sexta-feira, 13 de janeiro de 2006

AGRICULTURA NA AMAZÔNIA

Aprovado edital do Pronaf florestal para a região

Por Écio Rodrigues (*)

Em sua última reunião de 2005, realizada em meados de dezembro, em Brasília, o Conselho Deliberativo do Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA), aprovou o Edital de demanda induzida, destinado ao apoio de projetos em duas linhas: a) qualificação de profissionais em assistência técnica e extensão rural; e b) custeio da assistência técnica propriamente dita para atividades produtivas a serem realizadas no bioma Amazônia.

Na verdade com a aprovação desse Edital o Programa Nacional de Florestas, gerido pelo Ministério do Meio Ambiente, resgata uma dívida com a Amazônia, uma vez que esse tipo de apoio já está em andamento em outras regiões como, por exemplo, a Mata Atlântica e o Cerrado.

Os recursos para apoio aos projetos virão do Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Eles custearão iniciativas públicas e de organizações não governamentais, voltadas à realização de cursos para agentes de extensão rural e para o fornecimento de assistência técnica para elaboração de projetos a serem apresentados aos agentes financeiros operadores do Pronaf.

Uso múltiplo - O Edital chega em boa hora, no momento em que o Basa divulga a deficitária concessão de créditos do Pronaf para atividades produtivas do setor primário, sobretudo as florestais, em 2005. A realidade é que sobrou dinheiro e faltaram produtores para acessarem os recursos existentes. Além das amarras tradicionais do sistema financeiro, impostas ao produtor pelo Basa, a oferta de assistência técnica tem sido apontada como uma das maiores causas dessa taxa reduzida nas operações de financiamento.

Indo além, a pretensão do Edital é ainda maior. Pretende ampliar a oferta e o acesso ao crédito rural, mas não ha qualquer tipo de atividade produtiva. A prioridade, rigorosamente discutida e aprovada pelo Conselho Deliberativo do FNMA, foi para as atividades inseridas na tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo. Isto quer dizer que os projetos a serem elaborados pela extensão rural com apoio do FNMA, se direcionarão à produção de castanha, açaí, patauá, abacaba, sementes florestais, madeira, paca, queixada e assim por diante, desde que inseridas nos princípios tecnológicos do manejo de uso múltiplo. Poderão ser realizadas de maneira coletiva ou individual.

Essa prioridade para o uso múltiplo é fundamental para que as propostas objetivem a manutenção do ecossistema florestal por meio da ampliação de seu valor por hectare. As experiências de manejo comunitário existente na região provaram, de maneira inequívoca, o potencial dessa tecnologia, para reverter os índices atuais de conversão da floresta em cultivos agropecuários.

Projetos do Acre - Conselho Deliberativo também foi bastante exigente com relação à manutenção e recuperação das áreas legalmente protegidas, nas propriedades onde se realizarão os projetos. Com ênfase nas matas ciliares e na reserva legal, os projetos apresentados ao FNMA que preverem sua manutenção terão maior pontuação e conseqüentemente maior chance de receber apoio financeiro.

Essa foi, sem dúvida, mais uma importante contribuição dada pelo Conselho Deliberativo para melhoria da qualidade dos Editais do FNMA. A conclusão acertada é a de que se a autoridade pública não atentar para as condições de dilapidação da reserva legal e matas ciliares, no momento de apoiar o produtor, ele não será incentivado a se preocupar com isso.

Assumindo a prioridade levantada pelas representações da sociedade civil, o Conselho Deliberativo, analisou e aprovou todos os projetos de demanda espontânea que se encontravam em condição de votação. Isso significa que o Fundo entra em 2006 com a carteira de demanda espontânea precisando ser recomposta e aguardando para recebimento de projetos.

Dois destaques especiais dos projetos de demanda espontânea, aprovados para a Amazônia, merecem citação. O primeiro elaborado e proposto pela Funtac irá organizar a produção de sementes florestais nativas na Floresta Estadual do Antimary e na Floresta Nacional Macuã, duas importantes e estratégicas áreas para a sustentabilidade da produção florestal no Acre. Já o segundo, proposto pelo Parque Zoobotânico da Ufac, irá implantar ações destinadas à viabilizar uma produção agropecuária sem o emprego das danosas queimadas.

