terça-feira, 31 de maio de 2011

FUZARCA EM NOME DO FUSO HORÁRIO

Ainda inconformados com o resultado do referendo e das últimas eleicões no Acre, os senadores petistas Jorge Viana e Aníbal Diniz querem impor a vontade deles



A volta do fuso horário antigo do Acre caminha para uma solução em respeito ao que foi decidido em referendo pela maioria (56,87%) do povo acreano.

Sem consulta à população, o fuso horário do Acre foi alterado, em junho de 2008, por uma lei de autoria do senador Tião Viana (PT-AC), atual governador.

Três comissões do Senado aprovaram nesta terça-feira (31) projeto de lei que retoma o antigo fuso horário do Acre de duas horas a menos em relação a Brasília.

Os senadores Jorge Viana (PT-AC) e Aníbal Diniz (PT-AC) demonstraram contrariedade com a decisão.

Viana alegou que respeita, mas não concorda com a decisão do povo, e foi o único a se abster na votação. Ele afirmou que o referendo foi alvo de manipulação política e eleitoreira.

- Excluíram o Acre do sistema online em que o mundo vive - lamentou, cogitando nova revisão do fuso horário no futuro.

Na verdade Jorge Viana se julga o nosso líder espiritual, intelectual e político. Ele é defensor da "ditadura da felicidade" (leia) no Acre.

Diniz votou a favor da mudança, mas avaliou como "injustiça" deixar o Acre duas horas atrasado em relação a Brasília.

- Fizemos valer a vontade do povo do Acre, mas vou reunir as assinaturas necessárias para discutir um fuso horário único no país - anunciou Diniz.

O senador Sérgio Petecão (PMN-AC) considerou "histórica" a votação para restabelecimento do fuso horário original.

O projeto aprovado pelas três comissões determina o seguinte:

1) o extremo oeste do Pará e a parte do Amazonas localizada a leste de uma linha imaginária que une o município de Tabatinga (AM) a Porto Acre (AC) terão uma hora a menos em relação a Brasília;

2) Acre e a parte do Amazonas localizada a oeste da mesma linha imaginária terão duas horas de defasagem em relação ao horário de Brasília;

3) restante do Pará terá fuso idêntico ao de Brasília.

A situação permanece inalterada nos demais estados brasileiros.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

O KIT ANTI-HOMOFOBIA E O CONTRADITÓRIO

Carlos Gomes
 
Um dos maiores desafios do século está sendo a equidade social e de direitos. Presenciamos cotidianamente várias formas de violações, seja por questões de raça, gênero, etnia, orientação sexual e por aí vai. Um fato recente me provocou a pensar políticas como mecanismo de garantia de direitos. Nesse sentido, quero provocar algumas reflexões acerca do “kit gay” - pelo menos é assim que está sendo massificado e divulgado.

Mas vamos aos fatos: primeiro, não se trata de um “kit gay”, mas de kit anti-homofobia, elaborado a fim de subsidiar nossos educadores e educadoras no País.

A sexualidade faz parte de nossas vidas, assim como suas múltiplas formas de expressão. Negar que adolescentes tenham sexualidade e inviabilizar esse debate é um tanto equivocado para não dizer reacionário. Existem, diariamente, vários casos de homofonia. Eles começam nas práticas discursivas e acabam na violência corporal.

Quem desconhece a proposta do kit anti-homofobia diz que atenta contra a família. Qual seria essa tal família? Recentemente, o STF reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Para as ciências sociais já rompemos com o modelo de família nuclear. O que quero exemplificar é que desqualificar a discussão em torno das violências e violações no contexto educacional é um retrocesso em um estado democrático de direito. O kit em nenhum momento direciona jovens adolescentes a serem homossexuais. O que ele busca é o respeito às diferenças e o convívio social dentro da pluralidade.

A suspensão do kit anti-homofbia por parte da presidente Dilma Roussef sinaliza falta de compromisso com uma educação inclusiva, que reconheça as diferenças e a necessidade do respeito à mesma. Sinto-me profundamente envergonhado em ver que a presidenta da República tenha de recuar na política para agradar quem nega e viola direitos. Esse lobby religioso é o mesmo que vai contra os direitos sexuais e reprodutivos, a liberdade de expressão, que promove “guerra santa” em nome de um Deus para suas benesses e vaidades e isso não pode nem deve pautar uma política de estado.

O governo vai mostrando que a politicagem e a possibilidade de salvar quem deve esclarecer o que parece ilícito não pode usar a vida de LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) como moeda de troca. Lastimável essa atitude de blindagem de companheiros em detrimento de uma política pública.

Recentemente, num jornal de Rio Branco, li que a bancada evangélica na Assembléia Legislativa já se articula para barrar o kit anti-homofobia no Acre. Que os deputados façam antes uma audiência pública com os diversos setores da sociedade, para que possam ouvir as mais diversas vozes a fim de esclarecer qual a proposta do kit e a ferramenta relevante que ele se torna no combate a homofobia dentro do processo educacional. Vários LGBTs são marginalizados, estigmatizados e excluídos do âmbito do direito e da cidadania, os índices de evasão escolar por conta da discriminação de lésbicas, gays, travestis e transexuais é um contraditório em um Estado que se propõe a fazer inclusão social e a garantir direitos.

Ainda temos uma dívida histórica a ser reparada com mulheres, negros, índios e com homossexuais. Por séculos e séculos tivemos um ciclo da homossexualidade como pecado, posteriormente crime e por fim doença. Parece que esse ciclo vem se renovando e ganhando força e isso, infelizmente, mostra o quão ainda precisamos avançar.

Estamos discutindo a educação e uma das tantas formas de violência vivenciada no processo educacional. É nesse momento da educação que temos a construção do futuro, da cidadania, do respeito, do amor ao próximo, da valorização dos direitos fundamentais e da dignidade humana. Pensemos para além do que está construído socialmente, vejamos um mundo onde a violência não seja valorizada em detrimento da garantia de direitos.

Carlos Gomes é assistente social e graduando em jornalismo pela Universidade Federal do Acre

domingo, 29 de maio de 2011

TESTEMUNHA É ASSASSINADA NO PARÁ

Felipe Milanez, Terra Magazine

Foi encontrado neste sábado (28), morto em um matagal, Erenilton Pereira dos Santos, 25 anos, integrante do assentamento Praialta-Piranheira, o memo onde vivia o casal José Claudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, executados na última terça-feira (24), em Nova Ipixuna, sul do Pará. O corpo estava a sete quilômetros do assentamento e a cerca de 100 metros da estrada. Erenilton era testemunha do caso do homicidio de José e Maria. Ele viu uma moto Bros vermelha sair do assentamento. A mesma moto foi flagrada por outra testemunha entrando no local, minutos antes do crime.

Dois dias após o duplo homicídio, Erenilton foi comprar peixe em Porto Barroso, no lago Tucuruí. Ele seguiu na mesma direção em que os motoqueiros suspeitos do assassinato do casal haviam tomado. Desde então, não deu mais notícias. Como Erenilton era considerado desaparecido, neste sábado, 10 pessoas sairam a sua procura. Encontraram a moto da vítima na estrada, próxima ao corpo, que foi localizado, por volta das 10h, por equipe do Ibama e da Polícia Federal.

Segundo a Comissão Pastoral da Terra, Erenilton também morreu com um tiro na cabeça e a arma seria do mesmo calibre da utilizada na execução do casal de extrativistas Zé Cláudio e Maria.

A vítima, que praticamente nasceu no assentamento Praialta-Piranheira, era casada e tinha quatro filhos. A família da vítima está assustada e teme retaliações. As polícias Federal e Rodoviária Federal já se encontram no local. Instituto Médico Legal e Polícia Civil estão a caminho.

Este foi o quarto homicídio de trabalhador rural em cinco dias, três deles aconteceram no Pará.

sábado, 28 de maio de 2011

ADELINO RAMOS

Assassinado em Rondônia sobrevivente do massacre de Corumbiara


O agricultor Adelino Ramos, de 56 anos, que participou da invasão da fazenda Santa Elina, palco do massacre de Corumbiara (RO), em agosto de 1995, foi assassinado na manhã desta sexta-feira (27), no distrito de Vista Alegre do Abunã (RO), enquanto vendia verduras produzidas no acampamento onde vivia.

Acusado pelo Ministério Público como um dos causadores do massacre de Corumbiara, Adelino Ramos foi condenado a oito anos de prisão. Como líder Movimento Camponês Corumbiara (MCC), ele não teria deixado os trabalhadores saírem durante a repressão policial e pistoleiros.

Em junho, durante reunião em Manaus (AM), o camponês denunciou ao ouvidor agrário nacional, Gercino Silva, as ameaças de morte que sofria.

Adelino Ramos era perseguido por latifundiários como um dos líderes do MCC. Ele morava no Assentamento Agroflorestal Curuquetê, em Lábrea, no Amazonas, e denunciava a ação de madeireiros.

Segundo a CPT, Dinho e um grupo de trabalhadores reivindicavam uma área na região para a criação de um assentamento.

No início deste mês, o Ibama iniciou uma operação no local, onde apreendeu madeira e cabeças de gado que estavam em áreas de preservação. A CPT na região acredita que esse foi o motivo da morte do camponês.

Segundo a CPT, o agricultor foi alvejado por um motociclista. Porém, Moradores de Vista Alegre do Abunã contaram que o assassino do agricultor chegou andando em uma rua nas proximidades de uma feira livre.

O homem atirou cinco vezes e continuou andando e se escondeu na mata quando a mulher de Adelino, identificada como Eliana, começou a gritar. Ela está sob proteção policial porque viu o assassino.

O assassinato de Adelino Ramos é o terceiro na Amazônia Legal nesta semana. Na terça-feira (24), José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo foram mortos a tiros numa estrada vicinal em Nova Ipixuna, sudeste do Pará.

A CPT denuncia que madeireiros estão ameaçando  de morte a agricultura Nilcilene Miguel de Lima, de Lábrea, presidente da Associação “Deus Proverá”, no sul do Amazonas.

Assentada na região há sete anos, Nilcilene desenvolve atividades de cultivo familiar ligadas à conservação do meio ambiente, da floresta e ao ativismo social.

A rica e exuberante região de Lábrea, na divisa dos estados do Acre, Rondônia e Amazonas, tem sido palco de muitos conflitos nas últimas décadas por causa da luta pela posse terra, principalmente para pecurária e exploração madeireira.

