Marina Silva
"Me sinto impotente e imensamente triste com o desmatamento nas áreas de preservação deste país. Não existe nenhum respeito pela natureza. Abram os olhos e trabalhem. Salvem nosso país, senhores".
Essa mensagem de Jussara Renaux, de Brusque, Santa Catarina, foi uma das mais de oito mil enviadas, por meio do serviço "Alô Senado" e por correio eletrônico, durante a Vigília pela Preservação da Amazônia, realizada na noite do último dia 13, no Plenário do Senado.
Artistas, ambientalistas, senadores, deputados, representantes de organizações não governamentais e de comunidades indígenas, quilombolas e seringueiras, ficaram até as duas horas da manhã do dia 14 dialogando sobre a Amazônia, sua importância para o País e o planeta, as ameaças que a atingem, suas potencialidades, as dificuldades e os avanços em termos de gestão pública e atividades sustentáveis.
A história dessa noite memorável começou com a angústia expressada pela atriz Cristiane Torloni, diante das dificuldades para sensibilizar o governo para o Manifesto Amazônia para Sempre, encabeçado por ela, Vitor Fasano e Juca de Oliveira, que alcançou mais de um milhão de assinaturas. Daí veio a ideia do senador Cristovam Buarque de fazer a Vigília, encampada por um grupo de senadores e concretizada pelas comissões Mista do Aquecimento Global, de Direitos Humanos e Legislação Participativa, e de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização.
A própria origem - uma demanda de cidadãos encampada pela representação política - ajuda a explicar a enorme vitalidade sentida naquelas horas. Fazia um profundo sentido estar ali. Era unânime o reconhecimento da urgência de dar consistência aos esforços já feitos para proteger um patrimônio incomparável e, ao mesmo tempo, denunciar e impedir iniciativas que possam resultar em desastre ambiental e social na Amazônia.
Por coincidência, na mesma noite a Câmara dos Deputados aprovou um exemplo dos equívocos que podem se constituir em riscos irreparáveis à população e ao meio ambiente amazônico: a Medida Provisória 458, que acelera a regularização fundiária na região. O que em princípio seria desejável foi aprovado com tantas brechas para mais concentração fundiária, destruição ambiental e incentivo a novas grilagens que se tornam imperiosas correções, agora a cargo do Senado.
A coincidência funcionou até mesmo como demonstração da premência de uma vigília ativa e permanente pela Amazônia, como insistiram vários dos presentes. E durante sete horas o evento acabou se tornando a maior oportunidade que a sociedade brasileira já teve para afirmar aos senadores e deputados a sua determinação de participar e exigir dos poderes públicos políticas claras e integradas para a região, orientadas pelo interesse nacional, o que significa dizer com justiça social e proteção ambiental.
A Vigília foi aberta com as presenças dos presidentes do Congresso Nacional e da Câmara, senador José Sarney e Deputado Michel Temer, e do Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. Seguiram-se apresentações de representantes de ONGs, de comunidades indígenas, quilombolas e de seringueiros; de cientistas de instituições públicas como o INPE e a EMBRAPA, além do comovente apelo de Cristiane Torloni, Vitor Fasano e da amazônida Myrla, de 13 anos, ativa participante da conferência nacional infanto-juvenil de meio ambiente. Ela pediu aos parlamentares coerência para que as futuras gerações possam também desfrutar de uma Amazônia íntegra e conservada.
Foram expostas iniciativas positivas e os entraves à implantação de um modelo de desenvolvimento sustentável na região. O Brasil, lembrou Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), precisa "inventar" um modelo de desenvolvimento que valorize sua condição de país tropical e saiba utilizar os recursos da floresta. Milton Kanashiro, da Embrapa, destacou a necessidade de a agropecuária na região considerar o manejo florestal adequado, de forma que os processos biológicos continuem acontecendo.
Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental, listou um conjunto de projetos de lei que podem ajudar a proteger a Amazônia. Entre eles, o chamado "projeto FPE Verde", que compensa com repasse maior dos recursos do Fundo de Participação dos estados e do distrito federal (FPE) os estados que tiverem em seus territórios unidades de conservação ambiental e terras indígenas demarcadas. Falou também do projeto do ex-senador Waldeck Ornelas que permite a dedução, no valor devido do Imposto de Renda, de parte dos recursos doados a projetos de preservação do meio ambiente, entre outros.
