segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

ACREANOS BUSCAM CAMINHO MAIS CURTO

Pascoal Muniz

O tipo de seleção que a Universidade Federal do Acre (Ufac) utilizou para escolher os novos alunos de graduação (calouros) para 2012 tem sido alvo de debates acalorados. Existem dois grandes problemas que poucos comentam: o primeiro é a oferta de vagas ser menor que a procura, de modo que precisa ser adotado um processo de seleção; o segundo é que o processo adotado quase sempre privilegia os candidatos de famílias de melhor nível cultural e maior renda.

Essa realidade repete-se em todos os Estados e é reflexo das iniqüidades da sociedade capitalista. Nos últimos cinco anos, a Ufac ampliou as vagas anual de 1070 para 2050 devido à política de reestruturação e expansão das instituições federais de ensino superior, possibilitando maior acesso e diminuindo a iniqüidade, mas sem resolvê-la.

Dado à escassez de vagas, é necessário estabelecer critérios para o preenchimento de vagas disponíveis. Para isso, as universidades federais adotaram como critério o mérito acadêmico dos candidatos, avaliados pelo vestibular ou pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que é um exame composto por quatro provas divididas em quatro áreas, mais a redação, que tem como objetivo avaliar os alunos e escolas de ensino médio.

Recentemente, o Enem tem sido utilizado para seleção no preenchimento das vagas no ensino superior das universidades federais e para acesso às bolsas do MEC para as vagas nas instituições particulares de ensino superior, o Prouni.

Quais as principais diferenças entre o Enem e o vestibular?

As provas do Enem são compostas de questões contextualizadas na vida real e com abrangência mais ampla do currículo nacional do ensino médio. O vestibular focava as disciplinas no lugar das áreas e exigia muito a habilidade de decorar as fórmulas, fatos e datas.

Considerando que o principal objetivo da maioria dos alunos do ensino médio é o acesso ao nível superior, a agenda de estudo destes alunos eram os temas e questões do vestibular. Deste modo, os conteúdos das provas do vestibular orientavam o ensino médio do Brasil e do Acre. O MEC apresentou o Enem como alternativa para corrigir a distorção.

O Enem é realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que tem a competência instalada reconhecida para avaliação em larga escala, diferente da maioria das universidades federais, que tem dificuldades para atender as atividades de ensino, pesquisa e extensão, devido à carência de docentes e técnicos, o que dificulta os gestores das IFES designar pessoas com dedicação exclusiva para esta função, sem prejuízos a outras atividades.

Ultimamente o Inep tem celebrado parcerias com as universidades federais para superá-las. Exemplo: Os docentes, indicados pelas universidades, estão trabalhando, a convite do Inep, para consolidar um banco de questões para as provas do Enem, que estão próximas de 100 mil. Essas questões são classificadas por nível de complexidade, todas avaliadas e testadas por equipes do Inep, com assessoria dos docentes das universidades. Diferente da Ufac onde as provas eram elaboradas por disciplinas, geralmente por um professor doutor.

EM 2012, os candidatos após serem avaliados e, com suas notas e respectiva pontuação, conquistada pela participação do exame do Enem, participaram de dois processos seletivos nacionais: o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), gerenciado pelo MEC, no qual as universidades federais oferecem vagas aos alunos que fizeram o Enem e o sistema seletivo da Ufac, que adotou outro procedimento.

O processo de seleção realizado pela Ufac para escolher os novos alunos de graduação para 2012 foi aprovado pelo Conselho Universitário, colegiado máximo da instituição, composto de 87 representantes dos Centros, todos os coordenadores dos cursos, representantes dos alunos e técnicos, reitoria e sociedade. No momento da decisão fundamentei posição conforme argumentações expressas neste artigo.

Um dos procedimentos adotados pelo processo seletivo da Ufac e que tem sido questionado é a ponderação das notas por área. Por exemplo: para os candidatos aos cursos de engenharia ou matemática as questões da prova de matemática têm peso três e questões da área de ciências humanas peso um. O inverso ocorreria se o candidato estivesse inscrito para o curso de ciências sociais. Este procedimento é sustentado por um conceito tecnicista com pouca aceitação nos meios educacionais modernos.

Argumenta-se que é importante que os alunos ingressos tenham boa formação em todas as áreas. O candidato ao curso de engenharia deve ter também boa formação na área de humanas. Sem o uso da ponderação os candidatos serão estimulados a estudar com o mesmo interesse todas as disciplinas. Para além do técnico queremos o cidadão culto e erudito.

