domingo, 27 de agosto de 2006

É PRECISO RESISTIR

A fumaça e alguma pobreza de espírito que pairam sobre o Acre nesse agosto de 2006 me fizeram lembrar que o jornalista Antonio Alves, do blog O Espírito da Coisa, foi demitido do jornal O Rio Branco, em agosto de 1988, porque escreveu que considerava psicopata quem derrubava e tocava fogo em dois mil hectares de floresta para plantar capim.

Além da coluna "A coisa em si", que escrevia no jornal, Toinho Alves apresentava, bem antes do surgimento de Arnaldo Jabor, na Globo, uma crônica deliciosa, na TV Aldeia, a estatal instalada no Acre pelo então governador Flaviano Melo (PMDB). Trabalhava lá, a jornalista Simony D'Avila, que agora dirige a emissora e é casada com o candidato a governador Binho Marques (PT).

No dia que a crônica foi publicada, Toinho Alves saiu direto de casa para gravação na emissora, quando Simony D'Avila o surpreendeu com a notícia de que o mesmo fora demitido do jornal. Toinho saiu e foi até à redação do jornal, onde encontrou o saudoso editor José Chalub Leite esvaziando gavetas da mesa.

- O que aconteceu, Zé Leite? - indagou Toinho, sentado sobre uma mesa.

- Você foi demitido pelo diretor Naildo Mendes por causa da crônica de hoje. Pedi demissão em solidariedade a você, bem como todos os empregados do jornal - explicou o editor, que trabalhava no jornal desde que o mesmo foi fundado, em 1970, pela família Tourinho, que também era proprietária do jornal Alto Madeira, de Porto Velho (RO).

No fumacento 1988, em junho ou julho, o jornal O Rio Branco foi comprado pelo empresário Narciso Mendes, que entregou a direção ao Naildo Mendes, irmão dele. Naildo, que derrubara dois mil hectares de floresta naquele verão, havia tocado fogo em sua propriedade na mesma semana em que a crônica foi publicada. Toinho Alves não sabia disso e havia se referido a outro caso, mas o diretor vestiu a carapuça de psicopata.

Enquanto Zé Leite e Toinho Alves conversavam, o empresário Narciso Mendes irrompeu a sala.

- Vou mostrar para você como sei mandar no que é meu. Tire a sua bunda de cima da mesa e vá embora daqui, agora - ordenou, dedo em riste.

- O senhor deve conhecer a seguinte frase de Víctor Hugo: "O valor de uma pessoa não se mede pelos ambientes que ela frequenta, mas pelos ambientes que ela se recusa a frequentar". Saiba que enquanto o senhor for dono deste jornal, minha bunda não sentará mais sobre suas mesas - rebateu Toinho, enquanto se levantava, batia as mãos nos fundilhos e se retirava da redação.

Narciso Mendes ficou colérico e seguiu os passos de Toinho Alves, a quem ofendeu com centenas de palavrões. Quando chegaram à rua, nela estava o jornalista bissexto Luis Carvalho. Ele, que havia estacionado o seu carro em frente ao jornal, ficou assistindo Narciso aos berros, mas foi surpreendido pela cólera do empresário.

- Por que você, com cara de safado, está olhando para mim? - quis saber Narciso.

- Vai tomar no cu, rapaz - respondeu Carvalho.

Narciso ameaçou avançar contra Toinho Alves, que levantou a guarda para o embate, mas desistiu de esmurrá-lo na cara por causa dos óculos. Ninguém sabe até hoje como o Luis Carvalho arranjou uma ripa com a qual Narciso Mendes foi golpeado até correr e se refugiar no prédio.

Toinho Alves voltou para a TV Aldeia e Narciso Mendes seguiu para o Palácio Rio Branco, onde foi recebido por Flaviano Melo. Logo que chegou à TV, Toinho foi chamado pelo jornalista Elson Martins, diretor da emissora.

- Já estou sabendo o que aconteceu, Toinho. O Flaviano está reunido com o Narciso Mendes. Telefonou e já falei que não vou censurá-lo. Ele sugere apenas para você maneirar na crônica.

- Tudo bem, Elson. Vou apenas bater no canto, bem colocado, no fígado - tentou tranquilizar Toinho, que gravou a crônica falando da ameaça de morte que sofrera do empresário.

O jornal ficou sem circular mais de uma semana e o Zé Leite convenceu o pessoal que não era da redação a desistir do pedido de demissão solidária. Voltou a circular quando Narciso Mendes contratou os jornalistas César Fialho e Romerito Aquino.

O que se seguiu levou o diário ao lixo da história. Seus repórteres anunciaram a semana em que o seringueiro Chico Mendes seria assassinado. No dia do crime, em 22 de dezembro de 1988, estavam de prontidão e tiraram fotos do corpo crivado de bala.

O Acre não foi mais o mesmo desde então, embora a fumaça e alguma pobreza de espírito teimem em pairar no ar.

É preciso resistir.

