quinta-feira, 29 de setembro de 2011

MATAR A FOME E ENSINAR A PESCAR

Luciano Martins Costa

Algumas críticas ao projeto Bolsa Verde, ainda pouco conhecido e ainda menos debatido nos círculos do ambientalismo, parecem desconsiderar certas complexidades das questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável.

Uma delas é a conveniência de oferecer instrumentos diferenciados conforme o estágio de pobreza da comunidade que se quer alavancar. Outra é a perspectiva de agregar rapidamente essa população assistida a um projeto de desenvolvimento mais amplo, que englobe não apenas a comunidade mas toda a microrregião.

Também faz pouco sentido comparar o Bolsa Verde com o Bolsa Floresta, um conceito criado pelo governo do Acre e reproduzido pela Fundação Amazônia Sustentável em 2007, por meio de convênio com o governo do Amazonas.

Considerado mais sofisticado e completo, o Bolsa Floresta foi pioneiro ao propor o pagamento de serviços ambientais para famílias de caboclos que se comprometem com a redução do desmatamento, trazendo como resultados combinados a geração de renda e o desenvolvimento da cultura da preservação.

Conforme as características da comunidade a ser beneficiada, esse programa eventualmente é aplicado em áreas nas quais já predomina o extrativismo, pontos esparsos de ocupação no "Amazonas profundo", onde atividades econômicas mais nocivas ao ambiente, como a pecuária extensiva, têm poucas chances de prosperar. Essa redundância levanta questionamentos que já produziram mudanças no projeto, como a segmentação do Bolsa Floresta.

Em outras circunstâncias, e de maneira contraditória, é o próprio sucesso do programa que faz germinar o vírus do desmatamento, quando, arrancados da miséria, grupos familiares passam a buscar um rápido incremento na renda, optando por negociar com madeireiras clandestinas, mesmo sob risco de perder o auxílio oficial.

Essa distorção ocorre no Acre, onde até mesmo empresas certificadas são acusadas de prejudicar as áreas onde vivem famílias que vivem do extrativismo.

Um grupo de moradores do seringal São Bernardo, em Rio Branco, denunciava ontem, pelo Blog da Amazônia, do jornalista Altino Machado, os danos causados por máquinas e caminhões da empresa Triunfo, madeireira devidamente certificada.

Os moradores das chamadas "colocações" em que se dividem os seringais, se distinguem da maioria dos agricultores familiares do Acre pela cultura de preservação herdada do movimento que teve Chico Mendes como líder mais destacado. Muitos têm sido seduzidos pela chance de ganhar dinheiro com atividades que contrariam esses princípios.

As críticas a programas de transferência de renda como o Bolsa Verde já foram soterradas em uma série de seminários sobre avaliação econômica de projetos sociais, organizados pela Fundação Itaú Social. Para efeito de mensuração de resultados, pouco importa se um programa "dá o peixe" ou "ensina a pescar".

Quem se beneficia quer a chance de sair da miséria. Desse primeiro degrau da escala social, é preciso ter instrumentos para consolidar o processo, evitando que os beneficiários abandonem os princípios que lhes deram a perspectiva de uma vida melhor respeitando o meio ambiente.

Luciano Martins Costa é jornalista e escritor, consultor em estratégia e sustentabilidade. Escreve no Brasil Econômico.

Um comentário:

Fátima Almeida disse...

A meu ver tudo se reduz a mero assistencialismo seja qual for o nome.algo tipo "cala a boca" e "fica quieto aí". A questão sempre estará em torno do poderio econômico de uns poucos com sua culpa e os excluídos de outro que sobrevivem com o mínimo indispensável desejando ter muito mais sem sentir culpa nenhuma. Eles não podem desejar nada.Só quem pode desejar são aqueles que têm capital. Obviamente, não se pode falar em princípios em condições tão desiguais. O peso da moralidade recai sempre em quem quer furar o cerco a qualquer preço. A falta de moralidade está é nos governos que estão sempre fazendo concessões para grandes grupos com negócios volumosos e ao mesmo tempo pretendendo domesticar a boiada rebelde.