sábado, 7 de outubro de 2006

SEU HÉLIO MELO NA BIENAL

Neste sábado, acontece a abertura da 27ª Bienal de São Paulo, que terá como destaque o artista acreano Hélio Melo (*1926 - †2001). Há mais de 20 anos a Bienal, que nesta edição tem como tema "Como viver juntos", não apresentava um artista popular.

Segue um vídeo de 1m28s no qual Hélio Melo fala da seca de 1977 e declama o poema Pirarucu. O trecho do vídeo foi cedido pelo documentarista Sílvio Margarido. Faz parte do documentário "A peleja de Hélio Melo com o Mapinguari do Antimary", dirigido por Margarido, Danilo D'Sacre, Dalmir Ferreira, Ivan de Castela e Jorge Nazaré.





O AVESSO DA SERINGUEIRA


Walquíria Raizer

Entro na sala e encontro um Gregório Filho aflito:

- Walquíria, elas estão no hotel. Resolva!

Conheci então a coordenadora do Rumos Itaú Cultural, Aracy Amaral e a curadora Lizette Lagnado, que selecionavam trabalhos de jovens artistas pelo Brasil.

Fizemos périplo básico no Acre: visita aos painéis do Maquesson, no Teatrão, ateliê do Dalmir, Casa da Leitura da Gameleira, conversa com os artistas plásticos, Casa da Leitura Chico Mendes, onde as visitantes se encantaram com o tirar de sandálias das crianças, a Usina de Artes, a sala projetada pela Bia Lessa no Palácio Rio Branco, o Museu da Borracha...

- Quem é esse?

- É o "seu" Hélio. Quero dizer, o artista acreano Hélio Melo.

Meses depois a Lizette Lagnado apresenta projeto para a Fundação Bienal e vence. É a curadora-geral da 27° Bienal de São Paulo, que é internacional, mas ela não fala nas entrevistas por achar meio out. O projeto dela vem quebrar paradigmas e deixa a crítica em polvorosa. Aborda três lugares: São Paulo, Recife e o Acre!

Um artista popular, do Acre? Há mais de 20 anos a Bienal não apresentava um artista popular.

O tema da 27° Bienal é "Como Viver Juntos", como enfrentar as fronteiras interiores, viver junto respeitando o outro, o seu jeito de ser. O "seu" Hélio Melo, o artista plástico acreano está em destaque na Bienal, com sua técnica peculiar, que utiliza extrato de folhas em sua pintura é um popular, sim. Mas o "seu" Hélio faz a crítica social, a crítica à devastação da Amazônia, aos (des)valores implantados, uma crítca contemporânea.

O projeto necessitava de algo vivo, de artistas vivos. Daí a idéia de convidar artistas do mundo, para que fizessem residência nos três Estados e produzissem sua arte.

No Acre, tivemos a arquiteta eslovena Marjetica Portc. Ela quis conhecer nossas construções, moradias. Ela mostrou seu trabalho aos artistas plásticos, arquitetos e universitários e trabalhou muito durante um mês e meio.

A outra foi a desenhista canadense Susan Turcot. Mostrou também o seu trabalho sonoro-visual para uma grande platéia, andou de bicicleta pelas ruas de Rio Branco, ministrou oficina para interessados e aprendeu com eles.

Nesse meio tempo, um artista grego, o Zafos, soube do burburinho e quis vir sem apoio de residência. Queria "ouvir" o som que se ouve no Acre. Ficou dois dias andando com o Gesileu Salvatore.

O terceiro artista residente foi o colombiano Alberto Baraya, aquele que fez uma seringueira de látex em tamanho natural, no Parque Capitão Ciríaco. Também fiz essa cara quando me falaram do projeto.

O Baraya falou de seu histórico, da sua arte, o que pretende com ela, ministrou oficina, enlouqueceu os ajudantes de carpintaria - foi necessário construir um andaime ao redor da seringueira para que ele pudesse revesti-la com leite, quer dizer o látex.

Neste sábado, quando a grande exposição for aberta ao mundo, em São Paulo, seria ótimo se todos os acreanos pudessem estar lá. Mas sabemos que não é possível. Fica aqui o registro de que não temos fórmula e não sabemos a resposta. Mas é ótimo saber que o nosso jeito consegue provocar perguntas.

Como viver juntos? Não sei. E penso que o Acre também não sabe. Mas acho que é assim, tentando entender porque construímos as casas desse e não daquele jeito, desnudando o nosso olhar sobre nós mesmos, vendo ali no centro da cidade o "avesso da seringueira exposta", que a gente pode conseguir encontrar o "como".

Walquíria Raizer é cientista social, cronista e poeta. É dona do blog Um caso poético.

2 comentários:

Anônimo disse...

Por falar em artista plástico, viveu aqui no Ceará, e era considerado o maior pintor primitivista do mundo, um cidadão chamado Chico da Silva, que asssinava suas telas com a impressão digital.Muita gente ganhou dinheiro com sua obra. Menos o próprio. Chico, pouca gente sabe, era acreano.eymard freire.

Anônimo disse...

O Chico da Silva, que tive a rara felicidade de conhecer em Fortaleza - também tive a oportunidade de conhecer Patativa do Assaré -, pouco antes dele completar sua missão, não assinava usando o polegar. Aliás, sua marca era o "esse" invertido.