domingo, 29 de março de 2009

FLAVIANO MELO - ENTREVISTA

"A mudança do fuso horário do Acre foi um erro grave, um ato antidemocrático", diz o deputado



O deputado Flaviano Melo (PMDB-AC) é autor do Projeto de Decreto Legislativo que dá direito ao eleitor acreano decidir se quer ou não que o horário oficial do Acre permaneça com uma hora de diferença em relação ao de Brasília, como determina a Lei 11.662, de autoria do senador Tião Viana (PT-AC), sancionada em maio do ano passado pelo presidente Lula. Até então, a diferença do fuso horário do Acre era de duas horas a menos em relação à Brasília.

- O fato de não ter consultado a população foi um erro dele [Tião Viana]. Um erro grave. Foi um ato antidemocrático. Talvez ele não tenha a experiência democrática que eu tenho. Talvez ele não tenha a vivência de ter lutado pela democracia como o meu partido, eu e minha família lutamos. Talvez ele ainda não tenha assimilado o direito democrático de todos. Porque fez o que fez, impondo uma mudança tão drástica à vida das pessoas. Eu não considero isso democrático - disse o ex-governador e ex-senador do Acre em entrevista por telefone ao Blog da Amazônia.

Veja os melhores trechos da conversa:

Qual é o estágio da tramitação do Projeto de Decreto Legislativo de sua autoria para que um referendo popular decida sobre a mudança do fuso horário do Acre?

Ele foi para a Comissão de Constituição e Justiça. As comissões começaram a funcionar e eu vou acompanhar mais de perto no sentido de que seja logo apreciado e vá para plenário. Fico feliz com a decisão do Michel Temer, presidente da Câmara, de que só as sessões ordinárias serão bloqueadas pelas Medidas Provisórias. Isso nos dá a garantia de que vamos votar muita coisa em sessão extraordinária. Então o meu esforço é para que seja aprovado e encaminhado para o Senado.

Quando vem dormir no Acre o senhor sente o impacto da mudança?

Para nós, que vamos e voltamos toda semana de Brasília, nosso organismo sente menos o impacto com a diferença de apenas uma hora, como está posto. Quando chego aqui, e eu tenho o costume de ir ao mercado... Quando o inverno amazônico começou, isto é, a partir de outubro, novembro e dezembro, o dia começa a clarear mais cedo e a gente não sente tanto. Mas quando começa a clarear mais tarde, como agora, o impacto é muito forte. Quando vou ao mercado às 6 horas da manhã ainda está muito escuro. Quando passo às 6h30, em frente das escolar, está totalmente escuro. Isso vai num crescendo até o dia clarear efetivamente às 7 horas da manhã. Sofrem os que que tem crianças, que vão pra escola, que necessitam estar cedo fora de casa. Todos sofrem porque não conseguem mudar o horário de dormir. Essa é a grande verdade.

O senhor chegou a ser signatário, segundo o senador Tião Viana, de um documento apoiando a mudança do fuso horário do Acre?

Isso não é verdade. O que eu acho que assinei, pois faz muito tempo, durante meu outro mandato... Lembro que sugeri, durante uma reunião da qual o então governador Jorge Viana participou, que o Acre voltasse a entrar no horário brasileiro de verão. O Acre entrava e por isso nós nunca ficávamos com três horas de diferença em relação à Brasília. Aí o governador Jorge Viana disse que ia consultar os empresários. Isso sim, foi o que sugeri.

O senhor acredita que o referendo poderá acontecer mesmo em 2010, como está sendo proposto?

É tudo o que eu gostaria. Acho que é tudo o que o povo do Acre quer. O povo do Acre quer opinar. Eu não entro em discussão se o povo gosta mais do fuso com uma hora ou duas de diferença em relação ao horário de Brasília. O que percebo é que o povo tende a questionar. Mexeram com a vida das pessoas. Tínhamos direito de fazer um plebiscito e não fizemos. Como isso não é mais possível, então vamos fazer um referendo popular para que o povo possa decidir se gostou ou não gostou da mudança. Ou: "eu quero o horário do jeito que está" ou "eu quero o fuso horário anterior, com duas horas de diferença em relação à Brasília". Eu defendo o horário que existia porque a maioria das pessoas diz que prefere ele.