Presidência da República manifesta “total repúdio e indignação”

Os ministros Gilberto Carvalho  (Secretaria-Geral da Presidência da República) e Maria do Rosário Nunes (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República) divulgaram uma nota sobre o assassinato do líder camponês Adelino Ramos. Eles manifestam “total repúdio e indignação”.

Eis a nota:

1 Adelino era uma liderança reconhecida na região Norte do país, sendo presidente do Movimento Camponeses Corumbiara e da Associação dos Camponeses do Amazonas. Dinho, como era conhecido, morava em um assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) com outras famílias e seu grupo buscava regularizar sua produção. Segundo lideranças locais, ele vinha recebendo ameaças de morte de madeireiros da região. Na manhã de hoje, na companhia de sua família, ele foi executado a tiros no município localizado na divisa dos estados de Rondônia, Acre e Amazonas. Cabe ressaltar que ele era um remanescente do massacre de Corumbiara, ocorrido em 9 de agosto de 1995, que resultou na morte de 13 pessoas.

2 O assassinato de Adelino Ramos merece o nosso total repúdio e indignação. Há três dias o Brasil se chocou com a execução de duas lideranças em circunstâncias semelhantes, no Pará. Hoje, mais uma morte provavelmente provocada pela perseguição aos movimentos sociais. Essas práticas não podem ser rotina em nosso país e precisam de um basta imediato.

3 Segundo levantamento conjunto da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos e da Ouvidoria Agrária Nacional, desde 2001, já foram registrados 71 assassinatos em Rondônia motivados por questões agrárias. Mais de 90% dos casos ficaram sem punição.

4 Imediatamente ao recebimento da notícia, entramos em contato com a Polícia Civil, com o governador do estado de Rondônia e com a Polícia Federal, exigindo a mais rigorosa atitude para investigar o caso e punir os criminosos, tanto os executores como os possíveis mandantes. É necessária uma ação enérgica e exemplar. Só coibiremos essa violência absurda quando acabarmos com a impunidade.

5 O governo brasileiro não tolera que crimes como esses aconteçam e fiquem impunes no nosso país. Nesta semana, a presidenta Dilma Rousseff já determinou que a Polícia Federal acompanhe as investigações no Pará, numa atitude enérgica e clara de que crimes como esses não podem se tornar uma prática rotineira em nosso país. Acompanharemos de perto os desdobramentos para garantir justiça. É isso que se espera de um Estado democrático de direito e é assim que o governo procederá.”

AMAZÔNIA PERUANA

Madre de Dios protege índios isolados

O governo regional do departamento peruano de Madre de Dios, na fronteira com o Acre, declarou como patrimônio cultural a reserva de índios isolados Mashco Piro, Yine y Amahuaca.

A decisão ratifica uma lei aprovada em 2006 pelo Congreso do Peru com o objetivo de estabelecer um regime especial de proteção aos povos indígenas ou originários em situação de isolamento e em situação de contato inicial na Amazônia peruana.

As áreas dos isolados estão situadas na bacia dos rios Piedras, Yaco e Chandles, nos distritos de Iñapari, Laberinto, Las Piedras e Tambopata, na província de Tahuamanu.

A decisão política do presidente regional, Luis Aguirre Pastor, foi comemorada pela Federación Nativa de Madre de Dios (Fenamad). A organização foi uma das principais defensoras da criação da reserva territorial para os índios isolados na Amazônia peruana.

- É um importante passo na consolidação da defesa dos últimos povos originários do Peru - disse Jaime Corisepa, presidente da Fenamad.

Na semana passada foi noticiada invasão nos territórios de uso ancestral dos indígenas Matziguenka, que vivem em isolamento voluntário. Os Matziguenka são conhecidos localmente como Kugapakori.

A invasão se deu a partir da zona de amortecimento do Parque Nacional do Manu, onde também vivem grupos dispersos de indígenas em contato inicial. Foram encontrados restos de vegetação, lixo, madeira serrada, acampamentos, animais mortos e pertences dos invasores.

Um indígena disse que  os Matziguenka sentem medo e podem se mudar para outros lugares. O que a Fenamad considera mais grave é o perigo de contágio de doenças que esse tipo de contatos podem gerar nessas populações altamente vulneráveis.

Segundo a Fenamad, em 2002 foi registrado epidemias na região associadas a contatos estabelecidos por expedicionários e turistas informais, que ingressaram na área atraídos por interesses arqueológico.

A situação de um povo indígena isolado é reconhecida quando o mesmo não tenha desenvolvido relações sociais com os demais integrantes da sociedade nacional ou, havendo feito, tenha optado por interrompê-las.

O contato inicial é quando o povo indígena começa um processo de interrelação com os demais integrantes da sociedade nacional envolvente.

A decisão do governo de Madre de Dios é a segunda no Peru. Em 2007, o conselho regional do departamento de Ucayali, também na fronteira com o Acre, declarou de interesse público a defesa e proteção dos indígenas em isolamento Murunahua, Mashco Piro e Isconahua, de três reservas existentes para esses povos na região.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O ARRAIAL DO ALTO SANTO

Antonio Alves


Tem coisas que o tempo leva... mas um dia traz de volta. Só os que têm mais de 50 anos de idade podem lembrar com nitidez os grandes arraiais da cidade de Rio Branco, no tempo em que se colocavam cadeiras na beira da rua para a conversa de vizinhos, quando a usina apagava a luz antes da meia noite e a Difusora saía do ar. O tempo das grandes friagens no início do verão amazônico.

Os que hoje são “antigos” ainda lembram dos mais antigos e seus costumes trazidos do Nordeste. No meio de tudo, a festa: o arraial e a quadrilha com mungangos de caipira, o forró e o mungunzá, a fogueira e o foguetório. E o namoro com promessas e simpatias mode dar em casamento.

Longe da cidade, lá pras bandas da Custódio Freire [veja no mapa], onde a rural Willys e o Jeep só entravam no verão, o povo do Mestre Irineu fazia um dos arraiais mais animados. Ia gente da cidade toda, que a comunidade do Alto Santo era muito conhecida e freqüentada.

Alto Santo porque era um lugar elevado, nas terras altas depois do igarapé São Francisco, abreviação do nome Alto Santa Cruz que o Mestre Irineu tinha dado para rebatizar a antiga Colocação Espalhado do grande Seringal Empresa.

Alto também –e santo, é o que o povo dizia- era o velho Irineu Serra, que curava os doentes desenganados pelos médicos com sua reza forte e com o Daime, que era como ele chamava a ayahuasca, bebida medicinal e espiritual dos índios que ele usava para ensinar os cristãos.

No arraial, o Mestre descansava seus quase dois metros de altura e seus quase oitenta anos de idade numa cadeira na “casinha das prendas” e ficava olhando a animação do povo, conversando com os visitantes, dizendo “Deus lhe abençoe” quem vinha lhe beijar a mão, aconselhando os que precisavam, lembrando histórias de tempos passado e avisando sobre os tempos difíceis que haviam de vir.

E vieram, esses tempos turbulentos. No início do verão de 1971 a comunidade se animou pra fazer arraial mas o Mestre não deixou. Disse que naquele ano não tinha. Em julho, “viajou para o mundo espiritual”, como dizem seus discípulos. Nesses 40 anos que se passaram desde então, o mundo tremeu e se balançou muitas vezes.

O povo do Alto Santo seguiu com o trabalho do Mestre, com a liderança de seus antigos companheiros e de sua esposa, dona Peregrina, mas o arraial nunca mais foi o mesmo.

Nos anos 80 e 90 a tradição ainda se manteve no terreno da escola, onde os jovens da comunidade fizeram alguns arraiais com a animação de sempre, mas com pouca divulgação na cidade, mais para o pessoal da comunidade mesmo. Mas este ano dona Peregrina resolveu trazer de volta o grande arraial dos bons tempos.

E quem passa na estrada, em frente à sua casa, vê uma grande turma de trabalhadores cobrindo barracas com palha de ouricuri e um grupo animado ensaiando a quadrilha.

Antigamente era assim: o pessoal saía pelas colônias, às vezes ia pra lá da Aquiles Peret, comprando galinhas para o bingo. Cada um trazia uma prenda, vendia uma cartela, dava um dia de serviço, um pouco de dinheiro - se tivesse- e a festa acontecia. Agora voltou, mas com as diferenças do tempo, é claro.

O lugar onde ficava a “casinha das prendas” é hoje local sagrado, escolhido pelo próprio Mestre para ser colocado seu túmulo, onde hoje tem uma capela que é a coisa mais linda, quem não viu vai ter oportunidade de conhecer. E as barracas vão ficar em frente à casa da Madrinha Peregrina, de onde se pode ver o antigo casarão de madeira onde ela e o Mestre moravam, hoje tombado pelo Patrimônio Histórico e transformado em Memorial.

Mas o esforço da comunidade ainda é o mesmo, cada um dando o que pode para fazer uma grande festa. E o dinheiro que for arrecadado, também como nos tempos antigos, será usado em benefícios para a comunidade. Este ano, para a recuperação da sede (o templo dos trabalhos religiosos) e construção do estacionamento.

No mais, é como antigamente: as músicas do tempo do ronca, aquelas tradicionais, que até os mais jovens do Alto Santo ainda conservam e gostam de tocar, a quadrilha bem simples e cheia de mungangos, a “puliça” prendendo e multando quem não se comportar direito, o bolo de macaxeira e a canjica de milho, todas aquelas comidas de arraial que nem é preciso falar e um panelão de caiçuma.

Mas tem novidades: uma programação cultural com apresentações de músicos e cantores, grupos de teatro, pastorinhas.. e a programação da Rádio Cipó com mensagens e melodias para a capital, o interior e o resto do mundo.

Os bons tempos estão de volta. É neste fim-de-semana: 27, 28 e 29, depois das seis da tarde. Só quem é muito besta, pra perder.

UMA QUESTÃO DE NÚMEROS

Márcio Bezerra da Costa

Se existe uma referência que convence na atualidade ela tem a ver com números. Nada mais chama a atenção midiática que um dado estatístico interpretado por um especialista num programa de TV. Mais que isso: os números acabam por se tornar as principais referências que parcela substancial da população tem para elaborar críticas ao sistema e tomar as decisões políticas eleitorais. São números de obras, projetos, escolas, hospitais, presídios, crimes, visitas, contatos, eventos, shows populares e salário.

