domingo, 19 de junho de 2011

HIPOCRISIA EM MARCHA

Janu Schwab



A versão acreana da Marcha da Liberdade só tem seu valor na intenção de querer se integrar a um movimento nacional, como se resmungassem “também somos Brasil". E só. O resto é dúviva. Como diz um dos cartazes que vi em foto de Talita Oliveira: "Marcha da Liberdade, protesto ou evento de fim de semana?".

A causa é válida, mas não apresenta soluções e, como disse o professor Gerson Albuquerque, faz uso de diversidades de fachada ou de temas universais para desviar os olhares (e ações?) do que realmente importa: combate a corrupção, ao tráfico de influência e a politicagem, seja de esquerda, de direita ou de centro.

O fiasco não está no grande ou pequeno número de pessoas presentes ou no teor brando ou inflamado do protesto. O fiasco repousa justamente na individualidade que sucumbe ao peso de uma pretensa coletividade. A mesma coletividade que, em nome da liberdade, diz: “Ou você está com a gente ou você não presta! Ou você está com a gente ou você faz mau jornalismo! Ou você está com a gente ou…”. Oi?

Ainda que seja assustadora, a tentativa de censura a um curta metragem exibido em programa do Ministério da Justiça em prol dos direitos humanos é totalmente compreensível. Dava para esperar algo diferente de quem transforma medos, receios e bandeiras genuínas da sociedade em moeda de troca política? Não, não dava.

Doze anos se passaram sem a Assembléia Legislativa convocar nenhum membro de Governo do Acre para explicar a menor suspeita que fosse. Doze anos. E quando chamam o secretário de Educação Daniel Zen é para tirar satisfação de uma interpretação melindrosa de um texto contundente: sentiram-se ofendidos com uma ofensa que não aconteceu.

Mais assustador é ver gente acostumada a perseguir, difamar e sabotar gritando por respeito à diversidade e liberdade de expressão só para estar na "crista da onda" dos protestos que acontecem ao mesmo tempo. É como se esses protestos fossem "o maior festival integrado de música da América Latina".

É como se resmungassem, soberbos: “Vejam a nossa força de articulação!" Essas pessoas, tão acostumadas ao policiamento moral e político típico (policiando ou sendo policiadas), que se dizem do bem, da paz e do amor, não conseguem enxergar o grande censor dentro delas mesmas.

Nesse contexto, o zarolho (ele mesmo se debochava) Jean-Paul Sartre tinha razão: o inferno são os outros. E para essa turma, os outros são sempre (da) oposição.

Esse mesmo entusiasmo em empunhar cartazes e entoar palavras (roucas) de ordem não se vê na hora de uma reflexão em relação ao respeito às reais diferenças, essas que acontecem no dia a dia, vestidas de opiniões e posturas divergentes, assim como opções e orientações idem.

Entusiasmo equivalente só vejo na hora que criam factóides, distorcem meias verdades, espalham boatos e repassam "babados fortes" a respeito de quem deu, quem comeu, quem traiu, foi traído, quem bateu ou apanhou, pariu ou abortou, isso e aquilo etc. Tudo, claro, por debaixo dos panos, costas e sombras, que essa turma não é chegada num olho no olho.

Lembro bem: muitas figuras que, em nome da liberdade de expressão e do respeito a diversidade, marcharam no sábado em Rio Branco, meses atrás, chamaram de burro parte do eleitorado acreano pelo resultado apertado das eleições ao governo do Estado e a derrota do 55 no referendo sobre o fuso horário.

Que diacho de respeito a diferença é esse? Que tipo de sociedade se quer construir no grito, sendo que no silêncio oportuno das relações interpessoais se joga sujo, julgando e condenando terceiros ausentes, em nome dos próprios interesses?

Latente, essa hipocrisia não é, pois a coisa é escancarada. Resta saber se ela é patente, marca registrada dessa turma que, como menino birrento, bate o pé pra dizer: “eu tenho direitos”. Mas ignora que o limite do próprio direito é o dever para com o direito do próximo.

Janu Schwab é publicitário; Foto: Talita Oliveira

27 comentários:

sérgio de carvalho disse...