Algumas pessoas argumentam que a realização do referendo junto com a eleição é inconveniente. Outros argumentam que o senhor se beneficiará politicamente disso. Caso o senador Tião Viana seja mesmo candidato a governador, haveria eleitor defendendo a candidatura dele e sendo contra a mudança do fuso horário. O senhor fez isso para politizar a questão?

Não, de modo algum, e eu nem havia analisado a questão por esse ângulo. Além disso, nas democracias mais aperfeiçoadas, como nos Estados Unidos, o eleitor vota em duzentas coisas simultaneamente. Eles aproveitam o momento eleitoral para incluir até a escolha de xerife. Qual é o problema nisso? Nós temos que partir para o aperfeiçoamento da democracia e para que as eleições sejam livres. Cada cidadão acreano poderá decidir o que é melhor em relação ao fuso horário do Estado.

Como o senhor avalia a mudança comandada pelo senador Tião Viana?

O fato de não ter consultado a população foi um erro dele. Um erro grave. Foi um ato antidemocrático. Talvez ele não tenha a experiência democrática que eu tenho. Talvez ele não tenha a vivência de ter lutado pela democracia como o meu partido, eu e minha família lutamos. Talvez ele ainda não tenha assimilado o direito democrático de todos. Porque fez o que fez, impondo uma mudança tão drástica à vida das pessoas. Eu não considero isso democrático.

Todos dizemos no Acre que o senhor é dono do jornal A Gazeta. Como o seu nome não aparece no contrato social, permita-me perguntar assim: por que o jornal de sua família é tão tímido na defesa do seu projeto?

[risos] A Gazeta não é um jornal da minha família. Isso não existe. Você sabe muito bem que não existe.

Mas um primo seu é sócio majoritário do jornal...

Dizem que sou dono da TV Gazeta, disso e daquilo... Conversa com o Roberto Moura [dono da TV Gazeta] que ele te conta essa história.

Gostaria de saber: por que a Gazeta não é mais enfática na defesa do projeto de sua autoria contra a mudança do fuso horário?

Não sei, pergunta para o Sílvio Martinello [diretor e sócio do jornal]. Eu não trabalho na Gazeta, cacete. Não sou o editor do jornal.

Então voltemos ao fuso horário. Quais seus próximos passos em relação ao referendo popular?

Vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance em defesa do referendo. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça é um parlamentar do PMDB. Vou pedir que o relator apresente seu relatório antes do prazo e vou pedir ao presidente Michel Temer para que inclua na pauta tão logo passe pela comissão. Se for necessário urgência urgentíssima, tenho o apoio do meu líder Henrique Alves. Já conversei com ele e ele disse: "seu pedido será atendido na hora que você quiser". Não quero atropelar nada. Eu poderia pedir urgência urgentíssima e o projeto sairia da comissão, sem ser apreciado na comissão, direto para o plenário. Mas eu quero que passe pela Comissão de Constituição e Justiça, que é a mais importante da Casa, para que tudo seja da forma mais transparente. Dessa maneira, evitarei que digam que se está conduzindo a coisa politicamente.

O senhor tem algo mais a dizer?

Apenas que se forma num dos cafés
, no mercado de Rio Branco, todas as manhãs, uma turma boa: Dudé Lima, assessor do governador Binho Marques, Abrahim Farhat, assessor do senador Tião Viana, os aposentados Zezé Gouveia e Gouveião, além do comerciante Cléber Cara-rachada, entre outros. Dia desses, chamei o Lhé e falei: quero convidá-lo para ser oficialmente o coordenador da campanha em defesa do referendo. O Abrahim disse que não pode, que é contra a mudança, mas que não iria atuar contra o senador.

"A mudança do fuso horário acreano patrocinada pelo Senador Tião Viana (PT), candidato certo da Frente Popular ao cargo de governador do Estado em 2010, é um tema que não vai lhe deixar em paz e poderá representar um desafio eleitoral significativo caso sua candidatura seja confirmada", avalia Evandro Ferreira. Leia no blog Ambiente Acreano.

14 comentários:

Anônimo disse...

Curto e grosso:

1) Ninguém lambuzou o nome do Tião Viana nem o de sua família na lama, foi ele próprio quem se atirou e levou consigo os que nisso estavam envolvidos (no caso sua filha). Quando o fez sabia que era errado e, portanto, dos riscos que corria.

