sexta-feira, 12 de maio de 2006

FRONTEIRAS BRASILEIRAS

Por Marcos Vinícius Neves (*)

A divisão das possessões espanholas e portuguesas na América do Sul, foi motivo para intensas disputas e conflitos ao longo de boa parte de nossa história colonial. A linha de Tordesilhas que demarcava oficialmente a fronteira entre essas possessões nunca foi respeitada de fato.

Mas no século XVIII a solução das questões de fronteiras tornou-se uma necessidade preemente. Por isso, Portugal e Espanha decidiram elaborar um Tratado que resolvesse definitivamente esse problema. Tinha início aí, sem que se soubesse ainda, a questão acreana.


Tratado de Madrid
Esse tratado de limites é um dos mais importantes da história brasileira. Segundo nossa história diplomática, a assinatura desse tratado representou uma grande vitória portuguesa, já que foi esse pais o grande beneficiado, em detrimento dos direitos espanhóis.

Devemos lembrar que em meados do século XVIII, o conhecimento que se possuía do interior do continente americano era ainda muito impreciso, como podemos constatar pelo Mapa das Cortes, que serviu de base para a elaboração do Tratado de Madrid.

Ainda assim os diplomatas portugueses foram hábeis em estabelecer o principio do Uti Possidetis como a base para a divisão territorial que pretendiam. Foi graças a esse principio, que estabelecia que a terra deveria ser possuída pelos que nela moravam e trabalhavam, que se pôde consolidar a presença portuguesa no imenso território que hoje constitui o Brasil.


Quanto à Amazônia o desconhecimento geográfico era ainda maior. Uma vez que os únicos cursos d’água bem conhecidos na região eram o rio Madeira e o rio Javari, foram estes utilizados como referencia para a fronteira sul da Amazônia Ocidental.

Pelo que foi definido no Tratado de Madrid a linha fronteiriça deveria partir do ponto mediano entre a foz do rio Madeira e a foz do rio Mamoré por uma linha reta até encontrar a margem do rio Javari (ver mapa correspondente), aproximadamente na latitude de 6º e 40’ Sul. Nascia assim a linha imaginária que causaria tantas polêmicas no futuro.



Destratando os tratados
As mudanças ocorridas nos diversos aspectos econômicos, políticos e sociais dos países envolvidos com a colonização americana levaram Portugal e Espanha a muitas idas e vindas na questão das fronteiras. Dessa forma, o Tratado de Pardo, de 1761, anulou o que havia sido acertado em Madrid. Posteriormente, já em 1777, o Tratado de Santo Ildefonso arremedou algumas das conquistas obtidas em Madrid e restaurou a linha divisória entre o Madeira e o Javari, como havia sido estabelecida em 1750.


Tratado de Ayachucho
Nas primeiras décadas do século XIX, o contexto histórico latino americano havia se alterado profundamente. As ex-colônias espanholas e portuguesas tornaram-se países independentes e as questões fronteiriças ganharam conotações inéditas. Foi nesta nova situação que Brasil e Bolívia negociaram o Tratado de Ayacucho, assinado em 1867.

Cabe ressaltar que o Brasil negociou esse tratado sujeito à pressões exercidas pela Bolívia durante a Guerra do Paraguai, que estava mobilizando todos os recursos bélicos e financeiros brasileiros. Ainda assim, a diplomacia brasileira soube se aproveitar da fragilidade congênita da Bolívia para tirar vantagens da assinatura desse tratado.

Como o povoamento brasileiro já havia penetrado nos rios Madeira, Purus e Juruá, os negociadores brasileiros procuraram empurrar a linha divisória mais para o sul, estabelecendo que o ponto inicial da fronteira seria agora a confluência dos rios Beni e Mamoré, onde se iniciava o Madeira. A partir daí o Tratado de Ayacucho dizia que “Deste rio para oeste seguirá a fronteira por uma paralela, tirada da sua margem esquerda na latitude sul 10º20’ até encontrar o rio Javari. Se o Javari tiver as suas nascentes ao norte daquela linha leste-oeste, seguirá a fronteira desde a mesma latitude, por uma reta a buscar a origem principal do dito Javari.”

Como se pode perceber no trecho transcrito acima, por ocasião da assinatura do Tratado de Ayacucho, ainda não se conhecia as verdadeiras nascentes do Javari. Acreditavam os diplomatas brasileiros que essas nascentes estavam no paralelo 10º20’, porém deixavam em aberto uma solução para o caso dessa idéia não corresponder à realidade, como se constataria posteriormente já que as verdadeiras cabeceiras do Javari estavam situadas a 7º06’e seria exatamente esse fato que daria origem à Questão Acreana a partir de 1895, quando começaram a ser demarcadas na prática essa fronteira.

(*) O historiador Marcos Vinícius Neves é presidente da Fundação Garibaldi Brasil

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