Janu,

Queria saber como conseguiu escrever este artigo sem ter participado da marcha e ter usado como base o discurso do Gerson e materia deste blog? O Gerson não participou de nenhuma reunião de mobilização, não procurou se informar e nem colocar seu ponto de vista no momento de construção da marcha, questionamentos validos, porém na hora errada. Nada contra o discurso dele, porém, foi equivocado e não pró ativo. Sou testemunha do processo de organização, fui ativo nele. Vivemos uma crise ideológica,em todos os aspectos. Mas deixo claro, não tivemos nenhum apoio do governo, o som por exemplo, até agora estamos passando o chapéu. As falas de todos os outros foram construtivas, e extremamente duras e críticas, como a da RAimunda Bezeerra, Haru Kuntanawa, Dani Mirini, Lhé e outras. Pena, que a única filmada e publicada foi a mais polêmica. Outra coisa, corrupção e outras temas são de extrema importancia discutir, mas no Estado do Acre e Brasil, estamos vivendo um momento que a tal bancada evangélica com sua barganha está dando as pautas, que líderes rurais estão sendo assassinado, que a polícia está repremindo violentamente as mais diversas manifestações. Cara, acho que corrupção fome e outros temas levantados é consequencia deste processe e não causa, a tendência não é melhorar, mas sim piorar. Por isso, questionar em relação a liberdade de expressão é sim pauta urgente. Uma dica: converse com a Veriana e outros que participaram, pergunte como foi a exibição do filme na frente do palacio, cade o Altino aí? A partir daí escreva com vontade. Companheiro, sabe que respeito e confio na sua opinião.
Abraço gigante

Roberto Feres disse...

Ao menos a marcha foi no sábado, e não num dia de semana às 6 da tarde, como de costume, fazendo que o transtorno ao povo que sai do trabalho apareça nas fotos como sucesso de público do evento.
Parabéns pelo texto, Janu.

La Luna disse...

Não o conheço, mas é perceptível que como é estratégico no uso das palavras.
Concordo com algumas considerações.
Mas acho leviano afirmar que"ver gente acostumada a perseguir, difamar e sabotar gritando por respeito à diversidade e liberdade de expressão".
O meu direito não acaba onde o do outro começa. Eles tem que ser garantidos paralelamente.
Será que ninguém ali é sério, tem compromisso com a discussão??
Enquanto publicitário, sobrevive sem sua pontinha do dinheiro público, da corrupção em que vivemos??

Tadeu Melo disse...

É lamentável, simplesmente lamentável a tentativa ácida de "avacalhar" um movimento de pessoas sérias!
O achismo que pinga desse seu texto me deixa perplexo.
Estamos sim conectados com um movimento nacional. Não por modismo, pois isso não nos apetece, mas por entender que o descontentamento não se expressa com RESMUNGOS, como você disse.
Respeite as pessoas que estavam nesse movimento, pois os idosos, mães de família e profissionais que caminharam, no mínimo acreditam que desmoralizações de movimento sociais, como esta que você esta promovendo, não devem passar em branco. E nosso “pretensa coletividade” não precisa lhe convencer, já que sua individualidade nem se quer esteve na marcha!!

ALTINO MACHADO disse...

La Luna, como você é uma mulher guerreira e firme nas opiniões, favor enviar os próximos comentários sem uso de apelido. Combinado?

joao disse...

O Janu Schwab não é "diretor de arte" da Companhia de Selva"? Hum!

joao disse...

Retificando: foi...

Altemar disse...

Eu não entendi patavina mesmo.
Afinal galera, sois contra ou a favor da liberdade de expressão?

Meu voto:

A FAVOR

Tadeu Melo disse...

É lamentável, simplesmente lamentável a tentativa ácida de "avacalhar" um movimento de pessoas sérias!
O achismo que pinga desse seu texto me deixa perplexo.
Estamos sim conectados com um movimento nacional. Não por modismo, pois isso não nos apetece, mas por entender que o descontentamento não se expressa com RESMUNGOS, como você disse.
Respeite as pessoas que estavam nesse movimento, pois os idosos, mães de família e profissionais que caminharam, no mínimo acreditam que desmoralizações de movimentos sociais, como esta que você esta promovendo, não devem passar em branco. E nossa “pretensa coletividade” não precisa lhe convencer, já que sua individualidade nem se quer esteve na marcha!!

Antonio disse...

Achei o comentário do Janu Schwab muito, mas muito pertinente. O pensamento crítico deve começar pela "nossa própria casa". Caso contrário, é bulling;e um bulling tribal contra outras tribos, que por sua vez, também comete esse mesmo tipo de coisa. Tudo contuinua sendo uma Babel.

Unknown disse...

O texto desandou quando abordou aparentes rusgas pessoais do autor com organizadores da marcha. Os dois primeiros parágrafos são o essencial e dizem o que deve ser dito.

joao disse...

Também concordo em parte com o meu chará, joão. Por trás dos textos há intensões que o próprio autor desconhece, ou não (comom diria Caetano).

Anônimo disse...

Ótimo texto.

@eutogorda disse...

Copio e colo sua opinião, cadê essa tão liberdade na pós marcha? ahh vá!
daqui uns dias vão colocar Acre, viva essa liberdade! Sem contar q o conceito de liberdade hoje em dia está literalmente sendo confundido com libertinagem né? conceitos vãos e supérfluos hoje em dia!