No quadro da Segurança Pública, de modo geral, destacando aqui algumas situações teóricas do contexto nacional, as estatísticas são ferramentas indispensáveis para se ter uma idéia e uma interpretação satisfatória. Através de dados produzidos por analistas criminais, os gestores produzem e sugerem a tomada de decisão em várias esferas. Mais que afirmar que trabalhar com estatística é importante para a medição dos índices de criminalidade, é preciso dizer que existem alguns problemas, estes nem sempre absorvidos pelos órgãos do sistema, que nos põem em dificuldade e podem até comprometer a visão correta de uma realidade dada.

Um desses problemas é a discrepância entre os índices criminológicos oficiais, que constam nos bancos de dados de instituições como o Instituto de Pesquisa Econômicas e Aplicadas, o Banco de Dados do Sistema único de Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso ocorre devido a algumas situações que vamos citar agora.

Quem nos garante que os crimes noticiados nas delegacias correspondem a 100% dos crimes acontecidos? Ninguém, até por que numa consulta rápida a quem conhecemos logo descobriremos alguém que não noticiou um crime por “n”  motivos.

Ou por falta de confiança na polícia, ou por medo da repressão dos agentes ou por acharem que o esforço em ir a uma delegacia não valeria a pena. Isso ocorre e em grande freqüência no Brasil. Para se ter uma idéia, segundo Marcelo Duarte, que foi coordenador geral de análise de informação do Ministério da Justiça, baseado em dados do PIAPS/MJ, apenas cerca de 10% das vítimas de furto ou agressão sexual noticiam o fato. Isso é absurdo quando pensamos que 90% desses casos sequer chegaram ao conhecimento do estado brasileiro.

Em casos de agressão física e roubo, esse número chega a cerca de 25%, o que ainda é baixo, quando comparamos a um universo maior. Isso significa que números de resoluções de crimes não chegam perto dos crimes que nunca chegarão ao conhecimento da autoridade pública.

Os números divulgados pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável, em 2010, sobre a taxa de homicídios no Brasil, que de 1992 a 2007 cresceu cerca de 15% podem ser ainda maiores quando voltarmos os olhos para o abissal domínio do crime onde o Estado não consegue chegar com seu braço armado nem com suas reformas teóricas e sociais.

Pensando nisso, é  propício o investimento em pesquisas de vitimização, que segundo a definição do Próprio Ministério da Justiça, são “estudos destinados a captar as ocorrências de eventos criminais junto à população com o fim de comparar os dados oficiais registrados pelas polícias com a ocorrência efetiva dos crimes, classificando-os por localidade, estrato social, cor da pele, idade, sexo, renda e outros critérios sociológicos de mensuração. Respeitam as mesmas etapas de todas as demais pesquisas: coleta, tratamento, análise e divulgação dos dados”.

Até 2010 o que se tinha em nosso país nesse sentido, eram pesquisas municipais que não se aproximavam de estabelecer um elo com a realidade nacional, apesar de nos fazer ter uma idéia do tamanho dos nossos problemas. No ano passado cerca de 300 municípios foram pesquisados, todos com mais de 15 mil habitantes, num total de 70 mil pessoas. Segundo a SENASP, a partir de 2011, os resultados deste processo serão divulgados.

O mais interessante a notar quando pensamos que nem sempre os números citados estão de acordos com a realidade em que vivemos, é que somente a nossa vivência cotidiana serve de termômetro destes índices. Sua vida melhorou? Você se sente mais seguro em relação à criminalidade? Sim ou não? Para uns sim, para outros não. Mas uma coisa é certa: falta algum, não tão abstrato a ponto de resolver todos os problemas do mundo, mas concreto o bastante para dá segurança a cada pessoa que sustenta nos ombros este país.

Como advertiu o historiador Andrew Lang, algumas pessoas usam a estatística como um bêbado usa um poste de iluminação - para servir de apoio e não para iluminar. Por isso mesmo, é bom não confiar nos que se baseiam demasiadamente em números e espectros, mas numa crítica arguta da realidade pondo em evidência questões sociais, culturais e, é claro, técnicas.

Márcio Bezerra da Costa é soldado da Polícia Militar do Acre graduado em ciências sociai

quinta-feira, 26 de maio de 2011

PIADA PRONTA DA HORA

O governo do Acre usa verba pública para aparecer como vencedor em todas as pesquisas de opinião. Vence até quando é derrotado.

Veja o que diz o colunista Leonildo Rosas, do Página 20:

"A recente pesquisa do governo encomendada ao Vox Populi também consultou a população sobre o fuso horário do Acre. A pergunta foi: faz dois anos que o Acre ajustou sua hora para ficar mais de acordo com o resto do Brasil. Em relação a isso você diria o quê?

Como era de se esperar, o resultado foi apertado. 49% dos entrevistados disseram que o atual horário é melhor e que já se acostumaram. Outros 48% falaram o contrário. Apenas 2% não sabem."

quarta-feira, 25 de maio de 2011

NÓS TEMOS FLORESTAS. ATÉ QUANDO?

Destaque para o comentário de Janu Schwab no post "Discurso histórico" da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC):

"Com todo o respeito à Deputada, por quem mantenho profundo respeito e admiração (e é o que me move a escrever o que penso agora).

O que acho mais louco, descabido, truncado e gasto é que os "pequenos" a quem ela se refere, são os que estariam, na teoria, cobertos, protegidos, amaciados pela florestania ou cidadania da floresta, do extrativismo ou da beleza que é o convívio homem-natureza tão cantado por aí, aqui e acolá, na Califónia americana (sim, porque temos por aí a California rondoniense, ou seria acreana, já nem sei).

Ora, sabemos que estão descobertos porque a direção para onde a máquina da sustentação (e desenvolvimento) econômica do Acre aponta é um tanto distante de como vivem os que vivem na floresta.

E, convenhamos, a vida na floresta nunca foi fácil e é provável que jamais seja - principalmente se comparada às "facilidades" que a urbe oferece.

Sabemos que Lei é Lei e que Lei não faz distinção de nada. Todos são iguais perante os rigores e blá, blá, blá e "Cumpra-se".

As leias de cunho ambiental existem para que, parafraseando a deputada, possamos continuar batendo no peito e dizer "Sim, nós temos florestas" sem o "Até quando?" bradado na avenida Paulista.

Aí fica a pergunta: Se os rumos da economia e do desenvolvimento passam ao largo da preservação, tal como alardeiam os "bacanas" ambientalistas, onde esses pequenos produtores e pessoas da floresta se encaixarão quando o "tratorzão" do desenvolvimento predatório, com mais hectares de mata para adentrar e menos multas a pagar chegar?

Serão eles abraçados pelas "facilidades" do desenvolvimento - que o novo Código Florestal promete - ou ficarão às margens, na berlinda do não saber?"

VIOLÊNCIA NO CAMPO

Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que faz acompanhamento dos conflitos no campo, revelam que 1.581 pessoas foram assassinadas no Brasil nos últimos 25 anos.

Diante da ausência de dados oficiais, o levantamento da CPT, que começou em 1985, é a fonte mais confiável e costuma servir como referência no noticiário sobre a realidade dos conflitos no campo no Brasil. 

Leia mais no Blog da Amazônia

Cresce o número de assassinatos em conflitos no campo

Pistoleiros cortaram orelha de extrativista assassinado no PA 

CNS culpa governo por assassinato de líderes extrativistas no Pará 

A CPT nasceu em junho de 1975, durante o Encontro de Pastoral da Amazônia, convocado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

O levantamento  que realiza tem como objeto de documentação e análise os conflitos, caracterizados pela CPT como ações de resistência e enfrentamento que acontecem em diferentes contextos sociais no âmbito rural envolvendo a luta pela terra, água, direitos e pelos meios de trabalho ou produção.

A CPT obtém os dados por meio de pesquisas, a partir de levantamentos de informações e dados em jornais de circulação local, estadual e nacional, boletins e publicações de diversas instituições, como movimentos sociais, sindicatos, partidos, órgãos governamentais e igrejas.

A organização também se vale de declarações e cartas assinadas, boletins de ocorrência, além das informações e dados pesquisados por suas regionais, enviados à Secretaria Nacional, em Goiânia (GO).

Segundo a CPT, os conflitos acontecem entre classes sociais, entre os trabalhadores ou por causa da ausência ou má gestão de políticas públicas. Os conflitos são catalogados em conflitos por terra, conflitos pela água e  conflitos trabalhistas, além das violências e manifestações.

Conflitos por terra: ações de resistência e enfrentamento pela posse, uso e propriedade da terra e pelo acesso a seringais, babaçuais ou castanhais, quando envolvem posseiros, assentados, remanescentes de quilombos, parceleiros, pequenos arrendatários, pequenos proprietários, ocupantes, sem terra, seringueiros, quebradeiras de coco babaçu, castanheiros etc.

Conflitos pela água: ações de resistência, em geral coletivas, para garantir o uso e a preservação das águas e de luta contra a construção de barragens e açudes, contra a apropriação particular dos recursos hídricos e contra a cobrança do uso da água no campo, quando envolvem ribeirinhos, atingidos por barragens, pescadores etc.

Conflitos trabalhistas: ações de resistência dos trabalhadores assalariados que reivindicam aumento de salário e manutenção dos direitos. Também se referem a situações de sujeição, exploração e desrespeito à pessoa e aos direitos dos trabalhadores nas relações de trabalho.

Violência: o constrangimento e ou destruição física ou moral exercidos sobre os trabalhadores e seus aliados. Esta violência está relacionada aos diferentes tipos de conflitos registrados e às manifestações dos movimentos sociais do campo.

Os “tipos de violência” são catalogados como assassinatos, tentativas de assassinato, ameaças de morte e numa síntese denominada “violência contra a pessoa”.

Na síntese, constam ainda as mortes em conseqüência do conflito (aborto, omissão de socorro, acidente, inanição, doenças), torturas, agressões físicas, ferimentos, prisões.

A CPT também apresenta o detalhamento da violência contra a pessoa, incluindo seqüestros, ameaças de prisão, cárcere privado, humilhaçõese intimidações.

Por último, as manifestações: ações coletivas dos trabalhadores e trabalhadoras que reivindicam diferentes políticas públicas e ou repudiam políticas governamentais ou exigem o cumprimento de acordos e promessas.

CRESCE NÚMERO DE ASSASSINATOS NO CAMPO

O assassinato do casal de extratitivistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, ocorrido nesta terça-feira (24), em Nova Ipixuna, sudeste do Pará, segue uma tendência de crescimento da violência decorrente de conflitos por terra no Brasil.

