segunda-feira, 26 de novembro de 2007

UM MONSTRO MUITO GRANDE



Fosse no tempo em que o PT e as organizações sociais eram realmente de luta e a imprensa brasileira menos insensata em relação ao que acontece diariamente na Amazônia, o país inteiro já saberia que o líder comunitário João Batista (foto), um dos principais responsáveis pela criação da Reserva Extrativista do Jutaí, no município de Jutai (AM), está desaparecido desde o dia 11, quando saiu de sua casa para vistoriar uma roça comunitária. Suspeita-se que ele tenha sido mais uma vítima da violência contra aqueles que realmente defendem a floresta.

A foto acima foi enviada pelo cientista social Paulo Jesiel para o blog da antropóloga Mary Allegretti junto com um depoimento de João Batista, de novembro de 2004. Vale a pena a leitura. Eis o depoimento:

"O ser humano é um monstro muito grande. Come tudo. O ser humano destrói tudo. Por isso precisa que haja a lei. Foi por isso que Deus criou as leis naturais. As leis naturais dizem o seguinte: Não entra no fogo, porque se tu entrar, tu morre queimado. Não pula na água se não sabe nadar, por tu afunda e morre afogado. Não trepa numa árvore alta e se segura num galho fino, porque o galho quebra, tu cai no chão e se esborracha tudinho. Não fica no meio da chuva com um ferro na mão porque vem um raio e te mata. Então por aí afora, tem muitos detalhes.

Baseados nessas leis que o homem criou suas próprias leis para disciplinar esse grande monstro que é a humanidade. Disciplinar e administrar a humanidade. O ser humano motivado por necessidade, ele destrói o ambiente e degrada a natureza. Por todos os modos, ou por ganância, ou por necessidade. Mas nós temos que entender que a ganância e a necessidade existem outros meios para se substituir. Agora nós temos que ver que nada justifica nós depredar a natureza por esses motivos. Mas o homem é tão perigoso... Que você vê um pobrezinho e diz: "Coitadinho"... Mas ele destrói a natureza. Isso não justifica a destruição da natureza porque ela é lenta e custa a se recuperar e muitas vezes ela não se recupera. Então, é aí que entra a lei, prá proibir o coitadinho e o ganancioso. Porque a humanidade precisa dessa natureza.

Estão sendo criadas na Amazônia muitas unidades de conservação. É lógico que isso é muito importante para o nosso país e para a nossa futura geração, porque se não fizermos isso hoje, amanhã será muito tarde. Porque haja visto, tanto os coitadinhos e os gananciosos estão comendo a floresta irresponsavelmente. Agora, acontece que as populações que têm nessas unidades de conservação, elas fazem parte dessa população de coitados, pobres, deserdados que fazem isso tudo pela necessidade e motivado pela desinformação social e econômica, que eles são. Mas com certeza, é possí­vel sim reverter esse quadro. É claro que não no imediato, mas havendo um investimento social, econômico e educacional é possível a longo prazo reverter esse quadro, transformando esse simples coitadinho, predador, num grande cidadão, cumpridor do seu dever e capaz de contribuir e reconstruir o seu ambiente e valorizar com certeza a mãe natureza. Como fazer isso?

Primeiro. Juntando os indivíduos, haja visto que eles vivem em colocações longe uns dos outros, isolados de tudo. Juntando em comunidades de 5, 10, 15 famí­lias. A partir daí­ se fazer um trabalho de apoio à vida e à cidadania. Como? Melhorando os seus meios de trabalho, as suas ferramentas, investindo na produção da roça, da agricultura, fazendo com que ele saiba produzir produtos extrativistas com qualidade, tal como a borracha, óleo de andiroba, copaí­ba, mel de abelha, e produtos artesanais paneiro, tipiti, tupé, aturá, jamachim, remo, canoa, melhorando a sua qualidade e produtividade agrí­cola de subsistência. Como no plantio de mandioca, farinha de qualidade, plantando cará, macaxeira, banana, cana, ananás, abacaxi, fruteiras, caju, beriba, mari, ingá, limão, enfim, todo tipo de fruteira na comunidade, plantio de hortaliça, chicória, cebola de praia mesmo. Tudo isso, melhora em primeiro lugar a saúde do homem porque ele passa se alimentar com qualidade, comendo frutas e verduras. Com certeza!

Segundo. Investir na educação escolar, de jovens adultos e crianças, para que ele possa descobrir os valores da arte da matemática e das letras e assim ele possa administrar com resultado a sua produtividade. Com isso, gerar renda sustentável para a sua famí­lia.

E terceiro, investir nos conhecimentos dos valores ambientais que o homem tem ao redor na sua comunidade. Investir na preservação dos lagos, que é um dos maiores valores que o comunitário tem, pois é a base alimentar de suas famílias. O peixe. O produto do lago. Investir nos conhecimentos da preservação dos animais das florestas, dos chupadores, nos barreiros, nos igarapés, pois são criadores dos animais da floresta. Investir nos conhecimentos dos valores que tem a floresta para a biodiversidade e em especial para o homem, pois a árvore é o verde, e sem o verde ninguém veve. Haja visto que é do verde da floresta, do verde, da árvore, é que o homem tem o alimento de toda a sorte, toda a matéria-prima que ele precisa, a madeira, e toda a oleoginosa para o biodiesel, a medicina e o cosmético. E a partir de que o homem da floresta passa a descobrir esses valores da floresta, possa ele mudar de mentalidade e comportamento, passando a contribuir e preservar o meio ambiente nosso de cada dia e transformando-se num grande colaborador da mãe natureza".

Um comentário:

Elisson Magalhães disse...

Não conheço esse Senhor, nem ouvi falar dele, há não ser pelo seu recente desaparecimento, mas pelo menos nessas palavras há muita, muita sapiência. Tiro o chapéu!