Janu Schwab disse...

Tadeu, essa reação negativa ao oposto, expressa no seu comentário, constrói o cenário pelo qual vocês (e eu também, diga-se de passagem) protestam. Minha individualidade não esteve na marcha de Rio Branco por um único motivo: a distância geográfica.

Mas estive na Marcha de São Paulo. E de dentro dela, ouvindo o que muitas pessoas tinham a dizer, transportei para o contexto acreano do qual faço parte desde 1986, e reforcei meu ponto de vista através do que vivi e que muitos vivem.

Não sou leviano porque vivenciei - e pessoas próximas a mim vivenciaram - o contexto do qual estou falando. Sair a rua e protestar por discordar de algo é saudável. O que não é saudável é incitar quem pensa o contrário a recolher-se a sua "insignificância".

A coletividade não é sua. Ela não pertence a você. Ela é um conjunto de todos. Inclusive de quem discorda de você. Porque se não for, o fato de você protestar de cartaz em punho e grito na garganta, não serve para nada além de mostrar que você é diferente para melhor de quem está em casa sentado no sofá jogando playstation.

E isso, cara, é vazio como só querer usar roupas de grife: exalta ego, agrega um tipo de valor vazio e segrega, pois nem todo mundo pensa ou pode pensar como você, sejam por objeções conceituais, por questões pessoais ou limitações que só ao espírito cabe entender.

Façamos assim: se você nunca perseguiu, difamou, sabotou ou defendeu como se fosse um feudo seu a coletividade (no sentido de bem comum, que só faz sentido quando permite que se faça dele o que cada um quer fazer), então a carapuça não serve pra você.

Porque, sendo sincero, na amplitude contextual que usei para construir o pensamento defendido no texto, a carapuça me serve, pois já persegui, sabotei e defendi como feudo algo que eu achava que me pertencia apenas por fazer parte dele - só não difamei porque me ensinaram lá em casa que fofoca e julgamento moral é algo muito feio, cada um é o que quer e pode ser.

Nisso, sou humano como qualquer um. Nem melhor ou pior, apenas igual. Não sou de lado nenhum. Se for pra existir um lado, que seja o do bom senso, pois esse cenário em que estamos vivendo é cria do maniqueísmo de Bons e Maus, Vermelhos e Azuis, Engajados e Alienados, ou seja, da total falta de bom senso em existir e deixar existir. Abraço.

Janu Schwab disse...

Caros Joãos, se não houvessem rusgas, o texto seria completamente diferente. Ainda bem que essas rusgas aconteceram e, embora alguns tenham levado para o pessoal, em campos conceituais.

Não desconheço as intenções explícitas e implícitas no texto. Sei de todas elas, de cabo a cabo. Discordo por conhecimento de causa e não por achismos ou qualquer motivo obscuro. Não fui alijado dos processos, eu pedi pra sair por motivos que me são claros.

E, sim, integrei a equipe da agência Cia de Selva por um ano e meio, atendendo contas do Governo do Acre. Não se mistura ideologia política com trabalho, a não ser que você siga carreira política.

Há quem diga que, assim como o médico, o publicitário não faz distinção de credo e partido político - quem faz essa distinção são os possuem credo e partido político.

Prefiro concordar com alguns colegas de profissão: ninguém espera da propaganda a imparcialidade do jornalismo (da mesma forma que ninguém esperaria de um advogado a imparcialidade de um juiz).

A publicidade e os publicitários existem assumidamente para promover uma ideia, defender uma marca ou vender um produto.

Para isso usam de tudo que sai da própria sociedade como recurso de linguagem. A única coisa que não fazem é obrigar alguém a adotar/comprar essa ideia, marca ou produto. Isso, nem os políticos fazem.

Não bastasse ter trabalhado na agência Cia de Selva por um ano e meio, que atende contas do governo do Acre, sou primo do Daniel Zen, secretário do Governo atual, neto do saudoso Mário Maia, ex-deputado cassado pela Ditadura, senador pelo Acre e parceiro da Frente Popular.

E ainda filho do também saudoso Everaldo Maia que foi do MR-8 no Acre e, tempos depois, um dos fundadores do MDA, o Movimento Democrático Acreano, que tentou fazer certa oposição a essa mesma FPA e que, por conta disso e de outras coisas, experimentou a sinuca de bico que é estar num estado onde ideologia política e mercado de trabalho se misturam. Morreu sem trabalho.

O caminho de cada um desses que citei, todos eles da minha família, com os quais cultivo e mantenho respeito, apreço, carinho e vinculo estreito, não é o meu.

