sexta-feira, 16 de maio de 2008

RECEITA DE DESRESPEITO FEDERAL


Estou em Cobija, capital do departamento bolivano de Pando, que se alcança após a travessia do rio Acre, em Brasiléia. É daqui que são exportadas armas e boa parte da cocaína que abastece Rio Branco, a capital do Acre, e várias cidades brasileiras - a nossa outra porta imexível de entrada da cocaína é Cruzeiro do Sul, no extremo-oeste do país.

Apenas os traficantes mais inexperientes eventualmente são presos por patrulheiros rodoviários ou policiais federais, especialmente os bolivianos e peruanos que ousam comparecer à delegacia para obter o visto de entrada com suas mochilas carregadas de droga.

Nessa Área de Livre Comércio também se adquire a preços tentadores os últimos lançamentos da indústria eletro-eletrônica. É possível adquirir, por exemplo, um notebook Sony Vaio por R$ 2 mil. É o tipo de equipamento que ninguém declara à Receita Federal, bastando esperar que os patrulheiros se recolham durante uma chuva.

O presidente Evo Morales esteve em Cobija na terça-feira. No dia seguinte, 80 homens da Força Especial de Luta Contra o Crime prendeu sete integrantes de uma quadrilha que aterrorizava a região. Mais de 30 pessoas foram assassinadas nos últimos cinco meses em Cobija pelo bando que era liderado pelo boliviano Mauro Vasquez, 38, casado com uma garota de 16 anos, e levado para um presídio de segurança máxima em La Paz.

Veja reportagem da equipe do site O Alto Acre.



No dia 27 de abril estive aqui e compareci à Inspetoria da Receita Federal em Brasiléia para declarar uma compra feita em Cobija: um pacote de 50 unidades de CD-R, um pacote de 25 unidades de DVD-R, um audifone, um teclado de computador e dois controles-remoto.

Não consegui pagar os R$ 36,47 de impostos porque meu CPF estava suspenso. Os fiscais agiram com rigor, de acordo com a lei, e fizeram a retenção de minha compra. Passei a contar com prazo de 30 dias para regularizar meu CPF (o que fiz no dia 29 de abril), quitar o Documento de Arrecadação de Receitas Federais e retirar a mercadoria.

Foi o que fiz hoje, tendo em seguida comparecido à Inspetoria da Receita Federal, onde o atendimento ocorre das 8 às 12 horas e das 14 às 17 horas. Ao chegar, às 8h45, havia apenas um fiscal para atender as centenas de pessoas que passam por lá diariamente.

Apresentei o comprovante de pagamento e o Termo de Retenção de Mercadorias. O fiscal levantou da cadeira com o telefone, se afastou de mim, mas deu para ouví-lo dizer a alguém que havia "um senhor" em busca de mercadoria retida, e que o interlocutor dele precisava chegar ao trabalho para abrir o depósito da inspetoria.

Após mais de uma hora de espera, apareceu o outro fiscal com a chave do depósito. Pegou um saco de ráfia com o número da retenção de minha mercadoria, mas faltava a declaração de bagagem apresentada por mim em abril.

O fiscal pegou o telefone e discou para outro fiscal:

- Rapaz, acorda. Você precisa estar aqui. Não estamos encontrando a declaração de bagagem de uma pessoa.

Fiquei esperando mais outro tempão até que chegou, de cara amassada, o mesmo fiscal rigoroso que havia feito a retenção de minhas mercadorias no dia 27 de abril.


- O senhor foi tão rigoroso comigo ao aplicar a lei e fazer a retenção das mercadorias naquela dia. Deveria também ser rigoroso para cumprir o dever de comparer ao seu local de trabalho na hora certa. O senhor deveria estar aqui às 8 horas, mas já são mais de 10 horas - disse-lhe.

- Mas expliquei direitinho ao senhor... - ele respondeu.

Aí argumentei que minha intenção era declarar a mercadoria e seguir viagem, que a fiscalização poderia ter recorrido ao bom senso. Bastava ter reforçado a minha necessidade de regularizar o CPF para não enfrentar o mesmo problema em outra ocasião. Mas que poderia ter permitido que seguisse viagem, pois tratava-se de uma merreca de muamba.

Os traficantes de armas e cocaína, além dos picaretas que se valem de empresas fantasmas para fraudar o fisco, seguem sem perseguição pela fiscalização.

Seria bom que o inspetor chefe da Receita Federal do Alto Acre, Telmo Figueiredo (jornalista), tomasse providências para melhorar o atendimento à população. Exigindo especialmente que os seus subordinados não fiquem dormindo em casa durante o expediente, quando filas se formam em frente à inspetoria.

A foto acima mostra um dos fiscais ao chegar com a chave do depósito, às 9h10.

Minha mãe e meu irmão, que me acompanharaam ontem na "viagem", fizeram compras em Cobija. Para que ficassem bem posicionados na fila, às 12h45 foram até a Inspetoria da Receita Federal declarar suas bagagens, enquanto permaneci na redação do site O Alto Acre para redigir a nota acima. "Os fiscais só reabriram para atendimento às 14h30", relatou minha mãe. O prédio da inspetoria em Brasiléia parece um xilindró. Os fiscais e a população merecem um ambiente mais adequado.

3 comentários:

Anônimo disse...

Altino,

Cuidado para não ficar preso por aí. O que a burocracia faz com os brasileiros é coisa de filme de terror. Eu mesmo já sofri esse tipo de abuso por parte de policiais que, depois que me identificaram, pediram desculpas. Como se o cidadão tivesse que ter algum cargo para ser respeitado. Um desrespeito!

Ah, estou preparando um artigo sobre o "teu" novo ministro do MMA...

Boa viagem!

Anônimo disse...

Um dia desses fui comprar alguns brinquedos e panelas para uso pessoal e fiquei surpreso com tanta fiscalização em cima do meu carro. Depois pude constar em outras viagens que fiz a passeio que não tinha um fiscal de plantão. Fala sério!

Unknown disse...

Coisas do capitalismo: A região norte responde por pouco mais de 2,5% da arrecadação federal. O Acre deve ser uns 2% a 4% destes 2,5% (0,07%). Por isso Brasília não coloca nem fiscais e nem infraestrutura aqui. Em Brasiléia, deve ter uns 4 fiscais para atender duas fronteiras (Epitaciolândia e Assis Brasil), 7 dias por semana. É uma tristeza. Provavelmente, aquele fiscal que apareceu lá mais tarde estava no dia de folga. Estão construindo um prédio novo agora. Precisariam fazer concurso. O ideal era colocar na estrada uma barreira com policiais e fiscais que averiguassem 100% dos veículos, e passassem todas as bagagens em raio x. Mas veja que não fazem isso nem no aeroporto.