apagar os vestígios da covarde tragédia de 9 de agosto de 1908 e a transformar os criminosos em heróis. Isso é justo: mas que aos 92 anos eu veja o nome do meu filho servir de escada para a ascensão dos seus matadores, isso é demais...

A posteridade julgará meu filho, e é o bastante."

Meu reino por dois cavalos

Na Bolívia, a culpa pela perda do Acre para o Brasil é creditada ao presidente Mariano Melgarejo. Ele negociou com o Brasil um tratado sobre os limites ainda durante a Guerra do Paraguai (1820-1871). O governo brasileiro, temeroso de criar uma fronteira hostil no norte, topou renegociar o Tratado de Ayacucho, de 1867. O cônsul brasileiro na Bolívia, Regino Correa, conhecia a paixão de Melgarejo  por equinos e o presenteou, antes de começar as negociações com um casal de cavalos brancos.

Conta-se que o boliviano ficou tão feliz com o presente que deu de presente ao Brasil “dois dedos” de terra marcados no mapa, pois se tratava de uma área despovoada. A linha divisória que era reta desde 1750 tornou-se oblíqua, a origem da chamada Linha Cunha Gomes (veja mapa). As terras do norte da Cunha Gomes são do Amazonas. As do sul são as conquistadas pela Revolução Acreana. O historiador Marcos Neves afirma que a história é “estranha” e muito pouco conhecida no Brasil. Mas reconhece que, à época, era importante para o Brasil neutralizar qualquer aliança entre Bolívia e Paraguai.



A sequência dos conflitos

Tomada de Xapuri - 06 de agosto de 1902

Inicio da última e mais sangrenta fase da Revolução Acreana. Xapuri foi tomada pelo exército revolucionário acreano, sem o disparo de nenhum tiro.

1º Combate da Volta da Empresa - 18 de setembro de 1902

Tropas comandadas por Plácido de Castro foram emboscadas e derrotadas na Volta da Empresa (atual Rio Branco) por um pelotão boliviano comandado pelo general Rozendo Rojas.

Combates do Telheiro e do Bom Destino – 23 e 24 de setembro de 1902

De Puerto Alonso (atual Porto Acre) partem ataques do exército boliviano contra os seringais Telheiro e Bom Destino de Joaquim Victor, mas são derrotados pelos revolucionários brasileiros.

2º Combate da Volta da Empresa - 05 a 15 de outubro de 1902
Plácido de Castro volta a atacar a Volta da Empresa que tinha posição estratégica para o domínio do médio rio Acre. Depois de dez dias de luta vence e toma o povoado.

Combate do Bahia – 11 de outubro de 1902

De Xapuri parte uma coluna revolucionária para dominar o barracão do igarapé Bahia, mas são atacados e derrotados pelos seringueiros e campesinos bolivianos que formavam a famosa Coluna Porvenir.

Combates de Santa Rosa e Costa Rica – Novembro e dezembro de 1902

Para consolidar o domínio do médio e do alto Acre, Plácido de Castro ataca povoados bolivianos as margens do Abunã e do Tahuamano, destruindo-os e vingando o massacre de brasileiros no igarapé Bahia.

Combate de Porto Acre – 15 a 24 de janeiro de 1903

Depois de seis meses de guerra, Plácido de castro e seu exército de seringueiros vence o exército regular da Bolívia e toma seu o quartel general em Puerto Alonso. Foi a vitória definitiva da Revolução que tornou o Acre brasileiro.

Fonte: revista Aventuras na História, da Editora Abril


segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Livro esmiuça conflito que tornou o Acre parte do Brasil

POR EDUARDO DAVIS

O poderio bélico e econômico que o Brasil tinha há mais de 100 anos permitiu a negociação do Acre, território cedido pela Bolívia pelo que hoje seria cerca de US$ 312 milhões, revela o livro "Relaciones Brasil-Bolivia. La definición de las fronteras" de Walter Auad Sotomayor.

Durante oito anos, o jornalista boliviano examinou minuciosamente documentos de ambos os países sobre o "conflito do Acre" e as negociações que levaram à cessão do território ao Brasil, assim como os acordos anteriores de fronteiras que significaram perdas territoriais para a Bolívia no Mato Grosso.

O resultado foi o livro publicado pela Plural Editores, que será lançado na próxima semana em La Paz, Cochabamba e Santa Cruz de la Sierra.

Sotomayor, que mora no Brasil há 40 anos, contou à Agência Efe que seu trabalho é "uma aproximação das ideias do momento de formação dos Estados nacionais na América", que permitem entender alguns processos ainda em curso no século XXI.

O primeiro acordo de fronteiras entre Brasil e Bolívia foi assinado em 1867, após sucessivas conversas nas três décadas anteriores.

