segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

MINISSÉRIE

AMAZÔNIA GLOBAL: O GLAMOUR NA TV

Lúcio Flávio Pinto

Amazônia - De Galvez a Chico Mendes podia não ser mais uma incursão do Sul ao Norte, na qual, invariavelmente, este se torna matéria prima para a modelagem daquele. A novelista Glória Perez, autora da mais nova minissérie da TV Globo, em plena exibição, é acreana de nascimento. Logo, não está descobrindo a pólvora nem inventando a roda. Ao contrário, seu texto defende uma tese, conforme ela a expressou em entrevista a Paula Lordello, para O Liberal.

"A conquista do Acre explica porque a Amazônia não deixou de ser brasileira já no início do século XX. Certamente o mapa do Brasil seria diferente, e o da Bolívia também, se o Bolivian Syndicate (consórcio internacional criado pela Bolívia para administrar o Acre) tivesse se estabelecido lá, com direito de explorar a região economicamente por 30 anos e de manter tropas regulares ali".

Se o que a ficcionista conjectura tivesse se consumado, o Acre não seria brasileiro: continuaria a ser boliviano. Jarbas Passarinho faria seus discursos em castelhano e José Vasconcelos apresentaria suas bromas. Este seria um fato. O sindicato internacional se apossaria também de território brasileiro? Esta seria uma hipótese, mas pouco provável. Não havia uma nação por trás desses aventureiros estrangeiros, ao menos com disposição para entrar na cena.

Os pioneiros do Brasil é que se impuseram à força regular da Bolívia. Mas o litígio só não se prolongou mais porque o Barão do Rio Branco encontrou uma solução instantânea e incruenta: comprou o território boliviano, transformando-o no Acre, ainda o Estado menos integrado do país e o mais pobre da Amazônia (a relação, porém, não é necessariamente de causa e efeito).

Ainda que a Bolívia tivesse mantido sua soberania sobre essa região e os especuladores estrangeiros avançassem além-fronteira, em nenhum momento a Amazônia poderia deixar de ser brasileira. Duas décadas depois nosso governo concedeu um milhão de hectares no vale do Tapajós a Henry Ford, que devolveu a concessão em menos de 20 anos de tentativa de implantar a heveicultura, sem ficar com um pedaço sequer de terra. Mais 20 anos e outro americano, Daniel Ludwig, comprou uma área maior (pensava que tinha 3,6 milhões de hectares), no Jari. Fracassou e se foi 14 anos depois. Ford e Ludwig tinham interesses econômicos apenas. Não trouxeram consigo mariners ou a CIA. Se ganharam mais do que deviam ou abusaram, a principal responsabilidade é do governo brasileiro.

Nossa Amazônia, evidentemente, atrai cobiça e provoca apetites. Ontem e hoje. Mas a sua manutenção íntegra e brasileira, em pacífica convivência com suas demais frações continentais, por tanto tempo e a despeito de sua fragilidade, revela que a ameaça estrangeira sempre foi latente, mas nunca se tornou explosiva. Os portugueses, que mantiveram o controle do país por grande parte da sua história de matriz européia, com mais intensidade na Amazônia do que em qualquer outra parte do território nacional (somos o Brasil tardio), foram exímios guerreiros e estrategistas de mão cheia. Sua predominância colonial, porém, também se explica pela visão dos seus competidores em potencial. Mais sofisticados, ou, talvez, mais bem informados e atualizados, eles adotaram outra forma de abordagem. Ou adiaram para quando desse bom tempo. O nosso tempo de hoje.

A declaração de Glória Perez é retórica. Atrai glamour, mas não a verdade. É o padrão TV Globo, mais uma vez.

Lúcio Flávio Pinto é editor do Jornal Pessoal, de Belém (PA). Com certeza não é o caso do jornalista, mas muitos paraenses estão inconformados porque o Pará não é retratado com destaque na minissérie Amazônia.

15 comentários:

Anônimo disse...

Altino,
assim como sou sua leitora assídua, também o sou de Lúcio Flávio Pinto, e como ambos, também sou jornalista.

