terça-feira, 6 de novembro de 2012

TEATRO UNIVERSITÁRIO FANTASMAGÓRICO

POR GERSON ALBUQUERQUE

A reitora Olinda Batista inaugurou na noite de segunda-feira (5) o Teatro Universitário, uma obra que custou, aproximadamente, R$ 10 milhões aos cofres públicos e cuja construção jamais foi discutida nas instâncias colegiadas da instituição. O governador, o prefeito, “o bispo de olhos vermelhos”, parlamentares e bajuladores da pompa oficial – reacionária e conservadora – foram convidados para a apoteose do “Olindão”, como a espirituosa comunidade universitária denomina o prédio nos corredores da federal do Acre.

Em 1988, o então reitor, Moacir Fecury, inaugurou o anfiteatro Garibaldi Brasil sem dar a mínima para o que realmente a Ufac necessitava. A obra, ainda hoje uma arquitetura completamente alienígena ao ambiente da instituição federal de ensino, é ruim como auditório e imprestável para qualquer atividade artística por causa da mais completa falta de noção daqueles que a idealizaram. No dia da festa de inauguração, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) manifestou seu claro repúdio contra aquela “coisa” que nem era teatro e nem era auditório e, especialmente, porque a mesma matava os anseios pelo teatro de arena que incendiava a imaginação da comunidade estudantil em fins de uma década de tantas mobilizações pela redemocratização do país e de suas instituições.

Passados 24 anos, outra obra alienígena – desta vez, literalmente, um “elefante branco” – está sendo encravada na paisagem do campus universitário. Esta, também, não é teatro e tampouco é o auditório que necessitamos para as atividades de debates e reflexões acadêmicas, principalmente porque suas dimensões não se coadunam com as expectativas dos grupos de pesquisa, oficinas e seminários necessários ao aprofundamento de temas caros aos alunos e professores em processos de elaboração de seus estudos.

A origem dos recursos para a construção do novo “teatro” é o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) que, desde seu lançamento pelo governo federal, condicionou a liberação de verbas à criação de novos cursos e campi e ao aumento das vagas em cursos já existentes, criando um impacto tão desastroso para as universidades a ponto de seu corolário ter sido a última greve geral que, durante os meses de maio a setembro deste ano, paralisou todo o sistema de ensino universitário público no Brasil.

O destino das verbas do Reuni endereçadas à UFAC, a exemplo das demais instituições, deveria ter sido objeto de discussões e deliberações no âmbito do Conselho Universitário (Consu) e sua aplicação seria muito mais benéfica se voltada para a melhoria das condições de ensino (ampliação/construção e climatização de salas de aula e laboratórios, melhoria das instalações do Restaurante Universitário e Biblioteca Central, construção da Residência e Creche Universitárias, entre outras, além de bolsas de estudo adequadas à permanência dos alunos na instituição, entre outras. Mas nada disso ocorreu nos quatro anos de mandato Olinda/Pascoal, cuja promessa de campanha era promover o “avanço” da instituição para um lugar que ainda não foi devidamente explicado em função dos desmandos e falta de zelo com as normas e princípios que devem reger a coisa pública.

Na prática, a realidade é outra e a fragorosa derrota do projeto Olinda Batista, nas últimas eleições para a reitoria, é uma clara evidência disso. Aos incrédulos, faço o convite para vir à Ufac e percorrer os ambientes das salas de aulas, banheiros, laboratórios e Biblioteca Central, especialmente, no meio das tardes quando este “pedaço de chão amazônico” se transforma numa “sucursal do inferno”, agravada pelas constantes quedas no fornecimento de energia elétrica. Digo mais: visitem os dois blocos destinados aos programas de pós-graduação da instituição para constatarem que estas breves palavras não são nem a pálida ideia da realidade que ali se presencia. As salas dos grupos de pesquisa da pós-graduação e as demais instalações (banheiros, laboratórios, corredores) contrastam com o monumental “elefante branco” que está sendo inaugurado, tendo o pomposo nome de Teatro Universitário.

A reitora não perde a oportunidade para afirmar à imprensa que os professores são os culpados pelo fato dos programas de pós-graduação desta IFE não se consolidarem, assegurando com isso a criação dos doutorados – passaporte para que a mesma continue a gozar do status de universidade –, mas não diz nada com nada ou nada que seja compreensível, e de propósito, para que ninguém perceba que o avanço prometido não passou de une marchant à reculons.

