sábado, 3 de abril de 2010

VOANDO VAI A COTOVIA

Thiago de Mello
Para Armando Nogueira

Voando contente vai sobre a floresta
meu coração de criança. Sabe a festa
esta viagem que dura mais de um dia
pela água e pelo céu. Mais andaria
só para ouvir de novo a fala mansa
de certo amigo. A vida vale a pena.

(Para o Armando
No céu, voando, 1990)

Valeu. Vinte anos depois
atravesso o céu de novo
preciso tanto estar junto
do amigo que deu beleza
e ventura à minha vida,
à dele tão parecida,
que as duas se amalgamavam
pelo sal das diferenças.

Só que desta vez não vamos
nos dar o abraço ritual
com os versos do Bandeira.

Eu lhe dizia:

- Alô, cotovia,
por onde andaste, que tanata
saudade me deixaste?

Ele sempre respondia:

- Andei onde deu o vento,
onde foi meu pensamento.
- Muito contas, cotovia!
E que otras terras distantes
visitaste, dize ao triste ?

Desta vez, tanto eu queria!,
Armando não me responde.
Não vou ouvir a sua suave
fala de sabedoria.
Só vou ver,
pela derradeira vez,
o meu amigo dormindo.

Sei que voando vai distante,
muito distante
a querida cotovia.

(Sobrevoando a floresta. Noite de 29 de março de 2010)

Thiago de Mello, 84, é poeta amazonense

Um comentário:

cabocla disse...

Somente ontem falando pelo Skype com meu mano-amigo Babá (alias José Bessa) soube da morte de Armando Nogueira, grande amigo de meu primo companheiro Thiago de Mello. Logo lembrei ao Babá do livro que Thiago escreveu com a participação de Armando Nogueira. Thiago em uma das visitas que nos fez aqui em Paris ofereceu-me o livro intitulado O Povo sabe o que diz. Contou-me que este livro surgiu de um bate papo animado entre os 3 amigos, Armando Nogueira, Sergio Andrade e ele. Como três meninos felizes, eles brincaram de tirar das memórias, expressões e adágios criados pela sabedoria popular. Reli ontem o livro que é ilustrado com os desenhos de meu primo Manduka filho de Thiago, grande compositor, cantor parceiro de Geraldo Vandré que nos deixou em 2004. Na certa Manduka e Armando se encontrarão lá pelo céu e Manduka com seu violão cantara para Armando:
"Pos isso somos quem somos
Estrelas de um só momento
Mas cujo brilho ameaça
A ordem do firmamento"
(Manduka)
E eu daqui da França em inicio de primavera saúdo a memória deles. Resta a saudade junto com a amizade eterna como já dizia o poeta que a amizade é assim:
Quando ela atinge o poder silencioso das estrelas,
Prescinde de convívio, elide o tempo,
É diamante sereno na memória.
Marilza de Melo Foucher