Como vc mesmo disse não se trata do caso do Lúcio Flávio, e nem o meu, achar que o Pará é quem deveria ser retrado numa produção da Globo. O que acredito - e já te disse isto antes - é que o maior problema não só dos paraenses, mas do resto do país e de não conhecer a história do Acre.

Lembro que na matéria da 1a edição da Rolling Stone Brasil, havia uma especulação sobre o governo do PT do Acre ter investido uma boa verba na mini-série mais cara da Globo. Então, para nós que estamos de fora, e jornalistas que somos, não fica difícil unir alguns pontos e - sem ter o conhecimento que os acreanos detém sobre sua própria história - concluir que a mediação Global na retratação do Acre possa fugir de fatos importantes para dar destaques à alegorias glamourosas...

Abraço grande em vc.

Dani Franco
Paraense e jornalista

Anônimo disse...

Seu blog é uma tribuna democrática e suprapartidária.

Anônimo disse...

Altino,
Leio seu blog quase tds os dias porque é (uma delícia) e porque vc é minha ligação com o que se passa no Acre e lhe dou crédito, como sou uma apreciadora do trabalho e competencia do jornalista Lúcio Flávio Pinto. Não somente respeito a opinião dele como concordo. Mas ai que tá: "Padrão Global" é o que o brasileiro consome tds os dias dentro e fora da "Amazônia" da Novelista Glória Perez. Mas e dai? Como ele mesmo afirma, é pura ficção. Pena que nem tds (brasileiros) saibam fazer a diferença... Descrever um Brasil "moderno"? Claro que tem que ter o "Padrão Global...
E voltando ao paraenses. Também acompanho vários jornais de Belém online. Não ressenti nenhum "despeito" da parte dos paraenses. Ao contrário- outro dia lí numa coluna de "O Liberal" que Belém iria ser citada em alguns capítulos e havia tom de orgulho nisso. Converso com amigos e famíliares, trocamos email, também não ressenti nenhum "despeito". Minha opinião e ela somente retrata o que eu conheço: O paraense é 'barrista' demais para se incomodar com o que se passa na casa do vizinho e sobretudo Belém é uma grande metrópole. Existe uma infra-estrutura capaz de receber produções cinematográficas de origem nacional e internacional, resultado é que muitos filmes já foram rodados lá... Se Belém não é retratada na "Amazônia" (por opção dos que a realizaram) é uma pena. Afinal Belém (e o Pará)e os paraenses fora do contexto histórico do Acre (e da Amazônia) é tremendo lapso.

Anônimo disse...

Silvana, li queixas incisivas no blog da Glória Perez e no Orkut. Ainda estão lás as reclamações dos paraenses. Mas isso é bobagem. Um beijo

Anônimo disse...

:-) Não li o blog da Perez... Não dá pra ler tudo, né?
XXX
Silvana

Anônimo disse...

Bobagem mesmo. A minissérie é bonita e a Glória é escritora e faz mesmo glamour e ficção. É uma minissérie e não um documentário. Mas, a crítica do Lúcio é legítima e coerente com sua história de jornalismo investigativo sobre as chagas do ambiente amazônico. Tudo no seu lugar. Quanto aos paraenses, concordo com a Silvana. Eles têm história para umas cinco minisséries e excelentes escritores também. E viva o Acre e viva o Pará. Sabe dançar carimbó, Altino?

Anônimo disse...

Dançando, sou tão leve quanto um muro. Não danço nada, nem carimbó, nem calipso. Só danço na vida, Márcia.

Anônimo disse...

Dançando, sou tão leve quanto um muro. Não danço nada, nem carimbó, nem calipso. Só danço na vida, Márcia.

Anônimo disse...