O mais recente relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), divulgado há pouco mais de um mês, afirma que 2010 foi marcado pelo crescimento do número de mortes em conflitos no campo: 34 trabalhadores rurais foram assassinados no país.

Segundo a CPT, o número de assassinatos no campo aumentou 30% em relação a 2009, quando foram registradas 26 mortes. A organização assinala que o número representa “uma inflexão na tendência de queda que vinha desde 2006″.

Trinta desses assassinatos ocorreram em conflitos pela terra, dois em conflitos pela água e dois em conflitos trabalhistas. A região Norte concentrou 21 dos assassinatos; o Nordeste 12 e o Sudeste 1.

Além dos assassinatos, em 2010 foram registradas no Brasil 55 tentativas de assassinato, 125 pessoas receberam ameaças de morte, quatro foram torturadas, 88 presas e 90 agredidas.

Os dados da CPT revelam que o Pará mantém a liderança quanto ao número (18) dos assassinatos, ou seja, 100% maior que em 2009, quando foram registrados apenas nove casos.

O Maranhão apresentou porcentagem ainda maior no crescimento do número de assassinatos. Em 2010 foram assassinados quatro trabalhadores - 300% a mais que em 2009, quando foi registrado um assassinato.

- O que é triste constatar é que nove dos 18 assassinatos no Pará envolveram trabalhadores contra trabalhadores, casos da Fazenda Vale do Rio Cristalino e do Assentamento Rio Cururuí. Uma violência que esconde os reais responsáveis pela tragédia. Desavenças entre trabalhadores são geradas pelos interesses do capital, sobretudo das madeireiras - afirma o relatório da CPT.

A organização menciona no relatório os conflitos em Anapu (PA), no início de ano. De um lado estavam os assentados do Projeto de Desenvolvimento Sustentável Esperança, criado por Irmã Dorothy, outra vítima da pistolagem no Pará.

O assentados bloquearam estradas para evitar a saída de madeira extraída ilegalmente da área, mas do outro lado estava o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, que defende a extração da madeira.

A CPT afirma que por trás deles estava o interesse das madeireiras. Para a organização, “os interesses econômicos, com seu olhar focado exclusivamente no lucro, recusa-se a ver outras dimensões e valores da natureza e utiliza diversos estratagemas para minar a resistência popular, inclusive jogando trabalhadores contra trabalhadores”.

- Esta é a lógica que sustenta os conflitos nas áreas da Fazenda Vale do Rio Cristalino e do Assentamento Rio Cururuí - exemplifica.

A CPT caracteriza conflitos por terra as ações de resistência e enfrentamento pela posse, uso e propriedade da terra e pelo acesso a seringais, babaçuais ou castanhais, quando envolvem posseiros, assentados, remanescentes de quilombos, parceleiros, pequenos arrendatários, pequenos proprietários, ocupantes, sem terra, seringueiros, quebradeiras de coco babaçu, castanheiros etc.

MPF DENUNCIA ANTONIO MONTEIRO

Ex-secretário de Segurança do Acre na gestão dos governadores Jorge Viana e Binho Marques, ambos do PT, Antonio Monteiro Neto foi denunciado pelo Ministério Público Federal por fraude, em 2005, contra a lei de licitações. Atualmente, Monteiro é assessor especial do gabinete do governador petista Tião Viana.

A licitação se referia a compra de material para o "sistema de inteligência", cujo recurso, no valor de R$ 249 mil, era oriundo de convênio com a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça.

Antonio Monteiro, de acordo com a denúncia assinada pelo procurador da República Paulo Henrique Ferreira Brito, teria dispensado licitação fora das hipóteses previstas em lei e sem observar as formalidades legais.

Consta nos autos que Monteiro chegou a ser advertido pela Procuradoria Geral do Estado sobre os cuidados que deveria ter para a dispensa e mesmo assim optou por dar prosseguimento à compra direta, tendo sido beneficiada a empresa Ferreira & Ferreira.

A dispensa de licitação alvo da denúncia do MPF serviria inicialmente para comprar materiais vinculados estritamente à atividade de inteligência. Na alegação do ex-secretário, os equipamentos deveriam ser comprados sob sigilo por questão de segurança.

Apesar disso, os peritos da Polícia Federal concluíram que os materiais de segurança poderiam ter sido adquiridos por licitação normal, pois a publicidade dos atos não ameaçaria a segurança nacional.

O secretário acabou incluindo no pacote equipamentos de informática e materiais de escritório, que não são específicos da atividade de inteligência e exigem a formalização de processo licitatório para sua aquisição.

Segundo o MPF, Antônio Monteiro também deixou de apresentar planilhas de comparação de preços e outras justificativas para a escolha da empresa Ferreira & Ferreira. A análise contábil da licitação também demonstrou superfaturamento de 13% a 300% nos valores pagos, equivalente a R$ 46 mil de sobrepreço.

A ação corre na 1ª vara da Justiça Federal e se o acusado for considerado culpado poderá ser condenado a pena de até cinco anos e ao pagamento de multa.

UM DISCURSO HISTÓRICO

Citando os "pequenos produtores", a Amazônia e até Irmã Dorothy, a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) defende na Câmara o novo Código Florestal. O discurso é de lascar. Os ruralistas agora aplaudem os novos aliados do ambientalista Chico Mendes.



"Sr. Presidente, colegas Parlamentares, pensei muito se subiria a esta tribuna para discutir o Código Florestal, mas quero dizer ao meus colegas e aos nobres pares que no terceiro mandato de Deputada Federal jamais poderia assistir a um debate como este, em que alguns que defendem a Amazônia como santuário da humanidade e outros que querem devastar nossa Amazônia não conseguem se entender e votar um Código que garanta a proteção de nossas florestas e, ao mesmo tempo, o desenvolvimento do País.

Eu não poderia me calar, Sr. Presidente, sabendo de onde vim e quem sou. Saí do seringal aos 14 anos, quando fui ver energia elétrica e televisão pela primeira vez. Durante muitas noites dormi ouvindo o ronco das onças e comi, às vezes, carne de macaco, quando criança para sobreviver.

Então eu não poderia ficar fora de um debate como esse, um debate que interessa aos pequenos produtores da Amazônia, aos homens e mulheres que estão passando fome na floresta porque alguns bacanas adoram defender o meio ambiente a partir do Planalto Central. Outros adoram defender o meio ambiente a partir desta tribuna. Outros até acham que defender o meio ambiente é fazer manifestações na Avenida Paulista.

Defender o meio ambiente, Sr. Presidente, é subir e descer rios nos seringais da Amazônia, é ver a situação de miséria em que vivem hoje homens e mulheres que moram no interior da nossa grande floresta, maior riqueza do Brasil. Enquanto isso, o País deixa esses pequenos produtores passarem fome.

Aliás, Sr. Presidente, hoje a proposta do Código Florestal mais condenada pelos bacanas é — o Relator, Deputado Aldo Rebelo, ouviu-me e resolveu colocar isso em seu projeto e em sua proposta de relatório — a que isenta os pequenos produtores da Amazônia dessas multas absurdas que têm sido aplicadas pelo IBAMA.

A maioria dos homens e mulheres que vivem hoje na Amazônia estão inadimplentes. Os homens estão acabrunhados com o tamanho da dívida que têm nas costas e não conseguem pagá-la. Mesmo que consigam vender sua pequena propriedade, não conseguem arrecadar o dinheiro, tamanho o número de multas que têm nas costas.

O pequeno produtor sequer tem condições de pagar um advogado para interpretar a legislação atual depois de tantos decretos que saem da Casa Civil, da Presidência República ou do Ministério do Meio Ambiente. Não sabemos nem quantas leis são hoje acerca da legislação ambiental.

O pequeno produtor da Amazônia não tem dinheiro para pagar consultoria, para legalizar sua situação e garantir o cumprimento da legislação ambiental de hoje. Isso é um crime contra quem mora na Amazônia, colegas Parlamentares presentes.

Acho um crime tão grande deixarem soltos os assassinos da Irmã Dorothy, aqueles que desbastaram a floresta do Pará, mas botar na cadeia o pequeno produtor da Amazônia, que derrubou uma árvore para construir a casa de uma filha que vai se casar, por ter cometido um crime ambiental?

Então, como estamos tratando o grande, aquele que consegue se defender, que tem condições de ir ao banco solicitar financiamento, de pagar consultorias, de pagar advogados? Estamos tratando-o com a mesma régua e com a mesma medição como tratam aqueles pequenos coitados da Amazônia?

Portanto, Sr. Presidente, como defensora da Amazônia, como defensora das florestas, defendo a necessidade de esta Casa votar o Código Florestal, porque é importante para o desenvolvimento do Brasil.

Somos o único país no mundo em que se discute proteção de floresta, porque podemos bater no peito e dizer: sim, nós temos floresta. Os outros é que não têm e ficam tentando colocar moral na casa alheia.

Muito obrigada, Sr. Presidente. (Palmas nas galerias.)"

Clique aqui e guarde para as próximas eleições a lista de quem votou contra e a favor das florestas brasileiras.

terça-feira, 24 de maio de 2011

NA BR-364, VIAGEM NO TEMPO GEOLÓGICO

Construção da rodovia revela Acre pré-histórico


De Rio Branco a Cruzeiro do Sul, no Acre, a BR-364 corta em muitos pontos sedimentos da Formação Solimões de idade terciária, cuja fonte de deposição foi a Cordilheira dos Andes, em decorrência do seu processo de elevação.

Trata-se de um processo iniciado a partir do período Cretáceo (65 m.a), período em que os dinossauros estavam se extinguindo na Terra e teve seu ápice no período Mioceno (8 m.a).

- Após a morte, plantas e animais que viveram no Acre pré-histórico foram soterrados e passaram por processo de fossilização, que é lento e natural, permanecendo enterrados por milhões de anos - assinala o paleontólogo Jonas Filho, da Universidade Federal do Acre.

Atualmente, quando as máquinas fazem cortes ou refazem os antigos cortes, os fósseis aparecem e revelam uma história escondida pelo tempo.

- O achado de um simples dente, escama ou garra, podem oferecer pistas extraordinárias sobre o ambiente e o hábito dos animais pré-históricos - acrescenta Jonas Filho.

Embora não existindo mais, os animais pré-históricos são, nos dias atuais, objeto do estudo dos paleontólogos para subsidiar o entendimento dos processos evolutivos da natureza.

Pesquisadores e acadêmicos de biologia da Ufac, coletaram fósseis de peixes, caranguejos, répteis e mamíferos, datados de oito milhões de anos, na BR-364, no município de Manuel Urbano.