8 comentários:

Anônimo disse...

Alma Necrolérico, essa história é incrível. A parte que mais gostei foi a das "ripada". ha ha ha.....
É preciso resistir!
Fernando França

Anônimo disse...

Fernando Socó, que ninguém brinque com o Toinho. O cara só tem aquele jeitão de acreano come-quieto. Certo dia, Toinho e eu fomos ao gabinete do Jacó Piccoli, que era presidente da Fundação Cultural. Queríamos falar com ele sobre o festival do Amapá. Jacó mandou a secretária nos dizer que expuséssemos em ofício o que tínhamos a tratar com ele. "Pois não, é pra já", disse Toinho. Ele pegou uma folha de papel e uma caneta, escreveu o nome da cidade e a data no cabeçalho, seguido do seguinte texto: "Sr. Jacó Piccoli, nós estamos aqui porque precisamos tratar agora a respeito da compra da área do festival do Amapá pelo senhor". Assinou o documento e pediu que a secretária Graça (ela já é secretária do Jorge Viana há pelo menos 15 anos) entregasse com urgência o ofício. Jacó então decidiu nos atender, mas quando apareceu na porta o Toinho avançou, agarrou o colarinho dele com as duas mãos e o suspendeu do chão. O Jacó não reagiu enquanto o Toinho ameaçava bater na cara. Jacó saiu da fundação e entrou chorando no gabinete do governador Nabor Júnior. Em seguida éramos chamados a nos explicar. Ah! O saudoso Jorge Nazaré estava na parada e se saiu com essa: "Eu não sabia que a coragem do Toinho era da melhor qualidade".

Anônimo disse...

Sempre haverá idiota votando em bastardo !

Anônimo disse...

Altino, essa censura continua e você sabe disso. Um dia a gente contará as histórias de hoje para a geração de amanhã.

Anônimo disse...

Noblat fez um comentário muito bom hoje em decorrência da baixaria política no Distrito Federal, que está sendo ignorada pelos jornais de Brasília:

"O que leva jornais, em plena capital da República, a ignorarem um fato político relevante como esse?

Ou não é relevante um ex-governador, em meio a uma campanha, aliado até outro dia de um candidato à sua sucessão, dizer o que Roriz disse sobre Arruda? (Veja aqui nota publicada abaixo.)

Onde fica o compromisso sempre apregoado por esses jornais de servirem à comunidade onde circulam? Como fica a defesa que eles sempre fazem da liberdade de imprensa?

Essa é a mais vital das liberdades. Porque sem ela as pessoas desconhecem o que ocorre. E por desconhecerem, exercem mal seus direitos de cidadãos.

O que se passa com a imprensa em Brasília se repete com a imprensa da maioria esmagadora dos Estados e ganha dimensões de escândalo principalmente em período eleitoral.

Temos uma imprensa atreladada a poderosos grupos políticos e econômicos e que a eles presta vassalagem em primeiro lugar. São eles que a sustentam - não os leitores.

É por isso que esse tipo de imprensa pode se dar ao luxo de vender tão poucos exemplares. Ela atrai mais anúncios pelo que deixa de publicar do que pelo que publica".

Anônimo disse...

Alcinéa querida,

Calculo o tamanho de sua indignação, pois, pela primeira vez na vida estou respondendo um processo e partiu justamente dessa colicorja que quer manter tudo como está em nosso Estado natal meu, seu e de Alcilene. Já que levei o primeiro processo e Deus sabe que não tenho onde cair morto e se justiça me condenar por declarar minha indgnação, ofererei algum órgão meu que possa ser leiloado e assim satisfazer essa sede de poder sem medidas desses advogados e mais quem eles representam. Sugiro que no dia 1 de outubro, todos nós, usemos uma mordaça para ir às urnas como forma de protestar. Não esqueça de incluir o Amapá Busca nessa lista, afinal, eu fiz a foto.

Anônimo disse...

"O jornal ficou sem circular mais de uma semana e o Zé Leite convenceu o pessoal que não era da redação a desistir do pedido de demissão solidária. Voltou a circular quando Narciso Mendes contratou os jornalistas César Fialho e Romerito Aquino.

O que se seguiu levou o diário ao lixo da história. Seus repórteres anunciaram a semana em que o seringueiro Chico Mendes seria assassinado. No dia do crime, em 22 de dezembro de 1988, estavam de prontidão e tiraram fotos do corpo crivado de bala".
Altino, tu não tem jeito mesmo! Estais mesmo se especializando no jornalismo da fofoca, da intriga, das meias-verdades, da mentira, da tua própria conveniência, do disse-me-disse, da baixaria. Rapaz, pára de escrever sobre o que não conheces e vai aprender o que é jornalismo sério, responsável, coerente, verdadeiro!!!
Romerito.

Anônimo disse...

Romerito, sinta-se à vontade para contar de modo sério, responsável, coerente e verdadeiro, tudo o que você sabe daqueles dias. Bom saber que você continua leitor do blog.