quarta-feira, 14 de março de 2012

AGRESSÃO AO PALÁCIO RIO BRANCO


O governador do Acre, Tião Viana (PT), começou a descaracterizar o Palácio Rio Branco, sede simbólica do governo estadual, tombado como patrimônio histórico, cuja reforma milionária aconteceu durante a gestão do governador Jorge Viana (PT).

No último Natal, a lateral do Palácio Rio Branco sofreu uma grave agressão, quando foi completamente perfurada para instalação de lâmpadas de decoração.

Para complicar ainda mais, na lateral esquerda do prédio, Tião Viana mandou instalar duas unidades externas de condicionadores de ar, o que volta a gerar poluição visual e desarmonia do prédio histórico, que ganhou ar-condicionado central durante a reforma.

Muitos comerciantes do Mercado Velho, em Rio Branco, já solicitaram ao DPHC (Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural) autorização para instalação de condicionadores de ar em seus estabelecimentos.

A autorização foi negada porque não se poder instalar unidade externa desses equipamentos de modo a poluir visualmente a harmonia da fachada do conjunto arquitetônico.

- É competência da Fundação de Cultura e Comunicação Elias Mansour, por intermédio do Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural, coordenar a política de proteção e conservação dos bens móveis e imóveis, de propriedade pública ou privada - diz o artigo 8˚ da Lei Estadual 1.294.

Mas é o próprio governador Tião Viana quem desrespeita a lei ao liderar a agressão contra o Palácio Rio Branco.

O Acre está prestes a completar 50 anos como Estado. Durante todo esse período, e considerando as décadas anteriores, como Território Federal, os acreanos foram moldando sua forma de vida, fazendo sua história e construindo uma cultura singular.

Nessa trajetória, alguns bens materiais e imateriais foram tomando cada vez mais relevância na vida dos acreanos. Podemos citar o Mercado Velho, o Palácio Rio Branco, a Rua Senador Eduardo Assmar (mais conhecida como Calçadão da Gameleira), o Casarão, dentre outros.

Todos esses bens formam um pequeno, mas importante grupo que podemos chamar de patrimônio histórico - um termo usado para nomear um bem móvel, imóvel, material, imaterial, artístico ou natural com relevância histórica e/ou cultural para uma determinada sociedade e que tenha sido tombado e registrado no livro de tombo através de procedimentos gerenciados pelo órgão competente do Governo - no caso do Acre, a Fundação de Cultura e Comunicação Elias Mansour, através do seu DPHC (Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural).

O tombamento tem o objetivo de proteger esses bens da ação do tempo e do homem, a fim de garantir a sua existência para que gerações futuras tenham acesso a um importante elemento histórico da sua sociedade.

O maior instrumento legal no Estado do Acre, que dá as diretrizes e legaliza o tombamento, é a Lei Estadual 1.294, de 1999.

Na teoria tudo é perfeito, entretanto, os problemas começam a aparecer.

Mercado Velho

Há meses não se faz fiscalização, de modo que as empresas lá instaladas poluem visualmente a fachada, como exemplo do “Oba Oba Magazine”, que escreveu, em grandes proporções, o seu nome na lateral do bem tombado. Outras empresas colocam faixas e cartazes poluindo a visibilidade do conjunto arquitetônico.

Outro fato: o Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural cobra dos proprietários a manutenção regular do bem, entretanto, a Lei 1.294 prevê, no artigo 22, que quando o proprietário de um bem privado tombado não possuir condições de fazer os reparos necessários no bem quem deve assumir essa responsabilidade é a Fundação de Cultura e Comunicação Elias Mansour através do DPHC, o que não tem acontecido.

Fachada da Rua Senador Eduardo Assmar

A rua teve sua fachada tombada no início dos anos 2000. Desde então, o número de comércio foi drasticamente caindo devido a grande restrição do tipo de atividade que se pode executar naquele bem tombado. Entretanto, é autorizado o funcionamento de uma boate na mesma rua, o que atrai um público que, devido ao estado alcoólico de alguns, acaba depredando alguns prédios ao redor e o Calçadão da Gameleira. Vale citar o artigo 8 da Lei acima referida, deixando claro a responsabilidade do DPHC sobre a proteção e conservação dos bens tombados.

Casarão

É o mais novo patrimônio histórico do Estado do Acre, tendo sido tombado em 2010. O prédio em si e a sua utilização não tem tido nenhum problema. O problema surge quando nós olhamos para o lado do bem. Lá está presente um prédio da Caixa Econômica Federal, que está em fase de conclusão. Trata-se de um prédio de grande porte, fazendo com que a atenção de quem procura olhar para o Casarão seja direcionada em um primeiro momento para o prédio da Caixa e não para o bem.