Foi estipulado em plena crise regional que provocou a Guerra da Tríplice Aliança, que uniu Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai, e forçado pelo temor de um possível apoio boliviano a Assunção, disse Sotomayor.

Devido ao bloqueio que a guerra do Paraguai impunha, na época a Bolívia era o único corredor que o primeiro tinha para se abastecer e manter contato com o exterior, o que dotou o país andino de um grande valor estratégico.

Apesar da posição de força que essa condição dava à Bolívia, o Brasil acabou ganhando na negociação um território calculado em 150 mil quilômetros quadrados, superior à área de Portugal e à da Áustria, explicou Sotomayor.

Em parte, o autor atribuiu a perda a "presentes, condecorações e declarações de amizade" às quais "era muito sensível o (então) ditador boliviano, Mariano Melgarejo" e que o Brasil ofereceu com fartura.

A segunda parte da pesquisa enfoca o "conflito do Acre", território que pertencia à Bolívia, mas que o país não ocupava e que no fim do Século XIX exploravam os "barões" brasileiros da borracha e outros bolivianos, embora em menor número.

Os empresários dos dois países tinham bases nas cidades brasileiras de Manaus e Belém, já que era pelo rio Amazonas que escoava à Europa a borracha que deu à região a prosperidade que jamais alcançaria novamente.

Segundo Sotomayor, a origem do conflito, que ocorreu entre 1899 e 1903, foi a decisão boliviana de estabelecer uma alfândega na região e passar a exercer sua soberania, com a devida cobrança de impostos.

Isso gerou uma forte reação dos barões brasileiros, que formaram milícias clandestinas combatidas pelo exército boliviano no meio da selva.

No auge do conflito, entre 1902 e 1903, o Brasil "havia mobilizado 8 mil soldados", frente aos mil deslocados pela Bolívia, sustenta Sotomayor.

Segundo a pesquisa, "os historiadores omitiram o número de mortos", que até hoje é um mistério.

Durante o conflito houve episódios curiosos, como a decisão boliviana de arrendar o Acre a um grupo anglo-americano indenizado depois pelo Brasil, e a declaração de "independência" da região proclamada em 14 de julho de 1899 pelo espanhol Luis Gálvez, um aventureiro que havia chegado em busca do "El Dorado".

O espanhol foi inclusive "presidente" da "República Independente do Acre", que não durou mais de seis meses e acabou abolida pelos mesmos barões da borracha brasileiros que a apoiavam.

A solução do conflito foi alcançada por José María da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco e ministro das Relações Exteriores do Brasil de 1902 até sua morte, em 1912.

Hábil negociador, Rio Branco já havia dado fim a diferenças com a França na Guiana e a outras com a Argentina, e, segundo Sotomayor, à solução do conflito com a Bolívia deveu "grande parte de seu prestígio como diplomata".

O diplomata carioca levou a Bolívia à mesa de negociações, embora Sotomayor defenda que deu até de um "ultimato" e ameaçou deslocar mais tropas rumo à região, ao que o país andino não teria resistido.

O fim do conflito foi selado com o Tratado de Petrópolis, de 1903, que custou à Bolívia outros 187 mil quilômetros quadrados, em troca de 2 milhões de libras esterlinas e da construção de uma ferrovia na fronteira.

Eduardo Davis é repórter da agência EFE

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

CNJ pede informações sobre denúncia de tortura em presídio no Acre

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apura o caso de um preso que diz ter sido torturado até ficar cego e tetraplégico no presídio Antonio Amaro Alves, em Rio Branco/AC. O Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ) vai pedir informações sobre o caso ao Juízo de Execução Penal responsável por fiscalizar as condições do presídio e ao juiz que determinou a prisão do detento. Após receberem a comunicação do CNJ, ambos terão prazo de 20 dias para responder.

A denúncia da tortura chegou ao CNJ por meio de uma notícia publicada na imprensa quarta-feira (31/7). Segundo o Blog da Amazônia, hospedado no Portal Terra, o detento W.F.S. está há quase dois meses internado em um leito do Hospital de Urgência e Emergência de Rio Branco sem conseguir enxergar ou sair da cama. Falando com dificuldade, relata em um vídeo postado pelo blogue ter sido agredido por agentes penitenciários com uma marreta de borracha, spray de pimenta, além de socos e chutes.

Receberão cópias dos pedidos de informações o Ministério Público do Estado do Acre, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e a Ouvidoria do Departamento Penitenciário Nacional (Depen/MJ). “Vamos informá-los para que adotem as providências que entenderem cabíveis”, afirma o coordenador do DMF, juiz Luciano Losekann.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias