domingo, 19 de agosto de 2007

SÃO TODOS ANARQUISTAS

Gerson Albuquerque

Nesses últimos dias andei tentando disfarçar meu tédio em relação a viver em Rio Branco nessa época de queimada, poeira, frio seco, rachadura nos lábios e garganta inflamada. Tudo, como sempre, previsível. Sem esquecer a falta d'água que há tempos os prefeitos prometem resolver. Nisso, como em tantas outras coisas e detalhes, eles não têm diferença mesmo, como se diz no popular. De Mauri, Flaviano, Kalume, J. Viana, Isnard, Angelim e até o que eu, na minha inocência de Penélope, acreditava ser diferente, o Eduardo Farias.

Previsível mesmo é o Ministério Público Estadual, com a Defesa Civil e o Foster Brown todo ano dizendo a mesma coisa sobre desmatamento e aquecimento global e blá, blá, blá. Aliás, do MPE, há muito esperamos outra postura, ou seja, nada de imprensa, nada de sensacionalismo, nada de vedetismos sobre queimadas. O negócio mesmo é tirar o IBAMA e o IMAC da letargia aguda que os atinge e colocar o “bloco na rua” não apenas para multar, mas prender e obrigar à prestação de serviços à comunidade – limpando ruas, esgotos e apagando incêndios – os grandes proprietários (a maioria com uma herança de grilagem) de terras e madeireiro(a)s que são os verdadeiros responsáveis por nossa desgraça nessa época do ano: o desmatamento e as queimadas.

Não podemos esquecer do ex-governador Jorge Viana, que agora é presidente de uma seita de empresários destruidores da floresta, bem a cara do que ele fez nos oito anos de mandato e das ervas daninhas que plantou e que estão por aí, brotando aos montes, pois coisa ruim se reproduz rápido, como diz minha avó.

Pois é, e pra amenizar o meu tédio, ando lendo as crônicas do Taqui Pra Ti, de autoria do velho amigo de guerra, Bessa Freire, que me inspiraram a escrever essas malfadadas linhas, pois me dei conta de que aqui, pelas bandas do “reino encantado do Aquiri”, tá cheio de anarquista no governo, na prefeitura, na Assembléia Legislativa, na Câmara Municipal, no MPE, no Judiciário, no Conselho de Transporte Público, no meio empresarial, na Polícia Militar e por aí vai. Os caras não cumprem a lei! E isso é coisa de anarquista. Subvertem a lei, não aceitam lei nenhuma, não aplicam e nem respeitam lei alguma. Basta darmos uma olhadinha no que tem sido as aberrações dos constantes aumentos de tarifas de ônibus nesta capital, da história muito mal contada do leite superfaturado, desse papo de fumaça andarilha que todo ano sai da Bolívia e Rondônia e vem encher nossos pulmões e nos adoecer.

A Constituição Federal é jogada na lata do lixo toda hora. Se fazem isso com a Carta Magna, imaginem o que não fazem com a Lei Orgânica do Município de Rio Branco, com as leis estaduais e municipais, enfim com toda a legislação brasileira. Os caras somente respeitam e atendem aos seus interesses pessoais e eleitoreiros, bem como os acordos com os seus “financiadores”, a maioria empresários sanguessugas do fabuloso negócio da madeira e do transporte coletivo.

Aí, em meio a essa patética “ordem” perfeita, entra em cena o surreal, protagonizado por uma “meia dúzia” (pelos dados da imprensa oficiosa) ou uns “vinte baderneiros” (como preferem outros das assessorias governamentais) que insistem em clamar pela aplicação da lei, estado de direito e coisas reacionárias desse gênero. É isso mesmo, os “baderneiros” destes confins amazônicos, saem às ruas clamando para que a lei seja aplicada. Voltamos ao pré-liberalismo, ou melhor, ainda nem chegamos às teses rousseaunianas, pois os pretensiosos badecos que nos representam na Câmara Federal batem no peito pra dizer que foram eleitos pra defender o governo e que “juntos fazem mais pela gente”. Nada mais paradoxal.

É, não restam dúvidas, são todos anarquistas mesmo. É isso aí, chegamos lá: as teses de Proudhon e Bakunin são seguidas à risca por essa àturma que, envolta no cinismo e na intolerância em relação a liberdade de pensamento e manifestação, entoam como lema, nos quatro cantos do Acre, a máxima: “se existe estado de direito nós o burlaremos”. Desse modo, resta-nos ressalvar um vida longa ao anarquismo e um abaixo os “baderneiros” que reivindicam a aplicação da lei, essa coisa “estranha” e “monstruosa” que, no Brasil, continua sendo pra inglês ver.

Gerson Albuquerque é professor da Universidade Federal do Acre e "baderneiro"

Um comentário:

Anônimo disse...

Professor , penso que se o direito emana do povo, deveria ser estudado desde o primeiro ano escolar, assim todos teríam profundo conhecimento dos seus direitos e certamente os doutores seriam mais humanizados e os humanos mais civilizados. teríamos então tempo para filosofar.