domingo, 25 de junho de 2006
SILVANA DE FARIA DITCHAM
Altino,
Olá! Como vai você?
Sou acreana, de Rio Branco, e vivo há 20 anos na Europa. De vez em quando vou ao Brasil para visitar a família. Tenho recebido visitas de acreanos aqui. Meu irmão, que vive entre Rio Branco e Manaus, esteve comigo ultimamente por um mês.
Vivo em Londres e, às vezes, leio na internet os jornais locais. Descobri sua página completamente por acaso, enquanto pesquisava sobre a novelista Glória Perez. "Caí” no seu blog e li alguns dos seus artigos e comentários. Em primeiro lugar, impressionante que você seja autodidata e escreva com tanta eloqüência, de modo desconcertante, visto os assuntos que trata.
Deve ser muito perseguido mesmo, como comentou na sua apresentação. Fiquei fã da sua irreverência, que é uma rara qualidade, porque é feita com fineza e certamente justa, pois não está sendo “pago” pra escrever. Isso me deixa acreditar que você é autêntico e agora consulto seu blog todos os dias e quero lhe agradecer pelas notícias, fotos e artigos.
Bem, vivendo assim tão longe, quero dizer que não morro de “saudades” do Acre ou do Brasil, nem da comida, nem do calor, muito menos dos piuns do seringal. Sinto saudade de pessoas e muito delas já se foram. Sinto saudade de lugares, mas muitos deles já não existem literalmente, como o seringal Mercês, dos meus antepassados, que virou pasto pra boi dos ‘paranaenses’.
Lembro de pessoas, como a Kátia, a Sonja que foi ‘rainha da primavera’, a Fátima Barros, a Socorro (hoje é Beth-juiza- Maia), a Kátia (irmã da Norminha), o Geraldo Barbosa, o Eduardo (irmão do Geraldo), o Júnior Adonay e muitos que vai custar listar. Estavam um ou dois anos na minha frente, mas como eu cantava e tocava violão junto com o Junior Adonay e Eduardo, sempre pensavam que eu era da turma deles, mas eu era apenas um ou dois anos abaixo. Menina buchuda mesmo.
Eu sou atriz, estou terminando um mestrado em filme e vídeo, sou também roteirista, mas muitos dos meus trabalhos ainda não foram publicados. O meu trabalho como atriz é inédito no Brasil.
Tive uma vida muito intensa e sempre fui uma “revoltada” contra o sistema do Brasil -política, costumes sociais, o meio artístico feroz! E essa é uma das razões por estar vivendo até hoje na Europa. Mas escolhi viver aqui sobretudo porque construí família: tenho duas filhas, marido e tudo o que isso representa.
Hoje estou aos poucos voltando às minhas raízes e estou preparando um documentário-filme para 2007 sobre os yawanawa. É um projeto ambicioso e devo passar uns seis meses aí no Acre para isso. Por sinal, adorei as informações no seu blog sobre os yawanawá.
Fiquei sabendo pelo jornal O Globo da minissérie sobre o Acre, escrita pela acreana Glória Perez, e como sou também uma acreana e envolvida em filme, cinema, etc., quis saber mais sobre esse projeto.
Há alguns anos, quando surgiu o projeto de filme sobre Chico Mendes, fui escolhida pelo produtor David Puttnam (ele foi em Paris me conhecer pessoalmente) e pelo diretor Chris Menges para fazer parte do projeto. Eu iria fazer o papel de “Ilzamar”. O filme começava quando Ilzamar e Chico namoravam- ela com uns 18 anos, e ia até a idade que ele era assassinado.
Nessa época eu tinha 24 anos, mas eu era muito jovem, fisicamente. Fiz testes em Londres, fui aprovada e fiquei esperando pelo filme começar. Certo dia recebí um telefonema, seguido de uma carta, confirmando que o projeto havia sido parado por causa dos direitos do filme - uma confusão entre a família de Chico Mendes, produtores brasileiros, americanos, ingleses, etc. Se você quiser aprofundar, poderemos tocar pra frente depois, não me sinto em posição de falar nisso agora.
Bem, continuando... Fiquei muito triste desse projeto não se realizar, pois iria ter um impacto internacional e ia “empurrar” minha carreira de atriz. De lá pra cá, sempre leio e vejo tudo relacionado a Chico Mendes. Fui até Xapuri, visitei a casa onde vivia, filmei, encontrei a Ilzamar, foi uma emoção pra mim. Mas, como sempre, voltei pra Europa.
Minha vida (daria somente ela um romance!) é aqui e vivi uma reviravolta: abandonei a carreira artística por muitos motivos pessoais. Nessa época, morava em Paris, mudei para Londres, etc.
Depois de algum tempo sem trabalhar no meio artístico voltei (dessa vez atrás das câmaras) e também decidi fazer uma faculdade e por isso estou acabando o mestrado e penso daqui a um ano “atacar” o doutorado. Veremos...
O irmão do meu pai faleceu anteontem em Belém. Ele tinha 83 anos e passou praticamente toda a vida dele no Acre, nas matas dos seringais do pai dele. Meu pai faleceu há três anos, com 93 anos. Meu pai e meu tio se foram e com eles uma parte da história do Acre. Dois arquivos vivos que se apagaram. Ouvi a música do Vital Farias e me deu lágrimas nos olhos. É a vida.
Um grande abraço pra você e obrigada pelo seu blog. Li seu blog de cabo-a-rabo. Saiba que é o melhor dos 'brazucas' e o melhor dos jornais do Acre. Tem muita gente fazendo politicagem e é difícil encontrar imparcialidade. Como vivo tão longe, acho que seu blog me dá uma certa objetividade.
Silvana de Faria Ditcham
► A Silvana cresceu entre Rio Branco e o Seringal Mercês, que era propriedade de seus pais Cézar Escócio Drummond de Faria e Tarcila Vianna de Faria. É casada com o baterista e percussionista inglês Martin Ditcham. Tem duas filhas: Oona, 15, filha de sua longa união com o diretor de cinema francês Gilles Béhat, e Maya, 3, filha de Martin Ditcham. Ela é irmã do advogado e compositor Cézar Escócio, que atualmente vive em Belém. Clique aqui para conhecer o site da Silvana.
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3 comentários:
Altino, por isso que valorizo seu blog e a sua pessoa.
Nós que estamos fora do Estado do Acre nos sentimos mais perto das informações do que acontece de importante por ai e ressalvando que você procura dar valor aos valores das terras acreanas.
Muito linda a Silvana e parabéns pelo trabalho dela no exterior. Que seja bem vinda ao retornar ao Acre e reveja o quanto ele mudou em alguns aspectos culturais. Eu que vivo às voltas com a inha sonhadora filha fico feliz quando leio essas notícias. Bom domingo a você Silvana e Altino/Kátia.
Lembro muito bem dessa parte da história contada por Silvana. Eu estava com David Putnam e vi as fotos dela, quando ele descobriu que havia uma atriz acreana que poderia representar Ilzamar.
Altino, como sempre digo, seu blog é referência, não só para os acreanos, mas também para os brasileiros que querem conhecer esse Estado mágico.
Obrigada e continue assim.
Beijos
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