Essa situação é prevista na Lei 1.294. Ela diz, no artigo 23, que “no entorno do bem imóvel tombado não é permitida qualquer edificação que venha impedir ou reduzir a visibilidade, colocação de cartazes ou anúncios, bem como, qualquer tipo de placas ou letreiros que venham comprometer a imagem ou a estrutura do bem tombado, sob pena de demolição da obra ou retirada dos materiais afixados, salvo quando houver autorização expressa prévia do órgão responsável pelo Patrimônio Cultural do Estado.”

Essa é a mesma situação que ocorre no Mercado Velho com a instalação de cartazes nas entradas das lojas.

Por ser o bem tombado mais recentemente, pode-se perceber a ineficiência no processo de tombamento adotado pelo DPHC da FEM. Não foi previsto o entorno desse bem, o que possibilitou a construção do prédio da Caixa naquele porte.

É nesse quadro de administração dos bens tombados que o DPHC traçou como meta realizar o tombamento de mais 20 bens até o final de 2014.

Se a Fundação de Cultura e Comunicação, através do DPHC, não consegue fazer a correta administração desses poucos quatro bens tombados, o que acontecerá quando esse número aumentar para 24 bens?

Mas o problema não é unicamente esse. Vivemos numa sociedade que ainda não tem a devida consciência e conhecimento sobre a importância de se tombar bens com valores histórico-culturais.

É claro que o cidadão não conquista essa consciência sozinho, mas com o auxílio de uma grande campanha, administrada pelo governo, de conscientização acerca dos bens histórico-culturais, o que nunca foi feito, ao menos de maneira sistematizada e com relevância.

Ao receber esses 24 bens tombados até 2014, o que a população fará com eles? Como se dará a relação diária entre ela e esses bens?

Considerando essas perguntas, já se pode imaginar outros questionamentos que poderão surgir na população: “Por que estão tombando esses bens?” ou “Como isso contribuirá para a melhoria da minha qualidade de vida?”.

O que se espera da Fundação Elias Mansour e do seu DPHC é que se tombe o maior número de bens no nosso Estado, mas que isso ocorra de maneira saudável, sustentável do ponto de vista da administração dos bens e com real relevância para cada cidadão acreano.

10 comentários:

Kika Gouvea disse...

É um abuso o descaso e\ ou a falta de respeito com que os governos e ate mesmo a população trata seus bens culturais, materiais ou imateriais.... de verdade uma lastima !!

João Rocha Lima disse...

Altino, existe algum meio de contato com você? Um email, algo assim? Obrigado!

João Rocha Lima disse...

Olá, Altino. Queria te mandar um email, mas não acho seus contatos aqui. Sou jornalista e correspondente de TV francesa no Brasil. Estou indo ao Acre em breve e queria conversar com vc. Abraços!

ALTINO MACHADO disse...

Meu email é altino.machado@gmail.com

Fátima Almeida disse...

A rua Eduardo Assmar deveria ter seu nome original: rua 17 de Novembro. Foi uma coisa muito arbitrária terem mudado o seu nome porque as três ruas centrais do Segundo Distrito correspondem a três datas históricas: 24 de janeiro, 6 de agosto e 17 novembro. Essa questão toda é muito complexa. Esta cidade não tem um passado colonial como Recife e Olinda, Cuzco, São Luis, Salvador cujos conjuntos arquitetônicos atraem muitos turistas. Nem uma fase neoclássica como o Rio de Janeiro, por excelência, com a vinda da corte em 1808. Enfim, foi um entreposto comercial com predominância árabe nos costumes daí a dificuldade em transplantar uma cultura patrimonialista dos grandes centros para esta cidade. Mas no tocante ao modo de vida, à relação com a natureza, seus entes, concretos ou imaginários, fauna e flora quase nada foi preservado, aliás, nada foi preservado. Para piorar as coisas as levas de imigrantes vêm contribuir para esse mosaico multicultural: tererê, chimarrão, churrasco, tacacá, vatapá, moqueca, carne de sol, cuscus, tapioca, pizza, sushi e sashimi, algo como ocorre em São Paulo mas com numa outra dimensão que bem merecia um amplo debate, uma carta, para o qual muito de nós que escrevemos neste blog jamais seriamos convidados.

Renaldo disse...

Queria saber que finalidade o governo teria em colocar aquelas 4 rodas ao lado da ponte metálica, sem nenhuma informação histórica devida sobre sua finalidade? e sua ligação com a ponte? Desenterraram-na e colocaram para ser corroídas pelo ferrugem.

Clênio Plauto S. Farias disse...

Uma vergonha.

Júnior Shin. disse...

Mudanças arbitrárias têm se tornado comuns por aqui, Fátima Almeida...

Laurinha disse...

Se essa foto é real, já tiraram o tal ar condicionado. Passei por lá agora a pouco e nem sinal de tudo isso!

ALTINO MACHADO disse...

Laurinha, removeram no mesmo dia que postei a foto. E no mesmo ida fiz novo post mostrando isso.