Eleições 2006 - Nós da sociedade civil deveremos estimular as entidades, em especial aquelas que possuem o Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas (CNEA), para voltarem a acreditar na demanda espontânea como mecanismo eficiente para acessar os recursos do FNMA, mecanismo um tanto esquecido com a ocorrência dos vários editais de demanda induzida.

Uma das maiores prioridades da nova representação da sociedade civil no Conselho Deliberativo, cujos representantes foram eleitos em maio e tomaram posse na reunião de Tamandaré em Pernambuco, deverá ser a recuperação da importância da demanda espontânea na composição da carteira de projetos apoiados pelo FNMA. Nessa terceira reunião, com a participação dos novos conselheiros, isso ficou bastante claro.

Por fim o Conselho Deliberativo marcou para final de janeiro de 2006 uma reunião para discussão de assuntos internos do FNMA. Nessa reunião as demandas da sociedade civil, como os assuntos da contrapartida, do investimento em bens de capital e outros, serão avaliados para serem introduzidos no regimento interno do FNMA ou em outras normas aplicáveis.

Uma preocupação encerrou as discussões. Trata-se da ocorrência das eleições em 2006 o que limitará os prazos para assinatura de convênios com prefeituras e outros órgãos públicos. O FNMA deverá estar atento para que não tenha sua execução financeira comprometida. As ONGs, por outro lado, ganham importância especial.

(*) Écio Rodrigues é engenheiro florestal e representante das ONGs da Região Norte no Conselho Deliberativo do FNMA.

Um comentário:

Anônimo disse...

O conjunto de notícias desse artigo do Écio é extremamente interessante e, em alguma medida, até mesmo preocupante naquilo que diz respeito ao Acre. Em primeiro lugar, o que me chamou a atenção foi a "mistura" que se vai desenrolando na estrutura administrativa do governo federal. No caso me refiro qo fato do Ministério do Meio ambiente assumir áreas da ação produtiva. Isso demonstra, no limite, a forma como se trata o meio ambiente no Brasil: a questão ambiental não foi, até agora, incorporada de forma integral para o conjunto das ações humanas com forte rebatimentos sobre a natureza. As ações de forte impactação ambiental como aquelas decorrentes da grande produção agrícola, a produção industrial e as faixas de mineração de grande escala, os processos de urbanização articulado ao processo da acumulação de capital de forma ampla são tratadas por outras esferas do governo. Nesse campo o Ministério simplesmenter acumula derrotas como as relativas aos produtos gfeneticamente modificados. Em segundo lugar, ao se voltar para a qualificação de profissionais da área da assistência técnica, fica a dúvida sobre o sentido dessa qualificação. Em que se apoiará, quais os objetivos produtivos ou, falando de forma mais ampla, quais os objetivos desenvolvimentistas para os quais se voltará essa assistência técnica? O que é certo é que não há, pelo menos não é conhecido, o modelo do desenvolvimento regional para a Amazônia. Também não há para o Acre. Logo, essa qualificação atenderá a aspectos circunstanciais e conjunturais. A Assistência Técnica é o segmento da ação de governo que se volta para articular um programa de incorporação de mudanças no processo produtivo. Um extraordinário instrumento de promoção das melhorias nos níveis de bem-estar. Mas não é neutra. Ela produz resultados. Em terceiro lugar, dois pontos: primeiro, o projeto da Ufac nos fala que ainda estaremos buscando alternativas de sistemas agro-florestais; segundo existem ações de recuperação urgentes a serem deflagradas no Rio Acre. Talvez fosse tempo de um amplo programa que vai da regulamentação do uso e preservação das florestas ciliares até medidas mais direta de produção de mudas de espécies regionais e replantio de florestas ciliares ao longo de toda a extensão. Em síntese, é urgente que se formule um programa integral de desenvolvimento regional e, a partir dele, que se repensem as estruturas operacionais de governo - em todos os níveis - e as políticas de ação pública e do crédito.