sábado, 25 de setembro de 2010

GOVERNO E PODER

José Augusto Fontes

Governo é ficção. Tem disfarçada intenção de estruturar as relações e visível finalidade de legitimar poderes. É invenção, é criação do homem para ‘organizar’ suas repetidas vontades, suas sucessivas necessidades de governar outros homens. Não se pega em governo, acaricia nem empurra. Governo é ente abstrato, mas o homem que exerce o poder que dele decorre pode ter vontades e necessidades bem concretas, duras como pedra. O poder é o perigo e a graça, é ele que atrai; o poder é a razão principal, é claro, sempre com o manto das melhores intenções e finalidades. Nem era preciso lembrar, ninguém perde isso de vista.

Criou o homem o governo para que ele mesmo, homem, pudesse exercer o poder, que é necessidade e vontade. Os homens foram ficando muitos, os comportamentos variados, os desejos e ambições saindo das vistas, que cresciam querendo acumular, sobrepor. Acumular foi dando na vista como meio de criar poder. Acumular e poder influir, direcionar. Acumular e ter poder, algo que se tem em que pegar. Como organizar tantas coisas? Como estruturar, nivelar, atribuir classes, legitimar o poder, uns aqui, outros lá? Inventou-se o governo. E daí, uma regra notória. Quem entrou, quer continuar. É claro, há sempre novos bons projetos.

As estruturas de administração criadas para este ou aquele governo são até interessantes, no sentido da repartição das competências e das atribuições. E seriam interessantes e úteis, realmente, se o homem acreditasse na finalidade da existência delas para que uns homens interagissem com outros, para que o produto fosse social, para que o bem fosse comum. Mas o problema é o homem, querendo sempre mais do que precisa, querendo mostrar poder para outros homens. O poder embaraça os governos porque os homens estão mais interessados em exercer poder do que em governar, administrar, distribuir.

Também é interessante a ideia da renovação periódica dos governantes, dos membros do poder, nesta ou naquela repartição de competências e de atribuições. No mínimo, serve para que uns saibam que há outros, e que é preciso conduzir-se adequadamente, se quiserem, uns e outros, atingir o objetivo tão igualmente peculiar em todos os casos, que se torna comum: manter sua porção de poder. E seria interessante e útil, realmente, se uns homens acreditassem nos outros, acreditassem na participação, nas ideias, na utilidade, em possibilitar oportunidades. E não perdessem tanto tempo querendo ter poder, uns sobre os outros.

José Augusto Fontes é cronista, poeta e juiz de direito

4 comentários:

José María Souza Costa disse...

Altino bom dia. Lhe convido a seguir-nos pelos BLOGs, para a falicidade das minhas leituras.
Abraços.
O meu é;
http://josemariacostaescreveu.blogspot.com

Altemar disse...

E o que pode ter subvertido nossos governos e governantes para pensar como agora inferido?
Ainda prefiro acreditar que exista virtude em alguns.
Ah Montesqueiu, que saudades de você!!!
Boa reflexão Dr.

Jozafá Batista disse...

Muito simples sair desse impasse: democratize-se o poder. Transforme-se o sistema representativo em democracia (demo + kratos), ao invés desse arranjo contraditório chamado "democracia representativa".
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A representatividade mata a política exatamente porque concentra o poder e solapa o exercício da cidadania ao necessitar da alienação como mecanismo, elemento mesmo do seu funcionamento.
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Democracia não é "estabilidade de instituições", isso é sistema representativo. Não é alternância de poder, isso também é necessidade do sistema representativo. Não é "liberdade de imprensa", já que a liberdade a ser preservada é a de expressão - imprensa é um setor econômico muito organizado utilizado para garimpar interesses dos seus donos, aqui no Acre ou em outros lugares.
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Democracia é exercício do poder por todos. Democratizar o poder anula a possibilidade de uns acumularem poder sobre outros. E se este poder é um pressuposto do sistema, a ponto da alternância ser uma necessidade para impedir a sua transformação numa monarquia disfarçada, isso não significa que não possamos criar algo novo. Todos juntos.
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Sistema representativo e democracia de gabinete produz plutocracia. É isso o que vivemos hoje. Um regime plutocrático.

lindomarpadilha.blogspot disse...

Caro Altini,

O "Estado" mesmo é resultado da necessidade de alguns se imporem sobre outros e exercerem (centralmente) mais poder. O estado é, pois, serviço de poder para o poder e por poder. Qualque permaneência institucional ou pessoal que ultrapasse o usufruto deste poder por mais de 10 anos consecutivos, já se apresenta como ditadura, de classe ou pessoa. Assim, na dita democracia representativa, que permite que um partido, coligação e setores do poder permaneçam por longos anos no poder, esconde na verdade uma unissidade própria de ditaduras. É mais ou menos o que assistimos hoje no Brasil. Não temos opção.

Bom trabalho.

Lindomar Padilha