Não gosto desse debate. É pequeno. O Acre e o Pará tem muito em comum. Aliás a cultura do
Acre tem forte influênica também do Pará. É claro que a Se a História do Acre vai ser contada nessa minissérie, com certeza um dia veremos a cabanagem sendo retratada. A História da amazônia é riquissima. A propósito, a obra de Glória Perez está excelente, mas não gostei do título da minissérie. Acho que a AMAZÕNIA - de galvez a Chico Mendes - tem uma delimitação que não mostrará nem a História do Acre completa, quiçá do resto da Amazonia. VIvA O ACRE, VIVA O PARÁ, VIVA O BRASIL

Anônimo disse...

Pois eu danço carimbó, marabaixo, lundu, siriá, batuque, toada de boi, marujada e o que vier. Graças à minha mãe, que nasceu em Bragança, litoral paraense conhecido como zona do sal. De lá ela trouxe um fervor de rítmos que você não faz idéia. Minha mãe é um caldeirão de energia. Ah! Vamos pegar carona com a Glória e fazer campanha por uma minissérie sobre a Cabanagem. Escreve vai, Glória!

Anônimo disse...

Esse debate é desagregador.
Amo meu planetinha Aquiri,
Amo o planeta Amapari,o marabaixo, o batuque e a gengibirra,
Meu poeta Joãozinho Gomes,Val Milhomen,
Amadeu Cavalcante,Zé Miguel,Enrico di Micelli e tantos outros tocadores do meio do mundo.
Amo o Pará, por isso vou parar.
É que eu tenho tantos amigos e parceiros musicais que
não quero cometer a injustiça de esquecer um único nome.
Viva a Amazônia de Galvez,Chico Mendes,
Marina Silva,Sebastião Tapajós,Thiago de
Melo,Marcio Sousa,Leila Pinheiro,Fafá de
Belém,Eliakin Rufino,Bado, Mario Ipiranga,Jorge Tufic,Nêgo Nelson,João Donato,Vital Lima e mais uma centena de canôas cheias de gente muito bôa...
"Quem é do amor não engana"

Anônimo disse...

Márcia,
Pois é, menina. Eu danço carimbó e siriá. Vou pegar o Altino na praia Poço das Cobras, numa noite de lua cheia e ensinar, muito embora se diga que carimbó, sirimbó é gostoso, só em Belém do Pará.

Evinaldo, também não gosto do bairrismo, principalmente entre terras que gostam de açaí e de mangas. Minha avó, mãe legítima de minha mãe, morava na Travessa Maurity, vc deve saber onde fica. Não vou dizer que somos farinha do mesmo saco, pois não estou tão fragmentada assim, mas somos povo do mesmo chão trilhado. E isso basta para nos unir. Ninguém nasceu no Acre, sem que não antes tivesse passado por terras de Nazaré, a mãe de todos.
Um beijo grande.

Anônimo disse...

cara Magnólia, Não sei onde fica a travessa Maurity. Moro em Rio Branco e fui em Belém apenas duas vezes, e por poucos dias. Fui nas Docas, na Beira rio e no Boulevar, igreja de Nazaré... tudo lindo. O Pará é mesmo um encanto. Essa discussão me constrange. Não tem porque ser alimentada. Nem de um lado, nem de outro. Somos iguais. Mesma vida severina. Apesar de tudo.

Anônimo disse...

Enuvaldo, não fique constrangido. À princípio o debate é rasteiro e seria mesmo se as opiniões fossem, em sua maioria bairristas e burristas. Mas, de certa forma, serviu pra despertar esse sentimento pan-amazônico (de quem é mesmo esse termo? Já li por aqui algumas vezes). Eu, por exemplo, nasci em Manaus, de pais paraenses. Migramos para o Amapá, depois passei alguns dos melhores anos da minha vida em Belém, estudando. Sou apaixonada pelo Acre, mesmo sem nunca ter pisado aí. É um sentimento tão bom de pertencimento.

Anônimo disse...

Fugindo os cometários, que isto dá é um livro, o importante é que o Acre está no cenário nacional, sinto-me orgulhosa de ser acreana, e poder ouvir elogios dos nossos bravos seringueiros....
Ah, e tb, quando fala que sou de lá, não ter de contar a História do Acre.