Os achados foram efetuados na semana passada, durante uma atividade prática da disciplina Paleontologia da Amazônia, ministrada pelo professor Jonas Filho, com a colaboração do professor Edson Guilherme, ambos do Centro de Ciências Biológicas e da Natureza, e com o apoio técnico do Departamento de Estradas e Rodagens do Acre.

Nos últimos três anos, pesquisadores da Ufac, em parceria com o Deracre, acompanham e monitoram as obras realizadas na BR-364, no trecho que compreende os municípios de Manuel Urbano e Feijó.

O objetivo é identificar novos sítios paleontológicos e fazer o salvamento de material fóssil, oportunidade em que os estudantes podem participar como atividade prática do curso.

As pesquisas paleontológicas ao longo da BR-364 vêm sendo realizadas pelos paleontólogos da Ufac e colaboradores desde a década de 1970 e dezenas são os sítios já catalogados.

O sítio Lula, localizado a 8 Km da margem esquerda do Rio Caeté, em Sena Madureira, foi um dos primeiros registrados para a ciência com grande potencial fossilífero.

Dele resultou a publicação do jacaré Caiman brevirostris (jacaré de rosto curto), descrito em 1977 pelo paleontólogo Jonas Filho e do gigantesco peixe Acregoliath rancii (Golias do Acre), descrito pela paleontóloga Marta Richiter, do Rio Grande do Sul, prestando homenagem ao paleontólogo Alceu Ranzi.

Outro destaque mapeado na rodovia, que apresenta grande quantidade de fóssil, é o sitio Morro do Careca, em Feijó.

O sítio tem recebido a visita dos pesquisadores da Ufac e está se transformando em verdadeiro laboratório a céu aberto para os acadêmicos de biologia do Campus Floresta de Cruzeiro do Sul.

Os nomes dos sítios são referidos ou oferecem homenagem aos donos das localidades onde estão situados ou são nomes de localidades já conhecidas pela comunidade.

- Quando a BR-364 for concluída, uma viagem poderá se transformar em uma grande aventura pelo tempo geológico. Com apoio, será  possível transformar algumas das localidades fósseis ao longo da rodovia em museu aberto e a disposição do público viajante. Além do esqueleto em sito, na condição natural de preservação, réplicas em tamanho original poderão se confeccionadas, dando um realismo ao local onde viveram no passado. Este é um sonho meu - conclui Jonas Filho.

Fotos: Jonas Filho/Ufac

OLINDA BATISTA ASSMAR


domingo, 22 de maio de 2011

ARRAIAL DO ALTO SANTO


Vai ter arraial no Alto Santo neste final de maio. A casa de mestre Irineu e Peregrina Serra vai reunir mais uma vez toda a comunidade em três dias de festa.

Como nos bons tempos antigos, vai ter quadrilha, comida, brincadeira, bingo, leilão, todas as atrações de um arraial tradicional, além de novas atrações artísticas e shows de música.

Mas todos terão que andar dentro da lei: uma “puliça” vai prender e multar quem jogar lixo no chão ou fizer qualquer coisa que atrapalhe a festa.

E a “rádio cipó” vai dar notícias de tudo o que acontece, além de músicas, mensagens, correio elegante, avisos e anúncios em geral.

O trabalho para erguer as bases dessa cidade caipira é intenso e a sua presença é o melhor apoio nessa empreitada.

O dinheiro que for arrecadado durante os três dias de arraial será aplicado em reformas na sede do Centro de Iluminação Cristã Luz Universal - Alto Santo.

Data
27, 28 e 29 de maio

Local
Estrada Raimundo Irineu Serra, próximo ao ponto final do ônibus.

OS XERIFES DA LÍNGUA

POR JOSÉ RIBAMAR BESSA FREIRE

Os toques de clarim e o rufar dos tambores chamaram a Infantaria e a 7ª. Cavalaria. O Exército colocou de prontidão os seus soldados armados até os dentes: a tropa da Academia Brasileira de Letras (ABL), o batalhão dos jornalistas, a brigada ligeira dos escritores, a legião de políticos, o pelotão do Ministério Público e até algumas divisões blindadas da Universidade. Todos eles irmanados na santa cruzada lançaram o grito de guerra que ecoou pelos campos, vilas e cidades do Brasil, ameaçando o inimigo:

- Oh, vós, que desejais assassinar o idioma. Liquidar-vos-emos. Avante!.

O inimigo é o livro “Por uma vida melhor” da professora Heloísa Ramos, adotado pelo MEC, que é apenas a ponta do iceberg. Lá, a autora apresenta a diferença entre falar e escrever e reconhece que na fala existe muito mais variação do que na escrita. O jeito de falar muda bastante, de acordo com a região, a classe social e a situação de comunicação. A mesma pessoa fala diferente se está em casa, na feira, no bar, no tribunal ou na igreja.

- Existem várias línguas faladas em português – já disse o escritor José Saramago, prêmio Nobel da literatura.

Nesse sentido, cada um de nós é “bilíngue” na própria língua. Uma dessas línguas é a chamada ‘norma culta’, a de maior prestígio em nossa sociedade, que é usada na sala de aula e está mais próxima da escrita formal. Outras são as variedades populares, regidas por uma diversidade de regras, mas que não chegam a prejudicar a intercompreensão.

Acontece que milhões de brasileirinhos chegam à escola, falando segundo as regras da variedade popular. Por isso, são ridicularizados e humilhados. Dessa forma, são levados a se envergonharem das variedades que a norma culta considera “erradas”, e não se apropriam, nessas condições adversas, da outra variedade considerada “certa”. São reprimidos. Sua fala fica excluída dos espaços públicos, comprometendo o exercício da cidadania.

Esse fato demonstra a incapacidade do Estado, que não encontrou ainda o caminho para permitir que todos os alunos transitem pela norma culta. A autora defende, então, que a alternativa é admitir que a variedade popular existe, tem suas regras e é legítima. As duas normas não se excluem, mas se complementam. O respeito ao jeito de falar do aluno cria um ambiente acolhedor e propício à aprendizagem da norma culta. Só isso.

Mas tal proposta foi suficiente para que os xerifes da língua, que combatem a diversidade, disparassem suas armas alegando, alguns deles, que o MEC quer instituir o “lulês” como idioma oficial. Distorceram – ou no mínimo não compreenderam (será que leram?) - o que está escrito no livro. Eles acham que quem defende o respeito à norma popular quer impô-la ao conjunto da sociedade, como eles o fazem com a norma culta. Por isso, chamam a 7ª. Cavalaria.

As cavalgaduras

A cavalaria veio. Na linha de frente, cavalgando um pangaré manco – tololoc, tololoc - o centurião José Sarney (PMDB, vixe-vixe!), membro da ABL, ex-presidente da República e presidente do Senado. No artigo ‘Fale errado, está certo’ na Folha de SP – com a espada em riste, ele faz aquilo que fez ao longo de sua vida: atribui aos outros seus próprios defeitos. Escreve que o livro em questão pretende “oficializar a burrice”, que “o Brasil resolve criminalizar quem fala corretamente”, quando é justamente o contrário, e que “defender a língua é defender a pátria”.

Sarney, defensor da pátria? Quaquaraquaquá! O que é ‘a língua’ e o que é ‘a pátria’ para ele? Em sua ‘pátria’ não cabem os deserdados, apenas os beneficiados pelo nepotismo. Já a ‘língua’ que defende não é um sistema variado, dinâmico e rico, mas se reduz à norma culta, que ele congela. Elimina as demais variedades, proclamando que apenas uma variedade é o português, embora nas conversas telefônicas com sua neta, que ouvimos gravadas e reproduzidas pelos telejornais, a norma usada para contratar o namorado dela, mais coloquial, não foi bem a que ele defende.

Da mesma forma, Sarney, o vixe-vixe, protesta com indignação contra a anarquia:

- Voltemos ao sistema tribal: cada um fala como quer”.

Imagina! Que país é esse onde cada um fala como quer e não como os sarneys da vida pretendem impor! Sarney, que passou a vida confundindo a coisa pública com a privada, sobretudo no que se refere à grana, quer privatizar também a língua. Acha que ela é sua e dos seus. Não reconhece que se trata de produção coletiva. Nem sequer suspeita que existam regras no falar popular. Exige que a norma culta seja o padrão de correção de todas as demais variedades, confirmando o que escreveu Roland Barthes:

- A língua não é fascista quando impede de dizer, mas quando obriga a dizer de uma determinada forma.

Cavalgando um burro alazão – tololoc, tololoc – o presidente da ABL Marcos Villaça também atacou o livro. Reduziu a riqueza do idioma a uma reles operação aritmética, com uma visão primária da matemática, dizendo que admitir outras formas de falar “é como ensinar tabuada errada. Quatro vezes três é sempre doze, seja na periferia ou no palácio”.

A mesma imagem foi usada por sua colega, a escritora Ana Maria Machado, que esqueceu o que ensinou quando foi minha professora de Comunicação Fabular e Icônica na UFRJ. Ela reforça essa comparação infeliz: “Equivale a aceitar que dois mais dois possam ser cinco, com a boa intenção de derrubar preconceitos aritméticos”. Trata-se de uma falácia, porque ninguém está reivindicando que 2+2=5, mas a possibilidade de ser 1+1+1+1 ou 3+1 e até 2+2=5-1 e assim por diante, já que o quatro contém o infinito.

Mas quem se superou mesmo em bobagens foi o jornalista Merval Pereira - um projetinho de Sarney - que veio cavalgando uma besta de sela desembestada: tololoc, tololoc. Em sua coluna no Globo concluiu que se o português popular é legitimo, então ele deveria “ser ensinado nas escolas e faculdades”, como se fosse preciso ensinar o que já se sabe. Merval condenou ainda o que chamou de “pedagogia da ignorância” e criminalizou o livro adotado pelo MEC: “Se for uma tentativa de querer justificar a maneira como o presidente Lula fala, aí então teremos um agravante ao ato criminoso de manter os estudantes na ignorância”.

