sexta-feira, 27 de maio de 2011

UMA QUESTÃO DE NÚMEROS

Márcio Bezerra da Costa

Se existe uma referência que convence na atualidade ela tem a ver com números. Nada mais chama a atenção midiática que um dado estatístico interpretado por um especialista num programa de TV. Mais que isso: os números acabam por se tornar as principais referências que parcela substancial da população tem para elaborar críticas ao sistema e tomar as decisões políticas eleitorais. São números de obras, projetos, escolas, hospitais, presídios, crimes, visitas, contatos, eventos, shows populares e salário.

No quadro da Segurança Pública, de modo geral, destacando aqui algumas situações teóricas do contexto nacional, as estatísticas são ferramentas indispensáveis para se ter uma idéia e uma interpretação satisfatória. Através de dados produzidos por analistas criminais, os gestores produzem e sugerem a tomada de decisão em várias esferas. Mais que afirmar que trabalhar com estatística é importante para a medição dos índices de criminalidade, é preciso dizer que existem alguns problemas, estes nem sempre absorvidos pelos órgãos do sistema, que nos põem em dificuldade e podem até comprometer a visão correta de uma realidade dada.

Um desses problemas é a discrepância entre os índices criminológicos oficiais, que constam nos bancos de dados de instituições como o Instituto de Pesquisa Econômicas e Aplicadas, o Banco de Dados do Sistema único de Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso ocorre devido a algumas situações que vamos citar agora.

Quem nos garante que os crimes noticiados nas delegacias correspondem a 100% dos crimes acontecidos? Ninguém, até por que numa consulta rápida a quem conhecemos logo descobriremos alguém que não noticiou um crime por “n”  motivos.

Ou por falta de confiança na polícia, ou por medo da repressão dos agentes ou por acharem que o esforço em ir a uma delegacia não valeria a pena. Isso ocorre e em grande freqüência no Brasil. Para se ter uma idéia, segundo Marcelo Duarte, que foi coordenador geral de análise de informação do Ministério da Justiça, baseado em dados do PIAPS/MJ, apenas cerca de 10% das vítimas de furto ou agressão sexual noticiam o fato. Isso é absurdo quando pensamos que 90% desses casos sequer chegaram ao conhecimento do estado brasileiro.

Em casos de agressão física e roubo, esse número chega a cerca de 25%, o que ainda é baixo, quando comparamos a um universo maior. Isso significa que números de resoluções de crimes não chegam perto dos crimes que nunca chegarão ao conhecimento da autoridade pública.

Os números divulgados pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável, em 2010, sobre a taxa de homicídios no Brasil, que de 1992 a 2007 cresceu cerca de 15% podem ser ainda maiores quando voltarmos os olhos para o abissal domínio do crime onde o Estado não consegue chegar com seu braço armado nem com suas reformas teóricas e sociais.

Pensando nisso, é  propício o investimento em pesquisas de vitimização, que segundo a definição do Próprio Ministério da Justiça, são “estudos destinados a captar as ocorrências de eventos criminais junto à população com o fim de comparar os dados oficiais registrados pelas polícias com a ocorrência efetiva dos crimes, classificando-os por localidade, estrato social, cor da pele, idade, sexo, renda e outros critérios sociológicos de mensuração. Respeitam as mesmas etapas de todas as demais pesquisas: coleta, tratamento, análise e divulgação dos dados”.

Até 2010 o que se tinha em nosso país nesse sentido, eram pesquisas municipais que não se aproximavam de estabelecer um elo com a realidade nacional, apesar de nos fazer ter uma idéia do tamanho dos nossos problemas. No ano passado cerca de 300 municípios foram pesquisados, todos com mais de 15 mil habitantes, num total de 70 mil pessoas. Segundo a SENASP, a partir de 2011, os resultados deste processo serão divulgados.

O mais interessante a notar quando pensamos que nem sempre os números citados estão de acordos com a realidade em que vivemos, é que somente a nossa vivência cotidiana serve de termômetro destes índices. Sua vida melhorou? Você se sente mais seguro em relação à criminalidade? Sim ou não? Para uns sim, para outros não. Mas uma coisa é certa: falta algum, não tão abstrato a ponto de resolver todos os problemas do mundo, mas concreto o bastante para dá segurança a cada pessoa que sustenta nos ombros este país.

Como advertiu o historiador Andrew Lang, algumas pessoas usam a estatística como um bêbado usa um poste de iluminação - para servir de apoio e não para iluminar. Por isso mesmo, é bom não confiar nos que se baseiam demasiadamente em números e espectros, mas numa crítica arguta da realidade pondo em evidência questões sociais, culturais e, é claro, técnicas.

Márcio Bezerra da Costa é soldado da Polícia Militar do Acre graduado em ciências sociai

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