sábado, 17 de setembro de 2005

DECISÃO POLÊMICA


Por determinação da Vigilância Sanitária, nos próximos dias os vendedores de açaí de Rio Branco estarão proibidos de bater o fruto na hora, como preferem os consumidores.

Serão obrigados a bater o açaí, acondicioná-lo em sacos plásticos e conservá-lo em freezer. Pelo que pude constatar ontem no Mercado Novo, a exigência desagrada vendedores e consumidores.

Os vendedores suspeitam que haja pressão dos supermercados, que estariam interessados no monopólio da venda de um produto cujo consumo é crescente. Acreditam que as vendas vão cair.

Acostumados a levar pra casa o açaí que assistem sendo batido na máquina, os consumidores também desaprovam a decisão da Vigilância Sanitária.

É o caso do Elson Martins, que trocou a carreira de químico pelo jornalismo. Martins viveu muitos anos no Amapá e Pará, os dois estados onde o consumo do açaí é uma tradição que se transformou num verdadeiro ritual. Leia a opinião dele a seguir:

"A decisão da Vigilância Sanitária é um absurdo. Pra começar, ninguém no Amapá ou no Pará compra açaí em supermercado. Açaí de supermercado é considerado velho e podre. O açaí só presta batido na hora.

Em Macapá, onde funcionam mais de 400 amassadeiras, todas têm um horário de bater: vai das 10 às 13 horas, no máximo, porque os caroços de açai chegaram das ilhas de barco, fresquinhos, e foram tratados em tanques e levemente aquecidos.


Algumas guardam certa quantidade de açaí para congelar e vender aos visitantes. Fazem assim: ensacam, mergulham numa água limpa de salmoura e metem no frezzer.

O açai tem altos índices de coliformes fecal: os pássaros defecam nos cachos e o pessoal que manipula o produto até o batedor não tem muita condiçao de higiene.

O açaí batido no Amapá ou no Pará (imagino que os exportadores já estão pasteurizando ou colando conservantes dentro para não azedar) tem duração menor que o leite nas geladeiras. Porque o consumidor o quer puro, nada de cheiros e gostos estranhos.

O amapaense toma o açaí com farinha de tapioca, não dessa que se produz por aqui, que é dura e não se desmancha no vinho do açaí. No mercado aqui em Rio Branco existe um paraense que vende da tal farinha, que ele importa do Pará. Preço do litro: 4 reais. É crocante, mas não é boa pra fazer o mingau que o acreano mistura com o mingau de banana.

Açaí é bom com camarão no bafo, peixe frito, charque assado, pirarucu. Em 1995, o Governo do Amapá mandou fazer uma pesquisa para saber o que as crianças gostariam de comer na merenda escolar. Mais de 90% respondeu: açaí com camarão. No Amapá, o quilo do camarção regional custa de 3 a 7 reais.

O que mais e vê em Macapá a partir das 10 horas é bandeira vermelha. A cor do PT, esqueceram? Indica não um açougue, mas uma batedeira de açaí. Quando o produto acaba, eles baixam a bandeira.

Uma família rural pode resolver sua sitiuação econômica em dois anos com plantio de açaí. Cultura fácil de formar e se manter. Sustentável.
O caroço do açaí é estrume de primeira.

Se a cidade de Macapá tem duas ou três amassadeiras em cada quarteirão, por que Rio Branco não pode ter isso? É um produto alimentício de alto valor. As famílias amapaenses formam seus filhos e netos com essa economia. A população se alimenta bem todo dia com o açaí.

Já dei a dica ao prefeito Raimundo Angelim: ele devia contratar alguns batedores de açaí do Amapá como consultores. Extrair o vinho é uma arte. Eles fazem isso como um ritual.

Dá gosto ver. Utilizam três pequenas bacias de aluminio que brilham de limpas e vão fazendo o movimento com elas. Utilizam água filtrada. Não cai um pingo de água suja no produto. Repito: são uns mestres.

Cada bairro, central ou periférico, poderia ter uma dezena de amassadeiras. As famílias nem precisam pegar em saquinhos. Levam suas próprias vasilhas e pedem o vinho do fino (mais barato) ou do grosso.

Bom, eu poderia escrever o dia todo sobre o açai, mas não para quem só enxerga a macroeconomia. Na verdade, essa tal de macroeconomia enche o saco do povo e o bolso dos técnicos.

Sugiro à Vigilância Sanitária que mande buscar no Amapá uns quatro mestres batedores de açaí para vir ensinar ao pessoal daqui, sobretudo ao pessoal da própria Vigilância Sanitária.

Eu não compro açaí batido na hora no Acre. No supermercado é que não vou comprar mesmo. Prefiro encomendar de vez em quando para que alguém traga do Amapá ou Pará".

4 comentários:

Anônimo disse...

A bandeira do Açai no Amapá, lembra a bandeira de Chicha, no Vale Sagrado de Cusco. A bandeira também é vermelha. Já a bandeira da cidade de Cusco é a do Arco-Iris, não confundir com a bandeira do Movimento da Diversidade Sexual.

Anônimo disse...

Altino / as primeiras vezes que provei assaí foi em minha casa e preparado por minha mãe. Em nosso quintal, em Brasiléia, tínhamos algumas "toceiras" de assaí. Meu pai era quem colhia os cachos e a preparação obedecia alguns cuidados. Primeiramente, minha mãe lavava os caroços com água fria que depois eram mergulhados em água quente para, depois, serem amassados. O "vinho" era, então, colocado em vazilhas de vidro ou louça e consumida no mesmo dia. Minha mãe falava que assaí "dormido" oxidava. Certamente, minha mãe não concordaria com a decisão da Vigilância Sanitária e eu ainda prefiro acreditar nela e no Elson (este com sua formação de químico). O cerimonial do assaí em minha casa marcou-me que não consigo tomar o açaí tipo paraense (uma papa) nem, agora, nas lanchonetes paulistas. Além disso, gosto de assaí com farinha do Acre - preferencialmente, tipo a de Cruzeiro do Sul.

Anônimo disse...

Não existe pior açaí do que o descongelado. Toda vez que compro o açaí, coloco no freezzer apenas para esfriar um pouco, depois deixo ele na geladeira, fora do congelador pra poder manter a pastosidade. Se botar pra "pedrar", depois que "despedra" ele fica um vinho fino (fraco, não chique) cheio de bagaço. Horrível. O Silverinha (Elson Martins da Silveira). Mas acho que contrariando a proposta dele de trazer o pessoal do Amapá, seria melhor levar uma comitiva daqui (incluindo na maioria o pessoal que trabalha com açaí e não somente os técnicos que gostam de uma viagenzinha com diárias) pra aprender com os amapaenses a arte de preparar o melhor açaí do mundo. E se for alguém, por favor traga uma porção de maniçoba pra mim.

Anônimo disse...

Uma das coisas que também conheci em Macapá foi o abatimento de galinhas na hora. Não sei se ainda existe isso por lá. Mas é bem mais interessante escolher a galinha viva e levá-la abtida ainda com o sague quentinho...
Imegine, os donos de supermercados iam enlouquecer. Cairia a venda de galinha congelada no supermercado.
Dia desses comprei uma pescada grande e bonita, mas congelada. resultado: quando descongelou a bicha tava com a carne toda esbagaçada. A vigilância deveria era proibiar a venda de certos produtos congelados, isso sim. E não a venda de produtos fresquinhos. Como diz a minha mãe-avó: - vôte, é cada uma que vale por duas. "Discunjuro"!