sexta-feira, 4 de novembro de 2005

ESPIÃO TUPINIQUIM

Altino, lí no seu blog a entrevista com o jornalista Elson Martins e como ele citou meu nome, resolvi enviar trecho do livro “Jogada$ do Poder”, que ainda escrevo, sobre os bastidores da política acreana. Este trecho relata exatamente o que o Elson lhe disse, mas com mais detalhes. Se quiser publicar, está autorizado.

Roberto Vaz
Diretor do Notícias da Hora

O espião tupiniquim e a força da
resistência contra as jogadas do poder

(...) Eu nem sei ao certo o que passava na minha cabeça, mas eu tinha uma vontade danada de me aproximar do jornalista Elson Martins. Ele vivia pirangando pelas biqueiras do Palácio Rio Branco. Perguntava sobre tudo e parecia ser bom moço. Certo dia eu o presenteei com um envelope com muitas fitas codificadas dos aparelhos de telex (o meio de comunicação mais moderno na época) que saíam do Palácio Rio Branco para os gabinetes em Brasília.

Vivíamos numa época de ditadura e diariamente eu xeretava o lixo da toda poderosa Heloisa Abud, secretária de confiança do governador, para apanhar os papéis carbonos de documentos que eram rebatidos em moderníssima Olivetti e que eram enviados pelo Palácio Rio Branco para as autoridades para repassá-los ao Elson. Eu também ficava de olho em quem entrava e saia do gabinete do governador Mesquita e os assuntos que eram tratados. O Nemézio Coelho, chefe do Gabinete Civil parecia não confiar em mim, mas eu o driblava me escondendo no banheiro ou dentro do armário da sala do governador sempre que ele deixava o palácio.

Eu atuava como espécie de espião tupiniquim e ninguém suspeitava que eu era uma das fontes da força de resistência da imprensa acreana. Não era uma questão ideológica, pois não tinha discernimento para avaliar o risco das coisas que fazia. Era uma questão de prazer, pois eu curtia muito com as notícias em primeira mão que o Elson conseguia colocar no jornal O Estado de São Paulo.

E ele, que sempre teve aquela cara fechada, abria um largo sorriso quando recebia material novo do palácio. Só que nunca notou que eu tinha necessidade financeira, uma vez que era órfão de pai e mãe e precisava ganhar a vida por conta própria. Nunca me gratificou pelos grandes furos que deu. Mesmo assim, nunca deixei de informá-lo sobre as ações do Barão e os desmandos da corte.

Essa aproximação me garantiu espaço na sua agenda de amigos. Ele era Cortez e sempre dispensava a mim cumprimentos entre as personalidades que ele conhecia. Eu era contínuo do Palácio Rio Branco, emprego que ganhei após emocionar o presidente Geisel em sua visita ao Acre, em julho de 1977 e o governador Mesquita.

Nesta época o Palácio do Governo era bastante frequentado. Campos Pereira era o grande jornalista, o nome mais forte do Acre na área da comunicação, mas sempre foi tratado com desprezo pelos ocupantes do poder. E foi através de um cano que dei no Campos que virei jornalista. Ele tinha um micro gravador e propus comprá-lo. Dividimos a dívida em três vezes e eu não tinha dinheiro. Ele me cobrava e eu sempre tinha uma desculpa. Comecei a me esconder dele. Até que um dia, em frente a muitas pessoas ele me fez uma vergonha danada. Como não tinha dinheiro me dispus a pagá-lo trabalhando para ele. Ele topou e eu comecei a correr campo. Eu fazia (bem ruins, é verdade) reportagens para o programa esportivo da Rádio Difusora. Meu sonho era assistir as partidas de futebol sem pagar ingresso. E não demorou para isso acontecer. Com pouco mais de seis meses de trabalho, eu já era reconhecido por alguns craques da época. Aos poucos fui me fixando na nova profissão.

