quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Iphan embarga fazenda Niectheroy por "atos criminosos" contra geoglifos

Antes e depois: imagem do geoglifo da fazenda Niectheroy em 2018 e 2021
 
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) constatou "atos criminosos" contra quatro sítios arqueológicos do tipo geoglifos, sendo cinco estruturas circulares e duas estruturas quadriláteras, e, por isso, embargou quaisquer atividades que promovam revolvimento de solo na área da fazenda Niectheroy, no município de Senador Guiomard (AC), com vistas ao plantio de milho e soja.


O embargo decorre de uma fiscalização do Iphan, realizada no final de julho. Os sítios arqueológicos foram impactados pelo plantio de milho, sendo mutilados e destruídos, bem como impactados pela presença de extensas plantações de milho no entorno.

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Por considerar que o sítio arqueológico "possui uma indubitável significância pré-histórica", a superintendente do Iphan no Acre, Amanda da Costa Vasconcelos, relatou o caso  à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal.

Segundo o Iphan, o plantio de milho e soja é irregular do ponto de vista do licenciamento arqueológico, uma vez que o proprietário o realizou à revelia do órgão, isto é, sem anuência da superintendência.

A fazenda pertence ao pecuarista Flavio Maia Cardoso, que mora na Fazenda Paulista, em Santa Terezinha de Itaipu (PR). O filho dele, Henrique Luis Cardoso, possui procuração como responsável pelo empreendimento.

Os donos da fazenda não apresentaram, desde 2015, o Projeto de Avaliação de Impacto ao Patrimônio Arqueológico, que necessita ser previamente autorizado por portaria do Iphan.

De acordo com laudo de vistoria da arqueóloga do Iphan Antonia Damasceno Barbosa, das sete estruturas, duas estão totalmente cobertas por plantio de milho, uma está parcialmente na área de pasto e na área de plantio de milho e outras três estruturas ela não conseguiu acessar.

–– No geral, observou-se que os sítios arqueológicos foram impactados pelo plantio de milho. Constatou-se, na fiscalização, que as estruturas de terra (geoglifos) foram impactadas/mutiladas e destruídas, bem como a presença de extensas plantações de milho no entorno –– escreveu a arqueóloga.

Ela relatou que ao caminhar pela área que compreende as estruturas do sítio arqueológico não foi possível visualizar as valetas e muretas características do sítio, o que a faz acreditar que, no momento do arado, o solo foi aproveitado para nivelar o terreno, aterrando assim as valetas e mutilando as muretas das estruturas de terra (geoglifos).

–– Ademais, deve-se considerar também que o sítio está localizado em uma área de alto potencial arqueológico, e, portanto, é bastante provável que hajam materiais arqueológicos para além daqueles visualizados durante a fiscalização –– acrescenta Antonia Damasceno Barbosa.

A arqueóloga assinalou que a necessidade de anuência do Iphan era de pleno conhecimento do proprietário, que protocolou Ficha de Caracterização de Atividade do empreendimento.

O Iphan atua com o objetivo de salvaguardar o patrimônio cultural do Estado Brasileiro e está amparado pela Lei no 3.924 /61 que proíbe, em todo o território nacional, o aproveitamento econômico, a destruição ou mutilação, para qualquer fim, das jazidas arqueológicas ou pré-históricas.

A execução do plantio implica numa situação irregular do ponto de vista da lei, pois não tem a anuência do Iphan.

As estruturas dos sítios arqueológicos que foram destruídos ou mutilados fazem parte do Processo de Instrução do Tombamento dos Geoglifos no Iphan e quando começaram a ser estudadas tinham de 25% a 75% grau de integridade e eram consideradas em ótimo estado de preservação.

No laudo de vistoria, de 12 páginas e dezenas de fotos, a arqueóloga do Iphan fez as seguintes recomendações:

1. Notificação ao proprietário sobre a destruição do sítio arqueológico, com ciência dos atos criminosos contra o patrimônio arqueológico.

2. Embargo do empreendimento Fazenda Niectheroy.

3. Fiscalização dentro de 30 dias para averiguar se as atividades estão paralisadas.

4. Que órgão ambiental seja questionado se: a) Há processo de licenciamento relativo ao plantio da Fazenda Niectheroy? A área onde estão localizados os sítios arqueológicos fazem parte desse processo? b) Foi emitida Licença para o plantio nesta propriedade? c) Foi exigido ao proprietários da Fazenda Niectheroy estudo arqueológico prévio à emissão das licenças ambientais ou requereu que o empreendedor apresentasse anuência do Iphan?

5. Que a Polícia Federal e MPF sejam acionados.

O Iphan concedeu 15 dias, a contar de 9 de de agosto, data da comunicação do embargo, para que o proprietário apresente informações sobre andamento do licenciamento ambiental e existência de licença ambiental para o empreendimento.

A fazenda Niectheroy mede 3,8 mil hectares, sendo 2,4 mil hectares de área projetada para plantio de milho e soja, 1,3 hectares de reserva legal mais área de preservação permanente e 89 hectares de área consolidada de multiuso.

O blog não conseguiu localizar o responsável pela empreendimento na fazenda Niectheroy até a publicação desta nota.

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