É provável que com a utilização das notas do Enem ou notas do vestibular não seria tão diferente o acesso dos alunos de outros Estados à Ufac. A diferença é que no vestibular o candidato de outro Estado faria uma viagem para fazer a prova. No meu entendimento, o grande problema foi a não adesão da Ufac ao sistema de seleção Sisu. Neste sistema, o aluno pode concorrer em duas opções. Além destas duas opções, puderam concorrer também às vagas da Ufac.

Um candidato ao curso de medicina, residente em Fortaleza, com bom nível de preparação, teve a opção pelo Sisu na Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, e outra opção provável para a mesma universidade, em Sobral, ou outro local mais próximo da residência da família. Se a Ufac tivesse integrada ao Sisu, dificilmente este aluno escolheria concorrer às vagas da Ufac, em função da distância. Como o Consu decidiu criar um sistema próprio, o referido aluno pôde concorrer `s duas vagas do Sisu, além da vaga da Ufac.

É provável também que uma proporção dos aprovados nesta primeira lista da Ufac sejam também aprovados nas vagas disponíveis pelo Sisu e nas universidades públicas estaduais e façam opção para estudar mais próximo da família, abrindo novas chamadas na Ufac.

Para que os candidatos residentes no Acre possam obter mais sucesso nos cursos mais concorridos, em particular no curso de medicina, é necessário mais estudo e perseverança.

Os alunos da medicina da Ufac, em sua maioria, fizeram Enem/vestibulares entre três a cinco anos para finalmente conseguir uma vaga na Ufac. Esses alunos têm, em média, 24 anos de idade. Participaram durante anos de cursos preparatorios com carga horária de 40 semanais. A sociedade acreana não oferece tais oportunidades e geralmente busca o caminho mais curto, que é enviar os filhos para estudar no exterior.

Nas ultimas décadas, os acreanos conseguiram sucesso nas seleções das universidades localizadas no eixo Rio-São Paulo. Temos vários médicos nascidos no Acre que estudaram medicina na UFRJ, Usp, Santa Casa (SP), UFPA, UFAM, UFC, UFMT, Jundiaí, Rio Preto, UFRGS. Lembro do exemplo do Dr. Adib Jatene, de Xapuri. Esses médicos acreanos para obterem sucesso certamente “ralaram” muito e “malharam” pouco.

Reconhece-se o avanço do ensino básico do Acre, indicadao pelas avaliações externas dos indicadores educacionais realizadas pelo Inep. Cabe à Ufac a responsabilidade de formar mais e melhores professores.

No campo cultural e educacional “ainda há muito o que se fazer pelo Acre" e pelo país. Nossa esperança de colher mais e melhores frutos são os recentes investimentos da União na Educação básica, tecnológica e superior. A Ufac já colhe alguns frutos desta política quando apresenta vários cursos muito bem avaliados pelo MEC. Temos capacidade instalada de avançar muito mais, de se modernizar e descentralizar a gestão, consolidar a identidade amazônica, estabelecer o planejamento participativo, melhorar a auto-estima da equipe e ampliar a inclusão dos segmentos sociais estabelecendo políticas afirmativas.

Que as diretrizes para a seleção 2013 sejam discutidas e aprovadas o mais rápido possível para orientar as escolas do ensino médio.

Pascoal Torres Muniz é professor e vice-reitor da Universidade Federal do Acre

2 comentários:

Fátima Almeida disse...

Tenho uma amiga morta de preocupada há dias porque as matrículas da nossa Universidade vão se encerrar exatamente no momento em que outras Universidades vão publicar seus resultados, como é o caso da UnB. A filha dela passou aqui e aguarda resultados em São Paulo e Brasília. Se a mesma se matricular aqui para segurar a vaga, e depois verificar que foi aprovada em Brasília, onde já reside, não poderá se matricular na UnB porque existe uma lei que impede de se fazer matrícula em duas ou mais federais, pois só será válida a primeira. Essa preocupação deve estar perturbando várias pessoas que fizeram inscrição para a UFAC e para outras próximas de suas residências. Não seria melhor a UFAC estender seu período de matrícula? Foi intencional isso de obrigarem às matrículas antes de saírem os resultados das outras federais? E quais as implicações disso?

lindomarpadilha.blogspot disse...

Lamento dizer, mas existem questões ainda mais graves. O pior de tudo isso é que durante o processo de discussão e posterior votação no conselho, a representante da Secretaria Estadual de Educação pouco participou e, quando o fez no momento da votação, se absteve sob o argumento de que o Estado não tinha uma posição sobre o assunto.

Bom trabalho

Lindomar Padilha