2) Quem assim procede, em momento algum demonstra estar preocupado com sua própria dignidade nem pode ser considerado exemplo de dignidade (pessoal, política etc.). Para mim, o Tião Viana pode ser perfeitamente utilizado como exemplo de uma imagem pública de dignidade fabricada graças a um desabonador controle sobre a mídia local e aos recursos de que (juntamente com seus correligionários) dispõe na administração pública. Nesse sentido, não é em nada diferente do Sarney. O único álibi que essa geração de políticos tinha para tentar se diferenciar das velhas raposas era essa presumida lisura no uso e aplicação dos recursos e bens públicos (o que aliás nivela sua atuação por baixo, pois as expectativas históricas projetadas sobre essa geração estavam além da mera resistência à "tentação" de roubar), álibi este que vemos se decompor dramática e tragicamente a cada dia.

3) Como pode uma pessoa que, aliado aos interesses de uma das maiores corporações de mídia do país, avilta a população de um estado inteiro, impondo alterações profundas em seu ritmo de vida, de trabalho e em sua dinâmica com a natureza, vir reclamar respeito à dignidade!!?? E onde fica a dignidade para com essa população, que nem consultada sobre a mudança foi pelo mui nobre e digno senador??!!

4) É lastimável ver o governador Arnóbio Marques assumindo esse papel de salvador da honra e dignidade de alguém cujos esforços só contribuem cada vez mais para a queda da máscara. A primeira impressão que vem à mente é a de que forte controle exercido de fora sobre os passos e atitudes do governador. No momento em que sai uma palavra em tom mais alto, esse controle externo chega e corrige o passo, o compasso e o tom. Como diriam os portugueses, chega a dar dó de si. Por mais cuidadosa que tenha sido a redação daquele artigo em que tenta alçar o Tião, o constrangimento está presente, em muitos casos salta aos olhos. Da mesma forma que também se percebe no texto do Antonio Alves, ao tentar fixar os significados e sentidos do que disse e do que não disse o governador, do momento político, do “perrengue” com a mídia e até das ações deste ou daquele agente público.
É, as coisas estão se tornando difíceis, é muito peso sobre as palavras e os discursos, o de tentar costurar discursivamente os desmantelos que, concretamente, saltam à vista. Este e o próximo ano serão de muito trabalho para Antonio Alves e para a equipe de escrivinhadores. Mas, como disse, está cada vez mais difícil manter, através das palavras, a coerência que se torna cada vez mais escorregadia na política e na prática. Veja só o meu propósito de ser “curto e grosso”, no confronto com a realidade, desfigurou!

Antonio Alves disse...

Às vezes não dá pra ser curto, nem pra deixar de ser grosso. Gostei especialmente da frase: "as expectativas históricas projetadas sobre essa geração estavam além da mera resistência à "tentação"de roubar". É uma pena que uma análise tão boa -e quase exata- seja assinada com um ridículo pseudônimo. Quando aparecerá gente disposta a defender a liberdade mais que a própria pele?
O Flaviano se diverte tirando casquinha no tombo do Tião. O Renan deve estar babando de alegria. E aqui, na democracia dos anônimos, os mais exaltados gritam "viva a nossa impotência!" e outros respondem "viva a nossa mediocridade". Será que devo deixar de lamentar, inventar um "fake" e me divertir também?

Leila Ferreira disse...

Poenta toinho, isso não e só casquinha não e casca grosa mesmo que ele ta tirando do tombo do Tião.
Tão inocente essa criatura, pouca vivida na política. Ainda vem dizer que “não havia analisado a questão por esse ângulo” que ele poderia ser beneficiado politicamente, santa paciência ele quase não pensa em benefícios políticos como a grande maioria.
Sou contra o horário e que venha o referendo.

Leila Ferreira

Acreucho disse...

Imaginem se Flaviano Melo é homem de "não ter olhado a questão por este angulo"...

Dulcivânia Freitas disse...

Olá Altino, eu moro em Macapá (AP) e quero te dizer que passo aqui diariamente. Porque gosto muito dos assuntos, pois amo o Acre (é um amor platônico, nunca estive aí), e pq você tem uma redação maravilhosa, limpa e de ótima narrativa. é o que chamam de 'texto gostoso'. Sem falar que o conteúdo é um verdadeiro serviço de utilidade pública e uma aula on line de como fazer apuração jornalística. tchau. Dulcivânia

Charles Foster Kane disse...