Os criminosos

Ops! Vocês ouviram o que eu ouvi? Ato criminoso? Pois é. Parece que os xerifes do idioma querem criminalizar a desobediência às regras da norma culta, reproduzindo o que aconteceu na Cabanagem, a revolta popular mais importante da história da Amazônia (1832-1840). Bilhetes escritos pelos cabanos, anexados aos processos criminais, foram exibidos nos tribunais durante o julgamento como “prova de seus instintos criminosos”. Um deles assinado por Antônio Faustino, um cabano com a patente de major, diz:

“Axome çem monisão que muntas vezis teno pidido. Çe uver cunfelito aqi não çei o qe soçederá. Estarei em pouçilitado de zequtar qalqer prugetu. Halguns camaradas já çairão daqi pur farta de cumer”. Pontu da Barra, 3 de otobro de 1835. Antonho Fostino, manjor de artilharia.

O outro, que também se encontra no Arquivo Público do Pará, “com uma caligrafia feita de garranchos”, é de um chefe cabano que adverte o presidente da Província:

“…E se V. Exa. Responsave pellos mal desta província não sortar logo logo móhirmão e outros patrisio que saxão prezo prometo intrar na sidade comeu inzercito de sinco mil Ome i não dexar Pedra sobre Pedra”.

Um terceiro documento, escrito pelo tenente-comandante de Soure, é um ofício dirigido ao cabano Eduardo Angelim, que ocupou o cargo de presidente da Província:

“Rogo a V. Exa. Nois quera há-remidiar com algun çal e mesmo harmamentu que estamos mointos faltos deles. O mais V. Exa. verá no Pidido jontu q. faz obegeto tãoben desti ufisio. Deos guarde V. Exa. pur moitos anus. Soure, 13 de Dezembru de 1835”.

Que Deus guarde a ABL, Sarney e Merval pelo período de tempo acima indicado, bem como proteja políticos como o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), para quem o livro adotado pelo MEC “está transformando a ortografia em pornografia gramatical” e até o senador Cristovão Buarque (PDT), ex-reitor da UnB e ex-ministro da Educação, que declarou sobre o livro em questão:

- Claro que o livro deseduca e, pior, mantém o apartheid linguístico. Manter o português errado é um crime, é manter a desigualdade.

Crime? Desigualdade? Segundo Boaventura de Souza Santos, devemos “lutar pela igualdade sempre que as diferenças nos discriminem e lutar pelas diferenças sempre que a igualdade nos descaracterize”. Não se trata, evidentemente, de adotar as normas dos cabanos, mas de recusar sua criminalização.

A professora Heloisa, que fez um trabalho cuidadoso, está sendo tratada como “criminosa” segundo algumas divisões blindadas da própria Universidade que também entraram em ação. Cláudio Moreno, doutor em Letras, ameaçou no jornal Zero Hora de Porto Alegre:

- O livro tem que ser proibido e as pessoas devem ser punidas.

Não disse que tipo de punição considera mais adequada. Acionado, o pelotão do Ministério Público partiu para o ataque. A procuradora da República Janice Ascari, do Ministério Público Federal, cavalgando um jegue – tololoc, tololoc - considerou o livro citado como “um crime contra nossos jovens”, ganhando manchete de página no Globo. “Essa conduta não cidadã é inadmissível, inconcebível e, certamente, sofrerá ações do Ministério Público”, avisou a procuradora.

O historiador peruano Pablo Macera comenta que se o Império Romano conseguisse proibir o latim vulgar, como querem agora os xerifes da língua, nós não estaríamos hoje falando espanhol, português, francês, italiano, romeno, catalão – todas elas variantes “erradas” do latim clássico, conhecidas como línguas vulgares na Idade Média.

A troca de ‘l’ em ‘r’, que costuma ser considerada como “atraso mental”, quando alguém fala “pobrema”, “craro” ou “pranta” é um fenômeno fonético presente na formação da língua portuguesa, como esclarece Marcos Bagno. Palavras latinas como “blandu, clavu, flacu, sclavu, obligare” mantiveram o “l” no espanhol, no francês e no italiano, mas ficaram consagrados na norma culta da língua portuguesa com o “r”: “brando, cravo, fraco, escravo, obrigar”, etc.

Os xerifes querem continuar hegemônicos na formulação da política de línguas, autoritária e intolerante. Para isso, manipulam a opinião pública, ignorando a Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, aprovada em 1996 em Barcelona, num evento realizado com o apoio da Unesco, recomendando que “os direitos linguísticos sejam considerados direitos fundamentais do homem” e que as diferenças linguísticas sejam respeitadas.

P.S.: Agradeço os colegas do COMIN e da EST, de São Leopoldo (RS), e os colegas da lista Uerj XXI, com quem pude trocar ideias sobre essa questão. Eles não têm, no entanto, qualquer responsabilidade pelo conteúdo ou pela forma desse texto.

O professor José Ribamar Bessa Freire coordena o Programa de Estudos dos Povos Indígenas (UERJ), pesquisa no Programa de Pós-Graduação em Memória Social (UNIRIO).

sábado, 21 de maio de 2011

"OREI E VOU BRIGAR POR SEGURANÇA"

Do vice-reitor da Universidade Federal do Acre, Pascoal Muniz, sobre a nota "Ufac ignora estupro de estudante":

"Senhor Jornalista

Em respeito à sociedade e comunidade acadêmica diante das noticias divulgadas no seu blog solicito divulgar a nota abaixo para explicar aos leitores a respeito da viagem e minha posição diante da segurança na UFAC. 

Sexta feira às 7 horas estava a caminho da Bolívia recebi um telefonema do jornalista Altino Machado, informando a respeito da agressão sofrida por uma acadêmica, às 18 horas, do dia anterior, no Campus sede da UFAC, informei ao jornalista que não fui avisado pela Reitoria a respeito, que estava viajando para participar de uma reunião na Prefeitura de Brasiléia a respeito do Campus da UFAC no Alto Acre e outra na Universidade Amazônica do Pando, a respeito do projeto Alpha III, com o professor Dr. Carlito Cavalcanti, coordenador do projeto, que também não tinha conhecimento do lamentável fato. Depois de uma rápida avaliação que não poderia mudar a triste realidade, resolvi dar seguimento a viagem, pois a Reitora estava no efetivo exercício do cargo respondendo pela Reitoria e certamente tomaria as devidas providencias.

No dia da lamentável violência, pela manhã, estive acompanhando a visita do Ministro de Ciência e Tecnologia a UFAC, à tarde numa reunião com 15 alunos treinando para desenvolvimento de uma pesquisa de um orientando meu, aluno do Mestrado em Saúde Coletiva e a noite no tratamento de saúde com fisioterapeuta, depois fui dormir e acordei cedo para a viagem.

Diante do fato tomei duas decisões, a primeira como cidadão pai de duas filhas, três netas, esposo, coloquei-me no lugar dos pais da aluna agredida e orei por ela e por sua família, pedindo a Deus o devido amparo, a segunda, como professor e Vice-Reitor da UFAC, brigar ainda mais internamente para melhorar a segurança para prevenir o arrombamento das máquinas do Bancos instalado na UFAC, roubos de carros, roubos de equipamentos, assaltos  nos pontos de ônibus e prováveis estupros.

Algumas medidas podem ser tomadas, a primeira ampliação do orçamento junto ao MEC para a atividade de segurança, para ampliar o numero de vigilantes e câmeras, além disto, solicitar ações de inteligência da Policia Federal com o objetivo especifico de identificar eventuais práticas do trafico de drogas na UFAC, solicitar a ronda sistemática da PM no campus, elaborar normas internas para orientação de segurança, alem de outras medidas. Finalmente assumo que me sinto responsável pela segurança da UFAC, mesmo na limitadíssima possibilidade de atuação da vice-reitoria.

Rio Branco, 21 de maio

Atenciosamente

Professor doutor Pascoal Torres Muniz

Vice-Reitor da UFAC"

NOSTRADAMUS

"Levanta e serve um café que o mundo acabou"

 

NOVAS AÇÕES DO TJ CONTRA O GOVERNO

O presidente do Tribunal de Justiça do Acre, desembargador Adair Longuini, anunciou neste sábado (21), novas medidas contra o governo do Acre para que o Judiciário possa resguardar a sua autonomia financeira na definição da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do Estado.

A discordância quanto aos rumos dados pelo Executivo à questão do orçamento foi objeto de várias comunicações administrativas entre o desembargador Adair Longuini e o governador Tião Viana (PT).

Até mesmo uma notificação na via judicial foi encampada pelo Tribunal de Justiça, com o ingresso de uma ação cautelar no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o governo estadual.

A notificação tinha o objetivo de, mais uma vez, cientificar o Executivo de suas obrigações, mas perdeu o seu objeto porque foi ultrapassada a data limite de envio do anteprojeto da LDO à Assembléia Legislativa do Estado.

Segundo Longuini, isso não impede outras ações ordinárias que já estão sendo elaboradas. O Blog da Amazônia apurou que o Judiciário moverá nova ação no STF argüindo a inconstitucionaldiade da LDO.

O Tribunal de Justiça tem solicitado ao Governo do Estado, desde abril, a suplementação de recursos relativos a duodécimos repassados incompletos e alertado quanto à necessidade da efetiva participação do Judiciário nas discussões para a elaboração da LDO.

Segundo a direção do Tribunal de Justiça, ainda no final do ano passado, no gabinete de transição, o governo estadual já havia se comprometido a reforçar o orçamento do Judiciário para o ano de 2011 e a repor os valores de duodécimos incompletos. Igual compromisso assumiu para garantir a participação do Judiciário na elaboração da LDO para o exercício de 2012.

Para o Tribunal de Justiça, o fato de o Governo do Estado não ter chamado, em tempo hábil, os demais Poderes para discussão sobre os limites orçamentários, não pode ser invocado em prejuízo do Judiciário.

Na avaliação da direção do TJAC, a exemplo de anos anteriores, o anteprojeto de LDO, enviado à Assembléia Legislativa na última segunda-feira (16), continua a padecer do vício de inconstitucionalidade, porque elaborado de forma unilateral pelo Executivo, sem a efetiva participação do Judiciário.

A expectativa da direção do TJAC é que o anteprojeto da LDO seja revisto junto ao Legislativo, onde tramitará e serão realizadas discussões para que os parlamentares se convençam da inadequada condução da matéria. Longuini anunciou que não descarta a judicialização do mérito da questão no momento oportuno para resguardar a independência financeira do Judiciário.

A CARAS DO ACRE


Acontecimentos é a Caras do Acre. É tão vazia e sobra tantos exemplares em menos de 10 bancas de revistas de Rio Branco, que chega a ser distribuída gratuitamente nos bares da cidade. Aceitei dois exemplares "de grátis" no Bar do Patetão, mas nem todos foram tão gentis que nem eu. A impressão é impecável. O papel é de primeira. Dói saber que recebe verba pública de um Acre que ocupa o sexto lugar entre os Estados com a maior concentração de pessoas em condições extremas de pobreza - 133.410 acreanos (19,6% da população) recebem até R$ 70 por mês.

