sábado, 2 de fevereiro de 2013

MORTE DE UM JOVEM

POR GABRIEL SANTOS 


Também morri em Rio Branco, no Acre. Quem não morreu aqui?

A cidade nunca esteve tão perigosa. A displicência dos governantes nunca foi tão clara. E o medo nunca foi tão presente.

Morri porque nem só a morte mata, mas o medo, a violência e a insegurança, também, nos privam da vida.

Morri porque sou jovem e quando saio para me divertir, deixo meus pais aflitos por não saberem se irei voltar.

Morri porque fui assaltado oito vezes nos últimos dois anos.

Morri porque não sei se meu desejo de envelhecer em lugar tranquilo será possível. Nem sei se será possível envelhecer.

Morri porque parte de um amigo meu morreu quando o pai dele foi assassinado em um assalto.

Morri porque a viatura da polícia demorou a chegar.

Morri porque tenho que atravessar a cidade inteira para ir à delegacia mais próxima.

Morri porque, chegando lá, os plantonistas não estavam presentes e tive que faltar ao trabalho no dia seguinte para fazer a queixa.

Morri porque esse pequeno Estado é incapaz de formar um serviço de investigação eficiente.

Morri porque temos um sistema prisional prestes a explodir, que não ressocializa ninguém e nem há vontade política para que isso aconteça.

Morri porque continuamos privando nossas crianças da cultura e da educação de qualidade.

Morri porque estamos perdendo nossos jovens para o tráfico e nada é feito para cessar esse absurdo.

Morri nas mãos da violência, preso na insegurança, sufocado pelo medo.

Morri porque estamos criando assassinos e vítimas, em vez de criarmos seres humanos.

Gabriel Santos é estagiário na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional

6 comentários:

joaomaci disse...

Um talento literário! E como tal, uma capacidade de análise da realidade social que a maioria daqueles que ocupam cargos de governo no Acre não tem, ou fingem que não tem.

Jozafá Batista disse...

Belo texto, parabéns! Só faço um adendo: não é possível "ressocializar" pessoas. O processo de socialização é único, ocorre ao longo de toda a vida. Seu motor é o processo que chamamos "educação".
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Privando as pessoas da liberdade, numa prisão, dentro das melhores condições, você pode no máximo adestrá-las. Para que elas aprendam a viver segundo determinadas regras.
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Mas isso não ressocializa. Por uma razão: os indivíduos, quando não podem entender o que aprendem, não se educam, se adestram.
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O medo da punição, a disciplina do dever não educam, adestram. Os indivíduos respondem a ordens cuja razão não entendem, e, com isso, tornam-se passivos ou cheios de pavor e revolta.
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Estes serão massa de manobra, não indivíduos. Nem cidadãos!
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A ideia corrente de que privação de liberdade ressocializa pessoas é um engano lamentável. E está produzindo sociopatas.

Gabriel disse...

A dissertação do jovem misturada a relatos reais são o fiel retrato da vergonhosa realidade que vivemos hoje em Rio Branco e no Acre. Pode ser até politicamente incorreto tocar nesse assunto, mas antes, que dizíamos que o estado não funcionava e que quem funcionava era o esquadrão da morte a violência era menor. E isso é fato e é estatística também. O que dizer de hoje? Que, de forma surpreendente, a violência é infinitamente maior? O que houve? o esquadrão era mais eficiente que o badalado estado democrático de direito? Que só tem nome lindo, mas não traz segurança pra ninguém? Vai-se continuar vivendo de sonhos e a população de pesadelo? Depois que o estado desarticulou e extinguiu o esquadrão, passamos a viver mais violência e insegurança! E, para constatar isso, não precisa nem fazer pesquisas aprofundadas, basta só perguntar ao cidadão de hoje se ele se sente seguro. Chega de hipocrisia, queremos um freio nessa bandidagem desenfreada, onde não se tem mais sossego, onde registra-se um BO na delegacia e nada é feito. Chama-se a polícia e ela não vem, ou, quando vem, chega 3 horas depois. Basta!Basta!Basta de o governo gastar mais com a mídia do que com a segurança. Vivemos uma vergonha escandalosa. O Estado mostrou-se incompetente em dar segurança ao cidadão. As residências estão sendo arrombadas e pessoas assaltadas diuturnamente e a polícia nada faz. As delegacias viraram protocolos de registro de ocorrência, e os BO viraram rotina, normal. VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! Para que serve o registro da ocorrência? O que queremos é que não ocorra o crime, ou, se ocorrer, que seja desvendado e o bandido preso. Se é esse o objetivo, de só registrar a ocorrência, então é melhor fechar as portas e economizar os impostos do cidadão. População, vamos fazer protesto, estender cartazes, formar nossa própria segurança, já que o estado mostrou-se incompetente. Do jeito que tá não dar para continuar.

joaomaci disse...

Bem esclarecido Josafá!
Mas isto não tira o mérito do texto do Gabriel que reconhece que "estamos criando assassinos e vítimas". O que demonstra um grande avanço se considerarmos o cinismo dos governantes que querem deixar crer que fazendo concurso para as polícias, comprando arma que dá choque, ou nomeando um secretário de segurança tipo "Beltrame" podem pacificar a cidade.

joaomaci disse...

Desculpem, não pretendo ser um árbitro, mas não posso deixar de me manifestar. A opinião deste outro Gabriel reduz os fatos a si mesmos e simplifica o que seria a solução. Do jeitinho que o pessoal da segurança pública faz!
Esse tipo de reação nos levaria à uma guerra civil (alguns dizem que já estamos) e sinceramente, os governos tem muita culpa no crescimento da violência e não podem cruzar os braços enquanto a carnificina cresce. Descontados os casos dos distúrbios mentais, a abundante violência, que invade as residências, que está nas ruas, no trânsito, nas escolas, enfim, é fruto do enorme abismo que separa economicamente os grupos que constituem essa sociedade.
E é para a redução desta situação que eles deveriam se dedicar. Para isso lhes damos o poder de normatizar tudo o que afeta a totalidade, inclusive a economia. Do contrário, é como sugerir "quem tem dinheiro compre sua segurança, quem não tem f..."
É certo que não devemos conformar, mas os protestos devem buscar as causas.

ELSOUZA disse...

A democracia confundida com BADERNA está gerando a INSEGURANÇA JURÍDICA.