Em meados de 1983, já instalado o governo de Nabor Júnior, eu já tinha quase cinco anos de palácio, mas aquilo não me satisfazia. Eu já tinha progredido, deixara de ser contínuo para fazer mandados na Assessoria de Imprensa do Governo. Era o chamado Pau Mandado. O Nabor era tido como um governo progressista para a época. Queria coisas novas, pois sabia que o seu mandato de quatro anos era apenas o início de uma década de poder. Vislumbrou que a imprensa precisava ser financiada para se modernizar e com isso se capitalizava politicamente. Decidiu então convencer o senador Mário Maia a montar um jornal. E como garantia sobre o noticioso, indicou os jornalista Silvio Martinello e Élson Martins. A dupla Batmam e Rob. Eles eram considerados os papas. Suas linhas editoriais eram consideradas comunistas, subversivas, esquerdistas, agitadoras e corajosas. O Acre precisava disso.

Pois Bem! O jornal estava prestes a começar os seus testes e certo dia, ao liberar o material de divulgação para as redações dos jornais, rádios e tvs, eu, desavisado, resolvi escrever no envelope do jornal Diário do Acre, a seguinte frase: “Cuidado, a Folha vem aí...” Isso foi o bastante para o editor do jornal O Diário do Acre, Estevão Bimbi, armar o maior barraco na assessoria de imprensa do governo. Feita uma rápida investigação, o jornalista Fé em Deus descobriu que o autor da frase fora eu e deixou para o assessor Sued Chaves decidir o que fazer comigo. O baixinho, embevecido pelo poder, não quis nem ouvir o meu relato e mandou-me embora, sem direito se quer a alguns trocados (eu era recibado, o mesmo que funcionário de GT criado pelo PT ou de cooperativa, criado pelo PMDB)

Mas aquilo que parecia ser o meu dia de azar, acabou se transformando no meu dia de sorte. Cabisbaixo deixei as dependências do palácio e rumei para a Rádio Difusora. Lá dei de cara com o Silvio, que me chamou num cantinho e disse:
- “Menino, tu que ser jornalista?”
- “Como assim?”, respondi.

E fumando o seu inseparável cigarro, começou a me contar os seus planos para esse novo jornal que ia circular na cidade. Não contou tudo, claro, mas nem precisava, pois eu já sabia que o Flaviano Melo estava por trás. E a Folha do Acre nasceu, cresceu e quando o Mário Maia brigou com o prefeito Flaviano Melo quebrou! E eu, que só sonhava em ser amigo do Élson Martins, acabei virando sócio dele depois de alguns anos de muito trabalho. (...) . Continua no livro.

2 comentários:

Anônimo disse...

Rsrsrs é íncrivel como o passado volta à nossa memoria. Me lembro do Roberto no estadio de futebol fazendo as entrevistas. "kkkk eu era maria chuteira" era a época em que eu namorava o Anísio e saia da faculdade para assistir aos jogos e esperar ele sair do estádio. Me veio a lembrança de um dia chuvoso ele todo molhado atrás de entrevistar o Carlinhos e o Anísio quando tudo o que eles queriam era sair de lá o mais rapido possível. Quanto ao surgimento dos jornais, me lembro que A Gazeta funcionava ao lado do Forum, e passei muitas horas após a faculdade estudando com meu querido colega Aragão que trabalhava lá, enquanto fechavam o jornal e faziam "as letrinhas" nós estudavamos para as provas. Bons tempos.
Mas o que mais gostei dessa época era quando trabalhava no aeroporto e ficava ouvindo a difusora no horário dos recados do povo para os seringais e colocações, após o almoço. Saudades de todos, inclusive do Campos Pereira, nos campo de futebol também catando entevistas. Bons tempos!!!

Anônimo disse...

Que legal saber dessas histórias. Bem que o Elson, o Sílvio, o Fé, o Suede e todos os citados aí contasse a sua versão ou um pouco mais que o Roberto tenha esquecido. Gosto disso. Isso também é cultura.