A democracia dos anônimos continuará imperando na "Ditadura do Silêncio", para que formadores de opinião como o "poeta" Toinho Alves siga com sua prosa,de maneira clara, democrática e sem medo de represálias políticas, não é "cumpádi" Binho...

Grupo de Choro Afuá disse...

Mudar o antigo horário do Acre é muito mais agressivo do que simplesmente mudar a terminação acreano para acriano em prol da correção gramatical. Tem que acabar com essas exceções da língua que a torna mais complexa, sou a favor da regra geral. Que seja acriano e que voltemos a ser acordados pelos galos. Fim desse novo horário que foi imposto já!!!!

walmir.AC.lopes disse...

A resposta do Lhe à “provocação” do Deputado Flaviano Melo me fez refletir sobre um ponto crítico: o posicionamento do Governador em relação ao inferno astral do senador.
Estão querendo exigir demais do Binho.
Como exigir, mesmo em nome da moralidade e da ética na política, que ele ajude a “fritar” um companheiro de longa data, co-responsável pela sua ascensão ao Palácio?
Como exigir, enfim, que um político, por mais íntegro, atropele os princípios da gratidão e do corporativismo partidário - essas duas forças poderosas que não fazem distinção entre bons e maus ou dignos e indignos -, mormente quando está em jogo a coesão do grupo, argamassa indispensável para a execução de futuros projetos políticos, coletivos ou individuais?
Por isso me agrada o jeitão meio “vaselina” do Binho, pois apesar dos políticos serem, primariamente, os maiores interessado na própria reeleição, normalmente fazendo tudo para atender os clamores do eleitorado e do próprio ego, parece que ele, neste particular, vem fugindo à regra geral. É o que dizem suas palavras e também a “mineirice” de seus silêncios em relação ao tombo do senador.

Elisson Magalhães disse...

Flaviano (e demais políticos) é (são) passado(s) na casca do alho e da cebola tmb. Assim como Chapolin Colorado, só que com muito mais astúcia, seus movimentos e palavras são friamente calculados.

Rafael Garcez disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Andarilho disse...

Não será preciso utilizar de todas as regras da gramática para falar, de uma maneira bem clara, que a construção de um 'Acre melhor', pregado pefa FPA, não sairá do papel sem que o seu processo de criação não seja carregado de interesses pessoais e coletivos, unicamente centrados na FPA, onde um por todos e todos com quem achar melhor.

Vingador disse...

Bem,
A questão da mudança do horário não foi debatida, primeiro por que você altino nos contou dias desses a história de como agem os "donos" da mídia, pelo que você contou...(risos), não dá pra levar este povo a sério, pois assim como o Barão os expulsou de sua sala chamando-os de urubus o binho os faz calar dando um grito.
Segundo não devemos esquecer que a diferença de três horas prejudicaria a transmissão dos programas da "grobo".
E digo mais se for feito o referendo ou o que seja no dia da eleição a frente vai sofrer um sofoco danado, por isso eles vão impedir esse negócio de consulta popular...

direitoshumanos.ac@gmail.com disse...

nem o pessoal do PT gosta desse modelo de horario atual... agora tirando as questões politicas que envolve, a oposição e o governo ... que essa medida foi atidemocratico foi, para todo mundo até para o proprio PT.

Gabi Ramos disse...

Olha pessoal, independente de politica, quem presta e quem não presta, o que o Senador fez foi um grande erro sim, talvez por ter sido mal assessorado pela sua equipe inexperiente. Não gosto de Flaviano Melo de jeito nenhum. Como pessoa comum não o conheço, mas como politico todos nós conhecemos e muito bem. Quando Governador e prefeito do nosso Estado foi um tanto irresponsável com as finanças também como está sendo o Governo atual também. Porém o Flaviano Melo está corretissimo. Pois Tião deveria sim ter consultado a população que tanto gosta, confia e vota nele. Mas ele queria atender urgentemente um pedido da rede globo, e falhou por não se importar com seu povo, pois o povo dele la em Brasilia está, sem problema em acordar cedo, ou melhor acordar de madrugada e ir para o ponto de ônibus no escuro, com riscos de assaltos etc e tal. Bem, que venha o referendo, e seja qual for o resultado com certeza terá se realizado uma Democracia.

Gabi Ramos
Cascavel - Pr