Na inauguração dessa espécie de “mausoléu” de seu mandato, havia possibilidade de ocorrer um apagão na Ufac. Nas últimas semanas, ações de ensino, pesquisa e extensão em nível de graduação e pós-graduação foram suspensas por diversas vezes, sem a administração superior dar uma palavra sequer para explicar à comunidade universitária quais providências está tomando para solucionar o problema, ou melhor, quais providências deixou de tomar ao longo desses quatro anos de mandato. Mas o espetáculo da inauguração do novo “teatro” que, esquizofrenicamente, a própria gestora maior da instituição chama de “auditório”, não pode ser interrompido e para isso Olinda Batista mandou instalar um gerador de energia exclusivamente para o prédio que está sendo inaugurado. A solução não é nova, porém, coloca em evidencia, mais uma vez, que o ensino, a pesquisa, a extensão e o respeito aos estudantes, professores e todos aqueles que frequentam a Ufac nunca esteve na ordem do dia do “avançar mais” de sua gestão.

O prédio do Teatro Universitário é fantasmagórico por sua arquitetura, sua espacialidade, suas cores e, fundamentalmente, por não ser um teatro. Mais que isso, por ser obra da decisão unilateral e arbitrária de uma administradora que levou dois longos anos para entregar o prédio que abriga os cursos de artes da instituição (Artes Cênicas e Música) e, quando o fez, sabia que o mesmo estava inacabado, impróprio para as finalidades a que se destinava e sem previsão orçamentária inclusive para a limpeza e manutenção diária daquela metade do prédio que estava sendo entregue aos alunos e professores.

Fantasmagoria e melancolia, talvez sejam as palavras-chave para o momento do descerrar as cortinas no novo “teatro”, que é um auditório para grandes solenidades de colação de grau e atos de condescendência com as patéticas outorgas de medalhas de “honra ao mérito funcional” a servidores mal remunerados e desprestigiados em vida e em morte.

No bojo desses remansos, banzeiros e idas e vindas do cotidiano acadêmico, nós que, apesar de certos gestores, continuamos acreditando nas artes de nossos ofícios – como servidores públicos – esperamos não sentir saudades de tudo isso ao ver transformada em realidade a pilhéria do “nada está tão ruim que não possa piorar”, cantada em verso e prosa por velhos frequentadores da cantina da universidade.

Gerson Rodrigues de Albuquerque é professor associado do Centro de Educação, Letras e Artes da Universidade Federal do Acre

2 comentários:

Eduardo disse...

Sim professor Gerson, vai piorar sim. Vide os embriões formadores daqueles que amanhã talvez estejam pelos corredores da UFAC. As escolas públicas. Ali sim. Não é a sucursal do inferno. É o próprio. Tráfico de drogas, prostituição masculina e feminina, lenocínio, violência física entre docentes, entre pais e docentes e entre docentes/discentes, malversação de fundos, ambiente insalubre, salas de aula mal iluminadas, mal aparelhadas, em estado precário, banheiros e bebedouros imundos (docentes não aceitam beber a mesma água que os alunos...), docentes mal preparados, desvirtuação das finalidades do espaço educativo, uso da escola em proveito próprio, improbidade administrativa, descumprimentos das regras educacionais, cabide de emprego para funcionários preguiçosos, onde vale somente a estatística (mesmo maquiada), o empurrar com a barriga, a lei de Gerson (não a sua, a do outro: levar vantagem em tudo – lei bem nossa, bem brasilis...). etc., etc., etc... Sim professor, vai piorar. Aqueles que comporão o futuro (como força de trabalho, como gestores, como cidadãos (?!)) estão num péssimo ambiente, mas em ótimo campo de treinamento para reforçar o time daqueles sobre os quais o senhor escreve. Não se iluda. Eles estão a caminho daí.

Administrador disse...

Com razão julgo o texto do nobre professor Gerson, que segundo minha modesta opinião, é um dos maiores intelectuais deste país. A gestão de Olinda foi um fracasso. Um detalhe deste fracasso é a incompetencia em mobilizar os esforços necessários para a criação de cursos de doutoramento, tendo a comunidade acadêmica e comunidade em geral, que se contentarem com os chamados "interinstitucionais", que geralmente acontecem do outro lado do Brasil. Até quando isso?
São capítulos de uma antiga história, lida e relida por alguns gestores, que a repetem, exclamando a opinião melancólica de que "não há jeito" para fazer isso ou aquilo. Com isso um apelo: Gerson, se candidata na proxima!!!