A CRISE É GENERALIZADA

Fátima Almeida

É só ler as páginas policiais do Acre para perceber que os malfeitores estão atacando por toda parte, a qualquer hora. Crimes hediondos, inclusive, como o daquela menina de 13 anos, assassinada em sua própria casa. Buscou-se muito o desenvolvimento, mas sem planejamento social. O loteamento dos cargos na máquina do Governo do Acre segue uma inclinação pessoal e passam ao largo de uma possível racionalidade científica, seja nas ações ou na economia do erário. Há centralismo e pouca ou nenhuma horizontalidade no poder de decisão. É sempre o governo de uma pessoa e não o de uma frente.

Agora mesmo ocorre uma invasão na margem da Av. Amadeo Barbosa, na faixa que se estende em direção à saída para Porto Velho (RO), onde os invasores estão construindo casas que mais parecem caixotes com madeira velha, mal serrada, outros, em alvenaria, à guisa de posse, em regime de mutirão, após o expediente. Tudo de forma caótica, improvisada, sem a menor possibilidade de merecer uma marca de carimbo “habite-se”.

No ramal do Brás, Belo Jardim II, que dizem ser terras do Incra, onde existe Luz para Todos, uma senhora loteou a sua área ao preço de R$ 4 mil cada lote. As casinhas de madeira e alvenaria já estão surgindo em meio a uma rua improvisada.

Ora, um empresário que tente um empreendimento imobiliário terá  que esperar um ano pelo licenciamento ambiental, afora o pagamento de taxas junto à prefeitura e vários outros trâmites. Do mesmo modo, quem mora em perímetro urbano, com imóvel cadastrado na prefeitura, que paga IPTU, precisa registrar reforma ou construção no terreno, pagar taxas e esperar o habite-se. Outros donos de chácara estão vendendo argila devido a essa nova onda de calçamento com tijolos. Nada disso está sendo feito com licenciamento ambiental.

Por toda parte as pessoas estão fazendo o que bem querem e entendem.

Está  surgindo em Rio Branco um segundo estado, daqueles que inventam possibilidades de ganhar dinheiro ao arrepio da lei, como se diz, protegidos pela própria condição marginal, em relação à concentração de renda, à participação política, à cultura e à educação, pois muitos são adultos que só conseguem assinar o próprio nome. Enfim, estão constituindo um novo Estado, próprio, bárbaro, na base do individualismo, do quem chegar primeiro, do toma-lá-dá-cá, em meio à rede de narcotraficantes, ladrões, homicidas impiedosos morando ao lado de trabalhadores honestos. E, no entremeio,  crianças e adolescentes sem orientação e sem segurança, meninas atraídas para a prostituição. É o caos, uma terrível crise de governabilidade e da ordem pública.

Pessoas que lideram certas invasões chegam mesmo a ganhar muito dinheiro dos ingênuos compradores, como se fossem proprietários legalizados, deixando a justiça sem saber o que fazer. É uma cadeia sem fim de impropriedades. Alguns não têm o menor escrúpulo em vender gato por lebre, como terrenos com as medidas erradas. Contra essas pessoas o poder público não faz nada mesmo porque, no âmbito da ilegalidade, nesses casos, ele fica cego, surdo e de mãos atadas por causa do apelo social.

O governo que está aí há 12 anos, entrando no décimo terceiro, não tem o menor controle sobre migrações internas e externas. Como nunca fez planejamento social, urbano e rural, possibilitou essa explosão demográfica com seu gigantesco déficit habitacional, deixando proprietários e judiciário buscando soluções que não vão existir nunca, arrastando ainda no calcanhar as malas da Assembléia Legislativa e uma imprensa, em parte sensacionalista.

É muita gente vindo de toda parte, de interiores, países vizinhos e de outras regiões. Chegam aos "emboléu" e vão ficando mesmo porque não tem mais para onde prosseguir muito menos voltar. O homem que matou a menina de 13 anos dentro de sua própria casa, por exemplo, veio de Minas Gerais. Sinceramente, eu gostaria de estar equivocada.

A crise é generalizada e é uma crise de autoridade pública.

Fátima Almeida é historiadora

sexta-feira, 20 de maio de 2011

UFAC QUER INVESTIGAÇÃO, MAS NEGA ESTUPRO


A reitora Olinda Batista disse nesta sexta-feira (20), em Rio Branco, que vai pedir investigação da Polícia Federal no caso da estudante de enfermagem, de 19 anos, vítima de estupro no campus da Universidade Federal do Acre (Ufac).

- Nós não temos realmente segurança no campus. Eu mesma tenho medo de ser estuprada, pois costumo sair do meu gabinete tarde da noite - afirmou a reitora.

Supostamente a pedido da família da vítima, a reitoria demonstrou disposição em tentar minimizar a repercussão do que aconteceu no campus.

- Eu já nem sei se esse estupro aconteceu realmente no campus. Existem outras versões e ninguém registrou a ocorrência junto aos seguranças da Ufac ou na polícia - acrescentou Olinda Batista.

Contrariando versão dos estudantes e até de uma funcionária da limpeza, que atenderam a vítima, a subcoordenadora do curso de Enfermagem, Crisângela Lago Santos, contou que se reuniu com a estudante e seus familiares e negou o estupro.

- O que aconteceu foi apenas uma tentativa de assalto. O homem estava armado, retirou a estudante da parada de ônibus… Ele tinha intenção de violentá-la e sabe Deus mais o que. Ela disse que estava orando muito e ele deixou que ela fosse embora. Tentou levar a bolsa, mas desistiu porque não havia dinheiro. Ela não sofreu estupro. Ela não sabe dizer qual o tipo de arma que tinha. Ele só mostrou o cabo para ela. Mas ela não foi estuprada.

Segundo a subcoordenadora, o agressor não estava de carro e não chegou a espancar a estudante. Ela disse que a família não registrou a ocorrência porque o caso tomou uma “dimensão muito grande e ficou com medo”.

- Se nada tivesse sido divulgado, quem sabe a família teria procurado a polícia para contar o que aconteceu. A estudante não sabe se seria capaz de reconhecer o agressor e contou que o viu pela primeira vez - acrescentou Crisângela Santos.

As aulas na Ufac foram interrompidas por causa de um manifestação de aproximadamente 200 estudantes. Eles pediam mais segurança no campus e gritavam “Olinda, que coisa feia”, referindo-se à reitora e ao estupro da colega. A reitora atendeu os estudantes e se comprometeu a participar de novas reuniões, a partir da próxima semana, em busca de soluções para a insegurança no campus.

UFAC IGNORA ESTUPRO DE ESTUDANTE



Após mais de 12 horas do estupro de uma estudante, no campus da Universidade Federal do Acre (Ufac), em Rio Branco, o vice-reitor Pascoal Muniz disse por telefone ao Blog da Amazônia que não tinha conhecimento do crime.

O vice-reitor estava num carro a caminho de Brasiléia, na fronteira com a Bolívia. Ele acrescentou que não poderia desistir da viagem.

- Não estou sabendo de nada sobre esse estupro que você está relatando. Infelizmente a reunião em Brasiléia é muito importante e já estou distante quase 20 quilômetros Rio Branco - acrescentou Pascoal Muniz.

A estudante da Ufac foi estuprada no final da tarde desta quinta-feira (19). Ela esperava o namorado num ponto de ônibus quando um homem se aproximou e apontou uma arma para a cabeça dela.

Sozinha, a acadêmica foi obrigada a entrar num carro e levada para outro local entro do campus. Após ser espancada e esturrada, a jovem pediu socorro a outras estudantes.

A jovem recebeu atendimento no Pronto Socorro, mas, a pedido da família, foi transferida para uma clínica particular. A família ainda não procurou a Delegacia da Mulher para registrar o crime.

Acadêmicos de vários cursos estão percorrendo as salas de aula convocando os colegas para um  protesto contra a falta de segurança no campus.

Dois professores da Ufac relataram que na semana passada uma estudante teria sido vítima de tentativa de estupro no campus. A segurança no local se limita a três homens, na entrada do campus, que apenas observam a entrada e saída de carros e pessoas.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

ESTUDANTE É ESTUPRADA NO CAMPUS DA UFAC

Uma estudante do curso de enfermagem foi estuprada por volta das 18 horas desta quinta-feira (19) no campus da Universidade Federal do Acre (Ufac), em Rio Branco, próximo ao bloco do curso de direito.

A estudante, de 19 anos, esperava o namorado num ponto de ônibus quando um homem se aproximou e apontou uma arma para a cabeça dela.

A acadêmica estava sozinha e foi obrigada a entrar num carro, sendo levada para o local conhecido como “Vai quem quer”, dentro do campus.

Além do estupro, a estudante foi vítima de espancamento. Ela pediu socorro a outras estudantes após ter sido abandonada pelo bandido.

A jovem recebeu atendimento no Pronto Socorro, mas, a pedido da família, foi transferida para uma clínica particular.

A família ainda não procurou a Delegacia da Mulher para registrar o crime. A polícia esteve no local, mas não conseguiu prender o tarado.

Após o estupro da estudante, acadêmicos de enfermagem e membros do Diretório Central dos Estudantes começaram a organizar um protesto contra a falta de segurança no campus. A manifestação está marcada para acontecer a partir das 10 horas desta sexta-feira (20).

O IMPORTANTE É DUVIDAR E PERGUNTAR

Luiz Cláudio Cunha, jornalista



Trechos do discurso proferido por Luiz Cláudio Cunha na solenidade em que lhe foi conferido o título de notório saber pela Faculdade de Comunicação da UNB, em 9 de maio de 2011.

Luiz Cláudio Cunha levou 42 anos para receber um diploma de jornalismo. Nesse tempo de vida profissional, faturou os principais prêmios do jornalismo brasileiro, como o Esso e o Vladimir Herzog, além do prêmio Jabuti, um dos maiores na área literária, com o livro-reportagem "Operação Condor: o seqüestro dos uruguaios — uma reportagem dos tempos da ditadura".

O jornalismo

O jornalismo é a atividade humana que depende essencialmente da pergunta, não da resposta. O bom jornalismo se faz e se constrói com boas perguntas. O jornalismo de excelência se faz com excelentes perguntas.

