segunda-feira, 29 de março de 2010

MORRE ARMANDO NOGUEIRA

O jornalista Armando Nogueira morreu nesta segunda-feira, 29, no Rio de Janeiro. Os pais dele, Rodovaldo e Maria Soares, vieram parar no Acre fustigados pela seca cearense. Casaram e tiveram dois filhos. Armando, o mais novo, começou as primeiras letras ainda em Xapuri, onde nasceu, mas logo mudou para Rio Branco, onde fez o ginásio e o comercial. Em 1944, ele foi sozinho para o Rio, com uma pequena mesada concedida pelo pai, Segue uma crônica de 1958:


Sepetiba, o campeão do mundo da minha infância

Armando Nogueira




Sepetiba era o terror dos bolivianos, prêto de raça que nunca fugia do jôgo, fôsse em Rio Branco ou em Cobija, em cujos campos costumava sangrar uma terrível rivalidade de fronteira.

Estávamos sempre juntos e eu sentia de perto a bravura de Sepetiba, entregando as pernas às chuteiras de couro cru, amarelas, que os bolivianos costumavam desembainhar naqueles amistosos vulcânicos de Cobija, Brasiléia (naquele tempo, era Brasília, a doce cidadezinha nos limites do Brasil com a Bolívia). Era o terror dos bolivianos o prêto Sepetiba, meu bom amigo Euclides da Costa.

Embora se diga que no interior não se joga futebol, embora tudo o que se inventa por aqui sobre a qualidade de jôgo nos campinhos longe do Rio, posso dizer que foi por lá, no Acre, vendo o Sepetiba, o Chico Banha, o Dudu, o Marajó, o Severo - foi vendo essa gente tôda que descobri o gôsto do futebol. Espremendo razões, chegarei à conclusão de que a êles, ao Sepetiba, devo eu a sorte de ter chegado até a Suécia para assistir à "Copa do Mundo".

Sepetiba não jogava bonito, soltava o pé, era valente; clássico era o Severo, espécie de Danilo dos pobres, visão de craque que trago da infância. Mas, o que me empolgava mesmo, era o coração do Euclides, o Sepetiba.

Correu o tempo, transferi-me para o Sul, não tive mais contato com os amigos, meus ídolos do campo do Rio Branco, que era a coqueluche do major Isidoro e do Geraldo Mesquita. Do Mesquita, tenho tido notícias, ele aparece, às vezes, por aqui, é botafoguense. Dos outros, ficaram-se, apenas, umas pontas de saudade que vêm à tona quando à tona me vêm a infância e um pedaço da adolescência, vividas entre o barro vermelho de Penápolis e aterra fina de Rio Branco, onde aprendi a fazer "embaixadas" de canhota com bola de borracha importada de Santarém.

Ontem, um amigo me trouxe de Rio Branco um pacote e uma carta. Presente do Sepetiba: a miniatura de uma péla de borracha com os nomes dos campeões do mundo gravados a fogo e uma dedicatória singela: Ao amigo Armando, um lembrança da "Copa do Mundo".

Revi, no presente, meu bom amigo Euclides, esguio, comprido e simples; reencontrei, na péla de borracha, minha terra e nela o menino que fui eu.

A "Copa do Mundo", que vi tão de perto, nos campos de Gotemburgo, Estocolmo, Udevala - aquela conquista de Solna me deu grandes e belas emoções. Nenhuma, porém, é tão minha quanto essa que me veio de Rio Branco.

Sepetiba devolveu-me a minha infância: o campo do Rio Branco, as meninas do ginásio de uniforme azul-e-branco na arquibancada, e a cidadezinha carregando em triunfos o "center-half" Sepetiba, o campeão do mundo dos meus 10 anos.


"Caro Altino, fazendo uma varredura em alguns documentos, encontrei uma crônica escrita por Armando Nogueira, que àquela época, em agosto de 1958, usava o pseudônimo "Arno" na coluna "Bola Pra Frente", do Jornal do Brasil. Ele homenageia meu pai, o famoso Pedro Sepetiba. Digitalizei o pequeno texto, mas o título saiu apagado, mas aqui eu te esclareço: "O campeão do mundo da minha infância". O nome do meu pai era Euclydes Barbosa da Costa, nascido no Seringal Catuaba com o nome de Pedro, dado por minha avó, dona Lídia Barbosa da Costa, nascida numa senzala da Ilha de Marajó (PA), após a assinatura da Lei Áurea. Bem, mas por essas razões do coração ou do destino, quando veio para Rio Branco ser batizado, a madrinha de apresentar achou o nome Pedro impróprio. Ao que parece, baseada nas andanças de Euclydes da Cunha por aqui, mudou o nome de meu pai para Euclydes (com y), mas o nome Pedro lhe acompanhou por toda sua vida vida, e pelos idos de 1940, numa partida de futebol, na cidade de Xapuri, lhe pespegaram o apodo "Sipitiba", daí o nome Pedro Sepetiba, conhecidíssimo em Rio Branco, e até na Bolívia, jogando futebol pelo Rio Branco. Enfim, meu pai se foi em 1994, mas sei que seu nome até hoje é lembrado com carinho por todos os que o conheceram.

Abraços

Edson Carneiro da Costa"

Um comentário:

Rosangela Barros disse...

Meus sinceros sentimentos de condolência! Que seu Sono Eterno seja uma Maravilhosa Viagem ao encontro da Paz!...

“Sepetiba devolva-me a minha infância: o campo do Rio Branco, as meninas do ginásio de uniforme azul-e-branco na arquibancada, e a cidadezinha carregando em triunfos o "center-half" Sepetiba, o campeão do mundo dos meus 10 anos”...

Sepetiba receba e envolva o Armando Nogueira nos Braços da Paz!... Sepetiba faz-nos entender o Fim!...