terça-feira, 18 de setembro de 2012

MARINA MANTÉM DISTÂNCIA DA DISPUTA

Cristiane Agostine, do Valor Econômico

Fundadora do PT e uma das principais articuladoras da Frente Popular no Acre, a ex-senadora Marina Silva assiste à distância a eleição em Rio Branco. Marina gravou depoimentos para um vereador do PV e outro do PT, mas não declarou voto a nenhum candidato à prefeitura. O postulante do PT, Marcus Alexandre, não a procurou.

Afastada do cotidiano da política do Acre, Marina defende mudanças na Frente Popular, da qual foi expoente. Para a ex-petista, "seria bom" ter um segundo turno na capital: "Quando a gente fica muito tempo em um lugar, tem ensinamentos que são pedagógicos. Essa pedagogia se revela nas dificuldades."

Marina construiu sua trajetória na Frente Popular. A ex-senadora lembra das dificuldades enfrentadas ao combater a elite que governou o Acre até os anos 90 e reconhece os avanços nos últimos anos. Mas alerta seus antigos aliados quanto à possibilidade de cometerem os erros que combateram.

"Há uma memória que se perde naturalmente, de como era antes e como ficou agora. Isso acontece não só em relação aos graves problemas que ajudamos a superar, mas também em relação aos que não devemos repetir. Quais são os erros que nós não podemos repetir?", diz.

A ex-senadora mantém amizade com políticos do grupo, como os irmãos Viana, mas afastou-se politicamente sobretudo quando deixou o PT, em 2009. Seu marido, Fábio Vaz de Lima, trabalha na gestão estadual de Tião Viana (PT) como secretário-executivo. Mas pessoas próximas à ex-senadora lembram de problemas enfrentados com os irmãos Viana.

Em 2005, Marina era cotada para disputar o governo do Acre, depois dos oito anos de mandato de Jorge Viana. Então ministra do Meio Ambiente, sua candidatura era tida como "natural" no PT, mas Tião, que estava no Senado em 2006, articulou sua própria candidatura para suceder o irmão, ao tentar aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para derrubar o impedimento a candidaturas ao Executivo de parentes consanguíneos. Com essa sinalização, Marina decidiu não se lançar. Tião não conseguiu aprovar a PEC a tempo para se candidatar e o escolhido foi o vice de Jorge, Binho Marques, com perfil técnico.

O período mais delicado, no entanto, se deu na eleição passada, quando Marina disputou a Presidência pelo PV. O mal-estar dura até hoje e o senador Jorge Viana relaciona a candidatura da ex-senadora ao resultado ruim que o PT teve no Estado. "A eleição passada foi um inferno", diz. "Era certo apoiar a Dilma [Rousseff] ou a Marina e não tivemos dúvida em apoiar a Dilma. Tivemos uma situação muito grave. Culpa de quem? Do Acre, porque daqui que saiu a candidata. Foi a [ex] ministra do Lula que levou a disputa para o segundo turno", comenta. "Foi lamentável ela não ter nos apoiado no segundo turno. Para o eleitor, a mensagem é que gente não se entende e votaram contra [o PT], diz Jorge.

No Acre, Dilma e Marina tiveram votação semelhante no primeiro turno: a petista teve 23,92% dos votos e a ex-senadora, 23,45%. José Serra (PSDB) teve 52,12%. No segundo turno parte dos votos de Marina foi para Serra: o tucano teve 69,67% e a petista, 30,33%.

Marina é moderada ao falar sobre 2010 e lembra que apoiou a candidatura de Tião e Jorge sem cobrar o apoio deles. "Para mim era uma espécie de salvo conduto para minhas relações no Acre. Mas não precisariam ter criado alguns desconfortos", diz.

Recentemente, a atuação de Jorge como um dos relatores do Código Florestal também gerou atritos. Para Marina, o senador deveria sido mais firme. "Ele, com certeza, teria que tensionar com o governo para se diferenciar desse acordo que foi feito com a bancada ruralista", afirma.

Em meio a metáforas, Marina diz que seu "silêncio" é uma resposta a seus aliados. "Talvez a gente esteja precisando escutar um pouco os nossos silêncios".

Grupo se reconcilia com antigos inimigos

Sentado em frente ao computador, em uma sala na TV Rio Branco, o empresário Narciso Mendes termina o artigo a ser publicado no jornal "O Rio Branco" com críticas ao candidato do PSDB à prefeitura da capital, Tião Bocalom. Dono do jornal impresso e da retransmissora do SBT no Acre, Mendes rasga elogios aos irmãos Jorge e Tião Viana. "Esses caras fizeram o Acre. Todas essas ruas que estão aí foram eles que fizeram", diz, batendo com a mão na mesa para enfatizar. A afirmação nem parece ser do empresário que se apresentava como "inimigo número um do PT" até meados dos anos 2000. "Deixei de ser antipetista", comenta. "Eu me adapto às circunstâncias".

O empresário, com trajetória na Arena, PDS, PFL, PPB e PP, atuou contra a Frente Popular quando o grupo ascendeu ao governo estadual com Jorge Viana (PT), em 1998. Mendes foi acusado por Jorge por intimidá-lo e por desmoralizar as investigações sobre o narcotráfico no Acre.

A aproximação de Mendes com rivais petistas se deu ao longo das gestões da Frente Popular. O jornal do empresário, que não recebia verba publicitária estadual, hoje publica matérias favoráveis ao governo. A empreiteira da família de Mendes presta serviços à gestão estadual.

O senador Jorge Viana (PT) minimiza essa aproximação. " Não posso achar que isso tem algum problema", diz. O governador do Estado, Tião Viana (PT), segue na mesma linha. "Se a empresa participa da licitação e ganha dentro dos termos da lei, que problema tem nisso? Nunca vi ninguém pegar um aliado e expulsar, desde que ele não interferira na honra de um projeto".

Outro exemplo de inimigo que se transformou em aliado é o ex-governador Orleir Cameli, cuja gestão foi marcada por denúncias de corrupção e desvios, combatidos pela Frente Popular. Atualmente, o governo estadual mantém uma relação cordial com Orleir e a empreiteira do ex-rival presta serviços ao Estado. César Messias (PSB), primo de Orleir, é vice de Tião e foi vice do antecessor, o ex-governador Binho Marques (PT). "Temos uma relação democrática, sem perder a integridade. Não há incoerência", diz Tião.

A reconciliação com empresários e políticos que foram combatidos pela Frente Popular no passado é criticada por fundadores e integrantes do grupo. Antonio Alves, o Toinho Alves, um dos articuladores da Frente, resume as reclamações. Em sua análise, o PT se "amoldou" à estrutura existente, sem de fato mudá-la. "No Acre foi feita uma conciliação parecida com a que [ex-presidente] Lula fez no segundo mandato, depois do mensalão, para ter governabilidade. Mas aqui é diferente: não precisava ter feito isso. O PT tinha base para governar", diz Toinho.

Formulador do conceito de "florestania", usado como bandeira da gestão de Jorge, Toinho afastou-se do grupo junto com a ex-senadora Marina Silva, a quem continua ligado. "O que lamento é ver o grupo que chegou ao poder para limpar a corrupção ter se transformado em uma oligarquia".

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