A pergunta desafia, provoca, instiga, ilumina a inteligência, alimenta o pensamento. Ao longo de milênios, o homem evoluiu seguindo a linha tortuosa de suas dúvidas, das perguntas que produziam respostas, das respostas insatisfatórias que geravam novas questões, que provocavam mais incertezas, mais perguntas.

Perguntando, o homem saiu da caverna, cresceu, evoluiu e se definiu como ser pensante. O homem se agrupou em tribos, criou hábitos, estabeleceu regras de convívio, preservou a espécie, expandiu habilidades, depurou a fala, criou a escrita, disseminou experiências, inventou ferramentas, desenvolveu recursos, ganhou qualidade de vida, garantiu o alimento para o corpo e para o espírito. Um processo civilizatório irrefreável sempre escoltado por perguntas, outras perguntas, mais perguntas.

A Imprensa

O governo, qualquer governo, faz mal à imprensa.

A imprensa, toda a imprensa, faz bem ao governo – principalmente quando critica.

Governo não precisa do 'sim' da imprensa. Governo evolui com o 'não' da imprensa.

A proximidade da imprensa com o governo abafa, distorce o jornalismo.

A distância entre governo e imprensa é conveniente para ambos, útil para a sociedade e saudável para a verdade.

A Internet

(...) O país vive uma completa democracia, que não se reflete na qualidade do que se vê e se lê no tedioso belicismo da Internet, com raras exceções. Nada, portanto, justifica o sigilo do nome e o abuso de codinomes engraçados ou ridículos que apenas ocultam a pobreza das ideias e o despreparo para a discussão inteligente. Eu, por princípio, só entro no espaço de comentários com meu nome, profissão e cidade, certo de que é um dever meu me qualificar perante quem me lê.

Espaço de uma justa e infinita liberdade, a Internet deveria simplesmente impor a regra da identificação a quem deseja usufruir de seu espaço democrático. Apenas isso. Imediatamente, resgataríamos o espaço e o tempo perdidos para os que não têm a coragem de expor suas ideias, boas ou ruins, com o próprio nome.

O fio condutor

A biografia é o fio condutor da história. Ela tem, sobre o jornalista, a atração que a luz exerce sobre os pirilampos. Uma bela biografia é isca segura para uma bela reportagem. O poderoso relato de vida das pessoas, simples ou poderosas, faz a diferença para o bom repórter.

Nada atrai mais o jornalismo do que o traço e o gesto das pessoas que movem o mundo, que geram ideias, que inspiram exemplos, que arrastam multidões, que transformam os tempos e ganham espaço cativo na estante da história e na memória dos homens.

O foco preferencial do jornalismo são as pessoas que dizem 'não', as pessoas que têm a coragem de dizer 'não', a coragem de enfrentar desafios, de contrariar interesses, de rebater dogmas, de fazer as perguntas mais impertinentes, mais abusadas, mais necessárias.

O 'não' mais corajoso da história foi o do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882). Ele enfrentou preconceitos, venceu suas origens culturais e superou restrições religiosas para recolocar o homem no seu devido lugar. Seu cérebro prodigioso desfez fábulas celestiais para nos situar, com humildade, apenas como o representante mais inteligente de um mundo animal que tem sua origem comum nas espécies selecionadas pelo elegante, caprichoso, indesmentível mecanismo da evolução natural. Dizer 'não' a Deus e à Igreja, naqueles tempos inflexíveis da ortodoxia vitoriana, define a coragem e a grandeza eterna de Darwin.

Um segundo 'não' vem de um jornalista. Conservador, reacionário, imperialista, rabugento, desbocado, teimoso, beberrão e fumante compulsivo, Winston Churchill (1874-1965) foi grandioso nas atitudes inspiradoras, insuperável na elegância da melhor prosa inglesa, imbatível na fina ironia e invencível na determinação de enfrentar a mais assustadora ameaça do século 20: Hitler e sua ideologia totalitária.

Seu granítico "não" salvou a humanidade da submissão ao nazismo. Em cinco dias decisivos de maio de 1940, entre a sexta-feira, 24, e a terça-feira, 28, a Grã-Bretanha estava assombrada pela rendição inesperada da França e o virtual esmagamento das tropas inglesas em Dunquerque. Churchill estava virtualmente só, inclusive dentro do gabinete, que procurava uma saída para o armistício com o III Reich.

Opondo-se a Lorde Halifax, o ministro das Relações Exteriores que apoiava a política do apaziguamento com Hitler desde Munich, o primeiro-ministro mudou a história ao dizer 'não" à paz em separado. Se tivesse cedido, a Inglaterra teria saído da guerra e o nazismo triunfaria para sempre, com seus aliados da Itália e Japão.

Um terceiro 'não' veio de Ulysses Guimarães (1916-1992). Seu maior momento foi nas praças de todo o país, comandando multidões nas Diretas-Já, e sua melhor fala foi na noite de Salvador de 1978, no simbólico 13 de maio, quando repeliu de dedo em riste os soldados e os cães que tentavam acuá-lo, produzindo um 'não' encharcado de dignidade: "Respeitem o líder da Oposição! Baioneta não é voto e cachorro não é urna!". Ainda assim, na autobiografia que acaba de lançar, José Sarney ousou qualificar Ulysses como "um político menor".

Esqueceu de dizer que, diferente de Ulysses, ele foi o político menor que disse 'sim' ao Pacote de Abril de 1977 que fechou o Congresso, que cancelou as eleições diretas para governador e que inventou o monstrengo do senador-biônico. No fecho da Constituinte, em 1988, Ulysses proclamou: "A censura é a inimiga feroz da verdade. É o horror à inteligência, à pesquisa, ao debate, ao diálogo". Hoje, nesta segunda-feira, 9 de maio, completam-se 647 dias de censura ao jornal O Estado de S.Paulo, patrocinada pela família Sarney -- agora sem baioneta e sem cachorro.

O quarto 'não', expresso pela costureira negra Rosa Parks(1913-2005), mudou a história dos Estados Unidos. Ela tinha 42 anos quando se recusou a ceder o lugar a um branco, no ônibus da cidade de Montgomery, e foi presa. O gesto incendiou Alabama e o país inteiro, que viu o primeiro boicote à segregação. Os negros começaram a andar a pé, de bicicleta, mula, carroça ou em táxis de negros que cobravam 10 centavos, a mesma tarifa dos ônibus agora vazios. A desobediência civil desatada pelo 'não' de Parks levou, um ano depois, em dezembro de 1956, à decisão histórica da Corte Suprema proibindo a discriminação na cidade, passo fundamental para garantir os direitos civis aos negros em todo o país.

Leonel Brizola também disse 'não'. Às 3h da madrugada de domingo, 27 de agosto de 1961, as luzes estavam acesas nos porões do Palácio Piratini, em Porto Alegre, para um 'não' que mudaria a história do país. O governador gaúcho não aceitou o veto dos militares à posse do vice-presidente Joao Goulart e começou ali, pelos microfones das rádios Gaúcha e Farroupilha, uma série empolgante de discursos através da rede de 104 rádios em defesa da legalidade constitucional. Foi um movimento popular tão arrebatador que o general Machado Lopes, comandante do III Exército, não conseguiu dizer 'sim' ao golpe – e, nove horas após a primeira fala de Brizola, aderiu à Campanha da Legalidade, determinando o seu sucesso pela imprevista cisão militar.

Os Estados Unidos começaram a dizer 'não' à guerra do Vietnã na pequena aldeia de My Lay. Na manhã de 16 de março de 1968, um helicóptero sobrevoou o local bombardeado e notou corpos de civis com vida. Ao aterrissar, o piloto Hugh Thompson Jr. (1943-2006) percebeu que os soldados estadunidenses disparavam em mulheres, velhos e crianças. Discutiu com o comandante da operação sobre o resgate de civis feridos numa cabana, e o oficial disse que iria tirá-los dali com granadas de mão. Num gesto inédito na história militar americano, ele apontou as metralhadoras contra o pelotão americano, avisando que iria atirar se eles não recuassem. Recuaram e várias vidas foram salvas. Mas já tinham sido mortos entre 350 e 500 civis, o maior massacre de civis na guerra do Vietnã.

Inicialmente perseguido por seus chefes, Thompson acabaria recebendo, 30 anos depois, a Medalha do Soldado, a mais alta condecoração do Exército para atos de heroísmo fora de combate. O 'não' de Thompson foi um ponto de inflexão no apoio à guerra em território americano. A partir dali, cresceram as manifestações pela retirada dos Estados Unidos do Vietnã.

O 'não' do capitão Sérgio Ribeiro Miranda de Carvalho (1930-1994) impediu que a tropa de elite da Aeronáutica, o Para-Sar, treinada para salvar vidas, se tornasse um esquadrão da morte. Conhecido como 'Sérgio Macaco', ele disse 'não' ao nome mais temido da FAB, o notório brigadeiro João Paulo Burnier. No tenso 1968, o brigadeiro era o expoente da linha-dura que imaginava explodir o Gasômetro, a central de gás encanado no Rio de Janeiro, ao lado da rodoviária, num momento em que 100 mil pessoas transitavam pelo local. A culpa seria jogada nos comunistas, pretexto para endurecer o regime. Apesar de ter sido preso, expulso da FAB e cassado em dezembro pelo AI-5 que ele abortou em junho, a recusa de Sérgio Macaco desarticulou o plano terrorista e salvou milhares de vidas.

(...) Quando fui chamado para trabalhar na revista Veja em Porto Alegre, em 1971, o chefe da sucursal era Paulo Totti. Aos 32 anos, era o mais talentoso jornalista do Rio Grande do Sul, a melhor escola que um repórter poderia ter. Em dezembro de 2007, cinco meses antes de completar 70 anos, Totti conquistou o Prêmio Esso de Economia com uma reportagem sobre a China, publicada no diário Valor Econômico. O melhor jornalista gaúcho há 40 anos é ainda hoje um dos grandes repórteres brasileiros. É dele esta frase consoladora:

- A função do repórter é a única que vai sobreviver no jornalismo do futuro. Sempre vamos precisar, no futuro, de alguém que pergunte.

Totti disse e eu completo: o importante - ontem, hoje e sempre - é duvidar e perguntar.

Espero que o título honroso que a UnB hoje me confere seja o reconhecimento não às respostas que obtive, mas às perguntas que fiz ao longo destas últimas quatro décadas.

Muito obrigado".

Clique aqui e leia entrevista com Luiz Cláudio Cunha no site da UNB.