Num painel sobre as ameaças à Amazônia, falaram Sérgio Leitão, do Greenpeace; Paulo Moutinho, do Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM); Muriel Saragoussi, do grupo de trabalho Amazônia e do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais; padre Nelito Dornellas, da Comissão Pastoral da Terra; e Sônia Guajajara, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
A Vigília se transformou, afinal, numa grande síntese que deixou muito claro que o privilégio de ter a Amazônia exige de todos nós ousadia, conhecimento, criatividade, visão abrangente e uma profunda noção do bem público, que permita entender o alcance da tarefa de inventar, como disse Nobre, um desenvolvimento com base na existência da floresta e não em sua destruição.
É preciso que a sociedade continue em estado de vigília para não permitir que sua vontade, expressa em tantas pesquisas e manifestações - a exemplo do Manifesto Amazônia para Sempre - seja desrespeitada por aqueles que insistem em um modelo predatório de crescimento. O primeiro passo será barrar os inúmeros retrocessos que estão em curso, em setores do governo, do Congresso e da sociedade.
◙ Marina Silva é professora secundária de História, senadora pelo PT do Acre, ex-ministra do Meio Ambiente e colunista da Terra Magazine.
3 comentários:
Minha querida Marina:
Vou sempre bater na mesma tecla. Esta pessoas tipo artitas Global por mais que tenha Status, não tem moral para fazer ladaínha em favor da preservação da Amazônia. A atriz que você citou, quando esteve por aqui saiu esbravejado e minimizando a imagem do Acre. Eles não conhecem a realidade dos povos que vive na floresta. Já esta virando retórica minhas falas por onde passo.
Por favor, me aponte uma solução ou alternativa que talvez eu não conheça, que os povos que vivem na floresta possam preservar viver dignamente. Os pseudos ecologistas e suas proles vivem em confortáveis mansões, discutindo ecologia em barzinhos degustando Wiski a 500 a garráfa. E os ribeirinhos, os colonos e os assentados? Qual é a renda mensal deles? Talves não sobreviva por mês, com o mesmo que os pseudos ecologistas pagam por uma garráfa de Wiski consumida numa mesa discutindo "ecologia".
Saudações.
Combater a devastação na Amazônia é uma luta que vem sendo travada há tempos, já em 1979 (arquivos) nas reuniões do Parlamento Amazônico, comissões brasileiras já apresentavam propostas tais como a criação de uma universidade a Universidade Pan-Amazõnica, com sede em Manaus, centro geopolítico da Amazônia, e que cuidaria de captar, impulsionar e desenvolver o conhecimento e as pesquisas necessárias para o melhor desenvolvimento do conjunto da Amazônia.Esta proposta contou com o apoio do Parlamento Amazônico e caberia à UNIPAN cujo reitor escolhido, na ocasião, foi o prof. Bruni do CNPq,desenvolver estudos de viabilidade, de potencialidades do Mercado Comum da Amazônia, um mercado comum para a região e que cumprisse plenamente sua função integra tória, do desenvolvimento de todas as formas e vias, adequadas à integração social, cultural, científica e produtiva. Havia também uma preocupação no sentido de consultar a Fundação Tecnológica do Acre; o INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, apoiada em pesquisas sérias.
Ou seja, HÁ TRINTA ANOS, já se travava a mesma LUTA que a senadora trava agora. Chico Mendes Morreu, nesse campo de batalha.
A Eco-92 aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, formulou idéias de que é inaceitável – crescer excluindo, crescer sujando poluindo. Sem negar a necessidade planetária de crescimento industrial, mas tratando de condicioná-lo à salubridade ambiental. À salubridade social.
A POBREZA foi o fio condutor das análises e das conclusões da ECO-92 – de que não se pode separar meio ambiente da pobreza, da marginalidade social-
No entanto, a região mais rica, mais exuberante do planeta, continua pobre espoliada e deficitária em termos de integração e desenvolvimento social e humano.
Onde milhões e milhões de brasileiros são ainda hoje obrigados (17 milhões do lado brasileiro e 8 milhões aproximadamente dos demais países amazônicos, portanto 25 milhões) a viver praticamente incomunicáveis em relação às médias ou grandes cidades. Milhares e milhares de famílias estão a dezenas de horas de barco dos hospitais, da vida econômica de tudo, essa é uma realidade incompreensível
Essa é a questão central. Essa é que tem que ser a medida de todas as decisões, a medida de todo ecologismo. Do contrário vamos aprofundar cada vez mais essa trágica realidade social, com a preservação da miséria, da lepra, da malária e do isolamento humano.
Acredito que todos devam ser a favor da preservação da Amazônia, promovendo a consciência comum do desenvolvimento social, superando de uma vez por todas essa lógica perversa, em que a maior província mundial de minerais de riquezas também abrigue o maior isolamento de miséria.
Concordo plenamente com os argumentos
e de sua defesa de opiniao.E assino embaixo
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