Por ter na família várias linhas de pensamento e ser livre para conversar sobre cada uma delas, o mlehor é tentar ver os pontos positivos de cada “lado". Lá em casa funciona assim: divergimos, mas sentamos na mesma mesa para almoçar e jogar conversa fora. Afinal, há algo maior que nos une. Devia ser assim em todos os cantos da cidade, com todas as pessoas.

Altemar disse...

Depois de algumas 1, 2, 3, 4 ... - ô Maninha já foi isso tudo? Eita.
Agora nem patavina nem lhufas
Hic, coff coff coff
Parei

La Luna disse...

Altino, como sabe, pseudônimos foram e são utilizados em situações onde não podemos nos identificar, ou seja, quando vivemos em espaços que não nos permitem falar, expressar o que pensamos sem sermos punidos.
Por isto estava na marcha.
Espero que em um tempo não muito distante, possa realmente me identificar, sem temer reações dignas de ditaduras.
A repressão não é só física, é psicológica, ideológica...
Sendo assim, não posso combinar com você, neste momento, de não usar apelidos.
Combinado??

sergio souto disse...

Parabens Janu, belo texto!
Sou amigo de toda sua família e ja
sou seu fã!!
Um abraço-açú!!

La Luna disse...

Cadê a postagem do meu comentário sobre o combinado do apelido???

Maria disse...

Everaldo não era filho do Mário Maia e sim sobrinho; logo, Janu é sobrinho neto dessa grande figura da história acreana. Isso é apenas um pequeno reparo e sem importância, claro, diante de um texto tão lúcido.

Tadeu Melo disse...

É notavel que você consiga teleportar suas impresões de São Paulo para o Acre. Eu não me arriscaria a fazer. Não sei, não vi e nem ouvi em nem um momento durante (ou após) a marcha alguém dizendo que esta não pode ser criticada.
O que realmente é complicado (e isso se tratando da marcha ou de qualquer tema) é a elaboração de impressões tão acertadas sem o mínimo dialogo com as pessoas envolvidas. Ou seja, atribuiram principios que nem se quer foram cogitados na construção deste processo. E o pior é que estes estão disseminandos como verdades absolutas!
Não sou dono de coletividade ou feudo (isso soa inclusive como um boa piada) mas acredito, francamente, que este seguimento da coletividade que participou da marcha busca mudanças. Se elas são boas ou ruins, se vamos ter impacto ou não isso só o tempo dira. Será que todas essas pessoas (que não têm uma árvore genealógica tão frondosa) quebraram suas bússulas do bom senso?
E como disse Renato Russo: e há tempos, nem os santos tem ao certo a medida da maldade.
Um grande abraço.

Anônimo disse...

Parabéns a resposta do comentários Janu! Poucos aqui são os que se apresentam sem leviandade.

Abraço!

Teu fã número 2

Janu Schwab disse...

Tadeu, sou acreano e piso nessa terra para uns bons quibes, tacacás e abraços nos amigos sempre que posso. Feriado, fins de semana com promoções de companhias aéreas e afins.

Nessas ocasiões, quando topo com pessoas aí, elas sempre se espantam: "feriadão desses e você vem pro Acre, maninho?" Venho, vou e sempre irei, é onde repousa todo o meu universo cognitivo.

Logo, transportar visões e vivências de outros centros para a realidade acreana é querer que o Acre, mais do que nunca, se integre. E garanto, não sou o único.

Maria, é fato. Mário Maia era tio do Everaldo. A pressa no escrever engoliu o "tio" antes do avô. A todo mundo aqui, um outro tanto de abraços, principalmente ao Sérgio Souto, que trago comigo na lembrança - em formato LP herdado do Everaldo. :)

Valterlucio disse...

Janu, de Januário. Fui amigo, companheiro em muitos momentos e admirador de seu pai, uma inteligencia raraa e em falta por estes tempos de meu Deus. Lembro de voce, imberbe, mas atuante já em 1986. Abraço
Valterlucio

aurelio disse...

E quem ta ná foto da Talita Oliveira, é meu conhecido Teddy! Vlw cara!

Unknown disse...

Eu estive lá. Achei criativas as expressões. Cópia?? Talvez. Imitação criativa? É mais provável. Fiasco? Fiasco é o Gerson querendo sua medalha de 'o coerente'. Ká ká ká. Eu perdôo as contradições dele, mas o restante do discurso foi válido. Como eu já tinha dito anteriormente: 'democracia é uma utopia'.
Vi uma coisa extraordinária: a Julinha falando em público. Nunca tinha visto isso antes.
Parecia mesmo um bazar de quinquilharia: tudo que procurasse tinha.
Podia ser melhor?? Podia, sempre podia. Mas se não foi tá bom assim mesmo.Melhor que a marcha da familia evangélica anti-gay.